31.1.07

Revolução Bolivariana em Marcha

Enquanto aguarda pela alteração da Constituição que lhe permitirá continuar a ser reeleito, Hugo Chavez fez hoje aprovar uma Lei Habilitante, a mãe-de-todas-as-leis (literalmente), que lhe dá poderes excepcionais para legislar por Decreto durante os próximos 18 meses, de modo a assegurar a «revolução» que se propôs levar a cabo (aqui, aqui, aqui e aqui). Dada a solenidade do momento histórico para a República Bolivariana da Venezuela, a Asamblea Nacional saiu do parlamento para votar a lei ao ar livre, na Plaza Bolívar, onde impôs, por unanimidade, «la dictadura de una democracia verdadera», nas palavras do vice-presidente Jorge Rodríguez.

Onde é que me inscrevo?

«CLUBE DOS AMIGOS DE MANUEL PINHO
Eu gosto de Manuel Pinho. O ministro da Economia nunca nos desilude. Ele é de confiança. Quando Manuel Pinho intervém já sabemos que vai haver borrasca. E eu gosto desta previsibilidade. Dá-nos segurança. Lembra-nos que, nesta época de incertezas, há coisas que não mudam. Uma delas é a trajectória do Sol. Uma outra é o astro Pinho. Certinho como um relógio suíço

por Paulo Gorjão

Ganhe o SIM ou ganhe o NÃO

Justiça abençoada



"A par da cerimónia oficial no Supremo Tribunal de Justiça, cujo início está agendado para as 15:30 horas, o arranque do ano judicial contempla ainda a realização de uma missa solene, cerca das 12:00 horas, na Sé de Lisboa." - via Casino da Elsa.

estado liberal?

Na formulação em epígrafe - «Estado liberal» - presume-se a co-habitação entre dois conceitos políticos aparentemente contraditórios: o Estado e o liberalismo.
É sabido que os liberais desconfiam, por método e por princípio, do Estado e, por conseguinte, declaram-no, um pouco marxianamente, o seu «inimigo principal». Há, até, algum liberalismo, sobretudo o que tem raiz «libertarian» norte-americana, que entende que o Estado e a liberdade são incompatíveis.
Contudo, a expressão «Estado liberal» faz parte do léxico político corrente, e é tida como a designação que melhor corresponde a uma ideia liberal da civitas. Falta, se assim for, que os liberais consigam estabelecer o seu modus vivendi com o velho inimigo, e expliquem como podem coexistir, ou antes, como podem colaborar, o princípio da soberania com o princípio da liberdade. Julgo mesmo que esta é uma tarefa essencial à credibilização do liberalismo português, que se tem deixado enredar numa metodologia redonda de crítica metodológica ao Estado, sem oferecer alternativas.
Por outras palavras: o «Estado liberal» é possível, ou o liberalismo não se concebe no Estado?
Deixo o desafio aos liberais da blogosfera portuguesa, desde logo, aos meus colegas do Blasfémias. Eu próprio tenciono voltar ao assunto

Só uma perguntinha

Era para, humildemente, como convém, inquirir a Dra. Mafalada do Blogue do Não - que tão insistente e pressurosamente gosta de corrigir tudo e todos ancorada na sua particular interpretação dos cânones jurídicos -, se tem alguma coisinha a dizer acerca da extraordinária opinião do Dr. Bagão Félix, formulada durante uma actividade de campanha do "Não", sobre a expressão normativa contida no art. 1873.º, do Código Civil, «... nascituros não concebidos...» que, assegura o ilutre defensor da penalização das mulheres, caso o "Sim" vença, provocará uma contradição insanável no nosso ordenamento jurídico.
Muito agradecido.

O preço da Liberdade


31 de Janeiro, proclamação da República no Porto - 1891
A proclamação da Republica das janellas da Camara Municipal


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A minha homenagem particular vai para o filho do Major Acácio Lobo, revolucionário republicano do 31 de Janeiro, que conheci hoje de manhã na cerimónia das comemorações da revolta realizada no Porto.

O estranho "liberalismo" do SIM

Embora o SIM reconheça à mulher a liberdade de abortar, parece haver algumas dúvidas sobre o direito dos médicos de poderem livremente escolher entre fazer e não fazer abortos para além dos casos em que o aborto é uma necessidade médica. Ou seja, no caso do aborto em que existem sérias dúvidas sobre se há ou não outro ser cuja liberdade interessa proteger, o SIM é taxativamente pela liberdade de uma das (eventuais) partes. No caso da liberdade dos médicos, em que nenhum direito negativo é violado, o SIM já não é pela liberdade mas sim pelo direito positivo ao aborto.

Dúvidas

O artigo 142.º, n.º 2 do Código Penal atribui a dois médicos médicos diferentes a competência para decidir se se verificam, ou não, os pressupostos de não punibilidade do crime de aborto:
«A verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é certificada em atestado médico, escrito e assinado antes da intervenção por médico diferente daquele por quem, ou sob cuja direcção, a interrupção é realizada.»
A prática, porém, parece ser outra, suscitando-se, nomeadamente, a intervenção de Comissões de Ética Hospitalar para se verificar se se está ou não em presença de alguma das situações previstas no n.º 1 do mesmo artigo. Dada a dificuldade em encontrar informação clara e actualizada sobre o os procedimentos burocráticos vigentes para a realização de um aborto no SNS, convido os leitores que disponham dessa informação (através da caixa de comentários ou do endereço de correio electrónico disponível ali à direita) a partilharem-na com os demais leitores, já que a mesma ajudará certamente a compreender muitas da questões que estão em debate.

Mário Soares

“Toda a gente sabe que sou a favor, não do aborto, mas da despenalização do aborto nas condições em que diz a lei, até às dez semanas. Sou a favor, sempre fui, portanto vou votar ‘sim’. Não tenho nenhuma dúvida”
“Se o ‘não’ ganhar não é nenhuma tragédia”. (...) “Tudo ficará igual, eu acho que é mau, mas é assim. A democracia tem preços e esse é um deles”. (link)

Para já o importante é conseguir o voto


PS guarda segredo sobre regulamentação da lei


"Não está em causa a regulamentação. A seu tempo será feita", afirmou [António Costa], sublinhando que, para já, o prioritário é conseguir a despenalização da IVG até às dez semanas de gravidez.


Votem que depois eles explicam em que é que votaram.

(Via Insurgente)

abominável, doutor neves!

Pelos «spots» que se foram ouvindo hoje de manhã, parece que o Daniel Oliveira terá brilhado no «Frente a Frente» com o Prof. César das Neves, que irá hoje para o ar, na TSF, a partir das 20.00 h.
Do que me foi dado ouvir, o Doutor Neves insiste na peregrina ideia de que uma mulher grávida por violação terá de conceber sob ameaça de penalização criminal. Esta questão esteve, de resto, em discussão no debate da alteração da lei do aborto de 1983, que conduziu àquela que está actualmente em vigor. O Doutor Neves, ao que me foi dado ouvir, afirma que os partidários do «Não» são maioritariamente contra a lei actual, porque querem excluir a possibilidade do aborto legal nesse caso. O Doutor Neves, do alto da sua autoridade moral e da sua bondade congénita, só pensa na «pessoa» que ali está, durante as primeiras dez semanas da gravidez, e esquece-se da pessoa da mãe, exposta à violência inominável de gerar um filho nessas condições. O Doutor Neves adianta, generosamente, que estas mães não seriam obrigadas a educar e a acompanhar o filho que a lei as obrigou a ter. Alguém cuidará disso, provavelmente, nos elevados pensamentos do Doutor Neves, o Estado, que é sempre, para estas e outras coisas, o tapete para onde se atira o lixo que se quer esconder. Que bela ideia, Doutor Neves! Na extinta União Soviética não fariam melhor!
São estas e outras ideias abomináveis do Doutor Neves, que fazem dele a Lídia Jorge do «Não».

O livre arbítrio

Durante anos vivemos na assombração do 'anti-comunista primário'. Por outras palavras a desventurada alma que criticasse o comunismo corria o risco de passar a primário coisa que jamais acontecia aos anti-fascistas. O que era mais interessante era a forma como se pronunciava o 'primário'. Era muito acentuado e quase sem dar por isso os acusados que tinham o inegável mérito de serem anti-comunistas acabavam a discutir o seu primarismo. Pois agora temos o problema do 'livre arbítrio da mulher'. Alguém imagina uma discussão sobre o livre arbítrio do homem? O livre arbítrio do homem aparece como algo natural. O da mulher está no paradigma do anti-comunista primário.
O Homem pode ter livre arbítrio. O homem também pode ter livre arbítrio. A mulher tem de ter mediadores.

A vida como causa de esquerda

A esquerda pró-vida é contra o aborto porque, entre outras razões, o aborto é um instrumento de opressão de uma sociedade patriarcal hostil à mulher e a tudo o que lhe diz respeito.

Progressive pro-lifers
There is, however, another reason pro-life progressives reject the mother's rights vs. fetal rights framework. We believe that it represents a false dichotomy, imposed by a patriarchal society in which the public sphere has been traditionally reserved for men, who of course do not bear children. The result is that our public institutions, such as schools and the workplace, are hostile to the needs of children and those who bear them. In addition, the sexual double standard works to punish women, but not men, for having sex when they're not "supposed" to. Therefore, single mothers face much more censure, official and unofficial, than single fathers. We believe that abortion, rather than freeing women from this oppressive structure, helps maintain it by altering women to fit the patriarchy rather than altering (or outright tearing down) the patriarchy to build a society more responsive to women's needs.

