30/04/13
28/04/13
Resultados das eleições islandesas
por
Miguel Madeira
Como previsto, a direita ganhou - e foi pior do que se poderia esperar: o mais votado foi o Partido da Independência (o tal que governou o país durante décadas e o levou à falência), houve um aumento global da votação (logo nem se pode dizer "foi o eleitorado de esquerda que se desiludiu e ficou em casa) e o "meu" favorito - o Partido Pirata - por pouco não ia elegendo deputados.
Comparando os resultados de 2009 e 2013:
Entre 2009 e 2013, o Partido Liberal e o Movimento dos Cidadãos passaram por um processo de fusões e cisões múltiplas que acabaram por dar origem à Aurora e ao Partido Democrata, logo a diferença foi calculada em bloco (tecnicamente, o Partido Pirata também teve a sua origem numa cisão de uma cisão do MC, mas tem uma ideologia suficientemente própria para merecer ser contabilizado à parte).
Fazendo uma análise em blocos, temos:
Para as posições dos vários partidos islandeses sobre vários assuntos, podem ver aqui.
Comparando os resultados de 2009 e 2013:
2009 | 2013 | dif. | |
Aliança Social Democrata | 55.758 | 24.292 | -31.466 |
Esquerda Verde | 40.581 | 20.546 | -20.035 |
Partido da Independência | 44.371 | 50.454 | +6.083 |
Partido Progressista | 27.699 | 46.173 | +18.474 |
Partido Liberal | 4.148 | -7.154 | |
Movimento dos Cidadãos | 13.519 | ||
Aurora | 5.855 | ||
Partido Democrata | 4.658 | ||
Partido Pirata | 9.647 | +9.647 | |
Futuro Brilhante | 15.583 | +15.583 | |
Outros | 1.107 | 11.782 | +10.675 |
Brancos | 6.226 | 4.217 | -2.009 |
Nulos | 566 | 585 | +19 |
Abstenção | 33.868 | 44165 | +10.297 |
Entre 2009 e 2013, o Partido Liberal e o Movimento dos Cidadãos passaram por um processo de fusões e cisões múltiplas que acabaram por dar origem à Aurora e ao Partido Democrata, logo a diferença foi calculada em bloco (tecnicamente, o Partido Pirata também teve a sua origem numa cisão de uma cisão do MC, mas tem uma ideologia suficientemente própria para merecer ser contabilizado à parte).
Fazendo uma análise em blocos, temos:
Novos partidos (FB+Piratas) | +25.230 |
Direita tradicional (Ind. + Prog.) | +24.557 |
Outros | +10.675 |
Abst/B/N | +8.307 |
PL+MC/A+PD | -7.154 |
Esquerda tradicional (ASD + EV) | -51.501 |
Para as posições dos vários partidos islandeses sobre vários assuntos, podem ver aqui.
25/04/13
23/04/13
Quanto custa um escudo?
por
João Valente Aguiar
Pelo sempre atento e arguto Ricardo Noronha, deixo aqui dois parágrafos do seu excelente texto que leva o título acima e que pode ser lido na íntegra aqui.
«Parece-me no mínimo insólita a assunção de que a União Europeia seria
um bloco monolítico ou que corresponderia fundamentalmente às elites políticas
e económicas que a governam, como se nela não existissem milhões de
trabalhadores igualmente explorados e capazes de materializarem uma alternativa
não apenas à austeridade no curto-prazo como ao capitalismo no médio e longo
prazo. Uma articulação das resistências e dos conflitos sociais à escala
continental — não uma soma de várias lutas nacionais, note-se bem, mas uma luta
conduzida sem fronteiras — produziria desde logo deslocações ao nível da
correlação de forças dentro das instituições europeias, retirando margem de
manobra aos falcões do Banco Central Europeu e outras aves raras do ajustamento
estrutural. Mesmo do ponto de vista de quem não raciocina para lá de uma
solução reformista, haveria todas as vantagens em fazê-lo a essa escala. Mas do
ponto de vista de quem se bate pela superação do capitalismo, a hipótese
nacional-desenvolvimentista é a pior de todas, quando defendida num país de pequenas
dimensões, com uma história secular de dependência face ao exterior e sem
recursos naturais que se conheça.
Desse ponto de vista, a argumentação dos economistas que vêm
defendendo uma solução nacional para a crise tem permanecido no terreno da ambiguidade.
Se uma medida de política económica implicar várias outras — por exemplo, se
uma renomeação da dívida na nova moeda implicar a nacionalização da banca, se
uma política de relançamento implicar intervenções no sector energético, se uma
política de rendimentos implicar o tabelamento de preços, etc — é importante
saber se o bloco nacional-popular de alianças vagamente equacionado a consegue
sustentar. Poucas coisas seriam piores do que um processo destes conduzido aos
solavancos, repleto de hesitações, que nos levasse de volta ao Verão de 1975 e
nos presenteasse uma reencarnação de Vasco Gonçalves a garantir que não há
terceiras vias nem meias medidas e que ou se está com a revolução ou se está
com a reacção. Infelizmente, os discursos de quem defende o abandono da zona
euro não parecem ter plenamente em conta a experiência do processo
revolucionário português e da sua derrota. Bem sei que não existe a esse
respeito qualquer tipo de fatalidade, mas um aspecto permanece actual menos de
quarenta anos depois: o grande problema do socialismo de miséria é que ao fim
de algum tempo só sobra a miséria. A soberania não nos tira deste buraco.»
O trabalho para lá do empreendedorismo
por
Zé Nuno Matos
Para quem tem estado a espumar com as análises proferidas por Miguel Gonçalves, responsável pelo programa Impulso Jovem, vale a pena ler a entrevista que o jornal Público realizou a Anselm Jappe (aqui fica um pequeno parágrafo):
E/ou aparecer hoje pelas 18.30 no Teatro Maria Matos e amanhã pelas 18.30 na FCSH.
22/04/13
Sobre a "realidade alemã" (3)
por
Miguel Madeira
Ainda a respeito deste assunto, pode ser interessante referir um tema que tem andando a ser discutido entre alguns economistas nas últimas semanas - um estudo do BCE que, aparentemente, demonstra que uma família alemã mediana será menos rica que uma família espanhola (ou, já agora, grega ou portuguesa) mediana (atenção que estamos a falar de riqueza, não de rendimento):
Este estudo tem sido usado nalguns meios para rejeitar mais "ajudas" da Alemanha aos países do Sul, com argumentos do género "os pobrezinhos dos alemães não têm que andar a sustentar os ricos dos espanhóis, portugueses e gregos", mas esse argumento deixa de lado um ponto importante - mesmo que o alemão típico seja mais pobre que o espanhol ou o português típico, a Alemanha é um pais muito mais rico que a Espanha ou Portugal (quem imaginaria tal coisa?) - a baixa riqueza do alemão típico é, simplesmente, o resultado de uma grande desigualdade da repartição da riqueza na Alemanha.
A esse respeito, o artigo "Are Germans really poorer than Spaniards, Italians and Greeks?" (via Tiago Tavares), por Paul de Grauwe e Yuemi Ji, onde aliás foi "roubar" aquele gráfico:
Este estudo tem sido usado nalguns meios para rejeitar mais "ajudas" da Alemanha aos países do Sul, com argumentos do género "os pobrezinhos dos alemães não têm que andar a sustentar os ricos dos espanhóis, portugueses e gregos", mas esse argumento deixa de lado um ponto importante - mesmo que o alemão típico seja mais pobre que o espanhol ou o português típico, a Alemanha é um pais muito mais rico que a Espanha ou Portugal (quem imaginaria tal coisa?) - a baixa riqueza do alemão típico é, simplesmente, o resultado de uma grande desigualdade da repartição da riqueza na Alemanha.
A esse respeito, o artigo "Are Germans really poorer than Spaniards, Italians and Greeks?" (via Tiago Tavares), por Paul de Grauwe e Yuemi Ji, onde aliás foi "roubar" aquele gráfico:
A recent ECB household-wealth survey was interpreted by the media as evidence that poor Germans shouldn’t have to pay for southern Europe. This column takes a look at the numbers. Whilst it’s true that median German households are poor compared to their southern European counterparts, Germany itself is wealthy. Importantly, this wealth is very unequally distributed, but the issue of unequal distribution doesn’t feature much in the press. The debate in Germany creates an inaccurate perception among less wealthy Germans that transfers are unfair.
21/04/13
Sobre a "realidade alemã" (2)
por
Miguel Serras Pereira
O Jorge sugere, aos que sabem francês, a leitura, à laia de suite do post de há pouco sobre a realidade alemã, deste artigo, publicado no Nouvel Observateur, sobre o "modelo alemão", os desempregados, as condições servis de trabalho, a precarização e as medidas degradantes de toda a espécie que a "saúde" da sua economia impõe a um número crescente de habitantes da região. Mais uma vez, a questão que se põe na Europa em termos de luta contra a oligarquia governante não é a do relançamento da "soberania" das economias nacionais, mas a questão transnacional — ou a exigência internacionalista e federativamente articulada — da democratização.
