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terça-feira, 4 de março de 2014

Editorial: O silêncio e o jogo

|Luís Filipe Cristóvão



No meio de toda esta confusão, no mundo, no país, na rua, ocorreu-me que o editorial desta mês poderia ser, simplesmente, uma imagem. Hesitava entre a letra da música de Los Hermanos, o apropriado “Todo o Carnaval tem seu fim”, ou a adaptação de uma frase que anda a anos perdida na minha cabeça, transformada agora em “o silêncio deveria ser, definitivamente, a tua filosofia”.

Ocorre que há uns meses visitei o Convento do Varatojo e a sua Mata Sagrada, pelo que acorri à pasta onde guardo uma série de fotografias dessa ocasião, em busca de alguma que pudesse transportar, como maior eficácia, esse elogio ao silêncio. No entanto, a que me saltou à vista foi esta, a de um improvisado campo de futebol onde, imagino eu, alguns dos frades franciscanos se arriscam, de tempos a tempos, a um disputado dérbi.

Encontrei-me assim, quando em busca do silêncio, perante a clara evidência de que não há como parar o jogo. A cada ocasião, a necessidade de fazer o movimento que dará origem a outro e a outro, logo de seguida. Não me ocorre melhor imagem para entrar, agora que o Carnaval termina, no mês de março.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Editorial: Nos 19 anos do ATV

|Luís Filipe Cristóvão

O mês de fevereiro marca o 19º aniversário do ATV – Académico de Torres Vedras, casa deste projeto literário que agora leva o nome de Revista Literária Sítio. Os 19 anos da associação marcam uma plena maturidade de um projeto que, mesmo vivendo diferentes vidas ao longo da sua existência, preocupou-se, sempre, em alimentar bases para o seu crescimento.

Assim também por aqui tentamos que isso seja possível. Mesmo perante dificuldades, desesperos ou desilusões. Tornando o mais importante, não aquilo que nos pode ferir neste momento, mas o que crescerá de cada problema na descoberta da sua solução. Mais do que parecer um otimista em excesso, da mesma forma que noutras alturas foi de negativismo que tentaram cobrir as minhas palavras, trata-se de exercer, sobre todo e qualquer momento, um esforço realista.

A realidade é, neste momento, a de um projeto à procura do seu rumo. As ideias de solidariedade, bem-estar, criatividade e esforço social que fazem parte da essência do ATV estão bem expressas no projeto da Sítio. Torná-lo bem mais abrangente é a missão de cada um de nós. Porque acreditem não custa nada, ser realista por um minuto que seja em cada dia e arriscar o impossível.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Editorial: Um ano

|Luís Filipe Cristóvão

Faz hoje um ano que a Revista Literária Sítio regressou para manter uma existência exclusiva online. Este regresso deveu-se à vontade de um punhado de pessoas, cada uma a partir do seu canto, a imaginar formas de dar espaço público aos autores que gosta de ler. Começámos por procurar os nossos amigos, as nossas ligações, para alargarmos, como sempre foi o destino da Sítio, a demanda para quem acabou por se juntar a nós. No fundo, é para isso que servem as revistas literárias, para encontrar gente que não estava ao nosso alcance conhecer de outra forma.

Mantemos a porta aberta sem grandes pretensões. Não são as linhagens literárias, nem os desejos vazios de ser “alguém” no mundo editorial que nos mantém neste trabalho. É, sim, uma vontade férrea de não desistir do que, parecendo tão natural, vai sendo cada vez mais raro: o viver as coisas pelo simples prazer que elas nos oferecem. Sem deixar que medos nos aterrorizem, sem permitir que ansiedades nos retirem de entre os dedos o que não conseguimos agarrar. A vida segue, na Sítio, dia a dia, com mais uma leitura, mais um projeto de vida de alguém que nos encontra.

Faz hoje um ano, online, fará, em breve, treze anos, que esta caminhada começou. Sempre com a presença do ATV – Académico de Torres Vedras, como base de apoio para uma ideia. Os grandes projetos fazem-se em equipa, mútuo apoio, multiplicada esperança. Há também lugar para ti na Sítio. Bom 2014.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

O óbvio

|Luís Filipe Cristóvão

Encaminhamo-nos para o óbvio diariamente. Acordamos a horas certas, saímos de casa com as roupas regulamentadas, picamos o ponto, sorrimos e queixamo-nos com a destreza habitual, tiramos o almoço da lancheira, tomamos um café no mesmo sítio de sempre, fumamos um cigarro a pensar no vazio. Depois, a mesma lenga-lenga, até que nos deitamos, de novo, à hora do costume.

