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Contrabaixo calibre 12
A Santo Antônio é uma das ruas mais feias do Bom Fim. É cinza e barulhenta e não tem árvores como a João Telles ou a Garibaldi, que são agraciadas por túneis verdes. Infelizmente, porque é a rua onde moro. Mas a Santo Antônio tem um prédio antigo, todo detonado, onde funciona uma escola de música. Não tem placa indicando o nome e, na real, nem sei se é uma escola, pode ser apenas um local de encontro de músicos, porque volta e meia, quando retorno para casa à noite, passo por ali e ouço um som com muita vida e energia, como só a música ao vivo pode proporcionar. Aí, a Santo Antônio se transforma, ganha beleza, ficando com uma atmosfera muito mais interessante. Ao lado da escola, num prédio grande e quadrado, funciona uma das sedes da Rudder, empresa de segurança conhecida aqui em Porto Alegre. Todos os dias dezenas de pessoas se amontoam ali na frente para conseguir um trabalho. O desemprego atinge índices cada vez maiores, o abismo entre ricos e pobres aumenta e, com ele, a violência, quem lucra com isso são as rudders da vida, que quadruplicam vertiginosamente seu patrimônio, entupindo de viaturas a Santo Antônio, deixando-a ainda mais desagradável.Numa tarde, passo por ali e vejo um dos guardas fazendo ronda em cima da marquise do edifício, ele tem uma doze nas mãos e tamborila os dedos no cano da arma. Da escola, vem um som de contrabaixo, alguém ensaiando. Olho pro negrão com a doze e sorrio com a coincidência. Parece que é ele quem está tocando o baixo. Ele me olha meio desconfiado, não entendendo o motivo daquele sorriso. Claro, o barulho da rua não permite a ele ouvir o instrumento. Sigo meu caminho...Porra!! Esse negrão não tinha que estar com uma arma na mão arriscando o pescoço para proteger o patrimônio alheio, deveria estar com um baixo, um trompete, um cavaquinho, nas mãos, tirando uma melodia como os pretos fazem tão bem.
Mas esse é o nosso mundo, e saber manusear uma doze é muito mais importante que saber tocar um contrabaixo.
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3.7.07
Diagramação - Mais Expressão de Vida
Páginas da terceira edição do "Mais Expressão de Vida", jornal produzido por usuários do GAPA (Grupo de Apoio à Prevenção da AIDS/RS) em parceria com a Catarse.
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