O operador de call-centre
por
Zé Nuno Matos
Conferência com João Carlos Louçã
24-04-2013, 15:30 - Sala 2, Instituto de Ciências Sociais
24-04-2013, 15:30 - Sala 2, Instituto de Ciências Sociais
As alterações no mundo trabalho constituem uma das faces mais
marcantes do período dos últimos 50 anos. Da rotinização da mudança
tecnológica maioritariamente orientada para novas formas de
acumulação à emergência de novas matérias- primas e domínios de
mercadorização gerados pelo factor tecnocientífico-económico e pela
capitalização do conhecimento (ou do “imaterial”). De novas
estratégias produtivas caracterizadas pelo elevado grau de
flexibilidade e precarização dos trabalhadores à mobilização e
exploração das capacidades linguísticas, cognitivas, comunicacionais,
relacionais dos indivíduos. Paralelame nte, a globalização dos
mercados, a escalada global do capitalismo financeiro, a
deslocalização de uma grande parte do aparelho industrial para
regiões economicamente subdesenvolvidas e a implementação de
orientações normativas que apontam para a desregulação e
empresarialização impulsionaram uma outra relação com o trabalho.
O
operário, símbolo do dinamismo fabril e depósito de esperança na
superação do mesmo, deixou de ser socialmente representativo. O
profissional, outrora senhor de um status relativamente elevado,
legitimado por uma deontologia própria, viu a sua condição ser
atravessada por lógicas de proletarização. O emprego, base de um
contrato político e de uma sólida identidade assumiu diferentes formas
– do contrato a prazo e do «recibo-verde» português, ao próprio não
emprego – todas elas caracterizadas por maiores níveis de
efemeridade, intermitência e precariedade, bem como por novos eixos de
conflito.
Embora assumam uma enorme relevância social, o
objectivo desta iniciativa não se resume aos traços acima
mencionados. Entre uma narrativa que analisa o novo a partir do velho,
encarando a flexibilização laboral como uma espécie de deturpação
evolutiva da ordem fordista, e uma outra que ignora o papel do velho na
construção do novo, elevando o trabalhador qualificado à condição
de empresário de si mesmo, existem uma série de buracos negros que
devem ser objecto de estudo e de reflexão. Será o trabalho imaterial
um fenómeno recente e circunscrito a um segmento específico? Deverá a
precariedade ser abordada apenas de uma perspectiva geracional? O que
é, e o que não é trabalho? As classes sociais desapareceram com os
operários? Numa perspectiva interdisciplinar, da sociologia à
antropologia, passando pela história, o objectivo deste ciclo de
conferências reside tanto na resposta a estas questões, como na
formulação de tantas outras.
organização: José Luís Garcia (ICS-UL), José Nuno Matos (ICS-UL)
Sobre a "realidade alemã"
por
Miguel Serras Pereira
Infelizmente só acessível em francês, aqui fica um interessante documento, difundido pela rádio livre parisiense Sons en lutte, sobre a "realidade alemã", que o Jorge Valadas me transmitiu. Um excerto da apresentação: "A 16 de Agosto de 2002, um grupo de especialistas dirigido pelo director dos recursos humanos da Volkswagen, Peter Harts, apresentava à coligação governamental, constituída pelo Partido Social-Democrata e pelos Verdes e encabeçado pelo chanceler Schröder, as suas propostas relativas às reformas do mercado de trabalho. Dez anos mais tarde, o resultado: pauperização dos trabalhadores, conteole social exacerbado e crescimento vertiginoso das desigualdades sociais. A Alemanha um modelo? Para o 1 por cento das classes superiores que dita a sua política aos 99 por cento restantes, sem dúvida: cada vez mais para eles, cada vez menos para os outros".
Torna-se assim inevitável a pergunta: que sentido tem e que interesses serve a palavra de ordem de reconquista da independência nacional contra a Alemanha, como se esta fosse uma realidade social homogénea, uma oligarquia indivisível e coesa, e o conjunto dos alemães, uma raça de senhores, um bloco de exploradores coerente dos países periféricos ou do Sul?
Torna-se assim inevitável a pergunta: que sentido tem e que interesses serve a palavra de ordem de reconquista da independência nacional contra a Alemanha, como se esta fosse uma realidade social homogénea, uma oligarquia indivisível e coesa, e o conjunto dos alemães, uma raça de senhores, um bloco de exploradores coerente dos países periféricos ou do Sul?
19/04/13
25 de Abril II - Com jeito vai...
por
Zé Nuno Matos
Alguns anos depois do fim
do enredo inicial as forças do mal regressam com novos poderes e
propósitos demoníacos. Os heróis do passado revelam-se incapazes de os
combater e toca às pessoas comuns do presente reorganizar-se para
enfrentar estes novos desafios.
Com interpretações notáveis, efeitos especiais inesquecíveis, uma banda sonora arrebata-corações e momentos de aventura e tensão que marcarão toda uma geração, "25 de Abril II" é já considerado o blockbuster do verão de 2013. Em parte thriller psicológico e épico bíblico é no entanto pontuado por momentos de humor hilariantes sobretudo quando os vários candidatos a "líder" do movimento são ridicularizados por toda a gente em devir comunizante e insurreccional.
A não perder, estreia dia 25 de Abril às 15h em frente ao Diário de Noticias, no início da Avenida da Liberdade. Os convidados para a estreia deverão fazer-se acompanhar de máscaras, lenços de cowboy, instrumentos musicais e outra parafernália interessante.
Com interpretações notáveis, efeitos especiais inesquecíveis, uma banda sonora arrebata-corações e momentos de aventura e tensão que marcarão toda uma geração, "25 de Abril II" é já considerado o blockbuster do verão de 2013. Em parte thriller psicológico e épico bíblico é no entanto pontuado por momentos de humor hilariantes sobretudo quando os vários candidatos a "líder" do movimento são ridicularizados por toda a gente em devir comunizante e insurreccional.
A não perder, estreia dia 25 de Abril às 15h em frente ao Diário de Noticias, no início da Avenida da Liberdade. Os convidados para a estreia deverão fazer-se acompanhar de máscaras, lenços de cowboy, instrumentos musicais e outra parafernália interessante.
17/04/13
16/04/13
O Passa Palavra desmonta as imposturas e sofismas da "independência nacional"
por
Miguel Serras Pereira
Aqui ficam alguns excertos do texto intitulado Um Balão no Ar que o colectivo do Passa Palavra consagra à desmontagem — mas, se se preferir, pode ler-se também "desconstrução" — das imposturas e sofismas da "independência nacional" enquanto aposta no "capitalismo de Estado". Dito isto, seria interessante que o Passa Palavra prolongasse ou completasse a reflexão que nos propõe analisando como outras vias, diferentes das da aposta no capitalismo de Estado nacional, são adoptadas por outras fracções da oligarquia dos gestores, por um lado, e, por outro, como, segundo creio, a interpretação nacionalista se tem desenvolvido, não só como reacção das periferias, mas também, em grande medida, em núcleos muito importantes de instâncias centrais no governo da UE.
(…) as companhias transnacionais deixaram de ser uma extensão do poder dos seus países originários e converteram-se em centros de soberania próprios, cujos limites espaciais não se confundem com as fronteiras de nenhum Estado nem são fixos como elas. Isto explica que a recente crise tivesse repercussões diferentes sobre as companhias transnacionais e sobre as economias nacionais. «Apesar dos seus efeitos sobre os fluxos do investimento externo directo, a crise global não interrompeu a crescente internacionalização da produção», afirmou o World Investment Report 2010. «Em 2008 e 2009 a diminuição das vendas e do valor acrescentado nas filiais estrangeiras das companhias transnacionais foi menor do que a contracção da economia mundial. Em consequência, a participação das filiais estrangeiras no Produto Interno Bruto global atingiu o máximo histórico de 11%».
(…)
Em visita à China, o secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), Jerónimo de Sousa, apelou para o aumento dos investimentos chineses em Portugal, declarando que «Qualquer investimento estrangeiro — chinês, americano ou canadiano — é sempre bem-vindo, no quadro do respeito pelo nosso interesse nacional e da defesa dos nossos sectores estratégicos e dos recursos naturais» (leia aqui). A ideia de que investimentos directos estrangeiros possam respeitar soberanias, quando a transnacionalização do capital se opera precisamente diluindo as soberanias estatais, só poderia nascer no cérebro de um nacionalista, perdão, de um patriota. E será que a compra pela transnacional chinesa Three Gorges Corporation da parte que cabia ao Estado português na Energias de Portugal (EDP) corresponde ao que o secretário-geral do PCP entende como «defesa dos nossos sectores estratégicos e dos recursos naturais»? Mas, apesar das palavras diplomáticas de circunstância, a mensagem foi clara e todos a entenderam. O PCP encara com agrado a saída da zona euro, numas circunstâncias em que, segundo a AICEP [Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal], entre Janeiro e Novembro de 2012 Portugal recebeu da União Europeia 91% dos investimentos directos entrados no país; e o PCP pensa que a China poderá substituir essa presença europeia.
(…)
Temos demonstrado em repetidos artigos que o abandono da zona euro trará consequências económicas ainda mais gravosas do que aquelas que hoje os trabalhadores, tanto portugueses como imigrantes, sofrem neste país. E temos afirmado que, no caso de Portugal sair da zona euro, esse agravamento da situação económica exigirá obrigatoriamente o reforço de medidas repressivas contra a luta dos trabalhadores, o que requer o fortalecimento do Estado.