Da "vida humana"

Muito interessante a confusão que se gerou à volta do termo "vida humana". É óbvio que o feto é uma "vida humana". Está inegavelmente vivo e é humano. Claro que o NÃO aproveitou o tabu que existe em relação à destruição da vida humana para fazer campanha. O mesmo tabu que habitualmente justifica a rejeição da pena de morte em todas as circunstâncias. O SIM tende, demasiadas vezes, a responder da pior forma possível a esta táctica alegando que o feto não é vida humana. Confunde-se aqui "vida humana" com "cidadão". "Vida humana" é uma categoria biológica, "cidadão" é uma categoria política. O que está em questão neste referendo não é se o feto é "vida humana" mas sim se toda a "vida humana" merece o estatuto de "cidadão", ou pelo menos um estatuto parcial de cidadão. E mesmo que se considere que toda a vida humana deve merecer o estatuto de cidadão falta decidir se se justifica ou se adianta para alguma coisa proteger todo o cidadão em qualquer circunstância através do direito penal.

30.1.07

O minarquismo de Vital Moreira

Ontem no Prós&Contras Vital Moreira defendeu a ideia de que o estado não deve proteger os valores de uma determinada facção contra outra facção da sociedade. Esta tese é particularmente interessante se tivermos em conta que o estado em Portugal tem servido para impôr os valores socialistas à sociedade. O salário minimo, o Serviço Nacional de Saúde, o ensino público e a Segurança Social são tudo imposições dos valores socialistas à sociedade. Só se mantêm porque o estado usa a força para cobrar os impostos que financiam essas actividades. Por isso, se Vital Moreira está mesmo a sério, se acredita mesmo que a força do estado não deve ser usada para que uns imponham os seus valores aos outros então deve defender a extinção do salário mínimo, do SNS, do Ministério da Educação e da Segurança Social pública.

Boa Ideia

O primeiro-ministro português está em visita à China ao mesmo tempo que o presidente chinês e vários ministros estão fora, em visita oficial a outros países. Apesar desta absurdo desfazamento de agendas, Sócrates não adiou a visita à China. É que um dos objectivos desta viagem é o de estar por longe, nesta altura da campanha para o referendo. Quando voltar, passa um ou dois dias a descansar do jet-lag e mais um ou dois dias para repôr a agenda em dia. Provavelmente, aparecerá no último dia da campanha para encerrar as actividades do PS, sem responder a nenhumas perguntas. ###

Acontece que continua a faltar uma resposta. O que é que vai fazer o partido maioritário se o SIM ganhar, nomeadamente no que diz respeito ao Serviço Nacional de Saúde. Até agora, a maior parte dos dirigentes do PS e os principais activistas do SIM sugerem que o aborto terá uma espécie de Via Verde no SNS, passando à frente de todas as listas de espera, desresponsabilizando a decisão individual das mulheres. Ou seja, não pretendem apenas que o estado saia do caminho, mas sim que se intrometa e agencie graciosamente todas as IVGs. O mesmo pretende, aparentemente, o Ministro da Saúde.

Ora, o SIM em que me disponho a votar, não é este. O SIM em que me revejo é apenas o da despenalização da IVG. Nada mais. Continuo à espera de esclarecimento. Faltam 12 dias.

Argumentos racionais a favor do SIM


O cardeal patriarca, D. José Policarpo, considera que a educação sexual "é bem-vinda e necessária", mas para ser "verdadeira" tem que ser feita na "perspectiva da castidade".
[bold meu] (...)
D. Policarpo critica ainda o "exercício da liberdade num perspectiva individualista", onde "cada um pode fazer tudo o que quer e lhe apetece". Trata-se de "uma liberdade individual sem responsabilidade", que o cardeal diz encontrar "nos acidentes de viação, nas agressões contra o ambiente, no abandono e abuso de crianças, no aborto".

A ler:

«Aborto e civilização», por José Manuel Moreira

Ainda o Prós&Contras

«No debate de ontem, o costume. De diferente, apenas a evidência de que alguns dos que baseiam a sua argumentação na alegada mentira contida na pergunta não passam de mentirosos.»

AMN, n' A Arte da Fuga

Reafirmar o que deveria ser óbvio:

«Acho obscena, assim mesmo: obscena, a utilização de crianças e adolescentes em programas como o Prós e Contras de ontem para falarem ou se manifestarem sobre o aborto. Tal me parece ser da mesma exacta natureza que o inquérito sobre os costumes sexuais dos pais, que tanta condenação suscitou e bem. Antigamente, no tempo em que os animais falavam, havia uma regra deontológica dos jornalistas que impedia entrevistas a menores sobre estes temas. Caducou?
Pacheco Pereira

A ler:

«Construção da OTA ou falência da TAP», por Rui Rodrigues

A Campanha ainda vai no adro (I)

O beijo, por exemplo. Entre os grupos do "sim" prevalecem largamente os dois beijos na cara, sendo excepções um ou outro socialista beirão deslumbrado com o trato do jet set de Cascais e, de forma irregular, Paula Teixeira da Cruz.
No "não", pelo contrário, só é admissível o beijo unifacial. Sem excepções. Sempre.
(aqui).

o estado da nossa democracia

O «Forum TSF» de hoje tratou dos limites à liberdade de expressão dos ministros dos cultos religiosos (sobretudo da Igreja Católica) e dos ministros do governo português, ao que parece consagrados numa muito sensata lei do referendo ao aborto.
Subjacente a essa decisão do legislador está, como é óbvio, uma íntima convicção da estrutural estupidez do povo português que, coitadinho, se deixa influenciar pela «padralhada» nas missas a que se desloca de livre e espontânea vontade (embora, reconheçamos, muito influenciado pela falta de laicização que ainda vigora na sociedade portuguesa, pela qual é responsável a sinistra ICAR), e pelos senhores ministros nos actos das inaugurações das estradas e nas almoçaradas festivas a que a «populaça» vai matar a fome.
A liberdade de expressão é, no nosso Portugal democrático, um princípio sacrossanto, ainda que a sua aplicação possa ser fiscalizada pelo legislador, a bem da pureza e da ingenuidade do povo, e da virgindade democrática da Nação.
A propósito, e já que falamos de programas da nossa comunicação social: alguém sabe informar em que lugar vai o nosso Doutor António, nesse fantástico concurso da RTP, que é os «Grandes Portugueses»?

coisas humanas

Do animado «Prós e Contras» de ontem saíram duas novidades com interesse: uma nova categoria biológica enunciada pela talentosa escritora Lídia Jorge, a «coisa humana» que vive no útero das mulheres até às dez semanas de gravidez, e um aviso sério de Vital Moreira, feito aos dois partidos centrais do nosso regime, para que digam aos portugueses como irão regulamentar, se estiverem no poder, a autorização legislativa que a vitória do «sim» representará. A isto acrescentou que acharia «muito mal» se o não fizerem até ao dia do referendo. Inquirido pela entrevistadora sobre as razões dessa opinião, esquivou-se a responder. Porquê? Pela simples razão de que essas explicações, sobretudo da parte do governo em exercício de funções, podem fazer toda a diferença e decidir o sentido de voto de milhares de cidadãos. Como é por demais evidente.

O SIM informado

Se o modelo adoptado será exactamente esse em caso de vitória do "Sim", não faço a menor ideia, ( Vasco M. Barreto)


Pois é, Vasco. Ninguém sabe qual é o modelo que será adoptado após uma vitória do SIM. Tanto pode ser um modelo de mera despenalização com proibição da actividade económica organizada (modelo seguido, por exemplo, no caso da prostituição) como pode ser um modelo de liberalização em que o aborto para a ser um acto médico normal. O governo em funções anda caladinho. O eleitores vão votar numa incógnita. Terão que especular. Alguns votarão pelo seguro para não serem surpreendidos.

Argumentos liberais a favor do SIM (9)

«... Eu, pelo menos, uma das razões porque voto sim é precisamente essa: a vitória do sim significa que o aborto passará a ser uma questão da esfera privada e da responsabilidade individual de cada um de nós. Entre outras garantias que oferece, a vitória do sim encerra o assunto. Restam, portanto, cerca de dez dias para assegurar que não precisamos de voltar a discutir o aborto

Pedro Adão e Silva, no Sim no Referendo.

Tutela penal em defesa de valores do colectivo

Eduardo Nogueira Pinto, Blog do Não: Ora, partindo do princípio de que, pelos vistos, todos partimos - e que é o princípio de que o feto, por ser vida humana (embora ainda não pessoa), merece uma tutela penal.

caramelo, nos comentários: talvez a maior parte das pessoas (não todas) que são a favor da despenalização sejam também contra o aborto por dois motivos:
[...]
2. Porque, não reconhecendo ao feto o estatuto de pessoa humana, e por isso não lhe conferindo a mesma protecção social e penal, não deixam de ver nele vida humana, sujeito de alguma protecção jurídica.


Comentário:
O que se defende nestes dois textos é que o código penal deve poder ser utilizado para defender valores colectivos. O problema é que tais valores não são mais do que a soma dos interesses individuais da maioria contra os interesses da minoria. Como antídoto para este tipo de colectivismo os liberais defendem que o código penal só deve proteger os direitos negativos dos indivíduos e nunca os valores de uma facção.

Fiquei Maravilhado

No Casino Estoril, estreia hoje um espectáculo chamado FOUR. Tive oportunidade de assistir a uma ante-estreia, na Gala do Desporto da Câmara Municipal de Cascais, no passado Domingo.

Ao contrário da generalidade dos espectáculos de casino, este não tem maminhas ao léu. E ao contrário da generalidade das pessegadas que os casinos gostam de oferecer, este Four - Espírito dos Elementos é absolutamente recomendável. Um espectáculo de circo/dança/luz/som com um bom gosto irrepreensível, flawless, original.###

Nota: Recomendação gratuita. (Convites para distribuir pelos blasfemos não serão rejeitados)

Referendo ao Aborto - Estratégia e táctica.

