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JOGOS PARA A ETERNIDADE - O primeiro Benfica-Liverpool

Dia 1 de Março de 1978 defrontaram-se pela primeira vez Benfica e Liverpool. 
Jogavam-se igualmente os Quartos-de-Final da então chamada Taça dos Campeões Europeus. O Liverpool, com Dalglish mas já sem Keegan, era detentor do troféu (ganhara em Maio de 1977, em Roma, ao Borussia Monchengladbach por 3-1, arrecadando o seu primeiro título europeu). O Benfica era campeão nacional, e seguia invicto num campeonato que terminaria sem derrotas, mas também sem título (o FC Porto interromperia um jejum de 19 anos, e venceria a prova com os mesmos pontos do que os encarnados, mas melhor diferença de golos *). Os ingleses eram naturalmente favoritos.
O Benfica apresentou-se desfalcado de Chalana, que saíra lesionado do jogo com o Vitória de Guimarães no Sábado anterior. E também de Vítor Baptista, que na antevéspera da partida anunciou inusitadamente que abandonaria o Benfica, para regressar ao Vitória de Setúbal - terá exigido um ordenado de 500 contos, a direcção benfiquista não aceitou, oferecendo 400, pelo que o jogador voltou costas e foi para Setúbal ganhar...100 contos, acabando suspenso e não mais realizando qualquer partida de águia ao peito.
Além do caso-Vítor Baptista, o jogo foi também marcado pela chuva torrencial que se abateu sobre Lisboa. Como os relvados de então eram bem menos resistentes, o terreno tornou-se quase impraticável - o que terá favorecido o futebol-força dos britânicos.
Cedo Nené marcou, mas num livre directo Jimmy Case empatou ainda na primeira parte. Já na ponta final da partida, um longo chapéu de Hughes bateu uma vez mais Bento (sempre muito infeliz nos confrontos com o Liverpool). A derrota deixou a eliminatória muito complicada para as Águias, e a eliminação seria consumada quinze dias depois, com nova derrota, dessa vez por 4-1, em Anfield Road, em mais uma noite de chuva. Os ingleses repetiriam o título, batendo o Brugges na final de Wembley.
A nível pessoal, deste jogo apenas me recordo do relato radiofónico, de ouvir o golo de Nené, e depois da ténue desilusão da derrota.
Como uma imagem vale mais do que mil palavras, deixo as fotos que consegui encontrar desta partida, bem como um pequeno vídeo com os golos.

















Ficha do Jogo:


* Se os critérios fossem os de hoje, o Benfica teria sido campeão nacional em 77-78, pois empatou na Luz com o FC Porto 0-0, e foi empatar às Antas 1-1.

JOGOS PARA A ETERNIDADE (18) - Meias-finais europeias

O regresso do Benfica, 17 anos depois, a uma meia-final europeia, traz à memória outros tempos, e outras meias-finais.~



Desde que despertei para o futebol (algures por 1976), já tive o privilégio de ver o meu clube disputar seis meias-finais europeias (esta será a sétima), e serão justamente esses momentos – pode dizer-se que, de glória - que irei recordar em mais um número da rubrica “Jogos para a Eternidade”.



Viajemos pois no tempo, começando por Abril de 1981 (tinha eu onze aninhos).







CARL ZEISS JENA, Taça das Taças 1980-81
A primeira presença do Benfica numa meia-final que a minha memória alcança, data de 1981.
O treinador era o húngaro Lajos Baroti, e a equipa encarnada constituída por jogadores de grande classe, e não menos carisma, como Bento, Pietra, Humberto Coelho, Carlos Manuel, Alves, Shéu, Chalana ou Nené.



Nssa temporada foi extremamente bem sucedida, com vitórias no Campeonato, Taça de Portugal e Supertaça, além do brilhante percurso europeu que agora recordo. Foi uma época marcante para mim, pois foi em Setembro de 1980 que vi o meu primeiro jogo do Benfica no Estádio da Luz, justamente para a Taça das Taças, diante do Altay Izmir da Turquia, data que já evoquei nesta rubrica.


Foi essa eliminatória que iniciou o bonito percurso que levaria o Benfica até às meias finais, após ultrapassar adversários como o Dínamo de Zagreb (na altura uma potência do futebol de leste europeu), o Malmoe (finalista da Taça dos Campeões dois anos antes), e o Fortuna de Dusseldorf (finalista da Taça das Taças, também em 1978-79). Além do jogo que presenciei no estádio, recordo, com particular estima, o encontro da segunda-mão frente ao Malmoe - na primeira-mão o Benfica perdera 1-0, e Bento sofrera, enfim, um golo, depois de um recorde de muitos minutos com as redes invioláveis -, em que Nené marcou dois golos de penálti já na segunda-parte, e a partida de Dusseldorf, uma das primeiras do Benfica que me recordo de ver na TV (antes dela, creio que apenas vira um Bayern-Benfica de 1976), disputada numa quarta-feira de Carnaval, e que terminou com um empate a dois.



Chegados às meias-finais, os encarnados tinham pela frente aquilo que se esperava ser uma pêra doce: os alemães de leste do Carl Zeiss Jena. Toda a gente aguardava então uma final entre Benfica e Feyenoord, mas a verdade é que a conquista do troféu seria decidida, pelo contrário, entre Carl Zeiss e Dínamo de Tbilisi, com vitória dos bielorrussos.



A eliminatória ficou logo marcada pelo jogo da primeira-mão, em que aos 10 minutos de jogo já o Benfica perdia por 2-0, não conseguindo, nos restantes 80, obter qualquer golo. Curiosamente, recordo essa partida com menor nitidez que as anteriores, mas lembro-me que foi também transmitida pela RTP.



Já o encontro da segunda-mão, na Luz, está bem vivo na minha memória. Ouvi o relato fechado na cozinha da casa dos meus avós, onde passava as férias da Páscoa. À distância de trinta anos, é possível perceber que a confiança na vitória não tinha ficado abalada pela derrota na RDA. Recordo a mobilização que esse jogo representou, e o destaque que a comunicação social lhe deu, com as capas dos jornais desportivos a pedir a final. Sem pesquisar, recordo grande parte dos nomes da equipa adversária: assim de repente…Grapenthin, Bauer, Schnuphase, Vogel, Bielau e Raab.



Um golo solitário de Reinaldo não chegou para a remontada. Mas ainda andei aos saltos pela casa quando, a poucos minutos do fim, a voz de António Pedro (não sei se ainda será vivo) gritou um segundo golo do Benfica que não chegou a existir.



No fim, foi a frustração total. A oportunidade de ouro de ver o meu clube vencer uma competição europeia, tinha-se gorado.



A vitória no Campeonato (5-1 ao Vitória de Setúbal na penúltima jornada), e na Taça (3-1 ao FC Porto no Jamor, com três golos de Nené, e três assistências de Shéu), trariam os sorrisos de volta.



A equipa era a seguinte: Bento, Veloso, Humberto, Laranjeira, Pietra, Carlos Manuel, Alves, Sheu, Chalana, Nené e Reinaldo.







UNIVERSITATEA CRAIOVA, Taça UEFA 1982-83
Dois anos decorridos, e o Benfica estava de volta a umas meias-finais, desta vez na Taça Uefa, e desta vez com melhor sorte.



A época foi ainda mais fantástica que a de 1980-81. Foi a primeira de Eriksson em Portugal, e além de Campeonato, Taça, e final da UEFA, o futebol praticado foi absolutamente esmagador. Não sendo dos tempos de Eusébio, terá sido esta, porventura, a melhor equipa que me lembro do Benfica alguma vez apresentar.



O percurso até à meia-final foi imaculado, com vitórias em casa e fora em quase todos os jogos. Betis, Lokeren, Zurique, e, particularmente, Roma, foram as estações percorridas. O jogo de Roma (vitória no Olímpico por 1-2) constituiu provavelmente uma das melhores exibições de sempre do Benfica. Tem, da minha parte, uma história pitoresca para contar, e já aqui o recordei também.



Infelizmente não vi nenhuma partida ao vivo em toda a caminhada. Aquando da 1ª mão da meia-final, disputada na Luz, creio que cheguei a chorar por o meu pai não me ter levado. Ouvi o relato precisamente nas mesmas circunstâncias que o do jogo com o Carl Zeiss dois anos antes: em férias de Páscoa, fechado na cozinha dos meus avós.



O adversário era também de leste, era também teoricamente acessível, mas vinha da Roménia e chamava-se Universitatea Craiova. Recordo também alguns nomes, como o guarda-redes Lung, bem como Ungureanu, Ticleanu, e, sobretudo, o avançado Camataru, que viria a estar mais de uma vez na iminência de se transferir para o Benfica. O resultado foi um comprometedor 0-0.



