Um aniversariante de 22 de fevereiro: o espanhol Luis Buñuel (1900-1983), um dos grandes do cinema – na foto, em visita no sul da França ao amigo de longa data e também espanhol Pablo Picasso em 1955, durante as filmagens do documentário "Le Mystère Picasso", de Henri-Georges Clouzot.
Ilustração mostra Stálin com “pinta de malandro”, escreveu jornal na época
Daniel Luque
O retrato de Stálin que Picasso queria esquecer
JAIME NOGUERA
Artista espanhol retratou líder soviético dez dias após sua morte e causou controvérsia entre os membros do Partido Comunista francês.
Quando recebeu um convite da revista literária “Les Lettres Françaises” para pintar um retrato de Stálin, o pintor espanhol Pablo Picasso ficou em um beco sem saída: a publicação, que era referência na época, era comandada pelo poeta Louis Aragono, também membro e colega do Partido Comunista da França.
Em março de 1953, apenas dez dias após a morte do líder soviético, o rosto de Stálin com os traços de Picasso estampava a página da revista francesa. E a figura, com bigode e olhos esbugalhados, atraiu atenção – negativa.
O jornalista Feliciano Fidalgo descreveu em 1983, no “El País”, que “pelo retrato de Stálin assinado por Picasso pode se imaginar um arruaceiro com pinta de malandro”.
Retrato dividiu críticos e adoradores do pintor (Foto: Wikipedia Commons)
Três dias depois, o Partido Comunista da França (PCF) expressou descontentamento com o trabalho. “O secretariado do PCF desaprova categoricamente a publicação do retrato do grande Stálin”, declararam.
Com a palavra, o biógrafo de Picasso
Para entender melhor o desenrolar dos fatos, a Gazeta Russa foi à cidade natal de Picasso, Málaga, onde mora o biógrafo do artista Rafael Inglada.
“O retrato de Stálin que Picasso fez após a morte do ditador soviético foi, penso eu, uma resposta às exigências do que deveria ser arte para uma potência como a Rússia. Foi o biógrafo e amigo de Picasso, Pierre Daix, que enviou um telegrama ao artista, em nome de Louis Aragon, para que participasse com um desenho da edição especial que seria dedicada ao falecido líder soviético na ‘Les Lettres Françaises’”, diz Inglada.
Picasso fez o desenho a carvão no dia 8, em Vallauris, e quatro dias depois a revista foi lançada.
O artista queria fazer um retrato de Stálin jovem (a partir de uma fotografia de 1903, que Françoise Gilot, então parceira de Picasso, havia achado em um jornal velho).
Dizia-se, porém, que ele e Françoise Gilot riram tanto ao terminar o desenho que Picasso ficou com soluço, pois o retrato guardava uma semelhança impressionante com o pai de Françoise. Ainda assim, a ilustração foi enviada.
Nem as flores que Picasso enviara a Moscou foram capazes de atenuar a polêmica entre as fileiras do Partido Comunista Francês e detratores e admiradores do artista.
O jornal “L’Humanité”, publicado em 18 de março daquele ano, divulgou em sua primeira página uma declaração categórica de desaprovação ao retrato.
“Sem questionar a integridade do grande artista, cujo compromisso com a causa da classe operária é conhecido por todos, o secretário do Partido Comunista Francês lamenta que o camarada Aragon, membro do Comitê Central e diretor da ‘Les Lettres Françaises’, que, por sua vez, conduz uma luta corajosa para o desenvolvimento da arte realista, tenha permitido a sua publicação”, escreveu o jornal.
Inglada: “Para Picasso, colaboração era uma coisa; outra era submissão” (Foto: Lola Durán/Valladolid)
Na época, os detratores e os defensores de Picasso se dividiram visivelmente em dois grupos. “Para Picasso, a situação parecia ridícula; mostrava que colaboração era uma coisa, e outra era submissão e exigência”, diz.
Segundo Inglada, o poder central do PCF considerou a arte uma “caricatura insultante e vulgar do grande guia dos povos”, e condenou Aragon e a redação da revista por terem publicado o retrato. Também foi exigido que toda a tiragem fosse destruída por “blasfêmia”, assim como a divulgação de uma nota de arrependimento público pelos responsáveis da publicação.
A queixa oficial foi recebida como uma ordem pelos comunistas gauleses. Aragon se viu obrigado a recuar e desculpar-se publicamente. Na edição seguinte, a publicação divulgou cartas com críticas de várias células do partido.
Comunista inveterado
O longo exílio de Picasso – por oposição ao regime de Franco –, combinado com as experiências brutais durante a ocupação nazista de Paris, levaram o artista a enxergar o comunismo como “um ideal de paz, a chave para um mundo livre do fascismo”.
Isso gerou, porém, protestos de grupos de direita em algumas de suas exposições, e os Estados Unidos negaram sua entrada no país.
O pintor realizava conferências públicas pelo mundo e doações para causas sociais, incluindo um milhão de francos para os mineradores de carvão franceses que estavam em greve. “Mais tarde, protestou contra a guerra na península coreana, à qual dedicou sua obra “Massacre na Coreia” (1951), crítica aos EUA e que tampouco agradou o PCF, que preferia, como no caso do retrato de Stálin, um trabalho mais simples.”
“Massacre na Coreia”, de 1951 (Foto: Wikipedia Commons)
Em 1962, Picasso recebeu o Prêmio Lênin da Paz entre os povos, mas mantinha uma relação complexa com o partido. Embora não aprovasse a repressão da revolta húngara, por exemplo, permaneceu fiel aos ideais marxistas até sua morte, em 1973.