Nota prévia: O texto que se segue é um mero exercício de especulação teórica. Não se baseia em qualquer informação privilegiada, pelo que a interpretação que é sugerida poderá não ter qualquer relação com a realidade.

"O general sábio faz que as suas tropas vivam à custa do inimigo"
Sun Tzu

O referendo ao aborto (ou I.V.G., se preferirem) de Fevereiro de 2007 foi uma iniciativa do Partido Socialista e do Governo apoiado pelo mesmo partido. Qualquer que seja o seu desfecho, o vencedor é já conhecido - é o próprio Governo.

Depois de vencer folgadamente as eleições gerais de 2005, o Governo encontrou-se confrontado com dois objectivos estratégicos principais:

A) Vencer as eleições gerais seguintes.
B) Governar de forma a que os resultados da governação permitam essa vitória.
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O Objectivo B obriga a que o Governo se liberte de alguns traços políticos "de esquerda" e opte por políticas centradas na eficiência, por vezes com traços liberais. Contudo, a governação "realista" pode apresentar uma pesada factura nas próximas eleições, comprometendo o objectivo A - um objectivo fundamental.

Na campanha eleitoral de 2005, o Aborto foi um tema central na campanha das forças políticas à esquerda do Governo, pelo que este decidiu retirar esta bandeira a essas forças, promovendo um novo referendo.

O referendo providencia dois objectivos tácticos:
C) Deteriorar o desempenho das restantes forças de esquerda nas próximas eleições gerais, reduzindo perdas de votos.
D) Ocupar a opinião pública com um tema que nada tem a ver com a governação, provocando um "efeito de cortina". Enquanto as pessoas andam entretidas com o Aborto, reparam menos na governação.

Pode haver pessoas do Governo muito empenhadas no tema do Aborto, que sentirão o resultado da votação como vitória ou derrota. O Governo no seu conjunto, e enquanto tal, já ganhou o referendo, sendo irrelevante, nesse aspecto, o resultado da votação, uma vez que ganhar o referendo não é nem um objectivo estratégico nem táctico - o objectivo é promover o referendo, não necessariamente ganhá-lo.

Já em 1998 quem "ganhou" os dois referendos perdeu as eleições gerais seguintes, mostrando a irrelevância política/partidária do resultado eleitoral (na ocasião poderá ter havido quem não compreendesse este facto).

Já no que respeita à Oposição, o referendo coloca desafios consideráveis. É que caso não exista uma acção clara contra a posição do Governo, a Oposição arrisca-se a perder votos para formações políticas conservadoras. Compreende-se a posição firme, contrária à posição do Governo, da chefia da Oposição. É que neste caso existe um objectivo táctico semelhante ao objectivo C) do Governo (trocando "esquerda" por "direita").

Falta mencionar a falta de oposição da Presidência da República à iniciativa do referendo. Neste caso, os objectivos estratégicos são semelhantes aos A) e B) do Governo, mutatis mutandis, mas acrescenta-se um objectivo estratégico E), manter a governabilidade do país, o que não se garante se as forças à esquerda do Governo crescerem desmesuradamente. É que o Alto Magistrado poderá reconhecer que o adversário do Governo no referendo não é a Oposição nem qualquer estrutura religiosa, mas antes são os seus aparentes aliados - as forças à sua esquerda.

José Pedro Lopes Nunes

Como perder um debate sem apelo nem agravo



Bem sei que o "Não" é deficitário em vários sentidos. Não podia levar ao Prós & Contras (ainda está a dar) um Vital Moreira. Ou um Vasco Rato. Mas também não era preciso fazerem aquela figureta.
Sinceramente, para fazer muito melhor bastava um ou dois que conheço do Blogue do Não. Pelo que vi, até seria preferível o perito em graçolas do 31.
Assim, bom... vocemecês lá sabem... o melhor talvez seja continuarem a marchar, pois para debates a sério...

29.1.07

Todos

Todos somos contra o aborto. Mas se o feto não é uma pessoa porque é que somos todos contra o aborto? Somos todos contra porquê?

Nota

No P&C discute-se se o feto é uma pessoa não. O que parece contar não é a na natureza do feto mas sim os sentimentos que as mães têm em relação a ele.

Iluminem-no!

No P&C, Daniel Oliveira está sentado entre Vasco Rato e a nossa Helena Matos. Admite-se que, amanhã, o Arrastão esteja num dos melhores dias de sempre.

Irreal blog

No Small-Brother:
«Momentos bucólico-cómicos de um estado insano
Um homem de 34 anos foi detido domingo pela GNR de Idanha-a-Nova, Castelo Branco, acusado de caça ilegal, por utilizar toques de telemóvel como chamariz para caçar tordos, disse hoje fonte policial.»
(no Público)
Dica do leitor«anti-comuna»

ANA D'OTA

O modelo definido pelo governo de privatização da ANA e simultânea concessão do aeroporto da OTA tem tudo para ser um sério entrave à oferta de mais, melhores e mais baratos serviços aos clientes.
Evidentemente, os futuros novos proprietários pretenderão rapidamente rentabilizar a OTA mediante uma aposta no investimento, serviços e taxas competitivas, desvio interno de clientes e de rotas em detrimento da qualidade e competitividade de todos os demais aeroportos. Só assim, desta forma enviesada e prejudicial para as outras regiões é que o governo consegue defender que a OTA será hipotéticamente rentável e atractiva.

Ora, se ao invés da manutenção de uma situação de monopólio a ANA fosse desmembrada e privatizada, deixando os aeroportos concorrerem ou associarem-se livremente entre si, poderiam estes constatar da real necessidade ou não de um novo aeroporto: onde se situaria, como seria construído, que capacidade teria e como seria pago. O que certamente seria mais racional e serviria os interesses dos clientes e dos contribuintes.

Saudações bloguisticas

Abraço ao Carlos Manuel Castro e ao Luís Novaes Tito pelos 3 anos do Tugir.

o valor negativo da democracia

Muitos dos comentários feitos a este meu «post» sobre as minhas opções de voto no referendo do próximo dia 11, vão no sentido de acharem impossível que eu consiga votar nas eleições portuguesas (legislativas, autárquicas e presidenciais), presumindo-se que por óbvia falta de informação sobre o que, de facto, uma vez eleitos, os políticos farão com o meu (nosso) voto (s).
O argumento diminui mais a democracia portuguesa, do que exactamente as minhas escolhas eleitorais. De facto, as pessoas habituaram-se a comer «gato por lebre», e já acham natural que os políticos não cumpram minimamente o que lhes prometeram. Os exemplos não faltam, desde o célebre «choque fiscal» de Durão Barroso, ao mais recente «read my lips» do Engº Sócrates.
Ao nível a que chegou a nossa «democracia representativa», o voto passou a ser mais um exercício de castigo político para afastar quem governa por governar mal, do que uma escolha de um projecto alternativo. Pelo menos, por enquanto, podemos usar o nosso voto para destituirmos pacificamente os nossos governantes. É aquilo aque chamo «o valor negativo da democracia». É mau, mas podia ser bem pior. Só é pena que as pessoas se conformem apenas com isso.

ASSIM NÃO pelo Gato Fedorento

A posição mais espatafúrdia de toda esta campanha é superiormente dissecada aqui pelos rapazes do Gato Fedorento.

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... ou a continuação do meu humilde contributo para a mais recomendável posição de descanso do nosso jcd.

aborto: a minha declaração de voto

1. O meu voto no referendo do aborto não me pertence. Entregá-lo-ei a quem me disser o que fará dele, caso concorde com o destino que lhe será dado. Lamentavelmente, até agora, só obtive explicações claras por parte do «não»: ficará tudo na mesma. Da parte do «sim», só a ideia da despenalização, quando, como é sabido, essa alteração poderá ser feita de várias maneiras e comportar diferentes consequências, nem todas elas, a meu ver, aceitáveis.

2. Devo dizer que sempre me inclinei para votar «sim». Por várias razões que fui, ao longo dos últimos meses, aqui expondo: parece-me que o aborto é, só pode ser, um problema de consciência individual, e que esta só pode manifestar-se sem ameaças legais; acredito que a lei em vigor mantém uma situação de hipocrisia social, porquanto o aborto é uma prática corrente na nossa sociedade, que só ocasionalmente, muito à portuguesa, é casuisticamente aplicada para servir de exemplo; porque conheço muitas raparigas e mulheres que já o fizeram, que sofreram e sofrem com isso, a quem jamais consideraria a hipótese de as castigar com uma sanção penal, ou propor que o Estado as investigasse. Sobre essa sanção, há que dizer que não colhe o argumento falacioso, diria mesmo hipócrita, utilizado pelos partidários do «não» de que a lei não se aplica e que nenhuma mulher está presa por ter abortado. Se esse é um argumento benévolo, mais o será então a revogação da lei. Todos sabemos, contudo, que não é isso que se pretende, antes se quer manter em vigor a ameaça da sanção, como forma de pressão psicológica e social. Ameaça imprópria, como todas as ameaças, de uma sociedade civilizada, diga-se. ###

3. O pior é que, para quem está inclinado a votar «sim», não existe um único «sim», desde logo porque o tratamento que lhe for dado por via legislativa e por decisão governamental poderá ser imensamente diferente. Eu passo a explicar.
Existem, pelo menos, dois tipos de «sim»: o «sim» À despenalização por se considerar o aborto um último recurso, assumido em estado de desespero consciente; e o «sim» como um simples direito fundamental da mulher ao seu corpo, exercido a expensas do Estado. Concordo com o primeiro, discordo do segundo, pelas razões que se seguem.

4. A primeira delas, é a de que o problema científico e filosófico de se saber se a mulher, pelo acto do aborto, está a dispor apenas de si, ou também da vida de outro, é praticamente insolúvel. Existem posições científicas, filosóficas e morais para sustentar uma e outra posição. Por conseguinte, nenhuma delas, por inconclusivas, ambíguas e reciprocamente refutáveis, deverá servir de fundamento a uma decisão legislativa sobre esta matéria.