Por outro lado, o abandono da zona euro provocaria de imediato um colapso nas relações exteriores, tanto comerciais como financeiras, o que teria como consequência o isolacionismo económico. Ora, todos os exemplos históricos têm mostrado, sem uma única excepção, que o isolacionismo económico corresponde ao reforço da intervenção do Estado na economia.
Ambas estas vias convergem no capitalismo de Estado. Por mais que se envolvam no fantasma de Dom Afonso Henriques ou em quaisquer outros fantasmas da sua preferência, no da Maria da Fonte por exemplo, os nacionalistas e patriotas portugueses estão, muito prosaicamente, a candidatar-se a um capitalismo de Estado.
(…) as companhias transnacionais deixaram de ser uma extensão do poder dos seus países originários e converteram-se em centros de soberania próprios, cujos limites espaciais não se confundem com as fronteiras de nenhum Estado nem são fixos como elas. Isto explica que a recente crise tivesse repercussões diferentes sobre as companhias transnacionais e sobre as economias nacionais. «Apesar dos seus efeitos sobre os fluxos do investimento externo directo, a crise global não interrompeu a crescente internacionalização da produção», afirmou o World Investment Report 2010. «Em 2008 e 2009 a diminuição das vendas e do valor acrescentado nas filiais estrangeiras das companhias transnacionais foi menor do que a contracção da economia mundial. Em consequência, a participação das filiais estrangeiras no Produto Interno Bruto global atingiu o máximo histórico de 11%».
(…)
Em visita à China, o secretário-geral do Partido Comunista Português (PCP), Jerónimo de Sousa, apelou para o aumento dos investimentos chineses em Portugal, declarando que «Qualquer investimento estrangeiro — chinês, americano ou canadiano — é sempre bem-vindo, no quadro do respeito pelo nosso interesse nacional e da defesa dos nossos sectores estratégicos e dos recursos naturais» (leia aqui). A ideia de que investimentos directos estrangeiros possam respeitar soberanias, quando a transnacionalização do capital se opera precisamente diluindo as soberanias estatais, só poderia nascer no cérebro de um nacionalista, perdão, de um patriota. E será que a compra pela transnacional chinesa Three Gorges Corporation da parte que cabia ao Estado português na Energias de Portugal (EDP) corresponde ao que o secretário-geral do PCP entende como «defesa dos nossos sectores estratégicos e dos recursos naturais»? Mas, apesar das palavras diplomáticas de circunstância, a mensagem foi clara e todos a entenderam. O PCP encara com agrado a saída da zona euro, numas circunstâncias em que, segundo a AICEP [Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal], entre Janeiro e Novembro de 2012 Portugal recebeu da União Europeia 91% dos investimentos directos entrados no país; e o PCP pensa que a China poderá substituir essa presença europeia.
(…)
Temos demonstrado em repetidos artigos que o abandono da zona euro trará consequências económicas ainda mais gravosas do que aquelas que hoje os trabalhadores, tanto portugueses como imigrantes, sofrem neste país. E temos afirmado que, no caso de Portugal sair da zona euro, esse agravamento da situação económica exigirá obrigatoriamente o reforço de medidas repressivas contra a luta dos trabalhadores, o que requer o fortalecimento do Estado.
Por outro lado, o abandono da zona euro provocaria de imediato um colapso nas relações exteriores, tanto comerciais como financeiras, o que teria como consequência o isolacionismo económico. Ora, todos os exemplos históricos têm mostrado, sem uma única excepção, que o isolacionismo económico corresponde ao reforço da intervenção do Estado na economia.
Ambas estas vias convergem no capitalismo de Estado. Por mais que se envolvam no fantasma de Dom Afonso Henriques ou em quaisquer outros fantasmas da sua preferência, no da Maria da Fonte por exemplo, os nacionalistas e patriotas portugueses estão, muito prosaicamente, a candidatar-se a um capitalismo de Estado.
Sai uma dose de capital humano a acompanhar de flexibilidade e empregabilidade e também com um bocadinho de empreendedorismo se puder ser
por
Zé Nuno Matos
Amélia Santos oferece-se para trabalhar a cuidar de crianças e idosos em troca de
comida.
14/04/13
13/04/13
Uns revolucionários...
por
João Valente Aguiar
«A Embaixada, o PCP e as grevesNaturalmente, a Embaixada [dos EUA em Portugal] não fazia o seu juízo apenas a partir de impressões recolhidas numa conversa telefónica e observava atentamente o comportamento do PCP, ao tempo a mais importante força política no terreno, perante a efervescente realidade social do país.
E também aí recolhia indícios que achava abonatórios. Assim, uma outra mensagem enviada ao Departamento de Estado pelo mesmo Scott em 23 de Maio, pouco mais de duas semanas antes da conversa com Cunhal, afirmava que "os esforços do PCP para parecer respeitável levam-no a tentar arrefecer a presente hiperactividade laboral".
Scott relata a este respeito a primeira conferência de imprensa do PCP na legalidade, referindo jocosamente o retrato traçado por Cunhal sobre a situação dos trabalhadores no tempo do fascismo - "uma recitação melancólica" de factos, seguida por uma "homilia" sobre a justeza das reivindicações operárias e, finalmente, por um ataque à extrema-esquerda, segundo Scott rotulada por Cunhal como o "inimigo fundamental".»
Interessante reportagem de António Louçã sobre as avaliações da Embaixada norte-americana em 1974 sobre o PS e o PCP e que pode ser lida aqui na íntegra.
E também aí recolhia indícios que achava abonatórios. Assim, uma outra mensagem enviada ao Departamento de Estado pelo mesmo Scott em 23 de Maio, pouco mais de duas semanas antes da conversa com Cunhal, afirmava que "os esforços do PCP para parecer respeitável levam-no a tentar arrefecer a presente hiperactividade laboral".
Scott relata a este respeito a primeira conferência de imprensa do PCP na legalidade, referindo jocosamente o retrato traçado por Cunhal sobre a situação dos trabalhadores no tempo do fascismo - "uma recitação melancólica" de factos, seguida por uma "homilia" sobre a justeza das reivindicações operárias e, finalmente, por um ataque à extrema-esquerda, segundo Scott rotulada por Cunhal como o "inimigo fundamental".»
Interessante reportagem de António Louçã sobre as avaliações da Embaixada norte-americana em 1974 sobre o PS e o PCP e que pode ser lida aqui na íntegra.
12/04/13
Reforço de Primavera
por
João Valente Aguiar
E pronto. O Zé Nuno Matos é o nosso reforço de Primavera.
Sociólogo de grandes qualidades analíticas e críticas, especialista em questões do trabalho, activista e participante nas lutas do nosso tempo, o Zé Nuno Matos trará certamente um importante contributo reflexivo para este nosso espaço. Bem-vindo!
Sociólogo de grandes qualidades analíticas e críticas, especialista em questões do trabalho, activista e participante nas lutas do nosso tempo, o Zé Nuno Matos trará certamente um importante contributo reflexivo para este nosso espaço. Bem-vindo!
Recomposição: sobre as recentes greves em Itália
por
Zé Nuno Matos
The workers, porters in particular, at the centre of these struggles,
are almost all migrants. It isn’t hard to understand why: existing
legislation blackmails them and poses them at the bottom of the labour
market hierarchy, where borders between employment and undeclared work
blur, where contracts are only formalities that bosses can easily
disrespect, where the intensity of exploitation doesn’t know rules nor
limits. In the system of cooperatives – job model of the Left and
principal enemy of these exploited workers – command hierarchies are
sharp-cut and articulated: from the top of a company to a network of
gangsters and spies, through the ordinary employment of mafia gangs
harassing key figures in the workers’ struggles (burnt cars, threats and
aggressions, etc.). And it is precisely in these extreme conditions,
however, that migrants become the paradigm of contemporary
precariousness, thus of the general composition of living labour.
O caminho de João Ferreira do Amaral para sair do euro
por
Miguel Madeira
Segundo o Expresso, esta é a estratégia proposta por João Ferreira do Amaral para sair do euro:
No entanto, o esquema de JFA nem sequer tem essa vantagem que poderia ser atribuída à desvalorização - ele propõe que o valor das dívidas à banca se mantenha constante em euros (ou seja, se o escudo desvalorizar, a dívida aumenta). É verdade que ele propõe que os aumentos do valor das dívidas resultante da desvalorização do "escudo" seja assumido pelo Estado (em vez de recair sobre os devedores), mas assim a proposta de JFA é um imenso criador de dívida pública:
- Já à partida, o valor da dívida pública do Estado português em euros manteria-se, logo a desvalorização do escudo iria fazer aumentar o valor real da dívida (se o escudo desvalorizar 30%, é de esperar que a divida pública passe de 120 para 170% do PIB)
- Como a ideia dele é o Estado assumir também os aumentos da dívida aos bancos resultantes da desvalorização, então ainda mais dívida iria ser gerada para isso: imagine-se alguém que deve 40.000 euros ao banco; o seu ordenado é convertido em escudos, que depois são desvalorizados em 30% - assim, para o devedor não ficar a dever mais por causa da desvalorização, o Estado teria que assumir 12.000 euros da dívida. Agora imagine-se isso multiplicado por milhões de famílias e a adicionar à divida pública que já iria em 170%...