A segunda-mão (soube-o mais tarde) terá sido uma das partidas disputadas em condições mais adversas de todo o historial europeu do Benfica. Ainda há pouco tempo, numa roda em que estive, Fernando Chalana recordava esse jogo, e lembrava tudo aquilo que os romenos fizeram para desconcentrar e amedrontar a equipa encarnada. Desde uma fanfarra à volta do hotel durante toda a noite, a perseguições ao autocarro, arremesso de objectos, tentativas de agressão, e um clima de terror dentro e fora do estádio. Só uma equipa com grande personalidade reagiria a tudo aquilo, e o Benfica de Eriksson era, na verdade, uma das melhores equipas europeias da altura.



Um frango de Manuel Bento ainda fez temer o pior. Mas Zoran Filipovic, numa época particularmente concretizadora (foi o melhor marcador dessa edição da Taça Uefa, anotando, por exemplo, os dois golos de Roma), marcaria, já na segunda parte, o golo que garantia o apuramento. Até ao fim foi preciso sofrer bastante, mas o pássaro já não fugiu. Uma tarde que jamais esquecerei.



15 anos depois, o Benfica voltava a uma final europeia. A primeira do pós-Eusébio. A primeira da minha vida.



Equipa: Bento, Pietra, Humberto, Bastos Lopes, Veloso, Carlos Manuel, Sheu, Stromberg, Chalana, Nené e Filipovic.







STEAUA DE BUCARESTE, Taça dos Campeões 1987-88
Não me irei alongar muito sobre um jogo ao qual dediquei precisamente o primeiro episódio desta rubrica – o que é, desde logo, significativo daquilo que ele representou para mim, e para toda a minha geração.



Foi a primeira meia-final que assisti ao vivo, depois de uma primeira-mão vista numa tarde de quarta-feira, em casa, junto de alguns colegas que convidei (em ano de caloiro, tinha a sorte de estudar na cidade onde vivia, e muitos colegas de turma, oriundos dos quatro cantos do país, e devotos das mais variadas cores clubistas, não dispunham de televisão nos seus quartos alugados).



0-0 em Bucareste, 2-0 em Lisboa, com dois golos de Rui Águas, e uma festa imensa vivida por 135 mil pessoas nas bancadas, nas escadas, nos corredores, a encherem como um ovo o antigo Estádio da Luz.



Este foi, durante anos, o jogo da minha vida. Está tudo dito.
Equipa: Silvino, Veloso, Mozer, Dito, Álvaro, Elzo, Sheu, Diamantino, Pacheco, Rui Águas e Magnusson.







MARSELHA, Taça dos Campeões 1989-90
A final de Estugarda parecera uma oportunidade única, desperdiçada ingloriamente. Após tantos anos de ausência, ninguém supunha que o Benfica voltasse tão cedo a repetir uma final da Taça dos Campeões Europeus. O que é certo é que, apenas dois anos volvidos, e lá estava o Glorioso em Viena, para discutir com o Milan o título europeu.



A equipa era substancialmente mais forte que a de Estugarda. Chegara Eriksson para o comando técnico, bem como jogadores de grande classe como os internacionais brasileiros Ricardo Gomes, Aldair e Valdo, e ainda Jonas Thern ou Vítor Paneira. O Milan também era muito mais forte que o PSV, e a coisa não correu bem. Mas não é da final que quero falar.



A exuberante época europeia do Benfica contrastou com a irregularidade num campeonato muito marcado pelas más arbitragens, numa altura em que o “sistema” estava já muito bem implementado. Em termos europeus, o Benfica chegou às meias-finais com um impressionante balanço de 6 jogos, 6 vitórias, e 19-1 (!!!) em golos. Os adversários não eram de topo, mas à excepção do modesto Derry City, também não se pode dizer que fossem brindes, pois num tempo em que a lei Bosman era ainda uma miragem, e os jogadores de leste raramente saiam para o Ocidente, os campeões da Hungria (Honved), e da União Soviética (Dniepre) seriam sempre opositores a respeitar.



Para as meias-finais calhou o Marselha (onde jogavam, entre outros, Mozer, Waddle, Deschamps e Papin), equipa que procurava por todos os meios (todos mesmo), chegar a um grande título internacional, objectivo que conseguiria concretizar três anos mais tarde.



A primeira-mão começou muito bem, com um golo do excêntrico Lima, de cabeça, na sequência de um canto. Contudo, o Marselha reagiu com todas as suas forças, virou rapidamente o resultado, e seguiu-se um autêntico massacre. A segunda-parte foi um vendaval de oportunidades para os franceses, a que Silvino foi correspondendo como pôde, realizando talvez uma das melhores exibições da sua carreira. Mas foi a sorte, a imensa sorte, que impediu o Benfica de sair do Velodróme com um resultado pesado e impossível de reverter.



Na Luz repetiu-se o clima de dois anos antes. Grande enchente, grande vibração. O estádio levara já as primeiras cadeiras, e a lotação diminuíra. Não estavam 135 mil como no jogo com o Steaua, mas talvez umas 100/105 mil, e, com bilhetes caríssimos (estávamos em 1990, e recordo-me de haver entradas a preço oficial de 15 contos, ou seja, 75 euros), esta partida bateu todos os recordes de receita no país.



O jogo foi fraquinho. O Marselha defendia a vantagem, e o Benfica não parecia capaz de impor o seu ritmo. A oito minutos do fim as coisas estavam muito complicadas, com o 0-0 a favorecer os franceses. Até que chegou um daqueles momentos que aparecerá sempre em qualquer livro de história benfiquista: a célebre mão de Vata.



Eu estava no estádio, situado na bancada lateral precisamente no enfiamento do lance. Pois confesso, e juro por tudo o que há de mais sagrado, que só em casa, muitas horas depois, viria a saber que o golo fora obtido com a mão. No momento em que vi a bola entrar na baliza, não pensei em mais nada. O estádio mergulhou numa loucura total, talvez apenas comparável aos momentos que se seguiram ao golo de Luisão a Ricardo, no campeonato do ano de Trappatoni.



Os instantes finais foram de algum sofrimento, com o livre perigoso assinalado a favor do Marselha. Mas o jogo terminou com a vitória do Benfica, e pessoas aos saltos por todo o lado, abraçadas umas às outras, como eu nunca tinha visto até então.



Se o clima inicial do jogo com o Steaua talvez tenha sido ainda mais entusiasmante, a verdade é que o golo obtido nos últimos minutos ofereceu a ponta final da partida com o Marselha uma dose de euforia suplementar, inigualável durante muitos anos. Foram seguramente os oito minutos mais vibrantes que me recordo de ter vivido no antigo estádio.



Equipa: Silvino, José Carlos, Ricardo, Aldaír, Veloso, Jonas Thern, Vítor Paneira, Valdo, Pacheco, Magnusson e Lima.









BARCELONA, Taça dos Campeões 1991-92
Muitos questionarão o facto deste jogo aqui figurar, pois o mesmo não foi exactamente uma meia-final.



Na verdade, tratou-se da última jornada da fase de grupos da primeira edição da Champions League, grupos esses (dois) que apuravam precisamente os finalistas, depois de algumas eliminatórias prévias. Foi nesta época que o Benfica conseguiu a épica vitória em Londres, diante do Arsenal (1-3), numa partida electrizante, com prolongamento, na qual Isaías terá feito a melhor exibição de toda a carreira, e na qual Rui Costa se estreou como titular na equipa principal. Esse triunfo, no mítico Highbury Park, valeria precisamente a passagem à fase de grupos, onde oito equipas discutiriam, em duas poules separadas, o acesso directo à final.



Do grupo do Benfica constavam ainda o Sparta de Praga, o Dínamo de Kiev, e o Barcelona de Cruyff, grande favorito (favoritismo que, de resto, confirmaria, ao apurar-se para a final, e ao vencê-la em Wembley diante da Sampdória, naquele que foi o primeiro título europeu do clube catalão). Foi também no primeiro jogo deste grupo, em Kiev, que Rui Águas se lesionou de forma arrepiante (fractura exposta). Derrota inglória nessa partida, empate a zero em casa diante do Barça, e dois empates na dupla jornada frente aos checos do Sparta, pareciam traçar o destino do Benfica na prova. Mas uma robusta vitória sobre o Dínamo de Kiev na Luz (5-0), e uma conjugação favorável de resultados de terceiros, trouxe de novo a esperança aos homens de Eriksson.




À entrada da última jornada, a classificação trazia o Barcelona em primeiro, com 7 pontos, o Benfica em segundo com 5, e por fim as duas equipas de leste, ambas com 4 pontos, e já fora das contas do apuramento. As vitórias ainda valiam apenas dois pontos, mas o empate entre Benfica e Barcelona na Luz (a que me lembro de assistir) fazia com que um triunfo encarnado em Camp Nou garantisse vantagem no confronto directo entre ambos, e apurasse o Benfica para Wembley. Ou seja, ganhando este jogo, o Benfica estaria na final. Mais meia-final que isto, não há.