5. A segunda, vai no sentido de considerar que o aborto só deve ser moral e legalmente suportável se se tratar de uma decisão livre e consciente da única pessoa que poderá, em última instância, efectivamente decidir: a grávida. Mas, para o poder ser, o Estado não poderá criar um sistema de desresponsabilização absoluta que transforme o aborto numa prática tão fácil e acessível como curar uma dor de cabeça ou uma constipação. Razão pela qual sugeri, ao longo das últimas semanas, que seria um erro incluir o aborto no SNS como acto médico gratuito. Este argumento, que o raciocínio básico do «sim» imediatamente qualificou como um «argumento económico», logo, desprezível, é mais de natureza moral e responsabilizadora, do que propriamente economicista (ainda que se o fosse não estaria a cometer qualquer incorrecção). Felizmente, o Dr. Mário Sousa, uma autoridade nesta e noutras matérias, adepto do «sim», deu-me razão.

6. Em terceiro lugar, considero de muito mau agouro que o governo nada tenha dito sobre a proposta da Drª Maria de Belém Roseira, sobre a criação de mecanismos de reflexão e de responsabilização para quem quiser abortar a expensas do Estado. É grave que um governo e um ministro da saúde tão envolvidos na campanha tenham ignorado essa proposta, que retiraria até ao «não» o seu principal argumento: o de pretenderem diminuir a efectiva prática do aborto, como evidentemente se concluirá de um sistema que aconselha, sugere alternativas e apoia quem está em dúvida. Por que motivo o governo não respondeu a uma interpelação de uma distinta militante e dirigente do partido que o apoia? Infelizmente, temo o pior: por pretender mesmo consagrar legalmente uma interrupção da gravidez irresponsável e sem qualquer acompanhamento médico, que não seja o do acto em si.

7. É, pois, necessário perceber que não existe apenas um «sim» e que as consequências da despenalização não são todas iguais: umas são aceitáveis, outras não o são É pena, diga-se de passagem, que os adeptos do «sim», num aggiornamento militante e pouco racional, não tenham querido explicar as consequências das suas eventuais diferenças, em vez de se terem agrupado em molhe numa argumentação de simples contraditório e de argumentos reflexivos pavlovianos («Oiço falar em penalização e em mulheres na cadeia, voto logo «sim»»). Perderam com isso e poderão bem vir a perder por isso.

8. Um liberal só dá o seu voto ao poder soberano em troca de explicações claras sobre o que este fará com ele. No caso do referendo do aborto, é uma falácia dos adeptos do «sim» dizer-se que vamos votar apenas a despenalização do acto até às 10 semanas. Não, não é verdade. Vamos votar, de facto, a despenalização, mas vamos autorizar um governo a regulamentar a prática do aborto. Sobre essa regulamentação, até agora o governo não disse nada. Em contrapartida, há dirigentes do PS a dizerem coisas completamente opostas, como a Drª Maria de Belém Roseira, com a qual concordo, e a Drª Edite Estrela, que já propôs que a futura legislação despenalizasse, de facto, o aborto para além das 10 semanas. Em que é que ficamos? O que fará este governo, e não os vindouros de direita ou de esquerda, mas este governo que decidirá a partir do dia 12 de Fevereiro, com o meu voto? Sem esse esclarecimento, não se poderá votar em algo que se desconhece. Porque, como dizem os liberais, só se troca alguma coisa por outra melhor. Quando, pura e simplesmente, se desconhece uma das duas alternativas possíveis, não se pode, por definição, escolher.

9. Em conclusão, direi que o meu voto (e julgo que o de muitos milhares de portugueses) continua disponível, e que se decidirá nos seguintes termos:
- Votarei «sim», se ouvir do governo português, que será quem vai ter a responsabilidade de regulamentar a decisão do referendo, uma atitude séria e consciente, que não transforme o aborto num acto irresponsável. Por outras palavras, votarei sim, caso o governo anuncie que acolherá a proposta da Drª Maria de Belém Roseira, ou outra que se lhe equivalha;
- Votarei não, se o governo português não esclarecer claramente que destino pretende dar ao meu voto.

10. Até ao dia 11 de Fevereiro continuarei, pacientemente, a aguardar que me esclareçam.

A propósito

«Governo israelita aprova nomeação de ministro árabe
O Knesset vai hoje pronunciar-se sobre a histórica escolha de Raleb Majadele
O Conselho de Ministros, reunido em Jerusalém, aprovou ontem por larga maioria a nomeação histórica do deputado trabalhista Raleb Majadele como o primeiro árabe a ser ministro desde que em 1948 foi criado o Estado de Israel.»

Em que país muçulmano seria possível nomear um ministro judeu? A propósito as pessoas que ficam feridas ou são mortas durante os actuais conflitos na faixa de Gaza serão orfãs? Nenhum desses mortos ou feridos tem mãe, irmãs, mulheres... que os chore? Desta vez não se vêem os feridos nas ambulâncias? Nem há roupa ensanguentada no chão? Ou será que a fábrica de imagens só funciona quando Israel dispara?

A campanha que não pode existir

«A duas semanas do referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, importa não ceder a propagandas terroristas. Como aqui se escreveu, a escolha a que somos chamados não é um duelo entre a selvajaria e a humanidade, entre amantes da vida e cultores da morte. Não é isso que está em causa nem a opção que nos é colocada. Como se previa, a campanha política e religiosa dramatizou-se, radicalizou-se, está a ceder ao simplismo irracional.» António José Teixeira, DN

Este homem nunca deve ter visto uma campanha. Nem em Portugal e sobretudo nunca seguiu campanha alguma noutros países. Pode estar-se pelo Sim ou pelo Não. Ser contra ou a favor do referendo. Mas o que não se pode é esconjurar o incómodo que o assunto nos traz achincalhando as pessoas que fazem campanha.

estarem lá


O texto que o José Miguel Júdice escreveu para o blogue Sim no Referendo e que o CAA reproduz em baixo em post é um texto que me parece obviamente descuidado. Num comentário que lá coloquei, chamei a atenção para a afirmação do autor que, depois de se declarar um adepto do Sim, conclui: "Finalmente, quero frisar que todos os que votarão 'não' ou 'sim' são a favor da vida".

Não é fácil entender que aqueles que são a favor da morte do feto e aqueles que são contra a morte do feto sejam todos igualmente a favor da vida. Como não é fácil entender a frase que é destacada no post: "As sociedades podem mudar as leis, mas devem sempre aplicá-las". Esta é uma frase que só poderia ser proferida por um polícia, por um advogado, por um juiz ou por um guarda prisional - e, ainda assim, só de uma forma descuidada.###

Porque se todas as leis fossem aplicadas numa sociedade - e, então, em Portugal, onde elas são aos milhões e, ainda por cima, complexas e contraditórias - seria necessário, embora provavelmente não suficiente, empregar todos os cidadãos como polícias, advogados, juizes e guardas prisionais - e não restaria ninguém sobre quem aplicar as leis, e muito menos para pagar os vencimentos aos agentes da justiça.

A principal funcionalidade das leis numa sociedade - como a principal funcionalidade das regras em qualquer outra comunidade, como uma família ou empresa - não é a de serem para aplicar sempre. É a de estarem lá.

E estarem lá, em primeiro lugar, para desencorajar os comportamentos que essas leis ou regras visam inibir; e, em segundo lugar, para serem accionadas selectivamente quando a prevaricação ameaça generalizar-se, e com uma frequência que seja proporcional à gravidade dos comportamentos que elas visam impedir (v.g. , a lei que proíbe os peões de atravessarem fora das passadeiras deve ser aplicada com um grau de frequência menor, relativamente ao número de infracções cometidas, do que a lei que proíbe o homicídio).

Porque se todas as leis fossem para aplicar sempre e sem excepção, os advogados iriam certamente enriquecer - mais os juizes, os polícias e os guardas prisionais. Mas não é certo que restasse alguém na sociedade para lhes pagar.

28.1.07

José Miguel Júdice

«As sociedades podem mudar as leis, mas devem sempre aplicá-las», por José Miguel Júdice no Sim no Referendo.

ou, também, no que me diz respeito,

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"O meu humilde contributo para que o meu amigo jcd possa vir a acordar virado para o sítio que melhor lhe convém".

Esmeralda


Se, cada vez que nasce uma criança, nós tivéssemos de decidir, através dos tribunais, ou da opinião pública e dos jornais, a quem entregar a sua tutela, não faríamos outra coisa - e a sociedade seria imensamente pobre.

Este problema já se colocou a muitos biliões de pessoas que viveram antes de nós. E elas legaram-nos uma solução, a qual constitui um princípio da nossa civilização: a tutela das crianças pertence aos seus pais naturais.

Trata-se de um princípio e, como todos os princípios, admite derrogações. Porém, este é um princípio tão importante que a sua derrogação deve revestir um carácter muito excepcional - v.g., ambos os pais se recusarem a tomar conta da criança, ou obviamente a maltratarem.

Nenhuma destas excepções está presente no caso da Esmeralda. Por isso, eu espero que este caso termine como deve terminar: primeiro, que a Esmeralda seja entregue ao seu pai natural, que a reclama; segundo, que o casal que, durante este tempo, tomou conta dela, não seja penalizado de qualquer forma, e seja mesmo apontado como um exemplo de humanidade no tratamento que deu à criança e alvo da admiração por parte dos seus concidadãos; terceiro, que a justiça portuguesa seja fortemente censurada pela sua ineficácia e morosidade, que só contribuiu para agravar os custos emocionais de todas as pessoas envolvidas.