JFA propõe que o aumento da dívida para assumir as dívidas privadas seja feito através do Banco de Portugal - o que me parece implicar imprimir dinheiro; mas facilmente se corria o risco de cair-se num ciclo vicioso, em que se imprimia escudos para o Estado assumir dívida privada, gerando uma maior desvalorização do escudo, obrigando assim o Estado a assumir mais dívida, para o qual teria que imprimir mais moeda e desvalorizando ainda mais o escudo.
Em última instância, todo o plano de JFA para sair do euro parece-me ter por base que a União Europeia e BCE iriam emprestar-nos dinheiro em quantidade e num prazo suficientemente amplos para sustentar o brutal aumento da dívida, e provavelmente que iria comprar escudos nos mercados internacionais para não os deixar desvalorizar muito mais que os 30% previstos.
Mas, se o resto da UE estivesse disposta a fazer uma tão grande transferência de dinheiro para Portugal (e provavelmente também para a Grécia, Chipre, Espanha e sabe-se lá que mais...), estaríamos sequer a discutir a hipótese de sair do euro?
[Noto que me estou a basear só no artigo do Expresso; é possivel que no seu livro JFA aborde melhor a questão e até responda aos pontos que aqui levantei]
- Manutenção do valor em euros dos depósitos na banca lusa. O Estado honraria as suas dívidas em euros. Esta garantia seria dada pelas autoridades nacionais e comunitárias, em conjuntoEu, quando escrevi que "[p]oderemos discutir se a austeridade-via-desvalorização é melhor ou pior que outras formas de austeridade (e eu consigo pensar tanto em razões para ser melhor, como em razões para ser pior)", realmente ocorreu-me que uma vantagem que, efectivamente, a desvalorização teria sobre a descida de salários é que, se os salários baixarem, os assalariados que tenham dívidas (e hoje em dia suponho que a maioria as tem, nem que seja para a habitação) ficam ainda mais endividados (se o salário baixa e a dívida fica na mesma, a divida em proporção do rendimento aumenta); já com uma desvalorização da moeda, tanto o valor real dos salários como das dividas baixa, logo pelo menos não há um aumento do endividamento.
- Preservação do balanço dos bancos: os créditos a famílias, empresas e Estado aumentariam na nova moeda em função da desvalorização desta
- Evitar o incumprimento generalizado à banca: o Estado substituir-se aos devedores no montante em que o aumento da dívida em moeda nacional resultasse da desvalorização. Um acréscimo de dívida pública interno e financiado através de empréstimos junto do Banco de Portugal
- Manutenção da nova moeda numa banda de flutuação de 15% em relação a uma taxa de referência face ao euro
- Cooperação europeia: novo empréstimo a Portugal para honrar a dívida do Estado e sustentar a balança de pagamentos até a desvalorização cambial ter efeitos positivos no reequilibrio das contas externas. O BCE renovaria durante algum tempo a dívida dos bancos portugueses e criaria uma facilidade especial, temporária, de crédito aos bancos, para reagir de imediato a qualquer sintoma de pânico na transição
No entanto, o esquema de JFA nem sequer tem essa vantagem que poderia ser atribuída à desvalorização - ele propõe que o valor das dívidas à banca se mantenha constante em euros (ou seja, se o escudo desvalorizar, a dívida aumenta). É verdade que ele propõe que os aumentos do valor das dívidas resultante da desvalorização do "escudo" seja assumido pelo Estado (em vez de recair sobre os devedores), mas assim a proposta de JFA é um imenso criador de dívida pública:
- Já à partida, o valor da dívida pública do Estado português em euros manteria-se, logo a desvalorização do escudo iria fazer aumentar o valor real da dívida (se o escudo desvalorizar 30%, é de esperar que a divida pública passe de 120 para 170% do PIB)
- Como a ideia dele é o Estado assumir também os aumentos da dívida aos bancos resultantes da desvalorização, então ainda mais dívida iria ser gerada para isso: imagine-se alguém que deve 40.000 euros ao banco; o seu ordenado é convertido em escudos, que depois são desvalorizados em 30% - assim, para o devedor não ficar a dever mais por causa da desvalorização, o Estado teria que assumir 12.000 euros da dívida. Agora imagine-se isso multiplicado por milhões de famílias e a adicionar à divida pública que já iria em 170%...
JFA propõe que o aumento da dívida para assumir as dívidas privadas seja feito através do Banco de Portugal - o que me parece implicar imprimir dinheiro; mas facilmente se corria o risco de cair-se num ciclo vicioso, em que se imprimia escudos para o Estado assumir dívida privada, gerando uma maior desvalorização do escudo, obrigando assim o Estado a assumir mais dívida, para o qual teria que imprimir mais moeda e desvalorizando ainda mais o escudo.
Em última instância, todo o plano de JFA para sair do euro parece-me ter por base que a União Europeia e BCE iriam emprestar-nos dinheiro em quantidade e num prazo suficientemente amplos para sustentar o brutal aumento da dívida, e provavelmente que iria comprar escudos nos mercados internacionais para não os deixar desvalorizar muito mais que os 30% previstos.
Mas, se o resto da UE estivesse disposta a fazer uma tão grande transferência de dinheiro para Portugal (e provavelmente também para a Grécia, Chipre, Espanha e sabe-se lá que mais...), estaríamos sequer a discutir a hipótese de sair do euro?
[Noto que me estou a basear só no artigo do Expresso; é possivel que no seu livro JFA aborde melhor a questão e até responda aos pontos que aqui levantei]
10/04/13
A Islândia, hoje
por
Miguel Madeira
Há anos que circulam mails e posts no Facebook em que a Islândia é apresentada tal como algumas pessoas viam a Albânia nos anos 70 - como uma espécie de farol para a Humanidade (ou pelo menos para a Europa).
Sobretudo no Facebook é frequente deparar-nos com "gostos" a artigos sobre a Islândia que, vai-se depois ver, foram escritos há anos atrás e referindo situações largamente ultrapassadas.
Assim, como está hoje a Islândia?
Em primeiro lugar, a coligação de esquerda que governa o país vai a caminho de uma derrota esmagadora nas eleições marcadas para 27 de abril: as sondagens dão à Aliança Social-Democrata (o PS local) entre 10 e 15% dos votos (contra 30% nas últimas eleições) e à Esquerda Verde (que pode ser considerado como uma espécie de BE) entre 5 e 10% (contra 21% nas últimas eleições). O primeiro lugar anda a ser disputado entre as duas tradicionais formações da direita: o Partido da Independência (liberal-conservador, que governou o país durante grande parte da sua história, nomeadamente nos anos que levaram à crise financeira) e o Partido Progressista ("centrista" agrário).
E outro assunto que se tem falado de vez em quando - a nova constituição islandesa?
Para esse assunto, é melhor dar a palavra Kristin Vala Ragnarsdottir, que no seu artigo A New Post-Crash Constitution in Iceland? (via Al Jazeera), dá uma explicação de como está o processo:
A grande questão que, a meu ver, interessa discutir acerca da experiência islandesa é o mais que provável regresso em força da direita ao poder (e durante vários meses, o "camisola amarela" nas sondagens era mesmo o partido mais comprometido com as politicas pré-crise). Qual será a causa disso?
Como bom esquerdista, a minha reação instintiva é dzer que é culpa da esquerda islandesa ter traído os seus eleitores - afinal, foi este governo supostamente de esquerda que negociou acordos gravosos com os representantes do gande capital multinacional, que só não passaram devido à resistência popular, logo para que é que as pessoas haveriam de votar neles?
Mas é provável que esta ideia ("a chamada esquerda vai perder porque não foi verdadeiramente de esquerda") seja simplesmente misturar os desejos com a realidade...
Diga-se que, durante esta legislatura, houve deputados da Esquerda Verde que abandonaram o partido e criaram novos, mas estes novos partidos - politicamente muito ambiguos - também não tiveram sucesso (um nem concorreu, e outro anda pelos zero e tal %).
Será boa ideia, quando surgirem os resultados, seguir o conselho do nosso leitor Libertário, e ver também a evolução das abstenções, brancos e nulos - entre outras coisas, para ver se a queda da esquerda foi porque os eleitores deslocaram-se para a direita ou se foi, antes, muitos antigos eleitores da esquerda que ficaram em casa (pensado "são todos iguais").
Outro factor que provavelmente está a influenciar é a questão da UE; o governo atual tem feito negociações para a adesão, mas parece que a população não está entusiasmada.
Sobretudo no Facebook é frequente deparar-nos com "gostos" a artigos sobre a Islândia que, vai-se depois ver, foram escritos há anos atrás e referindo situações largamente ultrapassadas.
Assim, como está hoje a Islândia?
Em primeiro lugar, a coligação de esquerda que governa o país vai a caminho de uma derrota esmagadora nas eleições marcadas para 27 de abril: as sondagens dão à Aliança Social-Democrata (o PS local) entre 10 e 15% dos votos (contra 30% nas últimas eleições) e à Esquerda Verde (que pode ser considerado como uma espécie de BE) entre 5 e 10% (contra 21% nas últimas eleições). O primeiro lugar anda a ser disputado entre as duas tradicionais formações da direita: o Partido da Independência (liberal-conservador, que governou o país durante grande parte da sua história, nomeadamente nos anos que levaram à crise financeira) e o Partido Progressista ("centrista" agrário).