É preciso dizer que, em 1988, o Benfica tinha chegado à final da Taça dos Campeões, em 1990 tinha repetido o feito, e agora, novamente com um ano de permeio, tinha oportunidade para voltar a marcar presença no jogo decisivo. Mas se nessas duas temporadas precisou de vitórias caseiras sobre Steaua de Bucareste e Marselha, agora precisava de vencer em…Barcelona.




Aconteceu aquilo que se esperava. Em apenas 20 minutos, Stoichkov fez gato-sapato do lateral-direito José Carlos, e o Barça chegou a 2-0. Um golo de César Brito, já na segunda parte, nem daria para alimentar a esperança. De notar que Paulo Sousa realizou então uma das suas melhores exibições com a camisola do Benfica, saltando nessa noite para a ribalta do futebol internacional, onde faria uma carreira de grande sucesso.




O Benfica acabou o grupo em terceiro lugar (o Sparta ganhou o último jogo), mas esta partida de Camp Nou foi uma verdadeira, ainda que pouco esperançosa, meia-final.




Equipa: Neno, José Carlos, Rui Bento, Paulo Madeira, Veloso, Paulo Sousa, Jonas Thern, Vítor Paneira, Rui Costa, Isaías e Yuran.





PARMA, Taça das Taças 1993-94
Era altura em que, de dois em dois anos, o Benfica lá estava a brilhar na Europa. Final em 1988, final em 1990, meia-final em 1992, e nova meia-final em 1994. Longe estávamos então de imaginar, que só 17 anos, e Vale e Azevedo depois, os encarnados voltariam ao galarim internacional.




Voltemos ao passado. Designadamente ao ano dos 3-6 em Alvalade, e dos não menos inesquecíveis 4-4 de Leverkusen. Foi justamente essa noite épica a qualificar o Benfica para as meias-finais da Taça das Taças.




Vale a pena lembrar um pouco desse jogo. A primeira-mão trouxera um cinzento 1-1 na Luz, com um golo de Isaías no último minuto a evitar a derrota. Ao quarto-de-hora da segunda-parte do jogo de Leverkusen, os alemães venciam por 2-0, e tudo parecia definido. A meia-hora que se seguiu entrou para a eternidade como um dos mais empolgantes jogos de toda a história do Benfica. Num ápice, golos de Abel Xavier, João Pinto e Kulkov viram o resultado, dando vantagem, aparentemente confortável, aos comandados de Toni. Já nos últimos dez minutos, dois golos de rajada voltam a colocar os alemães na frente, parecendo sentenciar uma derrota inglória. Novo golo de Kulkov, a quatro minutos do fim, estabelece o 4-4. Uhff, até cansa só de lembrar. Que alegria! Que festa!




E aí estava o Benfica na meia-final, onde tinha por opositor o então fortíssimo Parma de Itália, país que na altura dominava o panorama futebolístico internacional.




A equipa italiana tinha vários internacionais, entre os quais as estrelas Zola (depois jogaria no Chelsea), Thomas Brolin (sueco), Sensini (argentino) e Faustino Asprilla (colombiano, e um dos melhores jogadores do mundo nessa temporada). O guarda-redes era Bucci, que estaria em foco na eliminatória.




A primeira-mão foi na Luz, e fez recordar as grandes enchentes das épocas anteriores. Mais de 100 mil devotos (eu, naturalmente, também não faltei) criaram um clima inesquecível de apoio ao Benfica. E os encarnados corresponderam com uma grande exibição.




Não havia ainda muito tempo de jogo, e já Rui Costa isolava Isaías para o primeiro golo da noite. Pouco depois, Zola empatou para o Parma, colocando um cubo de gelo nas emoções portuguesas. Já no início da segunda parte, foi o jovem maestro a recolocar o Benfica na frente do marcador, para alguns minutos mais tarde Vítor Paneira desperdiçar uma grande penalidade (defesa de Bucci), que elevaria a contagem para 3-1. Pelo meio, muitas oportunidades perdidas, e uma grande exibição de Yuran. No fim, um magro 2-1 a saber a pouco para tanto futebol.




A segunda-mão, no Ennio Tardini, foi marcada pela expulsão precoce de Mozer, que viu dois cartões amarelos ainda na primeira meia-hora de jogo. O Benfica foi resistindo, e mesmo com dez, a um quarto de hora do fim mantinha a sua magra vantagem construída em Lisboa. Um golo de Sensini seria fatal, e os encarnados, muito desgastados por uma longa época, não mais conseguiram ameaçar as redes contrárias.




O destino ditou uma eliminação inglória, perante um adversário que, pelo que se havia visto, sobretudo na Luz, estava ao alcance do Benfica.




Equipa: Neno, Veloso, Mozer, Hélder, Schwarz, Kulkov, Vítor Paneira, Rui Costa, João Pinto, Yuran e Isaías.




Seguiu-se um período de trevas. Nas três temporadas seguintes o Benfica ainda chegaria aos quartos-de-final por duas vezes. Mas o valeeazevedismo deitou tudo a perder, e quase matou o próprio clube.




Com um futebol muito diferente, com competições totalmente reformuladas, o Benfica volta agora, passados todos estes anos, a uma meia-final. Que seja para ganhar.

JOGOS PARA A ETERNIDADE (17) - Os Mundiais e as Finais 1978-2006






Quando estamos à beira de mais uma final do Campeonato do Mundo, é altura de recordar outras finais, e outros Mundiais, em mais uma viagem pelos alçapões da memória.

Esta competição representa, e sempre representou, o topo da hierarquia do futebol, e a sua história confunde-se com a história da própria modalidade. As grandes estrelas foram, com poucas excepções, as estrelas dos Mundiais, e durante muito tempo todas as inovações tácticas e estilísticas ocorriam justamente nesta prova, acima da qual não existia, nem existe, de facto, mais nada.

Também para mim, acima dos Mundiais só…o Benfica. Desde criança que me apaixonei pela grande gala do futebol internacional, até porque ainda me lembro de ser esta a única ocasião em que a televisão transmitia jogos em dose suficente para satisfazer a minha gula.

O primeiro Mundial de que me recordo, e de forma razoavelmente nítida, foi o da Argentina em 1978.


ARGENTINA 78

Lembro-me, um por um, dos vários jogos transmitidos pela RTP, numa altura em que apenas a final da Taça dos Campeões e a final da Taça de Inglaterra (sim, estou a dizer bem), chegavam aos nossos ecrãs.

Não me perguntem por tácticas nem modelos de jogo. Com 8 anos, o que me impressionou foram os papelinhos que cobriam as bancadas do Estádio do River Plate, e provocavam um efeito visual espectacular, e infelizmente, não mais repetido em Mundiais.

Argentina e Holanda foram os finalistas. A selecção europeia chegava à sua segunda final consecutiva, mas, francamente, não alcanço nem uma simples frame do Mundial anterior.

Vi o jogo a preto e branco, como era próprio da altura. Mas, curiosamente, uns meses mais tarde, numa montra de electrodomésticos na Rua Morais Soares, assisti pela primeira vez na vida a uma exibição de TV a cores, (re)vendo justamente esta final. Foi um problema para me arrancarem de lá…

O jogo começou atrasado porque o árbitro não gostou de uma ligadura num braço de um dos irmãos Van der Kerkhof, que na altura eram titulares da selecção holandesa.

Na primeira parte , golo de Kempes. Na segunda, já perto do fim, empate por Nanninga de cabeça. À época, não dei muita importância ao caso, mas a verdade é que, com 1-1 no marcador, Rensenbrink atirou uma bola ao poste que daria o título mundial aos holandeses. O extremo do Anderlecht era, aliás, a grande estrela a sua selecção, na ausência de Cruyff, cujo motivo na altura não entendi, uns anos depois lá me explicaram, para recentemente deixar novamente de perceber. Quanto não vale ser criança?

O melhor jogador do mundo era, para mim, Mário Kempes. Foi ele que marcou os dois primeiros golos do jogo de todas as decisões, um dos quais já no prolongamento. Além disso tinha estampa de craque, com um cabelo esvoaçante, meias em baixo, e cara de matador.De Maradona só ouvi falar um ano depois, através das páginas do “Onze”.

“Onze”, ainda bem que falo nele. Em 1978 era uma palavra mágica para mim, de tanto maçar os meus pais para o comprarem. O primeiro número que tive, e ainda guardo, era justamente o da apresentação das equipas para este Mundial, integralmente traduzido em português (creio que só a partir daí foi vendido entre nós). O segundo, que também ainda tenho, e já sem tradução, foi um fantástico álbum fotográfico da competição, que vi e revi centenas…milhares…milhões, de vezes, e conheço praticamente de cor. A dita revista, ensinou-me mais francês - especialmente palavras como “but” ou “pelouse” - que todos os professores da língua que tive na escola.

