segunda-feira, setembro 03, 2012

Petit climbing trip - Parte V - Meadinha

 OLHA! TOMA LÁ BOLACHAS!




 
Um espectáculo inusitado. Vários ribeiros de ocasião caíam em cascatas varrendo as linhas de fraqueza da parede de granito.
Encostados ao carro - de motor ainda quente devido à longa viagem – de braços cruzados, apreciávamos o fenómeno.


 À esquerda na foto pode-se apreciar uma cascata de água improvisada pelas chuvas recentes.


Cruzámos toda a Espanha sob intermitentes pancadas de chuva. Comentámos que o timing das actividades tinha sido perfeito, dadas as circunstâncias. De facto, desde a nossa partida de Portugal tínhamos aproveitado todos os dias de bom tempo para concretizar as escaladas. O mau tempo esteve reservado para os períodos de descanso e viagem, normalmente coincidentes.
As previsões ditavam que a chuva iria começar a cair ao fim do dia em que esperávamos terminar a nossa abertura em Ordesa. As previsões revelaram-se acertadas.
No dia seguinte, apontámos a viatura de novo para Portugal. Ainda com dias disponíveis iríamos re-visitar a parede da Meadinha, uma verdadeira jóia de granito em plena serra da Peneda.
O raios de sol abriam caminho por entre as nuvens e a parede negra pela húmidade começou a secar.


A Meadinha a secar.


Estávamos decididos a culminar a nossa viagem de escalada com uma nova via na Meadinha. Existiam no entanto algumas reservas. Em primeiro lugar havia que formatar de novo o cérebro para o granito especial da Peneda. Tinham sido vários dias a lutar contra a verticalidade exigente de Peña Montañesa e contra os cubos de calcário vertiginoso de Ordesa. Agora, a intenção era enfrentar de novo as fissuras de granito, confrontar as infames protuberâncias de cristal tão características da Peneda.
 Antes de nos lançarmos a uma nova linha, resolvemos “aquecer” numa via estabelecida. A via escolhida revelou-se um belo “aquecimento”. A “CaravelaRoxa” foi aberta por Natália Pereira, Sergio Sá e Marco Cunha em Outubro de 2011. Era a mais recente aquisição da parede da Meadinha. O alinhamento tinha sido muito bem visto e a coisa prometia dar luta. E deu luta! 


 A Daniela a iniciar a "Caravela Roxa".

 
 A Daniela na "Caravela Roxa". Passos bonitos em granito excepcional.


Todos os lances da via revelaram-se muito estéticos e o “crux” possuía alguns passos de placa ultra-técnica, seguidos de uma fissura de entalamento de mãos terminando numa escalada de cristal e aderência, tão típicos por estas bandas. 

 
 Dois momentos no "crux" intenso da "Caravela Roxa".


Chegámos ao cimo  da parede com a sensação de ter escalado uma clássica na verdadeira acepção da palavra. Uma linha lógica que bem merece ser colocada no panteão das melhores vias, a par com as hiper-clássicas locais.
De novo no solo, escolhemos a futura linha à qual nos iríamos dedicar nos dois dias seguintes.
Duas atractivas fissuras gémeas realçavam acima de toda a restante morfologia no topo do flanco direito da Meadinha. O problema seria interligar a metade inferior sem nos perdermos num mar de vegetação.
“Mas, olha! Ali, aquilo é uma fissura!” – anunciou efusiva a Daniela.
“Onde?!” – perguntei céptico.
“Naquele esporão, ali!”


 As fissuras gémeas no centro da foto, tirada após a abertura da via. Abaixo das fissuras e ligeiramente à esquerda pode-se apreciar uma linha ténue escovada. Por aí segue a "nossa" nova via na Meadinha.