Neve em Tavira, 1954


Fonte: Forum de Meteorologia

Warm Snow

Nevou pelo segundo ano consecutivo em Lisboa, depois de 50 anos 'snow free'. Se o planeta continua a aquecer desta maneira, qualquer dia descemos o Parque Eduardo VII a esquiar.

Estão a ver como vai acabar tudo?

«Escutas apanham director da CML
Escutas telefónicas realizadas no âmbito dos processos relacionados com a Bragaparques revelam uma enorme familiaridade entre o dono da empresa e a Câmara de Lisboa.»

A sério que é isto que apuraram: 'enorme familiaridade'?
Já se esqueceram disto:
«Erros grosseiros da acusação na prisão de Paulo Pedroso»
http://dn.sapo.pt/2007/01/12/sociedade/erros_grosseiros_acusacao_prisao_pau.html

27.1.07

Sim, talvez.

Hoje acordei virado para o lado do Sim. Ontem estava mais virado para o lado da abstenção. Numa análise introspectiva do sentido deste voto balançante entre o sim e a abstenção, acabo de compreender o que me faz tombar para um lado ou para outro.

1. Nos dias em que o meu colega Carlos Abreu Amorim enche o Blasfémias de artigos a defender a sua veemente opção pela despenalização, acordo no dia seguinte do lado da abstenção.
2. Nos dias em que visito o blogue do Sim, adormeço já na abstenção.
3. Nos dias em que ignoro o que se diz e escreve sobre o assunto, fico novamente a pensar que é altura de ajudar a acabar com estas cansativas discussões, votando favoravelmente no referendo.
###
Nunca votarei no Não, por motivos já explicados. Em Outubro, escrevi aqui:

Vem aí um novo referendo à despenalização do aborto e votarei favoravelmente. Não me sinto com o direito de julgar moralmente as atitudes de quem decide em
consciência interromper uma gravidez.

Da outra vez ganhou o não. E ganhou, em parte, porque a campanha do sim foi sequestrada por algum trogloditismo extremista, afastando a moderação do debate e muitos indecisos das urnas. Convinha evitar que a Ana Drago escrevesse coisas como "Num País Que Não Respeita Os Meus Direitos Eu Não Quero Viver ...", moderar os ímpetos guerreiros da Odete, evitar utilizar a campanha para propaganda de grupos marginais construtores de happenings. Em resumo, fugir ao ridículo. E principalmente, convém respeitar as opiniões dos que votam não.

Embora as coisas não estejam tão mal como da última vez, os principais adversários da vitória do Sim continuam a ser os mais activos defensores da causa da despenalização. Cada vez que falam, actuam, insultam, acusam, amesquinham, gozam... são mais umas centenas de portugueses que ficam em casa.

Alguns defensores do Sim ainda não compreenderam o óbvio e continuam alegremente a apostar em argumentação contraproducente. É que há muito boa gente a acreditar que efectivamente o aborto é um crime, que às 8,10 ou 12 semanas já há uma criança a caminho e, nessa situação, qualquer tentativa de 'gozo' ou amesquinhamento de uma convicção profunda só tem como resultado o extremar de posições e o arrastar dos indecisos para o campo do Não, quanto mais não seja por solidariedade para com os atingidos ou por repulsa pelas atitudes extremistas.

Ainda não perceberam que as imagens cada vez mais perfeitas e tridimensionais das ecografias modernas, mexem com muita gente e que o despeito mostrado por alguns irresponsáveis activistas só faz com que muitos cidadãos de bom coração se queiram ver bem longe de tais gentes.

Do que serve atacar a Igreja Católica e as opiniões públicas e publicadas de sacerdotes? A ICAR é, por estatuto, contra a despenalização. Por estatuto milenar, pelo fundamento da própria igreja. Será sempre assim. Claro que há padres que vão comparar o aborto à execução da Saddam. Até conheço doutores por extenso que acham que um aborto é muito mais grave que o enforcamento de Saddam.

Na ICAR, ainda há muitos padres que acreditam em Deus e um ou dois até acreditarão que Noé deixou entrar um casal de pulgas na arca. Há padres que vestem a batina, como outros vestem as camisolas e se o que dizem pode soar a absurdo aos olhos de quem está longe daquele mundo, não será muito diferente do absurdo a que soam certas defesas do FCP feitas por alguns dos seus adeptos. (vá lá, dos outros clubes também?)

Mudar a opinião de um católico convicto beato de igreja será tão fácil como arranjar um benfiquista capaz de convencer o Carlos Amorim a deixar de ser dragão.

Perante estes defensores do Não, os únicos argumentos que poderão ter alguma aceitação, referem-se ao previsível mau futuro dos filhos indesejados, às famílias sem capacidade financeira e/ou emocional para prestarem apoio ou educação às crianças, aos filhos de mães toxicodependentes. Mais vale não deixar vir ao mundo um filho indesejado do que ter um drama que envolve crianças indefesas para resolver. O mais vale prevenir do que remediar.

Mas a abstenção está mesmo aqui ao lado. E as intervenções cada vez mais frequentes dos responsáveis políticos a atirar a prática de abortos para o Serviço Nacional de Saúde é o outro grande argumento que me faz cada vez mais hesitar.

A incompreensão do pensamento liberal leva a que muitos defensores do Sim manifestem indignação por se trazer o argumento económico para cima da mesa. Não percebem que o que está em causa não é a questão económica mas sim a questão da responsabilidade individual. A gravidez não é uma doença. O aborto é uma opção individual de cada mulher e essa opção implica a sua própria responsabilização. Não é papel do estado facilitar ou complicar essa decisão. Pede-se, simplesmente, que saia do caminho.

E não, o aborto não é comparável ao cancro de pulmão do fumador. O cancro é uma doença e as doenças devem ser tratadas. Se Portugal optou por um SNS, nada a fazer, é lá que se tratam as doenças. E o fumador até já pagou antecipadamente por esse tratamento, tantas são as externalidades incluídas no preço do tabaco.

Se os abortos forem praticados livremente no SNS, provavelmente, quem está há 10 meses em lista de espera passará a estar 12. Alguém acredita que seja possível aumentar ainda mais os impostos para financiar a prática de abortos no SNS, sem diminuir os recursos em outras áreas?

Recentemente, A., reformado, ao fim de 10 meses de espera por uma operação às cataratas, já praticamente cego, recorreu ao sector privado. Foi operado em 15 dias e pagou pela operação seis meses de reforma. Não teve alternativa, por falta de capacidade so SNS. A chamada Via Verde para o aborto, seria um tremendo insulto para todos os que, como A., esperam e desesperam meses a fio por intervenções urgentes.

Ah, e não me venham falar nos casos limites de indigência, dos que não têm capacidade de pagar as intervenções. Esses são casos de Segurança Social e não de Saúde.

Coincidências ou infiltrações?

Nos cartazes a anunciar o próximo referendo do aborto, da autoria do MAI, consta, tal como já acontecera em 1998, este logo:


Muito susceptível de ser aproveitado para uma sub-reptícia campanha partidária, pelas suas curiosas semelhanças com este:###

Opções editoriais (III)

O site oficial do PS tem um link para este outro site oficial do PS, no qual se encontram publicados estes elementos, que não destoariam no site de qualquer partido da oposição.

Opções editoriais (II)

O blogue do não tem caixa de comentários, mas só os publica, mesmo que assinados por bloggers devidamente registados, após aprovação prévia.

Opções editoriais (I)

O SIM no referendo não tem caixa de comentários.

Três perguntas aos defensores do SIM

1. Se uma mulher grávida abortar depois das 10 semanas de gravidez, caso não se verifique nenhuma das outras causas de exclusão da punibilidade previstas no artigo 142.º do Código Penal, deve ser perseguida criminalmente?

2. Se uma mulher grávida abortar, antes das 10 semanas de gravidez, fora de «estabelecimento de saúde legalmente autorizado», deve ser perseguida criminalmente?

3. Se uma mulher grávida abortar, depois das 12 semanas de gravidez, ainda que o aborto se mostre indicado para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a sua saúde física ou psíquica, deve ser perseguida criminalmente?###

O crime de aborto encontra-se previsto no Capítulo II (Dos crimes contra a vida intra-uterina) do Título I (Dos crimes contra as pessoas) do Livro Segundo (Parte especial) do Código Penal. O primeiro capítulo daquele Título I intitula-se Dos crimes contra a vida (extra-uterina, entenda-se). Daquela estruturação parece resultar que o legislador penal entendeu que a vida intra-uterina é vida e, mais do que isso, que há uma pessoa, merecedora de tutela (ainda que, num caso específico ? previsível doença grave ou malformação genética -, a tutela esteja dependente da viabilidade do feto). Poder-se-ia considerar que a pessoa ou vida em causa é a da mãe, mas este entendimento não é compatível com a possibilidade de a própria mãe ser agente do crime, sendo certo que, não sendo punível o suicídio (tentado) nem as ofensas à integridade física auto-inflingidas, é forçoso concluir-se que, no aborto, o bem jurídico protegido não pode ser outro senão a vida do feto.
O aborto é um crime público, isto é, um crime em que a acção penal (abertura de inquérito e ulterior dedução de acusação pelo Ministério Público) não depende de queixa, bastando que a autoridade judiciária tenha conhecimento do crime por qualquer meio, não sendo também admissível a desistência de queixa, ainda que esta exista. O Sr. Procurador-Geral da República já anunciou que não lê blogues nem pede à sua assessora que os leia por ele, mas dá atenção a cartas anónimas, pelo que uma carta deste tipo será suficiente para que seja aberto um inquérito.
Um dos argumentos mais utilizados pelos defensores do SIM no referendo é evitar «as autoridades policiais e judiciais deste país continuem a poder tratar a mulher que decide abortar no início da sua gravidez como uma criminosa».
Uma eventual vitória do SIM, porém, não vai evitar que isto aconteça. Chegado ao conhecimento das autoridades policiais ou judiciárias a suspeita de uma mulher ter praticado um aborto, deverá ser instaurado um inquérito judicial, que só poderá ser arquivado quando se concluir que o aborto em causa não aconteceu ou, em alternativa, que o feto tinha menos de 10 semanas ou que se verificou uma das outras causas aborto não punível, já que, nos restantes casos, continuará a haver crime punível com pena de prisão. Até que se chegue a tal conclusão, a mulher poderá ser constituída arguida, interrogada ou sijeita a outros meios de prova.
A única forma de evitar que as mulheres que abortam possam continuar a ser «perseguidas como criminosas» seria a revogação pura e simples do artigo 140.º, n.º 3 do Código Penal, o que, creio, nem sequer os mais acérrimos defensores do SIM defendem.