Com o triunfo argentino terá nascido, por esses dias, o meu fascínio pelo país do tango, que infelizmente ainda não tive oportunidade de conhecer. Maradona faria o resto.

Aqui vai a equipa argentina, que consigo escrever sem qualquer consulta ou hesitação: Fillo, Olguin, Galvan, Passarella, Tarantini, Ardiles, Gallego, Kempes, Bertoni, Luque e Ortiz. Quanto à Holanda, lembro-me de Krol, Rep, os irmãos Vander Kerkhof, Nanninga (que marcou o golo) e Rensenbrink. Ah, e também o Janssen e um guarda-redes sui-generis, que sofria golos sem se mexer, chamado Jongbloed.


ESPANHA 82

Se do Argentina 78 nem todos se recordam, creio que o Mundial Espanha 82, pelo contrário, marcou fortemente a minha geração, e terá sido um dos melhores, senão o melhor, de sempre.

aqui evoquei o Brasil-Itália (2-3) que eliminou a selecção que praticava o mais bonito futebol que alguma vez vi na vida.

Mas este Mundial teve mais do que um dos melhores Brasis de todos os tempos. Foi também uma impressionante parada de estrelas que coincidiram no tempo, como, além de Zico, Sócrates e Falcão, também Maradona, Rummenigge, Platini, Paolo Rossi, Dino Zoff, Kempes, Boniek, Lato, Breitner, Keegan, Dassaev, Roger Milla, isto para referir aqueles que me vêm à cabeça no imediato. Os grandes jogos sucederam-se, e alguns deles figuram ainda hoje na galeria dos grandes clássicos de todos os tempos.

A final foi marcada pela ausência do…Brasil, com quem toda a gente contava. Ainda assim, o Itália-Alemanha foi uma grande final, à altura do resto da competição, com os italianos, orientados por Enzo Bearzot, a darem sequência a uma série de excelentes exibições (Argentina, Brasil, Polónia e Alemanha), quase sempre coloridas com golos de Paolo Rossi, depois de uma fase de grupos apagada, com três empates e apuramento por número de golos marcados.

Já havia televisão a cores no país, mas em minha casa só mais tarde, por alturas do Europeu de França, em 1984, teria direito a tal luxo. Vi todo o Mundial a preto e branco, e vibrei mais com ele do que com qualquer outro, o que para mim é prova suficiente de que a tecnologia não traz felicidade.

Também me lembro bem do onze da Itália, sem necessitar de qualquer consulta,: Zoff, Gentile, Scirea, Collovatti, Cabrini, Oriali, Tardelli, Antognioni, Conti, Grazziani e Rossi.

Que saudades…


MÉXICO 86

Para os portugueses México 86 lê-se “Saltillo”. Deixarei essas recordações para outra oportunidade, e direi que este foi, para mim e para muita gente, o último dos mundiais da era, eu diria, neo-romântica.

Possivelmente graças a Maradona, talvez também à qualidade de muitos dos jogos – não repetida nos eventos seguintes -, mas em larga medida porque nos anos noventa as transmissões televisivas de futebol tomariam de assalto o nosso quotidiano, retirando ao Campeonato do Mundo a exclusividade que então tinha nessa matéria.

Para mim, pessoalmente, existiu também o factor idade. Com 16 aninhos, este foi o último Mundial da minha inocência, e em breve as prioridades seriam outras, depois de uma infância e pré-adolescência totalmente dedicadas ao futebol, e de vários anos ao longo dos quais quase não me lembro de brincar com nada que não fosse, de algum modo, relacionado com bola, jogo, cromos, campeonatos de caricas (lá está, sem a tecnologia dos vídeo-jogos, mas com igual entusiasmo) ou revistas com jogadores.

Depois de vários one-man-shows protagonizados por Diego Maradona (o ás dos ases da minha memória futebolística), chegou o dia da grande final: Argentina e a crónica Alemanha, num domingo ao final da tarde (em Portugal).

Maradona não marcou nesta partida, o que causou um ligeiro desencontro com a história. Mas a Argentina ganhou 3-2, num jogo empolgante, em que depois do 2-0 os alemães, em dois pontapés de canto, chegaram ao empate, para depois, a passe do mestre, Burruchaga evitar o prolongamento e dar o segundo título ao país das pampas.

À medida que a idade avança, um estranho mecanismo deixa a memória um tanto mais turva. Já não consigo dizer toda a equipa campeã sem me engasgar. Talvez isso também suceda pelo facto de toda ela se poder enunciar apenas num nome: Diego Maradona. E fiquemo-nos por aqui.


ITÁLIA 90

Foi provavelmente o pior Mundial de todos os tempos, e foi também aquele que vivi com menor entusiasmo, fruto das circunstâncias da idade: 20 aninhos, já mais ou menos bem vividos.

Assisti ainda assim a bastantes jogos, entre eles, claro, a final.

O jogo foi pobre, defensivo e violento, como a maioria dos que o antecederam. Deste Mundial salvou-se um ou outro pormenor de Maradona (já longe do fulgor mexicano), a brilhante e empolgante selecção dos Camarões (com Milla a fazer das suas), a eficácia alemã (data desta altura a célebre frase de Lineker, dos onze contra onze), e pouco, ou nada, mais.

Muitos empates, muitos zero a zeros, cenas feias (como a cuspidela de Rijkaard a Voller), vários jogos decididos por penáltis, estrelas sem brilho – e não posso deixar de referir Van Basten, o melhor ponta-de-lança que me lembro de ver jogar, e que partia para a competição no auge da sua carreira, deixando a Itália sem honra nem glória.

No fim, como dizia Lineker, ganharam os alemães. E, embora tenham sido a melhor equipa ao longo da prova (ou pelo menos a menos má), a forma como venceram foi equívoca: um penálti muito duvidoso nos momentos finais da partida, convertido por Brehme.

Da selecção campeã recordo apenas as principais estrelas: Matthaus (ainda assim o homem da prova), Klinsmann e o referido Brehme, todos eles jogadores do Inter de Milão.


ESTADOS UNIDOS 94

Realizar um Mundial num país pouco dado a futebóis foi um risco que a FIFA decidiu assumir. E saiu-se bem, pelo menos em termos organizativos e financeiros.

Dentro das quatro linhas as coisas correram melhor que quatro anos antes. Foi pena que a final não correspondesse às expectativas, acabando decidida por penáltis, depois de um bocejante 0-0.

Este foi o último Mundial de Maradona, que, mesmo marcando um golo, acabou por sair pela porta pequena, confrontado com uma análise de doping positiva.

Da final, que era também o tira-teimas entre Romário e Roberto Baggio para se perceber quem era o melhor, recordo que foi justamente a estrela italiana a falhar o penálti decisivo, depois de Baresi (outro dos esteios da equipa) ter também falhado na sua vez.

Ayrton Senna tinha morrido havia pouco tempo, e o Escrete dedicou-lhe o triunfo. 24 anos depois, o Brasil voltava a ser campeão. Era agora tetra-campeão.

Vamos ver se me lembro da equipa toda. Ora aqui vai: Taffarel, Jorginho, Aldair, Márcio Santos, Leonardo, Dunga, Mazinho, Raí, Zinho, Bebeto e Romário.


FRANÇA 98

Estava destinado a ser o Mundial de Ronaldo (não este, mas o outro). Foi o Mundial de Zidane, e duma pátria que, jogando em casa, aproveitou para enaltecer as virtudes da imigração.

Da selecção francesa faziam parte vários “aculturados”, e foi o argelino quem mais brilhou, inclusivamente na final, marcando os dois primeiros golos.

Muito se falou duma misteriosa doença que terá afectado o “fenómeno” brasileiro na manhã antes da final. Nunca percebi o que se passou, embora tenha as minhas deconfianças.

O certo é que a constituição das equipas chegou a ser dada sem o número 9, embora ele acabasse por alinhar de início. Debalde, o dia era da França, que, com uma excelente exibição, conseguiu ser campeã pela primeira vez.

Para a história ficaram as excelentes prestações da Croácia e da Holanda, eliminadas nas meias-finais. A qualidade geral da prova foi aceitável, e nem a ausência de Portugal me retirou o entusiasmo que, com 28 anos, e uma série de assuntos resolvidos, começava a voltar paulatinamente aos níveis da infância.


JAPÃO/COREIA 2002

Se exceptuarmos o Itália 90, este será provavelmente o pior dos Mundiais que recordo.

Além da triste prestação portuguesa – com uma selecção cheia de equívocos, com um seleccionador incompetente, muito amadorismo e indisciplina -, a prova ficou marcada pelos gravíssimos erros de arbitragem, sobretudo nos jogos da selecção da Coreia do Sul, levando a equipa da casa ao colo até às meias-finais.