Por mais que olhasse não conseguia identificar nenhuma fissura no local que a Daniela apontava. Uma observação mais atenta denunciou, finalmente, a dita fenda. Uma fina estria de ervas cortava verticalmente o compacto esporão.
“E, onde há erva há buraco!” Neste caso: fissura.
A Daniela acabara de descobrir o elo de ligação entre os lances inferiores e as chaminés superiores.
“Limpar aquilo, vai dar trabalho!” – concluí desalentado.
A receita para se abrir novas vias na Meadinha incluí: escova de aço, espigão de metal (um saca-entaladores também serve), piolet (não o usámos mas... na próxima vez...), muita paciência e um completo desleixo pelo vestuário.


A iniciar o primeiro lance da via.
 A curtir as vistas no incio do segundo lance, antes de me entalar!


Os primeiros lances foram escalados com relativa facilidade e a dita fenda foi literalmente conquistada. No entanto, o sacrifício foi recompensado com a revelação de uma fissura de antologia, perfeita para entalar as mãos e proteger convenientemente.


Um descanso de pés depois dos passos de artificial baptizados com o nome: "Passo Alvarinho". Segue a oferta de uma garrafa de Alvarinho a quem conseguir realizar em livre pela primeira vez o referido passo.


 Depois de umas limpezas, surgirá uma excelente fissura.

 
 A Daniela no processo de escalada...


 ...e limpeza!

 
O lance seguinte também reservou uma agradável surpresa. Desde o solo, o que parecia uma penosa chaminé de “arrastamento” de baixo acima, transformou-se numa escalada variada entre oposições, fissura de mãos e chaminé fácil.


 A entrada do espectacular penultimo lance. Uma das fissuras gémeas.

 

 Dois momentos da Daniela a sair da chaminé.



 E a chegar à reunião. Yô!


No final, ainda inspirados e com vontade de fazer mais, resolvemos evitar a trepada fácil comum com a via “Esperança”, concluindo a nova linha  com mais uns 40 metros de ressaltos interessantes.
 Foram dois sorrisos de orelha a orelha que emergiram no topo da Meadinha.


 Um ultimo largo só para terminar em beleza.


 No topo, a dar-lhe nas sandochas!


 
Na descida ainda podemos apreciar o Marco Cunha a trabalhar num novo projecto da autoria do próprio, do Sergio Sá e da Natália Pereira. Uma futura via para repetir!


Rumo a casa, reflectíamos sobre as ultimas três semanas. O plano inicial passava por escalar apenas nos Alpes mas, os humores da atmosfera condicionaram a viagem transformando-a num corrupio de escaladas e emoções variadas. Os resultados foram cinco aventuras de intensa exploração vertical, cinco novas vias distribuídas pelos Alpes, Pirinéus e Portugal.
No final, não queríamos que terminasse. Com a alma a transbordar resignamo-nos...
OVER!


 Over!


Paulo Roxo


Os Topos:





6 Comments:

Anónimo said...

Mais uma boa razão para regressar à Meadinha, mais não seja pelo Alvarinho!
haja é tempo para escalar...
Sergio D

taia said...

Antes demais obrigada pelas elogiosas palavras à via "Caravela Roxa".
Parabéns por mais um via na catedral granítica, e agora sim é tempo de lançar o nosso post sobre a "Toma lá Esperança", uma tentativa apressada num dia chuvoso de fazer a "Toma lá Bolachas" que resultou num mix de duas vias vossas. Ensarilhadas...enfim. Abraço e esperamos por vós em breve

sesa said...

Obrigado por continuarem a inspirar-nos.
Em relação à secção "alvarinho" vão juntando os trocos... pareceu possível e a fissura é Brutal.
Abreijos do abismo.

FPereira said...

Toma lá umas migalhas de bolacha: o lance 2 dá para ligar com o lance do jardim e ganha-se tempo com isso. Atenção aos pitons fixos no passo Alvarinho podem saltar que nem rolhas(... de Alvarinho). Que fissurinha!

Ana M. Duarte said...

Sempre em grande!
Parabéns

Anónimo said...

Muito bom!!!!!
Meadinha forever!!!!
Abraço
João Animado