Adenda:
O Pedro Caeiro já respondera (negativamente) à pergunta 2 neste post. A resposta torna ainda mais pertinente a pergunta.

O estatuto do feto até às 10 semanas II

A lei da Procriação Medicamente Assistida penaliza com pena de prisão a clonagem reprodutiva, incluindo a clonagem por transferência de embrião. Este artigo da lei tem como principal justificação a sacralização da vida humana e em particular do processo natural de reprodução. Esta penalização é particularmente curiosa se se tiver em conta que no caso do aborto a sacralização do feto é contestada por uma facção muito importante da população. Seria até interessante saber se existem pessoas que sejam contra a sacralização do feto mas pela penalização em abstrato da clonagem reprodutiva. Outro ponto importante é que a mesma lei que penaliza a clonagem reprodutiva permite a clonagem para fins científicos. Ou seja, proibe o uso do embrião como um fim em si mesmo, mas permite o uso do embrião como instrumento da humanidade. Éticas ...
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Artigo 36.o
Clonagem reprodutiva
1?Quem transferir para o útero embrião obtido através da técnica de transferência de núcleo, salvo quando essa transferência seja necessária à aplicação das técnicas de PMA, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.

2?Na mesma pena incorre quem proceder à transferência de embrião obtido através da cisão de embriões.

Em nome e por conta

Um caso, para quem ainda está disposto a pensar.

A biologia (II)

Se as mulheres não amam os óvulos menos ainda me parece possível que os homens amem os seus espermatozóides. Não acho provável que de cada vez que dormem com uma mulher acordem enlevados a pensar se os ditos espermatozóides estarão a dar origem a uma nova vida.
Não duvido que os homens amem os filhos mas amam-nos porque quiseram ser pais, porque tratam desses filhos... mas não porque alguém um dia lhes diz que uma determinada criança nasceu graças aos seus espermatozóides.
Assim no caso de Baltazar Nunes há algo que não entendo: no final de 2001 ele não se interessa pela gravidez de Aidida; sabe em Julho de 2002 que o tribunal quer saber se é ele o pai biológico; ele e o tribunal esperam até Outubro de 2002 para fazer esses testes; em Fevereiro de 2003 sabem os resultados.
E aí ao saber que os espermatozóides eram os dele desenvolve-se naquele homem um extraordinário amor pela criança? Aí e só aí perante a certificação dos seus espermatozóides ele sente que é pai e que aquela é a sua filha?

A biologia (I)

Em Portugal desenvolveu-se nos últimos tempos um bizarro amor pela biologia. Os óvulos e os espermatozóides tornaram-se no nó da questão.
Na questão do aborto fala-se de óvulos, fetos, embriões... como se as mulheres andassem todos os meses, qual vaso do Graal, a pensar que têm uma vida dentro delas. Vão desculpar-me a franqueza mas não é assim. Ou só é assim quando querem estar grávidas. Quanto ao restante tempo da sua vida fértil não fazem um luto por cada óvulo, fecundado ou não, que expelem naturalmente. Sei que muita alminha vai ficar chocada pelo 'tom' desta afirmação mas um dos problemas desta campanha é que não é suposto falar-se do assunto propriamente dito. E então falamos de bebés e de vida. Ora é preciso que não se esqueça que as mulheres levam meses e meses da sua vida fértil a conviver com óvulos que podiam ter sido vida e não foram. Aliás muitas mulheres usam dispositivos intra-uterinos o que, na lógica biológica que está instalada, as obrigaria a chorar uma vida todos os meses.

Os maravilhosos dias da comunidade pré-capitalista

«A discriminação dos idosos (48 por cento) é, aliás, uma das características mais alarmantes das sociedades contemporâneas, em que a falta de solidariedade, a falta de memória e a falta de respeito pelas pessoas atinge, sobretudo, os seres mais fracos e enfraquecidos. Este drama é agravado em Portugal pelos baixos rendimentos que os idosos auferem, com reformas e pensões miseráveis e onde muitos milhares não passam fome devido à rede de apoio social lançada pelos governos de António Guterres.» São José Almeida, PÚBLICO

Mesmo deixando de lado os elogios à «rede de apoio social lançada pelos governos de António Guterres» cabe perguntar se São José Almeida alguma vez terá lido um jornal português dos anos 20, 30 ou 40 do século XX.
Esta tese dos idosos muito respeitados nos fabulosos tempos de antanho é uma das mais disparatadas ideias feitas usadas a torto e a direito para dizer mal dos tempos presentes. Em primeiro lugar os idosos quase não o chegavam a ser. Morria-se muito cedo. E no caso das mulheres os inúmeros partos e abortos transformavam qualquer mulher de trinta anos numa quase idosa. A isto há que juntar as dificílimas condições de vida. A ausência de medicamentos eficazes... Os idosos tal como os adolescentes são 'categorias' contemporâneas. Existiam sim os velhos. Eram poucos como disse. Respeitados em alguns casos. Odiados noutros. Folheiem-se os antigos livros da escola primária e encontram-se textos terríveis como os do filho que foi levar o pai ao cimo do monte para o deixar lá. A fazer o quê? À espera da morte.

Ó ditosa pátria!

«O secretário de Estado adjunto da Educação precisou ontem que a experiência pedagógica associada à nova Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário (TLEBS) só será suspensa no próximo ano lectivo. Em declarações à Lusa, Jorge Pedreira esclareceu que a portaria que será publicada em Fevereiro só terá efeitos práticos em 2007-2008, ano em que 'não vai realizar-se a experiência pedagógica com os alunos, já que não há condições técnicas para isso». (PÚBLICO)
E durante este ano lectivo ensina-se o quê? E a senhora ministra não tem uma palavrinha a dizer às famílias? Só uma palavrinha...

Tradição que glorifica o egoísmo e o desprezo do Outro

"I was born of the Hebrew persuasion, but I converted to narcissism." (Woody Allen)

(citado pelo HO)

Uma mãe nunca escreveria assim


"São as derivas niilistas em direcção ao relativismo moral e à condenação da virtude que mais desacreditam um certo liberalismo em voga e dão uma certa credibilidade à sua caricatura pela esquerda jurássica - que tem como moínho contra o qual arremete incessante e quixotescamente o 'neoliberalismo'.

O regresso aos valores do liberalismo clássico é a solução. Entre esses valores, avultam a redescoberta do temor ao Todo-Poderoso (ou da submissão, na bonita versão islâmica) e a revalorização da família como célula basilar da sociedade, deixando para trás o modelo individualista-anómico redutor, fonte da actual decadência do Ocidente.

Sim, Ayn Rand não tinha filhos. Uma mãe nunca escreveria assim. E, além disso, era judia, seguidora da tradição que glorifica o egoísmo e o desprezo do Outro, seja ele o herético (Jesus) ou o gentio, o não-eleito, o sub-homem, expulso, invadido, guetizado, hoje com o rosto palestiniano, "raghead", "hagi", iraquiano ou persa".

(Euroliberal, comentário ao post nunca foi mãe; editado)

26.1.07

Só gostava, caros amigos,

... André e Gabriel, que a vossa fúria justiceira também se tivesse acendido a propósito de outros disparates desta campanha. Por exemplo, quando em Outubro, em Coimbra, a fotografia de um bébé de um mês, por mero acaso, filho de uma conhecida activista pró-Sim, foi utilizada nos panfletos do Não preparados pela diocese. Ou na ocasião em que um bispo qualquer comparou a IVG à execução de Sadham. Ou quando outro nomeou as mulheres que a fazem de "criminosas abomináveis". Ou, também, quando um padre doutorado em Teologia avisou, canonicamente, que quem votasse Sim teria direito à excomunhão automática e ficaria privado de funeral religioso. Ou, ainda, a propósito daquela lúcida analogia sobre telemóveis. E cegonhas.
A indignação também tem lados. E sentidos. Infelizmente, quase sempre únicos.
Por mim, apenas digo que a profecia de JPP se concretizou no dia seguinte: de facto, nesta campanha há qualquer coisa que faz assemelhar, mais ainda, os príncipes da igreja aos dirigentes do Bloco de Esquerda...

penúria e autoridade


Quando os liberais enfatizam a maximização do interesse-próprio e a liberdade das trocas como a solução para o progresso económico e social eles estão a encorajar, embora sem o pretenderem, o crescimento da influência do Estado na sociedade. ###

Numa troca livre ambas as partes esperam e podem, em princípio, ganhar. E a repartição dos benefícios da troca depende crucialmente do zelo com que cada uma das partes protege os seus interesses. Neste particular, o Estado torna-se a contraparte negocial ideal para qualquer entidade privada - pessoa ou empresa.

A razão é que o Estado é uma entidade mal equipada para zelar pelos interesses de todos os cidadãos. Na impossibilidade de todos os cidadãos estarem presentes em cada negociação em que o Estado se envolve, eles acabam a ser representados por um agente da administração pública que, estando a gastar o dinheiro dos outros e não o seu, não possui incentivo a zelar eficazmente por ele.