Foi o primeiro Mundial transmitido pela Sport Tv, o que significa que muitos jogos não tiveram cobertura em sinal aberto. Embora já tivesse Sport Tv em casa, por motivos de vida pessoal e profissional tinha de me deslocar bastante na altura, o que me impediu de ver alguns dos jogos.

A final quase salvou o campeonato, pois foi um bom jogo, e teve um vencedor justo: o Brasil de Scolari, e de…Ronaldo (que reapareceu em grande, depois de uma longa lesão, como que resgatando a aura perdida quatro anos antes).


ALEMANHA 2006

Todos se lembram bem dele. Portugal, ainda na ressaca do Euro 2004, e com Scolari ao leme, chegou às meias-finais pela segunda vez na sua história, feito que nem toda a gente soube reconhecer devidamente.

Obviamente que a forma como vivi o Mundial foi totalmente marcada pela prestação portuguesa, e nunca esquecerei o sofrimento de jogos como os dos oitavos-de-final (com a Holanda), e quartos-de-final (com a Inglaterra).

A final foi ganha pela Itália, mas não correu da forma que eu pretendia. Zidane havia sido o melhor jogador da prova, e aquela era a ocasião para o coroar como rei, como melhor jogador da era pós Maradona. A coisa até começou bem, com um penálti à Panenka, mas depois o homem estragou tudo. Cabeçada em Materazzi, expulsão e, talvez por tudo isso, derrota nos penáltis com uma Itália um pouco mais ofensiva do que habitualmente.

Apesar dos jogos não terem sido maus, não houve nenhuma equipa que deslumbrasse.

Na África do Sul, não tem sido bem assim…

JOGOS PARA A ETERNIDADE (16) - OS MEUS TÍTULOS

Quando o Benfica está à beirinha de conquistar o seu 32º título, é altura para recordar outros campeonatos ganhos, e a forma como eles foram eles vividos por este vosso amigo, em mais uma viagem pelo passado.
Recordo-me de um total de nove títulos (este poderá ser o décimo). Desde 1977, tempos de Chalana, Nené e Mortimore, até 2005, já com Simão, Luisão e Nuno Gomes. Vamos então relembrá-los um a um:

1976-77
Depois de uma época marcada pela impressionante recuperação classificativa face ao Sporting (que na primeira volta chegou a dispor de seis pontos de avanço, que hoje equivaleriam a nove), o Benfica sagrou-se campeão a três jornadas do fim, em jogo com o Beira-Mar no Estádio da Luz.
A festa estava prevista apenas para a semana seguinte, mas as derrotas de Sporting e FC Porto anteciparam a decisão. 4-0 foi o resultado, a que se seguiu uma volta triunfal ao campo, carregando aos ombros o treinador inglês John Mortimore.
Recordo-me de vários momentos dessa temporada (as partidas com o Sporting e com o FC Porto, por exemplo), mas a memória que tenho do jogo do título, e desse dia, é algo difusa. Recordo-me de ouvir partes do relato (provavelmente o meu pai ouvia-o enquanto eu brincava), tomei conhecimento que o Benfica era campeão, mas nem me lembro de ter ficado particularmente eufórico com o acontecimento.
Na altura este era o 14º título em 18 anos, pelo que as comemorações seriam naturalmente comedidas.
A equipa-base dos encarnados era composta por: Bento, Pietra, Alhinho, Eurico, Alberto, Toni, Shéu, Vítor Martins, Nelinho, Nené e Chalana (que na sua primeira temporada como sénior foi a grande estrela da equipa).

1980-81
Este sim, foi o primeiro título que vivi com verdadeiro entusiasmo de campeão. Pôs fim a três temporadas de jejum (uma eternidade para a altura), e foi obtido numa época quase perfeita dos encarnados, a qual incluiu também a Taça de Portugal, a Supertaça e umas meias-finais europeias. Foi também nesta temporada que assisti ao meu primeiro jogo no Estádio da Luz, precisamente um Benfica-Altay Izmir para a 1ª eliminatória da Taça das Taças.
O treinador era o húngaro Lajos Baroti, e a conquista foi selada na penúltima jornada, com uma goleada ao Vitória de Setúbal (5-1), testemunhada por um Estádio da Luz a rebentar pelas costuras, e já preparado para as festividades. Julgo ter sido o último jogo da carreira de Toni, que já não era titular, mas entrou para os minutos finais.
Não estive lá (só bastante mais tarde me tornei presença habitual), pelo que foi mais um título que me chegou pela rádio. A partida ficou marcada por uma muito criticada, e totalmente desproporcionada, carga policial aos adeptos que apenas pretendiam invadir o campo para festejar a vitória. Meteu Assembleia da República, críticas ao governo e tudo.
A equipa-base era a seguinte: Bento, Veloso, Humberto Coelho, Laranjeira, Pietra, Carlos Manuel, João Alves, Shéu, Chalana, Nené e César.

1982-83
Um maior distanciamento temporal vai permitir um dia perceber onde enquadrar a actual equipa de Jorge Jesus, entre as que melhor futebol praticaram no Benfica do pós-Eusébio. Deixando esse exercício para depois, entregaria o prémio, por agora, ao conjunto de 82-83, orientado por Eriksson (na sua primeira época), e que encantou o país e a Europa.
Foi uma temporada inesquecível, com vitórias no Campeonato, na Taça de Portugal, na Supertaça e uma caminhada épica até à final da Taça Uefa, perdida na Luz diante do Anderlecht. Mais do que os resultados, o futebol de ataque praticado em todos os campos (fosse em casa, fosse fora) ficou na retina de muita gente, catapultando o treinador sueco para uma carreira internacional de grande sucesso .
O título foi carimbado em Portimão (vitória por 0-1), com duas jornadas ainda por disputar, e, se não estou em erro, quatro dias depois da final da Uefa. A festa foi feita na semana seguinte, em casa diante do Sporting. Esperava-se uma goleada (na Taça tinham sido 3-0), mas a vitória ficou-se por um golo solitário de Chalana, numa partida em que Bento defendeu um penálti e…falhou outro (suponho que por ordem inversa, mas isso pouco interessa para o caso).
Equipa-base: Bento, Pietra, Humberto Coelho, Bastos Lopes, Álvaro, Carlos Manuel, João Alves, Shéu, Chalana, Nené e Filipovic

1983-84
No ano seguinte, ainda com Eriksson, a superioridade benfiquista voltou a ser inquestionável. Numa temporada em que apenas cedeu oito pontos, o Benfica sagrou-se campeão na penúltima jornada, em casa, e uma vez mais diante do eterno rival.
Nem foi preciso vencer, pois, à mesma hora, o FC Porto perdia no Bessa, e como tal, bastou um empate a um golo com o Sporting, a que se seguiu a tradicional invasão do relvado.
A grande aposta dos encarnados, depois de alcançada a final da Uefa no ano anterior, era a Taça dos Campeões Europeus. O sonho acabou por morrer aos pés do…Liverpool, com uma derrota por…4-1 (daquela vez em plena Luz, depois do 1-0 de Anfield), o que, numa altura em que ser campeão era corriqueiro, acabou por deixar um travo ligeiramente amargo, que nem o título nacional apagou inteiramente.
Tal como era habitual, todas as grandes emoções do campeonato foram vividas pela rádio. Assisti contudo, no Estádio do Bonfim, à primeira jornada desta temporada, e ao último golo da carreira de Humberto Coelho – que se lesionaria com gravidade poucas semanas depois num treino da selecção, não mais voltando aos relvados -, numa partida que o Benfica venceu por 2-3, com as bancadas a abarrotar de gente, um sol abrasador e um calor quase insuportável, sobretudo para quem estava espalmado contra a vedação (como era o meu caso). Estávamos, afinal de contas, em pleno Agosto.
Equipa-base: Bento, Pietra, Bastos Lopes, Álvaro, Sheu, José Luís, Carlos Manuel, Stromberg, Chalana, Diamantino e Manniche.
Chalana e Stromberg seriam vendidos para França e Itália respectivamente, Eriksson também abraçaria o Cálcio, e esse desinvestimento (necessário para Fernando Martins completar o terceiro anel do estádio) revelar-se-ia fatal nos anos seguintes.