E outro assunto que se tem falado de vez em quando - a nova constituição islandesa?
Para esse assunto, é melhor dar a palavra Kristin Vala Ragnarsdottir, que no seu artigo A New Post-Crash Constitution in Iceland? (via Al Jazeera), dá uma explicação de como está o processo:
This bleak outlook was, however, tempered by the new left-wing government’s decision to embark on a constitution-writing process, which satisfied a demand of the “pots-and-pans” revolution and initiated an important process of envisioning a new direction for Iceland.
The current constitution[2] of Iceland was adopted from the Kingdom of Denmark in 1944, with the promise to revise it shortly. The constitution has long been seen as unfit for a parliamentary democracy because it is, to a large extent, built on the Royal Danish constitution.
The rewriting process started in October 2010, with the establishment of a National Assembly of 1,000 randomly selected individuals (with some tweaking to ensure the right gender and age distribution). The aim of this gathering was to open discussion of the values and pillars upon which to build the new Iceland. The assembly, in turn, submitted its findings to a Constitutional Committee comprised of seven people from different political persuasions and headed by Gudrun Petursdottir, director of the Institute of Sustainable Development at the University of Iceland. A strong message was duly delivered the following year: the public should have ownership of the natural resources and the electoral process should be more transparent.[3]
The problems started with the next, crucial step in the constitution-writing process: election to the Constitutional Assembly of the 25 people that would actually draft the document. There were 523 candidates, including myself, and a new electoral methodology was used: single transferable vote (STV),[4] which had previously been tested in Ireland, Scotland, and Australia. Yet media coverage was scant, limiting campaigns to Facebook and Twitter. Voter turnout was a disappointingly low 30 percent.
More discouraging was the behavior of the formerly ruling right-wing parties after the results were declared. The Independence and Progressive Parties have been able to count around 60 percent of combined votes for parliament for the past 60 years. The Independence Party led the Icelandic government for 16 years to state collapse and, with the Progressives, they were responsible for selling Iceland’s three banks, which paved the way for superheating the economy. These two parties have a stake in the constitution remaining as it is due to their connection with the dubious privatization of the banks, and links to the former banking leadership as well as to powerful fishing and farming consortiums, which also own much of the media. People connected with the Independence Party filed a technical court complaint about the voting procedures. The High Court, whose judges had been appointed primarily by the Independence and Progressive Parties in their reign prior to the collapse, deemed the Constitutional Parliament elections null and void, demonstrating the power of vested interest, nepotism, and corruption in Iceland. The parliament, led by the two left-wing parties, responded by appointing the 25 elected to the Constitutional Assembly to the Constitutional Council.
The Draft Constitution
Could the draft constitution help wrench back some of the power to the people? After four months, the Council proposed a new draft constitution[5] that built on earlier proposals for public ownership of natural resources. It defines specifically what the natural resources of Iceland are—marine stocks, resources of the ocean and its floor, water and water-harnessing rights, the rights to geothermal energy and mining—and stipulates that their use must be in accordance with sustainable development principles using a permit system. The rights of nature and coming generations to healthy ecosystems are also enshrined in a proposed law for the first time.
Regarding transparency, the new draft constitution has stronger checks and balances between the three branches of government and more clearly defined accountability for politicians should they make the sort of bad decisions that led to the collapse. The draft constitution also has important articles concerning the rights to information, freedom of the media, appointment to public office, and the independence of key state agencies. (...)
But despite the pressure, the two right-wing political parties appear to have regained their influence and are predicted to gain a majority again in upcoming elections in 2013. Whether they can derail the draft constitution remains to be seen. In a referendum in October 2012 the majority of those who voted (49 percent) wanted the proposal for the constitution to be the grounding for a new constitution with natural resource ownership devolved to the people. Since much resistance has come from the Conservative and Progressive Parties, the likelihood of a new constitution being accepted by this parliament is increasing. The constitution will have to be voted for in two consecutive parliaments. The government has promised a national referendum on the constitution bill and hopefully it will take place at the parliamentary elections on April 27, 2013. In the meantime, the tepid pace of the national recovery continues. Unemployment is now at 5.6 percent, although this figure is skewed by the fact that many have left Iceland and gone to work in Norway and other countries. A more sustainable political system remains a possibility, but it may require more banging of pots and pans to bring it about.
A grande questão que, a meu ver, interessa discutir acerca da experiência islandesa é o mais que provável regresso em força da direita ao poder (e durante vários meses, o "camisola amarela" nas sondagens era mesmo o partido mais comprometido com as politicas pré-crise). Qual será a causa disso?
Como bom esquerdista, a minha reação instintiva é dzer que é culpa da esquerda islandesa ter traído os seus eleitores - afinal, foi este governo supostamente de esquerda que negociou acordos gravosos com os representantes do gande capital multinacional, que só não passaram devido à resistência popular, logo para que é que as pessoas haveriam de votar neles?
Mas é provável que esta ideia ("a chamada esquerda vai perder porque não foi verdadeiramente de esquerda") seja simplesmente misturar os desejos com a realidade...
Diga-se que, durante esta legislatura, houve deputados da Esquerda Verde que abandonaram o partido e criaram novos, mas estes novos partidos - politicamente muito ambiguos - também não tiveram sucesso (um nem concorreu, e outro anda pelos zero e tal %).
Será boa ideia, quando surgirem os resultados, seguir o conselho do nosso leitor Libertário, e ver também a evolução das abstenções, brancos e nulos - entre outras coisas, para ver se a queda da esquerda foi porque os eleitores deslocaram-se para a direita ou se foi, antes, muitos antigos eleitores da esquerda que ficaram em casa (pensado "são todos iguais").
Outro factor que provavelmente está a influenciar é a questão da UE; o governo atual tem feito negociações para a adesão, mas parece que a população não está entusiasmada.
09/04/13
A "aliança" entre a esquerda nacionalista e os sectores mais à direita dos capitalistas portugueses
por
João Valente Aguiar
A este propósito, já Francisco Louçã tinha escrito há quase dois anos o seguinte sobre as propostas nacionalistas de Vítor Bento e que vale a pena citar, na medida em que se aplicam tanto ao antigo presidente da SEDES como à esquerda nacionalista. De facto, eu já tinha alertado aqui contra o desprezo com que a maioria da esquerda portuguesa tem votado os capitalistas portugueses e a sua circunscrição da crítica à Alemanha e à defesa de um confronto de nações:
«Suponhamos que o governo decidiu sair do euro e ressuscitar o escudo. Mandou por isso imprimir em segredo as notas de escudo e prepara-se para anunciar a novidade, numa sexta à noite, à hora do telejornal, quando os bancos já estão fechados (ou decreta um feriado bancário durante vários dias). Nesse fim-de-semana, todos os bancos fazem horas extraordinárias para distribuir as notas por todos os multibancos, para que a nova moeda possa entrar imediatamente em circulação.
O que vai acontecer é que toda a gente vai descobrir que se prepara a nova moeda. Esta operação de lançamento do escudo envolve milhares de pessoas, que transportam e distribuem as notas, e eles vão contar às suas famílias. E, de qualquer modo, toda a gente assistiu nas semanas anteriores a declarações dos ministros a explicar que isto vai muito mal e precisamos de decisões muito corajosas para salvar a Pátria em perigo. Em resumo, toda a gente percebeu o que vai acontecer.
O que farão então as pessoas? Não é preciso adivinhar: vão a correr aos bancos levantar todas as suas contas e guardar as notas de euros. Se não o fizerem, todas as suas poupanças vão ser transformadas em escudos, a um valor nominal que cairá com a forte desvalorização que, afinal, é o objectivo desta operação. Os trabalhadores que depositaram salários e poupanças vão ser as primeiras vítimas da nova política. E por isso vão tentar salvar o que puderem.
Ora, os bancos não querem nem podem pagar aos clientes todos os seus depósitos, simplesmente não têm o dinheiro para isso – nem há notas suficientes para cobrir toda a massa monetária líquida que existe em Portugal (a massa monetária é a soma das notas e moedas em circulação com os depósitos nos bancos, e os bancos não guardam todo esse dinheiro, porque emprestam grande parte dele). Os bancos vão por isso fechar as portas quando se generalizar o alarme, e o governo vai chamar o exército para guardar os edifícios. Foi assim na Argentina ou na Rússia, foi assim em todos os casos em que se anunciaram grandes desvalorizações (e nem se tratava de sair de uma moeda e criar outra, o que nunca aconteceu na história da União Europeia).
Os nacionalistas, que propuseram a saída do euro, começam agora a ter a primeira dificuldade. É que vão defender o exército e os bancos contra a população. E vão ter de fazer a sua primeira vítima, os depositantes nos bancos. A conta é fácil: se a desvalorização for de 50%, as poupanças e depósitos vão perder metade do seu valor.