Para quem procura um emprego e segue o conselho liberal de maximizar o benefício próprio que retira dessa troca, a melhor solução encontra-se geralmente em procurar um emprego no Estado porque é aí que tenderá a obter a melhor relação entre o salário que recebe e a quantidade e intensidade de trabalho que terá de dar em troca.

Para todos aqueles que visam maximizar o seu interesse próprio e desejam vender caro aquilo que, de outro modo, venderiam barato - ou que, noutra variante, desejam encontrar um comprador para os seus produtos, mesmo que este não necessite deles - o comprador ideal é o Estado, e dificilmente encontrarão outro comparável.

Para quem ambiciona maximizar o interesse próprio, obtendo a melhor pensão de reforma face ao número de anos de trabalho que tem de fornecer em troca, o local ideal para a procurar é no Estado. E quem ambiciona coleccionar múltiplas pensões de reforma, servindo um única patrão, existe apenas uma instituição que lhas pode dar - o Estado.

O agente da administração que negoceia do lado do Estado a concessão de um emprego pouco exigente e bem remunerado, a compra de produtos caros ou não necessários, e a concessão de reformas generosas e múltiplas está também a seguir o preceito liberal de maximizar o seu interesse próprio - no último caso, porque ele também vai beneficiar dessas pensões de reforma, no anterior porque ganha as graças ou outros favores de uma empresa que amanhã pode ser seu empregador e, no primeiro, porque ganha estatuto ao comandar um número maior de funcionários na sua repartição.

Neste aspecto, os portugueses não têm nada a aprender com os economistas liberais como Mises ou Rothbard nem com o egoísmo radical de Ayn Rand. Aquilo de que eles estão necessitados é de lições de altruísmo. O altruísmo que leva cada cidadão a sentir-se mal por receber do Estado benefícios que não merece e cada agente da administração a colocar à frente do seu interesse próprio os interesses dos milhões de cidadãos que ele representa.

É pelo altruísmo - e não pelo egoísmo ou sequer pela promoção do interesse próprio - que os liberais podem combater o aumento do peso do Estado na economia. É ainda pelo altruísmo que os liberais podem promover o desenvolvimento daquela esfera da sociedade que é essencial a uma democracia e que constitui um domínio privilegiado do altruísmo - a esfera cívica.

Porém, ao colocarem todo o ênfase na promoção do interesse próprio como motor da prosperidade, os liberais não podem depois ficar surpreendidos que a esfera pública da sociedade não cesse de aumentar ao mesmo tempo que a esfera privada diminui e a esfera cívica se esvazia - e que, a prazo, em lugar de prosperidade e liberdade, obtenham, antes, penúria e autoridade.

Apesar de nos «faltar» a «dignidade» das cartas anónimas.... fica o registo


(via)

Notícia de Última Hora.

O primeiro-ministro acaba de comunicar aos portugueses que o simplex foi um êxito.

O estatuto legal do embrião

Retirado da Lei da Reprodução Medicamente assistida (PDF):

A lei confere um determinado tipo de protecção ao embrião:

Artigo 9.o
Investigação com recurso a embriões

1?É proibida a criação de embriões através da PMA com o objectivo deliberado da sua utilização na investigação científica.

###
A lei considera que os interesses do colectivo humanidade devem ser colocados acima do embrião em determinados casos:

3?O recurso a embriões para investigação científica só pode ser permitido desde que seja razoável esperar que daí possa resultar benefício para a humanidade,


A lei sujeita a manipulação de embriões à aprovação de uma comissão:

dependendo cada projecto científico de apreciação e decisão do Conselho Nacional de Procriação medicamente Assistida.


A lei reconhece direitos de propriedade sobre os embriões:

5?Orecurso a embriões nas condições das alíneas a) e c) do número anterior depende da obtenção de prévio consentimento, expresso, informado e consciente dos beneficiários aos quais se destinavam.


Mas a doação de espermatozóides está altamente condicionada:
Artigo 10.o
Doação de espermatozóides, ovócitos e embriões
1?Pode recorrer-se à dádiva de ovócitos, de espermatozóides ou de embriões quando, face aos conhecimentos médico-científicos objectivamente disponíveis, não possa obter-se gravidez através do recurso a qualquer outra técnica que utilize os gâmetas dos beneficiários e desde que sejam asseguradas condições eficazes de garantir a qualidade dos gâmetas.


O Comércio de óvulos e espermatozóides é proibido. Nega-se o direito de propriedade pleno sobre tais células:

Artigo 18.o
Compra ou venda de óvulos, sémen ou embriões e outro material biológico É proibida a compra ou venda de óvulos, sémen ou embriões ou de qualquer material biológico decorrente da aplicação de técnicas de PMA.


Até o sémen dos mortos é propriedade colectiva:
1?Após a morte do marido ou do homem com quem vivia em união de facto, não é lícito à mulher ser inseminada com sémen do falecido, ainda que este haja consentido no acto de inseminação.


A lei protege a vida dos embriões durante pelo menos 3 anos:
Artigo 25.o
Destino dos embriões
1?Os embriões que, nos termos do artigo anterior, não tiverem de ser transferidos, devem ser criopreservados, comprometendo-se os beneficiários a utilizá-los em novo processo de transferência embrionária no prazo máximo de três anos.


Toda a procriação medicamente assistida é tutelada por uma comissão de ética:
Artigo 30.o
Conselho Nacional de Procriação medicamente Assistida
1?É criado o Conselho Nacional de Procriação medicamente Assistida, adiante designado por CNPMA, ao qual compete, genericamente, pronunciar-se sobre as questões éticas, sociais e legais da PMA.


(continua)

nunca foi mãe


Provavelmente, uma das razões principais porque os autores liberais do século XX nunca conseguiram impôr as suas ideias para além de círculos muito restritos deve-se ao facto de eles nunca terem reconhecido o altruísmo como uma valor social importante. Estão neste caso, certamente, os economistas Ludwig von Mises e Murray N. Rothbard. Mas, acima de todos, foi Ayn Rand que desvalorizou o altruísmo ao ponto da sua condenação, ao mesmo tempo que elevava o egoísmo ao estatuto de uma virtude moral. Ela é autora de um livro com o título sugestivo de A Virtude do Egoísmo.###

Esta linha de pensamento colocou o liberalismo em rota de colisão com um dos valores centrais do cristianismo - o altruísmo - e desfigurou moralmente uma corrente filosófica que os liberais clássicos do século XIX - como Burke, Tocqueville, Macaulay e Lord Acton - tinham desenvolvido com sucesso à luz dos valores centrais da civilização cristã. O preço que os liberais modernos ainda hoje pagam por esta desfiguração é considerável.

Ayn Rand ambicionou criar uma moral racional, substituindo-a à moralidade tradicional de inspiração cristã - uma moralidade onde o altruísmo não tinha lugar e onde o egoísmo se constituía em um dos seus pilares centrais. Não é aqui o lugar para comentar o sucesso ou insucesso deste empreendimento. Bastará, talvez, dizer que, a julgar pela sua própria vida pessoal, o resultado nâo foi impressionante (cf. Nathaniel Branden, Judgment Day - My Years with Ayn Rand, Boston: Houghton Mifflin Company, 1989).

Adepta fervorosa do capitalismo, Ayn Rand não compreendeu (como Mises ou Rothbard) que
o sucesso de uma sociedade baseada na liberdade das trocas depende tanto do apelo ao interesse próprio de cada uma das partes - isto é, do egoísmo - como do apelo de cada uma das partes ao interesse próprio da outra - isto é, do altruísmo. Ela compreendeu ainda menos que existe uma instituição fundamental na sociedade - e sem a qual o funcionamento da sociedade dificilmente seria possível -, que está assente predominantemente no valor do altruísmo. Refiro-me à instituição da família e ao altruísmo que constituem a característica predominante do comportamento de uma mãe e de um pai em relação aos seus filhos.

Ao condenar o altruísmo e ao exaltar o egoísmo, Ayn Rand tornou-se uma escritora para adolescentes, precisamente aquela fase da vida em que cada ser humano procura afirmar a sua individualidade e ganhar autonomia face à influência dos pais, do mesmo modo que Mises e Rothbard se tornaram frequentemente os ídolos de jovens economistas na adolescência da sua carreira profissional e intelectual.

Como é que uma mulher tão brilhante em muitos outros aspectos poderia ter cometido tamanho erro de desvalorizar um dos valores centrais da vida em sociedade - o altruísmo - ao ponto de o condenar é um mistério que permanece por explicar. E o mesmo se aplica a Mises e a Rothbard.
Uma explicação possível é que Ayn Rand nunca foi mãe. Nem Mises e Rothbard alguma vez foram pais.

direito de propriedade

A crise permanente em que vive o CDS resulta de um erro de avaliação da quase totalidade dos seus protagonistas: o partido, que se reclama da democracia-cristã, não é o mesmo que foi fundado pelo MFA, por Freitas do Amaral e Adelino Amaro da Costa, nos idos de 1974. Se é que este alguma vez existiu, ou se foi alguma coisa mais do que uma muleta, primeiro, para a revolução, e, depois, para o PSD chegar ao governo, esse partido extinguiu-se com a acção do Dr. Portas: primeiro na criação de um caldo de cultura anti-cavaquista n? O Independente (a que o Dr. Cavaco da altura, convenha-se, deu uma preciosa ajuda...); depois com o balão de ensaio que foi o PP com Manuel Monteiro; por fim com a sua mais do que óbvia entronização na liderança do partido. O Dr. Monteiro não percebeu isto, o Dr. Castro também não parece estar a entender. Já o Prof. Freitas percebeu-o tão bem, que imediatamente se desfiliou do partido sob a alegação de que «não era o que fundara». Por isso, quando o Dr. Portas quiser regressar, o que parece estar para breve, ao partido que é o seu, construído por si e com a sua gente, à sua imagem e semelhança, fá-lo-á sem dificuldade. Com ou sem utilidade, isso logo se verá.

o fim da história

Parece que a política desapareceu em Portugal. Ou melhor, que terá sido substituída pela problemática do aborto. As ideologias desapareceram, os partidos eclipsaram-se, as forças sociais sucumbiram-lhe. Só existem o «sim» e o «não». Em Portugal, nos últimos tempos, a escolha é essa, e quem não for por um ou por outro não é certamente bom chefe de família. Os alcunhados «nins» são párias políticos e sociais, gente desprezível, comparada aos colaboracionistas de todos os «reich» e de todos os «antigos regimes». Gente do pior, sem coluna vertebral e de frouxo carácter. Quem se limita a não pensar no assunto, ou a não querer que lhe falem dele, não existe para a cidade. São res nulius, os metecos, os plebeus sem cidadania.
Em tempos de sonolência e de maioria absoluta, uma pequena guerra civil fazia-nos falta. Depois do dia 11, com tudo a ficar mais ou menos igual ao que era antes, o país vai sentir falta de adrenalina e terá de voltar-se para outro lado qualquer.