1986-87
Depois de um bi-campeonato portista, com Artur Jorge, o Benfica voltou aos triunfos, aproveitando muito bem o enfoque dado pelos nortenhos à Taça dos Campeões Europeus, que venceriam em Viena com o calcanhar de Madjer.
O Benfica vinha de uma temporada aziaga, em que perdera tudo em poucas semanas, depois de uma caminhada empolgante. A inesperada eliminação europeia aos pés do acessível Dukla de Praga (com um golo fatal, sofrido em casa, nos últimos minutos da segunda mão), e, principalmente, o título perdido na penúltima jornada, em plena Luz, diante do Sporting (1-2, o primeiro derby a que assisti ao vivo), abriram feridas na confiança dos adeptos face à sua equipa. Mais feridas ainda deixou a histórica goleada sofrida em Alvalade - os célebres 7-1 - e a relação com o regressado John Mortimore ressentiu-se de tudo isso, não mais voltando a ser a mesma.
Em 1986-87 a equipa foi muitas vezes assobiada, e desconsiderada, mesmo comandando a classificação durante quase todo o campeonato. Temia-se que acontecesse o mesmo que no ano anterior, até porque a penúltima jornada reservava novamente um Benfica-Sporting.
Só que a história não se repetiu. Desta vez, praticamente na mesma situação, e também com 120 mil nas bancadas, o Benfica ganhou por 2-1 (golos de Chiquinho e Nunes), conquistando o título nacional, ao qual iria juntar, alguns dias mais tarde, a Taça de Portugal. Foi a última dobradinha do clube da Luz até à data.
Este foi o primeiro dos dois títulos que festejei em pleno estádio (o outro seria o último, o de 2005). Fui ver esse derby, presenciei a invasão de campo, e toda a euforia que tomou conta da família benfiquista. Recordo-me, como se fosse hoje, de ir festejar com as pessoas com quem vi o jogo, a um restaurante de Setúbal chamado “O Quintal” (não faço ideia se ainda existe). Comi cherne grelhado, regado com vinho rosé. Tinha eu os meus fabulosos 17 aninhos.
Para a história desta temporada fica também o registo daquele que terá sido o jogo com maior assistência de sempre disputado no nosso país, e a que eu também tive o privilégio de assistir. Foi o Benfica-FC Porto (3-1, hat-trick de Rui Águas), e "A Bola" do dia seguinte falava em 140.000 pessoas na Luz. Não as contei, mas sei de muita gente que ficou à porta com o bilhete na mão, sem conseguir passar a densa barreira humana que entopia todas os buracos por onde entrar no estádio.
Equipa-base: Silvino, Veloso, Dito, Oliveira, Álvaro, Sheu, Nunes, Chiquinho, Diamantino, Rui Águas e Manniche

1988-89
Terá sido dos títulos menos sofridos que a história recente do Benfica nos apresenta. Talvez por isso, talvez fruto do desencanto de uma eliminação europeia precoce (com o improvável Liegeois), talvez também por ter, à época, 19 anos, e nessa idade as prioridades estarem muito para lá do futebol (raparigas, noitadas, festas, raparigas, faculdade, raparigas, etc, etc), terá sido também dos que menos me entusiasmou.
Foi o ano das vitórias por 1-0 conseguidas no último minuto, com golos de Vata (o surpreendente Bola de Prata nessa época), em que a contratação falhada de Quinito como técnico do FC Porto (substituído depois de uma copiosa derrota em Eindhoven) cedo deixou o caminho livre aos encarnados. Ainda assim, diga-se que com o regresso de Chalana (já longe do fulgor dos primeiros anos), e com as contratações de Valdo, Ricardo e Magnusson, o Benfica tinha uma extraordinária equipa, cuja base esteve na origem de duas finais da Taça dos Campeões Europeus nos anos imediatamente anterior e posterior a este. É verdade que haviam saído Dito e Rui Águas (como resposta do FC Porto à contratação de Ademir, no qual os azuis-e-brancos estariam interessados), mas as ausências pouco se fizeram sentir.
Ainda assisti ao vivo a três jogos desse campeonato, mas não foi uma temporada que me tivesse proporcionado recordações particularmente intensas.
Curiosamente, estive em vias de presenciar ao momento da consagração. Foi em Setúbal, a três jornadas do fim, quando uma vitória poderia ser suficiente para fazer a festa. Um golo de Aparício, já nos momentos finais (estabelecendo o 2-2), retardou o título, e obrigou a multidão que enchia por completo o estádio do Bonfim a guardar as bandeiras e cachecóis para a semana seguinte.
Foi em casa com o Estrela da Amadora, que uma vitória por 3-0 selou as contas. Não faço a menor ideia onde estaria a essa hora, e nesse dia. Mas estava certamente feliz.
Equipa-base: Silvino, Veloso, Mozer, Ricardo, Álvaro, Sheu, Vítor Paneira, Valdo, Chalana, Diamantino e Magnusson.

1990-91
Eriksson havia regressado, e na primeira temporada tinha levado a equipa à sétima final da Taça dos Campeões da sua história. Em parte por isso, em parte por influência de um sistema tentacular que já à época invadia a arbitragem, o campeonato de 89-90 fugiu para o FC Porto, que, com Bandeirinhas, Kikis, Demols, Tozés e Vlks, conseguiu bater o Benfica de Valdo, Thern, Magnusson e Ricardo. Foi esse, aliás, o primeiro dos campeonatos ganhos pelo FC Porto de forma imoral, e fruto da sua crescente influência na arbitragem.
Em 1990-91 os encarnados viram-se precocemente afastados da frente europeia, ao perder com a Roma logo na primeira eliminatória da Taça Uefa. E, dedicando-se em exclusivo ao campeonato, partiram para uma caminhada imparável rumo ao título, que teve o seu apogeu nos célebres 0-2 das Antas, com dois golos de César Brito.
Lembro-me de ouvir o relato desse jogo (que a poucas jornadas do fim decidiu quase tudo), como me lembro, também via rádio, da partida que garantiu o título, no Funchal diante do Marítimo (vitória por 0-2, também).
Na última jornada, com o estádio cheio, o convidado para a festa do título foi o Beira Mar, que levou 3-0, dois dos golos apontados por Rui Águas (de regresso ao seu clube depois de uma incompreensível experiência nas Antas, que nunca lhe perdoarei), que assim conseguia destronar Domingos Paciência na luta pela Bola de Prata - um grupo de sócios portistas, alegando (sabe Deus porquê) que Domingos tinha mais um golo, decidiu então mandar fazer um troféu paralelo para entregar ao avançado do FC Porto, numa daquelas atitudes saloias que mostra bem o espírito, passado e presente, daquele clube.
Recordo-me que a RTP transmitiu em directo os últimos dez minutos da jornada final, e a festa que se lhe seguiu.
Este foi o último campeonato de um período em que o Benfica, ganhando ano sim, ano não, ainda mantinha, ou pelo menos repartia, a hegemonia do futebol português. Daí em diante só conquistaria mais dois títulos, ambos em circunstâncias muito especiais.
Equipa-base: Neno, José Carlos, Ricardo, William, Veloso, Jonas Thern, Vítor Paneira, Valdo, Pacheco, Isaías e Rui Águas.

1993-94
Depois de um verão muito quente, com Sousa Cintra a aproveitar-se alarvemente da crise financeira do rival, e a aliciar muitos dos seus principais jogadores (que tinham os salários em atraso, e, como tal, podiam rescindir facilmente os contratos), o Benfica partiu para a temporada futebolisticamente fragilizado, mas com o seu orgulho ferido. Isso revelar-se-ia determinante, até porque na luta pelo ceptro teve no Sporting o mais directo opositor.
Paulo Sousa e Pacheco mudaram-se para Alvalade, João Pinto foi resgatado in-extremis numa viagem do presidente Jorge de Brito a Torremolinos, e Rui Costa, Isaías e Neno foram também abordados, mantendo-se todavia na Luz. Futre tinha sido vendido para Marselha, mas ainda assim, os que ficaram, formavam uma grande equipa. Restava saber se haveria condições de retaguarda (desde logo financeiras) para levar a nau a bom porto. E nesse particular o trabalho desenvolvido por Toni foi fundamental, segurando pelas pontas um grupo muito talentoso mas desorganizado e indisciplinado, que tinha nos russos Kulkov, Yuran e Mostovoi as principais dores de cabeça.
A época haveria de reservar grandes momentos, grandes vitórias, estádios cheios, muitos novos associados, o que parecia permitir ao clube retomar o rumo correcto. Infelizmente foi sol de pouca dura, e os anos seguintes iriam evidenciar que as coisas estavam mesmo mal. Só onze anos depois o Benfica voltaria a ser campeão nacional, depois de aventuras que quase levaram à sua destruição.
O grande momento deste campeonato foi naturalmente a vitória por 3-6 em Alvalade, jogo em que João Pinto, um dos protagonistas do defeso anterior, terá feito a exibição da sua vida. Mas o título só ficou seguro duas rondas depois, em Braga, numa partida com o Gil Vicente (numa altura em que ninguém se lembrava de reclamar por os clubes pequenos mudarem os jogos grandes para estádios onde pudessem obter maiores receitas), em que foi uma vez mais João Pinto a brilhar, marcando os dois primeiros golos de uma vitória por 0-3.
Na altura eu fazia parte de uma equipa (se é que se pode chamar-lhe assim) de futebol de cinco que, ainda disputou alguns torneios na região. O jogo de Braga foi durante a semana, num fim de tarde de, salvo erro, quarta-feira, e ouvi o relato durante um treino, som vindo do auto-rádio de um dos colegas que estacionara junto ao ringue. Quando o jogo acabou estava, recordo-me bem, a tomar banho, e seguiu-se naturalmente uma jantarada. Mas a maior dose de euforia tinha sido servida com o triunfo em Alvalade.
Na semana seguinte o Estádio da Luz encheu para receber os campeões. Era a penúltima jornada, e o adversário o Vitória de Guimarães. Não arranjei bilhete, e faltei à cerimónia. Nem a minha ausência, nem o empate a zero retiraram brilho às festividades.
Equipa-base: Neno, Veloso, Mozer, Hélder, Schwarz, Kulkov, Vítor Paneira, Rui Costa, Yuran, João Pinto e Isaías.