Para o combater, resta-nos pouco mais do que a imaginação. Sonhamos sem sair do lugar, desejamos sem falar, buscamos sem que nada o permita entender. Lutamos contra o óbvio de forma silenciosa, mas obstinada, contagiando tudo o que nos rodeia com essa vontade de fazer diferente. Fugimos enquanto nos entregamos. Não é assim tão difícil de entender, nem tão complicado de perceber.

Parece que estamos aqui, mas estamos longe. E é esse o nosso sítio.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Editorial: Da vida e da morte num país que acaba

|Luís F. Cristóvão

Muito antes de este ser o dia de visitar os mortos, eu acordava bem cedo com a excitação de ter um saco do pão, em pano, pronto, para sair de casa em busca do “pão por deus”. Era um hábito forte e enraizado na aldeia do meu pai, onde o feriado do primeiro de novembro também marcava o aniversário do grupo desportivo, e juntava toda a gente da aldeia, em bailes populares pela noite e jogos de futebol no campo pelado durante a tarde. A manhã, essa, era das crianças, à solta pelas ruelas, ao “pão por deus”.

Foram dezenas e dezenas de rebuçados, bolachas, broas, chupa-chupas, línguas de gato… Na casa de algum primo, uma moeda de 25 escudos, um verdadeiro tesouro prateado, porta para uma série de outras guloseimas ou pequenas compras durante o resto do dia. No café, lembro-me também do “pão por deus” significar uma ou duas carteirinhas dos calendários da bola, onde bigodudos jogadores apareciam prontos a ser colecionados religiosamente, guardados numas capas que estavam sempre perto de mim, no meu quarto, ao acordar.

Muito antes de este ser o dia de visitar os mortos, este foi o dia de festejar a vida. Depois crescemos e saímos de casa para caminhar por cemitérios, em silêncio, em busca de palavras que imaginamos ecoar pelas copas das árvores que, nestes dias, nos protegem mais da chuva do que algum raio de sol envergonhado.  Mas isto, também era dantes.

Hoje ficamos em frente aos computadores, a exercer o mesmo trabalho de um qualquer outro dia. Hoje ficamos presos nas repartições, nas salas de professores, nos balcões das lojas. Hoje não há vida, nem morte, que nos valha. Por algum tipo de negociação que nos custa a perceber, apagaram do calendário um dia que, para mim, não era religioso no sentido canónico de uma qualquer Igreja, mas que fazia e continuará sempre a fazer parte da religião da minha memória.

Hoje ficamos apenas por aqui. Num país que acaba.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Editorial: Sem tempo para guerras

|Luís Filipe Cristóvão

Sem tempo para guerras, assumimos a luta pelo sonho – sonhamos um espaço onde os autores podem divulgar o seu trabalho e onde leitores podem descobrir novos caminhos de saber. Falhamos, constantemente, umas vezes atrás das outras, mas não desistimos. Ao nosso sonho correspondem, mensalmente, novas vozes e novas ideias, as nossas portas estão abertas, façamos deste recreio um espaço para nos renovarmos.

Sem tempo para guerras, assumimos a luta pelos nossos direitos – inventamos o que ocupa o vazio e permanecemos em constante desbravar de sensações. Queremos que as nossas palavras sejam sentidas, queremos que as nossas imagens sejam emocionantes, queremos que o nosso estímulo não se perca no vazio. Connosco, estão todos os autores que comungam deste desejo de ser maior, entre as nossas janelas corre o ar, façamos desta sala um espaço para nos encontrarmos.

Sem tempo para guerras, não desistimos. Não precisamos de mais razões para fazermos aquilo que queremos fazer. E o que nós queremos, agora – como querem todos vocês que por aqui passam em busca de espaço para publicar, algo para ler, muito para sonhar – é isto. Esta é a Sítio. Construam nela a vossa casa.



Nota: Porque esta revista é feita por múltiplas vozes, os editoriais passam agora a ser assinados. A cada um deles, corresponde uma cara, um pensamento, um desejo. Tal como a cada dia, nos poemas, nas prosas, nas fotografias.