Diferença entre liberalizar e despenalizar no caso dos correios

Despenalização sem liberalização. A despenalização implica que ninguém é preso por transportar cartas. A ausência de liberalização implica que empresas específicas têm privilégios específicos. Por exemplo, só o monopolista é que pode ter operações de grande escala de distrbuição de cartas com menos de 50 g. Se uma empresa nova entrar no mercado ninguém vai preso, mas as autoridades fecham-lhe a porta.


Despenalização com liberalização. Todas as empresas têm liberdade para operar no mercado como entenderem e como é óbvio ninguém vai preso.

Egas Moniz

Não só, caro FJV. A partir de agora, dirá o fumador para o ex-fumador: «Anormal!»

Aviso

Informa-se a Camarada Comissária da Vigilância do Pensamento, Deputada Helena Pinto, que também o blogue Sim ao Referendo contém ligações a blogs que promovem «ligações a sites com conteúdos de natureza fascista». Por exemplo, este.###

Nota: o artigo da senhora comissária também ele «é uma cortina para ligações a artigos e sites de dirigentes da extrema direita com uma lamentável história de promoção do ódio
Ver fundo da página.

Dá-lhe Que está No Chão

Quando era pequenino, sempre que um menino chorava, o Luís apontava-lhe o dedo e gritava "Maricas! Maricas!". Quando jogavam à bola e o seu guarda-redes sofria um golo, logo o Luís gritava "Frango!". E quando o avançado da sua equipa falhava um golo, o Luís vozeava um potente "NABO!", mesmo que a bola passasse a rasar o poste num remate de bicicleta fora da área. Quando a sua equipa ganhava, o Luís calava-se e partilhava os louros, mas quando perdia, subia para um palanque a listar os erros cometidos pelos colegas. Quando havia uma qualquer luta, o Luís gostava de ficar de fora a incitar os colegas. Se o adversário caísse no chão, o Luís era o primeiro a galgar para o meio do grupo e a pontapear energicamente o derrotado. Se, pelo contrário, fosse o amigo do Luís a cair, logo se afastava argumentando que a luta tinha sido mal conduzida e explicando o que é que deveria ter sido feito para ganhar. O Luís é daqueles que nas eleições da escola, votava sempre em segredo nos adversários, para minimizar as vitórias dos que o rodeiam.

É este Luís que quer ser chefe de turma, para mais tarde chegar à Associação de Estudantes. Tem hipóteses. Experiência não lhe falta.

a relação mais intensa


Dentre toda as relações que se estabelecem entre dois seres humanos - entre irmãos, amigos, colegas de trabalho, pais e filhos, marido e mulher, tio e sobrinho, patrão e empregado, entre namorados, avós e netos, etc. - a mais intensa de todas, a grande distância de todas as outras, é a relação entre mãe e filho.###

Esta é a mais duradoura de todas as relações humanas e a única que dura para a vida inteira - a relação entre pai e filho ocupando um distante segundo lugar. Quanto às relações entre namorados e entre conjuges, a despeito das promessas de amor eterno, nós sabemos como elas se esfumam, frequentemente, ao fim de poucos anos.

Quando um homem - provavelmente por ter cometido um crime hediondo e jazendo na prisão para o resto da sua vida - tiver sido abandonado por todos, amigos, colegas de trabalho, namorada ou mulher, irmãos, pelo pai até, nós podemos estar certos que aquela velhinha que cruza as portas da prisão para visitar tão desprezível ser humano só pode ser uma pessoa - a mãe dele.

Este é o mais a-racional de todos os amores - o único amor que não conhece condições - e por isso é o mais valioso e duradouro de todos. Sem ele, muitos homens e mulheres, abandonados por toda a humanidade, não conheceriam outro caminho senão o suicídio. É a certeza que, não obstante, existe ainda uma pessoa no mundo que lhes quer bem e os conforta que os mantém vivos e desejosos de viver. O amor da mãe consegue este milagre e muitos outros mais pequenos.

Esta é uma relação que se inicia quando a mãe descobre que está grávida e que se intensifica durante a gestação para atingir a plenitude à medida que o filho nasce e se desenvolve. É certo que às dez semanas de gravidez esta relação está ainda no início - mas já existe. Cortar esta relação, mesmo que numa fase inicial, vai ter um custo para a mãe e um custo que se pode prolongar para o resto da sua vida - porque, não é de mais insistir, está-se a cortar a relação mais intensa que pode existir entre dois seres humanos.

Por isso, eu não posso subscrever a leveza de alguns argumentos pretensamente racionais, vindos do lado do Sim, que têm caracterizado esta campanha e, de algum modo, legitimam o aborto. Porque a relação entre uma mãe e um filho - mesmo que em fase fetal - não pode ser analisada em termos racionais. Trata-se de uma relação profundamente a-racional. E ainda bem que assim é, caso contrário, muitos de nós - senão mesmo, a maioria - não estaríamos hoje aqui.

imprescindível

25.1.07

economia do aborto


Para uma mulher, o principal custo de ter um filho é um custo de oportunidade - a penalização sobre a sua carreira profissional e, no limite, a renúncia a uma carreira profissional e aos rendimentos que daí resultariam.###

Ter um filho, para uma mulher que tem uma profissão, implica ter de empregar uma pessoa que tome conta dele e ficar ausente do trabalho durante vários meses, perdendo relevância e oportunidades de promoção, para além das faltas que passará a incorrer para levar o filho ao médico ou ficar em casa quando ele está doente. Não é um custo insuportável. Se tiver um segundo filho, a sua situação profissional vai complicar-se, aproximando a fronteira da inviabilidade. Se tiver ainda mais um - o terceiro - é praticamente certo que ela terá de ficar em casa e renunciar à sua carreira e vencimentos durante um certo número de anos.

Para uma mulher que já esteja em casa, este custo de renúncia é zero; para outra que ganhe o salário mínimo, este custo é o salário mínimo; para outra que ganhe dois mil euros por mês o custo é de dois mil euros por mês. Em termos desta componente do custo, ter um filho é tanto mais caro quanto maior fôr o rendimento de uma mulher. Por isso, uma mulher da classe média é uma consumidora muito mais intensa dos métodos de controlo dos nascimentos - incluindo o aborto - do que uma mulher pobre.

Visto de outro ângulo, uma família pobre tende a ver num filho um activo líquido - ele começará a trabalhar ainda adolescente e a contribuir para o rendimento do agregado familar e, um dia, será ele e os irmãos que sustentarão os pais na velhice, enquanto que o custo de o ter se reduz à alimentação e pouco mais. Pelo contrário, para um casal da classe média que não tenciona pôr o filho a trabalhar aos 16 anos e muitos menos conta com ele para lhe financiar a velhice, um filho representa sobretudo um custos adicional - como aquele que foi mencionado acima - e, portanto um passivo líquido.

Não é de mais insistir: as principais consumidoras de métodos de controlo dos nascimentos - incluindo o aborto - são as mulheres da classe média, não as mulheres pobres. A taxa máxima de abortamento numa sociedade verifica-se entre as mulheres da classe média e a mínima entre as mulheres da classe baixa. (As mulheres da classe mais elevada, por razões que não tratarei aqui, tendem a possuir uma taxa de abortamento também baixa).

O argumento do "aborto de vão-de-escada" que tem sido utilizado na presente campanha sobre o referendo, em que se imagina uma mulher pobre a abortar em condições miseráveis, só é chocante porque é uma raridade. A esmagadora maioria dos abortos são feitos por mulheres da classe média e estas podem pagar um local mais confortável e seguro do que o "vão-de escada", embora isso lhes custe.

Por isso, a gratuitidade do aborto que resultará do Sim ao referendo é no interesse sobretudo das mulheres da classe média e dos seus parceiros - jamais no interesse generalizado das mulheres da classe mais pobre do país. Primeiro, porque as mulheres pobres raramente recorrem ao aborto. Segundo, porque sendo as mulheres pobres que produzem mais filhos, são os filhos delas que, em número crescente como contribuintes, vão pagar os abortos à classe média do país.

Coisa pública

A lei actual determina que os tempos de antena deverão ser emitidos pelo canal do Estado entre as 19 e as 22 horas. Apesar de ter sido prática corrente emitir por volta das 20.00, a RTP, dentro da lei, repete-se, decidiu alterar para as 19.00 a emissão de publicidade institucional.
Os partidos políticos não gostaram. Afinal o canal do Estado está ou não ao seu serviço? Para que é os contribuintes pagam impostos? Não é também para terem de gramar com as homilias dos partidos que os governam?
A solução foi rápida e consensual: alterar a lei, claro. Que também é para isso que elas servem: dar resposta aos interesses partidários.