2004-05
Obtido em circunstâncias particularmente difíceis, na sequência de um longo jejum, com um plantel muito limitado e uma concorrência extremamente forte (FC Porto campeão europeu, Sporting finalista da Uefa, Boavista ainda nos seus bons tempos, Sp.Braga a nascer para aquilo que é hoje), depois de um campeonato verdadeiramente espectacular (o melhor de que me lembro), este foi para mim o título mais reconfortante de todos os que vivi.
Cedo comecei a acreditar na equipa, e momentos houve em que me pareceu ser o único a fazê-lo. Levei a peito aquela equipa, aqueles jogadores, e aquela temporada. No fim, como nos filmes, tudo acabou em bem.
Foi, até hoje ,a temporada futebolística em que vi mais jogos ao vivo. Em casa não perdi nenhum, e fora fui a todo o lado onde pude ir. Muito sofri eu…
A decisão final foi apenas na última jornada, no Bessa, em tarde para recordar durante uma vida. A procissão de carros pela A1 acima, o leitão da Mealhada, em restaurante à pinha onde os cânticos slb,slb emergiam à medida que o vinho escorria pelas gargantas, o dramatismo de um jogo que, pela primeira e única vez na vida, quase me obrigou a sair da bancada, tal o estado de nervos que me tolhia o corpo e a alma. No fim foi o que se viu. Talvez tenha sido dos poucos benfiquistas a estar, nessa noite, no Bessa, no Aeroporto, e no Estádio da Luz, com um belo jantar pelo meio, e festa até de manhã. Só me deitei depois de ler “A Bola” de segunda-feira.
Este campeonato ficou porém desde logo alinhavado na semana anterior, no também inesquecível derby do golo de Luisão. Já aqui recordei esses dois momentos.
Equipa-base: Quim, Miguel, Luisão, Ricardo Rocha, Dos Santos, Petit, Manuel Fernandes, Nuno Assis, Geovanni, Nuno Gomes e Simão.

Agora, venha o próximo…

JOGOS PARA A ETERNIDADE (15) - Europeu de 1984

Inicia-se no próximo sábado o 13º Campeonato da Europa de Futebol.
Respeitando rigorosamente a periodicidade com que foi instituído – de quatro em quatro anos -, desde 1960 que esta competição foi progressivamente ganhando força até se transformar naquilo que é hoje: pouco menos que um verdadeiro Mundial, havendo até quem defenda ser o Euro mais exigente que a própria prova da FIFA, dado o grande equilíbrio entre as selecções normalmente apuradas.
Das edições anteriores recordo-me de sete, precisamente desde 1980, tinha eu dez anos.
Apesar de ter uma memória difusa de um Bayern de Munique-Benfica disputado em Março de 1976, não me recordo, nem ao de leve, do Europeu disputado três meses depois em Belgrado, o tal em que Panenka inventou uma forma diferente de marcar penáltis, que Postiga e Zidane décadas depois repetiriam com sucesso. O primeiro campeonato que me lembro, e já razoavelmente bem – vivera já antes as emoções do Mundial de 1978 -, é pois o de 1980 disputado numa Itália mergulhada no “Totonero”, uma espécie de Calciocaos dos anos setenta. Não tive a noção na altura, mas vim a perceber depois ter sido esse um dos piores europeus de sempre. Estádios vazios, futebol defensivo, violência nas bancadas, de nada faltou ao Itália 80. Venceu a Alemanha de Rummenigge, Schuster e Matthaus (que se estreava), numa final pobre diante de uma improvável Bélgica.
O Europeu que mais me marcou foi obviamente o de 2004 - pela carreira da selecção nacional, pelo inolvidável ambiente de festa gerado no país, e pelo facto de o ter vivido de perto com presença em vários estádios. Mas o primeiro Europeu que me tocou verdadeiramente, como de resto a toda a minha geração, foi o de França em 1984, no qual a equipa nacional conseguiu uma participação brilhante, ficando a apenas cinco minutos de uma final, que durante mais de setenta anos fugiu ao futebol português. Este épico torneio constituiu a segunda presença da história da selecção nacional numa grande prova internacional, depois da saga dos “Magriços” dezoito anos antes. A qualificação para a fase final foi naturalmente difícil, para mais num grupo fortíssimo do qual faziam parte Polónia (terceira classificada no Mundial anterior) e a URSS, finalista de três (60, 64, 72) das seis edições até aí disputadas. A Finlândia fechava o grupo e na altura não tinha futebol para entrar nas contas do apuramento.
A chave da qualificação portuguesa acabou por ser a dupla vitória frente aos polacos (2-1 numa bela tarde de domingo na Luz e, sobretudo, 1-0 numa noite de nevoeiro em Chorzow com um golo de Carlos Manuel), que permitiu chegar à última jornada, em casa frente à URSS, em condições de passar, mesmo depois da copiosa derrota em Moscovo por 5-0, que custou a substituição do seleccionador Otto Glória por uma comissão técnica constituída por Fernando Cabrita, António Morais, Toni e José Augusto. No último jogo, em Novembro de 1983 perante um Estádio da Luz praticamente cheio, um golo solitário de Jordão, na transformação de uma grande penalidade bem cavada por Chalana, pôs o país em festa. Dezoito anos depois dos “Magriços”, dois anos antes de “Saltillo”, aí estava Portugal, com um conjunto brilhante de jogadores, mas uma organização fora de campo ainda rudimentar, a disputar uma prova importante diante dos melhores.Efectivamente a selecção nacional de então tinha grandes jogadores. Bento, Carlos Manuel, Jaime Pacheco, Diamantino, Chalana, Nené, Gomes e Jordão, eram apenas alguns dos nomes que se destacavam de toda uma geração que nunca tinha tido tão boa oportunidade para brilhar - pelo menos ao nível de selecção pois Benfica e F.C.Porto tinham sido finalistas europeus pouco antes. Faltava todavia ao futebol português uma estrutura técnica e dirigente que pudesse garantir o rigor de um trabalho sólido e coerente. Neste âmbito tudo era ainda muito amador, funcionando na base da carolice de uns quantos, situação que se revelou devastadora dois anos depois em Saltillo.

Neste Europeu terão desde logo surgido alguns problemas, nomeadamente fruto da extrema rivalidade já então existente entre Porto e Benfica, com a agravante de a quase totalidade dos seleccionados pertencer a esses dois clubes (ao contrário do que se veio a verificar mais tarde, com a emigração massiva dos melhores jogadores portugueses) e não existir uma liderança técnica reconhecida por todos. Na verdade António Morais era o técnico dos jogadores do F.C.Porto, enquanto Toni era o dos do Benfica, e Cabrita apenas procurava apaziguar os ânimos.
Nos jogos de preparação antes da prova ficou no ar alguma preocupação. Derrota no Jamor por 2-3 com a Jugoslávia, e empate no Luxemburgo adensaram duvidas sobre o que podia Portugal fazer num grupo em que teria de se haver com Espanha e Alemanha, para além da estreante Roménia.
Mas no primeiro jogo, diante dos germânicos, a alma portuguesa gritou bem alto que estava disposta a entrar para a história. Contra os campeões europeus e vice-campeões do mundo, Portugal impôs um empate a zero, num jogo em que até desfrutou de algumas boas ocasiões para marcar. Para a época, empatar com a Alemanha era um estrondoso êxito, e abria as melhores perspectivas.
A equipa apresentada, num cauteloso 4-5-1, seria repetida no segundo jogo, e teria poucas alterações até final. Bento, João Pinto, Lima Pereira, Eurico, Álvaro, Carlos Manuel, Jaime Pacheco, Frasco, Sousa, Chalana e Jordão. Além destes onze, só Gomes e Diamantino viriam por uma vez a alcançar a titularidade.
Faltei às aulas para ir ver o jogo a casa. O ano lectivo estava no fim, tinha faltas para dar, e aproveitei-as até aos limites nos dias dos principais jogos da tarde. Julgo que as férias grandes terão começado durante a competição.
A sensação de ver aqueles equipamentos vermelho-verde vivos, novinhos em folha, a entrar no estádio de Estrasburgo, numa era em que a televisão a cores ainda era uma jovem novidade, ficará para sempre marcada na minha memória. Não sou do tempo do Mundial 66, e aquela era a primeira ocasião em que podia ver a selecção do meu país, pela qual sempre nutri grande carinho, a jogar num grande palco.
No segundo jogo, disputado em Marselha num domingo de intensa trovoada no nosso país – que durante a tarde me deixou em pânico por faltar a electricidade, colocando em risco a possibilidade de ver o jogo -, a nossa selecção colocou-se em vantagem perante a Espanha já na segunda parte com um magnífico golo de Sousa, mas não conseguiu segurar o resultado, pois o temível goleador Santillana, num ressalto dentro da área, acabou por estabelecer a igualdade. Chalana realizou uma exibição soberba, começando neste dia a destacar-se verdadeiramente como a grande estrela da equipa portuguesa.
Portugal entrava para a última jornada com a necessidade imperiosa de vencer a Roménia, e sob um manto de críticas pela atitude demasiado defensiva adoptada nos primeiros jogos, sobretudo diante da Espanha, onde se esperava mais alguma audácia. Muitas das críticas passavam pela não utilização de Fernando Gomes no ataque, e pelo reforço do meio-campo com cinco médios, na altura considerado um total exagero.
Para o jogo com a Roménia em Nantes, a comissão técnica fez a vontade aos críticos, colocando Fernando Gomes ao lado de Jordão no ataque luso. Teria pois que sair um médio, e aí é que o caldo se entornou. As pressões de F.C.Porto e Benfica eram muitas, o balneário estava totalmente dividido em dois, e a dúvida que se punha era entre Carlos Manuel ou Jaime Pacheco. Decidiu-se pelo primeiro.

