Apesar de não comemorarem o Natal, os japoneses fazem um pequeno recesso na virada de ano, não tão longo quanto no Brasil mas que mesmo assim oportuniza de se viajar um pouco mais longe. Um dos destinos que queríamos conhecer há algum tempo era a Tailândia, mas lendo a respeito do país descobrimos que o melhor clima por lá é no final do ano, então decidimos ainda em outubro por passar o ano novo lá.
Compramos a passagem ainda antes das confusões políticas e tomada do aeroporto, o que nos deixou um pouco apreensivos de que a viagem poderia não sair. Mas nas nossas leituras sobre o país também ficamos sabendo que golpes de estados são até comuns por lá, não envolvem os confrontos armados e confusões que esperamos (principalmente nós, brasileiros) desses eventos. São processos bem mais pacíficos e com bastante apoio popular. Assim imaginamos que as coisas logo se acalmariam.
E assim foi. Algumas semanas antes da data programada a situação se acalmou, permitindo nossa viagem, que acabou acontecendo na véspera de Natal, 24 de dezembro. No Japão, tirando a decoração do comércio, não existe “clima natalino”, então não foi tão estranho passar a noite de Natal dentro do avião, até porque estávamos empolgados com a viagem. Havia poucos ocidentais no nosso vôo, e a única referência natalina, apesar do avião ser da Northwest, empresa americana, era um dos comissários com um gorrinho de Papai Noel, que parecia ser indiano. Ainda com a questão do fuso, não tinhamos nem mesmo hora exata para “celebrar” o Natal.
Chegamos em Bangkok (ou Krung Thep, กรุงเทพฯ, o nome em tailandês) passada a meia-noite, e o ônibus para a região do hotel não operava mais, assim tivemos que usar um táxi. Já sabíamos onde ir para pegar os taxis normais, e o esquema de se pedir o destino em um guichê que escrevia o endereço no alfabeto local para os taxistas, que raramente falam inglês, mas mesmo assim a comunicação foi difícil, pois não entendiamos nada que o motorista falava. Mas deu tudo certo, chegamos no hotel sãos e salvos.
Bangkok é a típica cidade grande de país em desenvolvimento: segundo meu amigo Rômulo, lembra o Rio de Janeiro. Não sei, o que posso dizer é que é bastante poluída, barulhenta e com muito tráfego. O que mais chama a atenção é a grande quantidade de templos budistas (religião oficial da Tailândia). É como uma versão budista das cidades da Bahia, com as igrejas dando lugar aos templos. Mas se engana quem acha que budismo é tudo igual: os templos da Tailândia não tem nada a ver com os do Japão. A arquitetura, os temas, visual, todos muito diferentes. Muitas stupas, muito dourado, muito brilho. Parece um budismo “barroco”, completamente oposto ao budismo Zen, minimalista, do Japão.
As pessoas na Tailândia são muito religiosas. Em frente de várias lojas se encontram pequenos altares com velas e oferendas. Na Tailândia, existe uma Fanta sabor Morango que eu achei muito boa. E seguido via as garrafinhas dessa Fanta, até com o canudinho, nos altares. Eu brincava que ia ali tomar a Fanta dando sopa e já voltava, mas não cheguei a fazer isso de fato (as Fantas não estavam geladas, hehe).
Outra parte da “crença incondicional” dos tailandeses é relativa ao Rei. Ele é absurdamente popular. Milhares de fotos dele e da Rainha podem ser vistas em Bangkok, em prédios públicos, cartazes, postes, em qualquer lugar por onde as pessoas passem. O desrespeito ao Rei é crime, e isso teria sido, dizem, um dos motivos dos golpes de 2006 e 2008, onde os primeiros ministros estariam tentando ganhar mais poder e diminuir a importância do Rei. A cor oficial do Rei é a amarela, que colore muitos dos monumentos na Tailândia, e camisas amarelas são bastante populares como forma de homenagem a ele. É por isso que os ocupantes do aeroporto em dezembro passado usavam camisetas dessa cor.
Não sei o motivo de tanta popularidade do Rei, afinal, ele faz parte do poder, o que deveria automaticamente gerar certa desconfiança. Uma possível explicação é que a Tailândia é o único país do sudeste asiático a nunca ter sido dominado por uma nação européia. Talvez isso dê um senso de orgulho nacional e veneração aos seus governantes. O que sei é que, por essa veneração sem questionamento, visitar o Museu Nacional de Bangkok é bastante frustrante, pra quem tem interesse em história. O que se aprende são apenas os lados positivos de cada rei, e parece que ninguém mais além deles fez nada de importante pelo desenvolvimento da nação. Não se ouve sobre as intrigas, disputas de poder etc, que a gente sabe que caracterizam a história de tantos países e não teria porque na Tailândia ser diferente.
Uma coisa que cansa em Bangkok é a constante “tiração de vantagem” em cima do turista. O que agrava o problema é que na Tailândia existe uma cultura de que perder a paciência é errado, e quem o faz automaticamente “perde” uma discussão ou disputa. Só que essa regra deve ter sido criada para os tailandeses, que provavelmente se comportam bem melhor entre seus conterrâneos. Após algumas tentativas desistimos de pegar taxis em Bangkok, pois nenhum motorista aceitava fazer a corrida pelo taxímetro. Em vez de ficarmos discutindo, desistimos e compramos um mapa das linhas de ônibus. Assim, economizamos em dinheiro e estresse.
Além de Bangkok, viajamos para as ilhas Phi Phi (หมู่เกาะพีพี), ao sul da Tailândia, onde passamos a virada de ano. Conhecia o nome por ser o mesmo de um restaurante tailandês de Porto Alegre, mas a fama das ilhas vem de ter sido cenário do filme “A Praia” e pela destruição causada pela tsunami de 2004.
Culturalmente, Phi Phi tem muito pouco de Tailândia. Mesmo os tailandeses que estão lá, em geral estão a trabalho, e todos falam inglês, idioma “oficial” da ilha. Mal se vê as placas no alfabeto tailandês que complicam tanto a leitura em Bangkok. Os europeus branquelas (e alguns brasileiros também) refletem à luz do sol sobre a areia. Muitos brasileiros, aliás. Nunca havia visto tantos em nossas viagens pela Ásia. O turismo é “turbinado”, nada de “retiro paradisíaco” que se possa esperar. O desenvolvimento da ilha, mesmo após a tsunami e reconstrução, se dá de forma desenfreada, e no pequeno espaço da ilha existe tudo que o turista pode precisar (e até o que não precisa).
O ambiente na ilha lembra muito Santa Catarina. As praias, também, tirando os destaques, não são muito diferentes das praias mais bonitas do Brasil. O que muda bastante é na qualidade de serviço (melhor), na segurança, mas também nos preços (mais caros que em Bangkok, mas talvez ainda mais baratos que no Brasil). A viagem foi ótima, descansamos, recarregamos as energias para a vida em Tokyo e fugimos do frio por alguns dias, mas fiquei bastante curioso sobre o que faz tantos brasileiros gastarem tanto, viajarem meio mundo, para ter experiências de praia tão parecidas com as do Brasil.
Ah, e uma curiosidade: Sião é o antigo nome de Tailândia, e todos os gatos de rua que vimos em Bangkok eram de fato de raça siamesa! (Diferentemente desse aí de cima, que é apenas um “gato escaldado” que “tem medo de tsunami”.)