Passou assim o primeiro choque. Mas vem aí mais, e pior. O escudo desvalorizou-se então 50% em relação ao euro. O governo aposta nessa desvalorização para recuperar a economia e espera que o efeito benéfico seja o seguinte: as exportações aumentam porque se tornam mais baratas em euros e dólares, enquanto as importações diminuem porque se tornam mais caras em escudos. Assim, haverá uma deslocação de capital para as indústrias e serviços exportadores e uma redução do consumo e das importações. Tudo isto melhora substancialmente a balança de pagamentos. A regra é esta: se a vida melhorar para Américo Amorim, o dono da maior multinacional industrial portuguesa, ou para outras empresas exportadoras, melhorará também para toda a economia.
Parece conveniente, mas é um problema. É que, com a desvalorização, o preço dos produtos importados aumenta no mesmo dia. O combustível passou a custar uma vez e meia o seu preço anterior (e todo o sistema de transportes também), e o mesmo acontece com os alimentos importados ou com os medicamentos, entre tantos bens de primeira necessidade.
Como dois terços do rendimento dos portugueses é para o consumo corrente, imagina-se o efeito imediato destes aumentos de preços no salário. Quanto às exportações, sim, vão aumentar, desde que os compradores no estrangeiro queiram comprar mais em função da redução do preço (e desde que não haja recessão no estrangeiro, e que os produtos portugueses correspondam a mercados com procura crescente, e que as suas características acompanhem as exigências dos consumidores estrangeiros, etc.). Talvez aumentem. Se aumentarem, será em todo o caso devagar: as receitas das vendas só entram quando se fizerem as vendas, e é preciso esperar o tempo da produção – e é preciso ter dinheiro para investir. Depois, o que Portugal exporta inclui o custo da matéria-prima e outros produtos que são importados, que são mais de metade do valor das exportações, e que ficaram mais caros. Por isso, as receitas das exportações aumentam pouco, devagar e mais tarde.
Chega depois o segundo choque. Metade das famílias portuguesas tem uma longa dívida ao banco, que lhe emprestou dinheiro para comprar a casa. Emprestou em euros e deve em euros aos bancos estrangeiros, mas vai receber em escudos dos devedores em Portugal.
O banco perdeu assim metade do valor dos seus créditos. O banco vai por isso à falência. É por isso que os defensores da saída do euro explicam, honestamente, que será necessário nacionalizar todos os bancos, não tanto para socializar o capital financeiro, mas antes para o salvar. E salvar um banco pode custar muito caro, como já sabemos pelo caso BPN [Banco Português de Negócios]. Porque, quando se nacionaliza um banco, fica-se com as suas dívidas, que são dívidas a quem nele depositou e dívidas a quem lhe emprestou dinheiro, normalmente a banca estrangeira. Salvar os bancos tem um custo, e não é pequeno: a dívida pública portuguesa duplica imediatamente com as dívidas dos bancos, que antes eram privadas e passam a ser públicas porque foram nacionalizadas.
Chegados aqui, já sabemos o que se vai passar: os nacionalistas vão propor um aumento de impostos para pagar as dívidas da banca ao estrangeiro, isto é, para financiar a banca internacional.
Voltemos agora aos problemas que os nacionalistas estão a viver no apoio ao governo que decidiu a saída do euro. Já têm contra si quem vai pagar mais impostos, viu multiplicar as suas dívidas, paga mais pelos alimentos, transportes e medicamentos, ou perdeu parte das suas poupanças e depósitos. Com tudo isto, os trabalhadores depressa perceberão que perderam parte do seu salário (ou da sua pensão), e que o esforço orçamental não diminuiu (pelo contrário, agravou-se, pois a dívida vai ser paga em euros mas os impostos são recebidos pelo Estado em escudos, e são precisos cada vez mais escudos por cada euro), e a saúde e a educação têm novos cortes.
Por outras palavras, os nacionalistas que defendem a saída do euro meteram-se numa alhada. Os que diziam que queriam impedir a austeridade, acabam a propor um sistema de mais austeridade, toda orientada para o benefício de um sector social, a indústria exportadora, e promovem a queda dos salários e das pensões. Não resolveram nenhum problema e criaram novas dificuldades. E perdem o respeito dos trabalhadores, que estão a ser prejudicados».
Por outras palavras, os nacionalistas que defendem a saída do euro meteram-se numa alhada. Os que diziam que queriam impedir a austeridade, acabam a propor um sistema de mais austeridade, toda orientada para o benefício de um sector social, a indústria exportadora, e promovem a queda dos salários e das pensões. Não resolveram nenhum problema e criaram novas dificuldades. E perdem o respeito dos trabalhadores, que estão a ser prejudicados».
Pena é que Francisco Louçã não retome mais vezes, e desta forma veemente e sem papas na língua, os efeitos catastróficos de uma saída do euro. E pena é também que Francisco Louçã não perspective o espaço europeu como única possibilidade de contraposição ao nacionalismo e como espaço privilegiado para uma democratização das relações sociais a partir das lutas dos trabalhadores. Apesar destas importantes diferenças que me separam de Louçã, antes a sensatez sobre as reais consequências de uma saída do euro do que o nacionalismo dos que, da direita mais extrema à esquerda pretensamente marxista, defendem a via social e politicamente mais nociva para todos os trabalhadores europeus.
08/04/13
Ainda os "privilégios" dos funcionários públicos
por
Miguel Madeira
Já repararam que muitas das pessoas que dizem (de forma não totalmente correcta) que os trabalhadores do Estado têm (face aos do sector privado) o privilégios de não poderem ser despedidos são as mesmas que dizem que uns dos males da economia portuguesa é uma legislação laboral que, segundo eles, torna praticamente impossivel às empresas despedir trabalhadores?
06/04/13
Os privilégios dos funcionários públicos
por
Miguel Madeira
Helena Matos fala do "actual regime de privilégio da função pública" (discurso ecoado por muita gente).
Mas em que consiste afinal esse famoso "regime de privilégio"?
A ADSE?
Eu sou uma espécie de funcionário público e não tenho ADSE.
O regime de aposentação?
No meu caso, o meu regime de aposentação é igual ao dos privados.
As subidas automáticas de escalão?
Em primeiro lugar, muitas empresas privadas têm "diuturnidades", que é exactamente a mesma coisa que "progressões" que havia na função pública; em segundo lugar, essas subidas de escalão por antiguidade já acabaram há um porção de anos; em terceiro lugar, mesmo as subidas de escalão de acordo com a avalição de desempenho estão suspensas há vários anos; e em quarto, eu nunca tive nenhuma "subida automática de escalão" - todos os aumentos que tive desde o ano 2000 (quando mais ou menos começou a minha carreira profissional) até hoje foram simplesmente o aumento anual da função pública.
As 35 horas de horário em vez de 40?
Não há nenhuma lei que diga que os trabalhadores do sector privado tenham que trabalhar 40 horas, nem que os do sector público trabalhem só 35. Eu realmente trabalho 35 horas, mas no meu local de trabalho muita gente trabalha 40 horas. E, em categorias idênticas, quem trabalha 35 horas recebe 87,5% do que quem trabalha 40, logo não vejo que isso seja um grande privilégio.
Os ordenados maiores?
Talvez. Realmente nalgumas categorias os funcionários públicos ganham mais que os do sector privado (embora nas categorias menos remuneradas ganhem menos que no sector privado); no entanto, é discutível até que ponto grande parte dessa diferença já não foi anulada pela redução remuneratória até 10% a que os ordenados dos funcionários públicos estão sujeitos; e, se não fosse a sentença do TC, este ano haveria uma redução adicional de (até) 7%, correspondente ao subsidio de férias (para não falar do corte de 14% no ano passado, declarado inconstitucional mas aplicado na mesma).
Não poderem ser despedidos?
Neste ponto mistura-se muita coisa - se estamos a falar de despedimentos individuais com justa causa, podem acontecer tanto no sector público como no privado (veja-se o caso da minha ex-colega, que foi mesmo despedida); se estamos a falar de contratos a prazo que não são renovados quando chegam ao fim, também são do mais comum que há no sector público. Quanto ao risco de despedimento por extinção do posto de trabalho / encerramento da actividade: no caso dos trabalhadores do Estado contratados ao abrigo do Código do Trabalho, é igual ao do sector privado (por exemplo, se esta fusão for para a frente e isso criar «sinergias» nos serviços administrativos, é perfeitamente possível eu ser despedido); já nos contratados ao abrigo do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, realmente não correm esse risco.
O pagamento do trabalho extraordinário?
Realmente, é aqui que o estatuto de privilégio dos trabalhadores do Estado é mais visível.
No sector privado, nos dias úteis o trabalho extraordinário é pago a 125% na primeira hora e a 137,5% nas seguintes; nos fins de semana e feriados é pago a 150% [pdf].
Já no sector público (com a excepção [pdf de 1,6 MB] dos profissionais de saúde), desde janeiro de 2013 que nos dias úteis é pago a 112,5% na primeira hora e a 118,75% nas seguintes, sendo pago a 125% nos fins de semana e feriados [pdf de 1,6 MB].
Um privilégio gritante sem dúvida...
Um contra-argumento contra o que escrevo aqui, nomeadamente a respeito da ADSE, das aposentações e dos despedimentos poderá ser "O Miguel não é funcionário público; é trabalhador com Contrato Individual de Trabalho de um Estabelecimento Público Empresarial - logo os exemplos pessoais que dá são irrelevantes"; mas o facto é que todas as medidas de contenção que têm sido tomadas têm como alvo todos os trabalhadores do sector público, seja qual for o seu vínculo e o tipo de instituição onde trabalham.