As coisas começaram mal, com a lesão de Chalana, já muito claramente o jogador em melhor forma, logo na alvorada do desafio, e que o obrigou a sair de maca. Temeu-se o pior, mas o pequeno genial ainda reservava muito futebol para esta prova.
Seria outro benfiquista, Nené, saltado do banco já na fase de desespero, a marcar o golo decisivo a nove minutos do fim da partida. Cruzamento do lado direito, e Nené com o sentido de oportunidade que lhe era característico, atirou à meia volta para dentro da baliza romena, ponde em delírio os emigrantes portugueses presentes – nesse tempo poucos eram os que se poderiam deslocar de Portugal a França para ver futebol. Ao mesmo tempo, no Parque dos Príncipes, um golo do central Maceda em cima do minuto noventa, eliminava surpreendentemente a Alemanha, guindando assim os dois países ibéricos à presença nas meias-finais.
Nessa mesma quarta-feira, outro tema dominava a actualidade do país. Tinha sido desmantelada a rede bombista FP-25, e detidos os seus alegados responsáveis, entre os quais o até então prestigiado Otelo Saraiva de Carvalho. A passagem de Portugal às meias-finais não terá pois merecido o destaque mediático que os dias de hoje normalmente conferem a feitos dessa natureza. Ainda assim foi causa de grande felicidade de todos os que de perto viviam o fenómeno desportivo, e a presença da selecção no Euro. De certa forma era o reviver da saga dos “Magriços”, agora com o pseudónimo de “Patrícios”.
Mas este Euro estava destinado a ser de algum modo acidentado para mim. Depois de ter de faltar às aulas no primeiro jogo, depois de me ver sem electricidade em casa poucas horas antes do segundo, eis que no sábado das meias-finais frente à anfitriã França partiu-se a antena da televisão.
Foi de grande angústia toda essa tarde, sem saber em que condições poderia ver o jogo. Acabei por o ver a preto e branco, e com o ecrã cheio de “chuva”. Mas vi-o.
A França, além de jogar em casa, era a melhor equipa da prova. Dispunha de uma equipa formatada desde o Mundial de 1978, e que no Espanha 82 atingira as meias-finais, sendo apenas derrotada, de forma dramática, no desempate por penáltis frente à Alemanha, numa noite de Sevilha que os franceses demoraram dezasseis anos a digerir. A equipa gaulesa, orientada pelo experiente Michel Hidalgo, contava com um super-Platini – hoje presidente da Uefa - na sua melhor forma de sempre, e que aliava uma capacidade técnica fora do comum, com uma notória liderança em campo e com uma veia goleadora impacável. O “dez” da Juventus marcou nove golos em cinco jogos (!), e foi a grande figura da prova, pedindo meças àquilo que Maradona viria a fazer dois anos depois no Mundial do México, onde de resto Platini voltou também a brilhar.
Para além de Platini, brilhavam no meio-campo francês Giresse e Tigana, dois artistas que eram protegidos pelo operário Luís Fernandez. Um dos melhores meio-campos de que há memória no futebol europeu das últimas décadas.
O jogo com Portugal no Velodrome de Marselha foi inesquecível, e ficará na história como um dos melhores de sempre dos campeonatos da Europa. Foi decidido no último minuto do prolongamento, depois de duas horas de grande emoção, intensidade e espectáculo.
Na equipa portuguesa deu-se a entrada de Diamantino para o lugar de Gomes, e de Jaime Pacheco para o lugar de Carlos Manuel, trocas mais uma vez envoltas em azedas polémicas dentro do grupo. Veja-se a preocupação que havia com os equilíbrios entre Benfica e F.C.Porto, sem a qual é difícil imaginar onde poderia ter chegado este conjunto de brilhantes jogadores portugueses.
Até meio da segunda parte do tempo regulamentar o domínio foi totalmente francês. Num livre directo em que todos esperavam o remate de Platini, Domergue diparou para o fundo da baliza de Bento pouco depois dos vinte minutos de jogo. Daí em diante assistiu-se a um vendaval de ataque da equipa da casa, com o guardião do Benfica a realizar seguramente uma das melhores exibições da sua carreira.
Como quem não marca sofre, Portugal acabaria por chegar ao empate, contra a corrente do jogo, após um cruzamento primoroso de Chalana, ao qual Jordão, sozinho na área, correspondeu com um cabeceamento perfeito batendo Joel Bats. Por portas e travessas, estava reposta a igualdade que nos levaria a um inesperado prolongamento, não sem que antes Fernando Gomes, entrado no segundo tempo juntamente com Nené, tenha tido nos pés a oportunidade de tudo decidir.
No prolongamento, dado o adiantamento dos franceses, o jogo tornou-se cada vez mais partido e espectacular. Ainda nos primeiros quinze minutos, Chalana entra em dribles sucessivos pela direita, cruza para o segundo poste, onde Jordão, falhando aparentemente o remate, acaba caprichosamente por colocar a bola no ângulo superior da baliza francesa, colocando Portugal em vantagem, e calando o Velodrome.
Contra todas as previsões e expectativas, Portugal via-se a poucos minutos de alcançar o momento mais alto da sua história futebolística, com uma presença numa final de uma grande competição internacional.
Ainda antes da mudança de campos, Nené, desmarcado uma vez mais por Chalana, isolou-se diante de Bats, e por muito pouco não fez o 1-3 que arrumaria a questão.A segunda parte do prolongamento foi penosa para Portugal, que sem capacidade física para resistir à avalanche gaulesa foi perdendo bolas sucessivas e foi-se remetendo às imediações da sua área. Faltavam apenas seis minutos para segurar a magra vantagem, quando Domerge, novamente ele, aproveitou uma confusão na área portuguesa para repor a igualdade. O lateral-esquerdo Domergue, que nem era normalmente titular, marcou nessa tarde-noite os dois únicos golos da sua carreira internacional.

Tudo parecia então ir para penáltis, mas a força dos franceses, impulsionados por um público cada vez mais entusiasta, acabou por lhes valer o terceiro golo, a um minutos do final. Tigana arrancou pela direita, foi deixando adversários prostrados no relvado, e cruzou para a pequena área onde Platini não perdoou, colocando a França na final.
O desespero tomou conta dos portugueses. A imagem de seis ou sete jogadores estatelados na relva é a prova evidente de que a diferença neste jogo se acabou por fazer pela capacidade física e ritmo competitivo das duas equipas. Seja como for, perder uma oportunidade daquelas para disputar uma final, daquela forma, foi absolutamente dramático. Esta derrota foi das maiores tristezas que tive com a selecção nacional.
A poderosa equipa francesa seguiu para a final, onde venceria a Espanha com alguma sorte – e ajuda do árbitro. Olhando à competição no seu todo, foi a França a melhor equipa. Portugal deixou boa imagem, mas não estava ainda, por diversos motivos, à altura de lutar por um título.
Este jogo e este Europeu ficaram contudo a marcar brilhantes páginas da história da selecção nacional.Chalana e Jordão foram os que mais alto brilharam, conseguindo o extremo benfiquista uma milionária transferência para o Bordéus, onde com Tigana, Giresse e outros, chegaria às meias-finais da Taça dos Campeões da época seguinte. Depois, as lesões comprometeram-lhe o resto da carreira.