Sol na eira e chuva no nabal não é possível - das duas uma: ou chamamos "funcionários públicos" a todos os trabalhadores do Estado, ou chamamos "funcionários públicos" apenas aos trabalhadores com Contrato de Trabalho em Funções Públicas; não se pode é usar a primeira definição de "funcionário público" para escolher os destinatários das medidas de contenção e a segunda para exemplificar os alegados "privilégios" que servem de justificação às medidas
Mas em que consiste afinal esse famoso "regime de privilégio"?
A ADSE?
Eu sou uma espécie de funcionário público e não tenho ADSE.
O regime de aposentação?
No meu caso, o meu regime de aposentação é igual ao dos privados.
As subidas automáticas de escalão?
Em primeiro lugar, muitas empresas privadas têm "diuturnidades", que é exactamente a mesma coisa que "progressões" que havia na função pública; em segundo lugar, essas subidas de escalão por antiguidade já acabaram há um porção de anos; em terceiro lugar, mesmo as subidas de escalão de acordo com a avalição de desempenho estão suspensas há vários anos; e em quarto, eu nunca tive nenhuma "subida automática de escalão" - todos os aumentos que tive desde o ano 2000 (quando mais ou menos começou a minha carreira profissional) até hoje foram simplesmente o aumento anual da função pública.
As 35 horas de horário em vez de 40?
Não há nenhuma lei que diga que os trabalhadores do sector privado tenham que trabalhar 40 horas, nem que os do sector público trabalhem só 35. Eu realmente trabalho 35 horas, mas no meu local de trabalho muita gente trabalha 40 horas. E, em categorias idênticas, quem trabalha 35 horas recebe 87,5% do que quem trabalha 40, logo não vejo que isso seja um grande privilégio.
Os ordenados maiores?
Talvez. Realmente nalgumas categorias os funcionários públicos ganham mais que os do sector privado (embora nas categorias menos remuneradas ganhem menos que no sector privado); no entanto, é discutível até que ponto grande parte dessa diferença já não foi anulada pela redução remuneratória até 10% a que os ordenados dos funcionários públicos estão sujeitos; e, se não fosse a sentença do TC, este ano haveria uma redução adicional de (até) 7%, correspondente ao subsidio de férias (para não falar do corte de 14% no ano passado, declarado inconstitucional mas aplicado na mesma).
Não poderem ser despedidos?
Neste ponto mistura-se muita coisa - se estamos a falar de despedimentos individuais com justa causa, podem acontecer tanto no sector público como no privado (veja-se o caso da minha ex-colega, que foi mesmo despedida); se estamos a falar de contratos a prazo que não são renovados quando chegam ao fim, também são do mais comum que há no sector público. Quanto ao risco de despedimento por extinção do posto de trabalho / encerramento da actividade: no caso dos trabalhadores do Estado contratados ao abrigo do Código do Trabalho, é igual ao do sector privado (por exemplo, se esta fusão for para a frente e isso criar «sinergias» nos serviços administrativos, é perfeitamente possível eu ser despedido); já nos contratados ao abrigo do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, realmente não correm esse risco.
O pagamento do trabalho extraordinário?
Realmente, é aqui que o estatuto de privilégio dos trabalhadores do Estado é mais visível.
No sector privado, nos dias úteis o trabalho extraordinário é pago a 125% na primeira hora e a 137,5% nas seguintes; nos fins de semana e feriados é pago a 150% [pdf].
Já no sector público (com a excepção [pdf de 1,6 MB] dos profissionais de saúde), desde janeiro de 2013 que nos dias úteis é pago a 112,5% na primeira hora e a 118,75% nas seguintes, sendo pago a 125% nos fins de semana e feriados [pdf de 1,6 MB].
Um privilégio gritante sem dúvida...
Um contra-argumento contra o que escrevo aqui, nomeadamente a respeito da ADSE, das aposentações e dos despedimentos poderá ser "O Miguel não é funcionário público; é trabalhador com Contrato Individual de Trabalho de um Estabelecimento Público Empresarial - logo os exemplos pessoais que dá são irrelevantes"; mas o facto é que todas as medidas de contenção que têm sido tomadas têm como alvo todos os trabalhadores do sector público, seja qual for o seu vínculo e o tipo de instituição onde trabalham.
Sol na eira e chuva no nabal não é possível - das duas uma: ou chamamos "funcionários públicos" a todos os trabalhadores do Estado, ou chamamos "funcionários públicos" apenas aos trabalhadores com Contrato de Trabalho em Funções Públicas; não se pode é usar a primeira definição de "funcionário público" para escolher os destinatários das medidas de contenção e a segunda para exemplificar os alegados "privilégios" que servem de justificação às medidas
05/04/13
«Sobre a passagem de alguns milhares de pessoas por um breve período de tempo»
por
João Valente Aguiar
Enquanto a esquerda mais ou menos parlamentar anda orgásmica com a demissão de Relvas (como se um governo definisse o que quer que seja, ou como se uma personagem
medíocre como aquele indivíduo contasse para alguma coisa), os companheiros das Edições Antipáticas lançaram um documento de reflexão sobre aspectos importantíssimos da
nossa conjuntura: “Sobre a passagem de alguns milhares de pessoas por um breveperíodo de tempo”. Para além de quatro ou cinco aspectos que mereceriam uma ampla
e mais detalhada discussão, registe-se a enorme importância deste escrito para
uma renovação das lutas sociais numa base democrática, de base libertária e
sem vanguardas iluminadas que só servem para edificar novos princípios de
dominação.
Deixo um breve excerto para abrir o apetite. O texto integral pode ser lido aqui.
«Estas linhas procuraram traçar uma breve narrativa do
movimento. Não pretendemos com elas erguer qualquer barricada inexpugnável ou traçar
um risco na areia que separe os bons dos maus, os revolucionários dos reformistas,
os libertários dos autoritários, os consequentes dos ingénuos. Os problemas que
identificamos no movimento são os nossos problemas e assumimo-los por inteiro.
Precisamente porque consideramos ser esse o espaço onde podemos conceber uma
vida para lá do Estado e do capitalismo, do trabalho assalariado e da divisão
entre representantes e representados, sentimos a necessidade de partilhar com quem
o integra, atravessa e o faz mover, este balanço de dois anos e qualquer coisa,
ao longo dos quais nos encontrámos e desencontrámos, convergimos e divergimos, falámos
e escutámos. As nossas críticas não partem de qualquer sentimento de
hostilidade e o nosso desejo é que a sua eventual severidade não se torne um
obstáculo à comunicação. O que escrevemos pretende ser um ponto de partida e
não um ponto final. Tão pouco se trata de avançar uma receita que resulte de um
pretenso diagnóstico aqui efectuado».
04/04/13
A nova aquisição do governo
por
Miguel Madeira
Há uma coisa que ainda não percebi muito bem - afinal, o meu quase homónimo Miguel Carvalho vai fazer o quê? Li qualquer coisa de que ele iria ser o embaixador do projecto Impulso Jovem, mas essa conversa de "embaixador" é sem dúvida uma metáfora - mas uma metáfora para o quê?
03/04/13
Sobre uma importante tomada de posição do colectivo do Passa Palavra: dominação de classe e cidadania governante
por
Miguel Serras Pereira
Exprimindo e fundamentando a justificada preocupação que devemos assumir quando, como hoje, nos desconcerta que "contra tanta indignação haja tantos elementos capazes de conduzi-la à mais perfeita impotência política", o Passa Palavra acaba de publicar uma análise, assinada pelo seu colectivo, intitulada "Protestos virtuais e impotência política", cuja leitura integral só posso recomendar aos frequentadores deste blogue. Retomo a seguir, quase sem alterações,as observações que deixei na caixa de comentários do artigo.
Considero que se trata de um texto muito importante e que, nas grandes linhas, aprovo sem hesitar. No entanto, parece-me menos feliz na apreciação exclusivamente negativa que faz do termo “cidadãos” tomando-o como expressão de individualismo e privatização. Permitam-me, pois, que passe a tentar esclarecer as minhas razões.
1. O “cidadão” é uma instituição social e colectiva por excelência, e, nesse sentido, exprime que o indivíduo socializa e politiza ou retoma explícita e criticamente, tornando-a uma questão comum, a sua socialização de partida e as condições sociais de existência que partilha com outros. Mais ainda: ao afirmar-se como cidadão activo reivindica participar em pé de igualdade no governo dos assuntos e problemas colectivos, e começa a afirmar-se como governante, ou a reivindicar o exercício do poder político pelos governados como condição da sua legitimidade. A cidadania activa – potencialmente governante – é, pois, a recusa da condição hierárquica de súbdito, pressupõe a acção comum, concebe e pratica a política como liberdade e responsabilidade não-profissional e igualitária de todos, rejeita a especialização classista dos representantes que a tornam prerrogativa de uns quantos sobre a instauração da passividade geral.
2. Assim entendida, a cidadania não ignora, mas levanta e põe na ordem do dia a questão das classes e da sua abolição. É, por definição, anti-classista. A igualdade e a participação igualitária dos cidadãos no exercício do poder é inseparável da recusa da hierarquia entre governantes e governados, proprietários e proletários, gestores e geridos, e assim por diante. A conquista da cidadania activa e plena implica a destruição da sociedade de classes, da sua divisão política do trabalho e da sua divisão do trabalho político.
3. Por tudo isto, parece-me que, em vez de rejeitada como expressão ou sintoma de “individualismo” ou de “privatização”, a reivindicação da cidadania governante deve ser assumida e adoptada como aspecto necessário da democratização anticapitalista que este texto nos propõe como tarefa. É de uma sociedade de classes e contra a condição de classe que, no actual regime de relações de forças, nos define como expropriados — enquanto "assalariados", "trabalhadores precários", "geridos", "explorados" ou "governados" — que partimos, mas terá de ser como cidadãos e iguais, e já não como classe ou membros de uma classe, que nos auto-organizaremos, se quisermos ser nós a governar-nos. Ou, por outras palavras, é transformando as condições de classe que nos fazem dominados que, como cidadãos governantes, sacudimos a dominação e nos libertamos.
Considero que se trata de um texto muito importante e que, nas grandes linhas, aprovo sem hesitar. No entanto, parece-me menos feliz na apreciação exclusivamente negativa que faz do termo “cidadãos” tomando-o como expressão de individualismo e privatização. Permitam-me, pois, que passe a tentar esclarecer as minhas razões.
1. O “cidadão” é uma instituição social e colectiva por excelência, e, nesse sentido, exprime que o indivíduo socializa e politiza ou retoma explícita e criticamente, tornando-a uma questão comum, a sua socialização de partida e as condições sociais de existência que partilha com outros. Mais ainda: ao afirmar-se como cidadão activo reivindica participar em pé de igualdade no governo dos assuntos e problemas colectivos, e começa a afirmar-se como governante, ou a reivindicar o exercício do poder político pelos governados como condição da sua legitimidade. A cidadania activa – potencialmente governante – é, pois, a recusa da condição hierárquica de súbdito, pressupõe a acção comum, concebe e pratica a política como liberdade e responsabilidade não-profissional e igualitária de todos, rejeita a especialização classista dos representantes que a tornam prerrogativa de uns quantos sobre a instauração da passividade geral.
2. Assim entendida, a cidadania não ignora, mas levanta e põe na ordem do dia a questão das classes e da sua abolição. É, por definição, anti-classista. A igualdade e a participação igualitária dos cidadãos no exercício do poder é inseparável da recusa da hierarquia entre governantes e governados, proprietários e proletários, gestores e geridos, e assim por diante. A conquista da cidadania activa e plena implica a destruição da sociedade de classes, da sua divisão política do trabalho e da sua divisão do trabalho político.
3. Por tudo isto, parece-me que, em vez de rejeitada como expressão ou sintoma de “individualismo” ou de “privatização”, a reivindicação da cidadania governante deve ser assumida e adoptada como aspecto necessário da democratização anticapitalista que este texto nos propõe como tarefa. É de uma sociedade de classes e contra a condição de classe que, no actual regime de relações de forças, nos define como expropriados — enquanto "assalariados", "trabalhadores precários", "geridos", "explorados" ou "governados" — que partimos, mas terá de ser como cidadãos e iguais, e já não como classe ou membros de uma classe, que nos auto-organizaremos, se quisermos ser nós a governar-nos. Ou, por outras palavras, é transformando as condições de classe que nos fazem dominados que, como cidadãos governantes, sacudimos a dominação e nos libertamos.
02/04/13
Espaço Pub - Ideologias Políticas Contemporâneas
por
João Valente Aguiar
Já saiu o livro "Ideologias Políticas Contemporâneas" com chancela da Almedina. O capítulo sobre "Comunismo" é da minha autoria. Outros autores: Miguel Cardina e José Soeiro sobre "A esquerda radical", Ana Rita Ferreira sobre a social-democracia, Orlando Samões sobre "Liberalismo" e José Tomaz Castello-Branco sobre "Conservadorismo". Aqui fica um mini-excerto do meu capítulo.
«Onde Lenine via formas do capitalismo controladas por um conteúdo socialista, a realidade histórica encarregar-se-ia de demonstrar como um conteúdo capitalista poderia sobreviver em formas (estritamente discursivas e político-ideológicas) socialistas.
Assim se encerraria o processo revolucionário soviético nas suas fronteiras, territoriais, políticas e sociais. Ao internacionalismo proletário suceder-lhe-ia a formação de uma nação proletária. A um marxismo das relações sociais suceder-se-ia a hegemonia de um marxismo das forças produtivas. O socialismo seria doravante maioritariamente compreendido (e cristalizado) em torno do eixo triangular Estado-nação/crescimento económico/alianças inter-classistas. Doravante, o socialismo poderia ser uma forma de recuperação oblíqua e inesperada do capitalismo. Embora ainda hoje (continuar a) ser percepcionado como um seu contrário…»
Rivais e Cúmplices na Exploração e Opressão das Populações de Gaza
por
Miguel Serras Pereira
Mais uma ofuscante afirmação simbólico-administrativa da vontade de independência nacional e de resistência islâmica dos piedosos muçulmanos do Hamas — para grande gáudio dos piedosos rabinos e devotos falcões de Israel, seus rivais e cúmplices na exploração e opressão das populações de Gaza.
El grupo islamista Hamás, que gobierna la franja de Gaza, introdujo este lunes una nueva ley por la cual convertirá en obligatoria la segregación por sexos de las aulas con niños mayores de nueve años. Además, prohibirá que profesores varones impartan clases en escuelas femeninas. En realidad, a efectos prácticos, las escuelas de Gaza ya están segregadas para los alumnos a partir de nueve años. La nueva norma convierte esa práctica en forzosa.
La nueva norma educativa entrará en vigor en el próximo curso escolar. Se aplicará a las más de 600 escuelas que hay en la Franja. La mayoría de ellas las gestiona el Gobierno. Aproximadamente otras 200 las administra la Organización de Naciones Unidas a través de su agencia para refugiados. El resto son centros educativos privados, varios de ellos cristianos. Varios de estos últimos son los que mantienen hasta hoy clases mixtas pasados los nueve años y hasta el inicio de la educación secundaria.
La segregación escolar por ley es un paso más en la islamización de Gaza, emprendida por Hamás después de ganar las elecciones legislativas palestinas de 2006 y de tomar el control de la Franja un año después. El mes pasado, la ONU se vio obligada a cancelar una maratón humanitaria que tenía prevista en Gaza por la negativa de Hamás a permitir que en ella participaran mujeres, con o sin velo.
En algunas ocasiones, los intentos de avances islamistas de Hamás se han encontrado con una fuerte resistencia social. Algunas mujeres han desafiado normas como la de prohibir a las mujeres fumar de la pipa de agua, o cachimba, en lugares públicos como cafeterías, restaurantes u hoteles, aprobada en 2010. También provocó polémica y desobediencia el veto a que empleados varones trabajen en salones de peluquería femeninos, introducido el mismo año.
“Somos musulmanes. No necesitamos conseguir adeptos y lo único que hacemos es servir a nuestra gente y a su cultura”, dijo el consejero legal del Ministerio de Educación gazatí, Waleed Mezher, a la agencia Reuters después de anunciar la aprobación de la nueva norma legal.
El grupo islamista Hamás, que gobierna la franja de Gaza, introdujo este lunes una nueva ley por la cual convertirá en obligatoria la segregación por sexos de las aulas con niños mayores de nueve años. Además, prohibirá que profesores varones impartan clases en escuelas femeninas. En realidad, a efectos prácticos, las escuelas de Gaza ya están segregadas para los alumnos a partir de nueve años. La nueva norma convierte esa práctica en forzosa.
La nueva norma educativa entrará en vigor en el próximo curso escolar. Se aplicará a las más de 600 escuelas que hay en la Franja. La mayoría de ellas las gestiona el Gobierno. Aproximadamente otras 200 las administra la Organización de Naciones Unidas a través de su agencia para refugiados. El resto son centros educativos privados, varios de ellos cristianos. Varios de estos últimos son los que mantienen hasta hoy clases mixtas pasados los nueve años y hasta el inicio de la educación secundaria.
La segregación escolar por ley es un paso más en la islamización de Gaza, emprendida por Hamás después de ganar las elecciones legislativas palestinas de 2006 y de tomar el control de la Franja un año después. El mes pasado, la ONU se vio obligada a cancelar una maratón humanitaria que tenía prevista en Gaza por la negativa de Hamás a permitir que en ella participaran mujeres, con o sin velo.
En algunas ocasiones, los intentos de avances islamistas de Hamás se han encontrado con una fuerte resistencia social. Algunas mujeres han desafiado normas como la de prohibir a las mujeres fumar de la pipa de agua, o cachimba, en lugares públicos como cafeterías, restaurantes u hoteles, aprobada en 2010. También provocó polémica y desobediencia el veto a que empleados varones trabajen en salones de peluquería femeninos, introducido el mismo año.
“Somos musulmanes. No necesitamos conseguir adeptos y lo único que hacemos es servir a nuestra gente y a su cultura”, dijo el consejero legal del Ministerio de Educación gazatí, Waleed Mezher, a la agencia Reuters después de anunciar la aprobación de la nueva norma legal.
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