Olga, a mulher russa de Picasso retratada entre amor, rancor e ciúm
30 DE JANEIRO DE 2019
ALEKSANDRA GÚZEVA
Da devoção quase religiosa ao ressentimento dos últimos anos: a relação entre Olga Khokhlova, bailarina das Estações Russas, e o fundador do cubismo continua viva nas pinturas do artista. Dos primeiros anos de relacionamento ao dramático adeus. Olga Khokhlova. 1917
Private collection
Pablo e Olga se conheceram através de Diaghilev. Ela dançava nas apresentações das Estações Russas, enquanto Picasso participava da produção de cenário e dos figurinos do balé revolucionário “Parata”.
Olga Khokhlova com um xale. 1917
Picasso Museum Málaga
A beleza e as boas maneiras de Olga imediatamente conquistaram o pintor, que decidiu acompanhar a empresa em sua turnê pela Espanha. Lá, Picasso criou uma das pinturas mais famosas de Khokhlova, retratada com o tradicional xale espanhol.
Retrato de Olga sentada. 1917
Picasso Museum, Paris
Diaghilev disse a Picasso que, com as mulheres russas, era uma boa prática pedir a mão relativamente cedo. E assim o pintor decidiu se casar com Olga.
Pelo amor à jovem, Picasso se afastou do cubismo. Esse período de sua produção artística foi definido como “neoclássico”: isso porque sua esposa queria, em retratos, ser reconhecível e fiel à realidade.
Retrato de Olga Khokhlova. 1918
Private collection
As pinturas de Olga enchiam o estúdio do pintor. Em 17 anos de vida juntos, seus retratos começaram a assumir uma aparência muito diferente, quase iconográfica.
Olga lê na cadeira. 1920
Museum of Grenoble
Em várias ocasiões, Picasso retratou sua mulher sentada em uma cadeira. Ela, por amor ao marido, abandonou a dança e desistiu da turnê na América Latina com as Estações Russas. Depois, Olga machucou a perna e passou muito tempo sentada.
Olga com sobrepeso. 1923
Picasso Museum Málaga
Enquanto Olga estava embalada no conforto da vida familiar, aconteciam na Russia a Revolução e a Guerra Civil. Na época, a jovem perdeu todo o contato com seus pais; ela teve que esperar três anos antes de recebê-los. Mas as cartas continham informações inquietantes: o pai havia desaparecido, um irmão morreu, outro irmão fugira do país, enquanto sua mãe e sua irmã viviam em condições desesperadoras. Durante esse período, Picasso fez diversos retratos de sua esposa triste e perturbada.
Maternidade. 1921
Picasso Museum Málaga
Em 1921, nasceu o único filho do casal, Paulo. A alegria do pintor era extrema e em várias ocasiões retratou sua mulher como uma Madona com a criança. Esses retratos surgem cheios de ternura.
Dança. 1925
Tate Modern
Em meados dos anos 1920, o relacionamento do casal começou a ruir. Olga ficava cada vez mais ciumenta em relação a Picasso (e tinha todas as razões para isso) e fazia escândalos.
Ela não podia aceitar que, durante um encontro com Diaghilev em Monte Carlo, o marido tivesse retratado jovens bailarinas das Estações Russas.
Segundo críticos, a pintura “Dança” retrata Olga. Coincide com o início da fase surrealista de Picasso, composta de dramas e tensões.
Nua sobre cadeira vermelha. 1929
Tate Modern
A crise entre Olga e Picasso ficou cada vez mais séria. Naquela época, o artista começou a se afastar da imagem realista de sua esposa. Atormentado pelo ciúmes dela, ele começou a sair secretamente com outras mulheres.
Cabeça de mulher. Olga Picasso. 1935
Picasso Museum, ParisEm 1935, Olga e Pablo se separaram. Pouco tempo depois, Maria Teresa, uma jovem amante do pintor, teria dado à luz uma criança.
Ainda assim, Olga continuou a aparecer nas pinturas da artista: da primeira, retratada como uma deusa, passou a ser pintada como um monstro.
‘Guernica’, de Picasso: assim foi feito o quadro mais famoso do século XX
Conheça a exposição que mergulha na mente do pintor que há 80 anos plasmou o horror da guerra
IKER SEISDEDOS
Madri 3 ABR 2017 - 19:39 CEST
A obra Guernica, de Pablo Picasso, começou a ser concebida bem antes de ser encomendada, já que, quando pequeno, o artista escapulia para baixo da mesa de jantar para admirar as “pernas monstruosamente inchadas que surgiam das saias de uma das suas tias”. Essa precoce fascinação pela deformidade subjaz no extraordinário feitiço da grande tela, intacto 80 anos depois de o artista pintá-la a pedido do Governo da República Espanhola para o pavilhão do país na Exposição Internacional de Paris de 1937. A teoria que liga os pontos entre o horror infantil e a eficaz monstruosidade do gigantesco mural-ícone é de T. J. Clark, curador, junto com sua esposa, Anne M. Wagner, de uma exposição que foi apresentada na manhã desta segunda-feira à imprensa no Museu Reina Sofía, em Madri, por ocasião do aniversário redondo da obra.
Brigitte Bardot watching Pablo Picasso at work in his studio in Vallauris
Brigitte Bardot e Picasso
Villauris, 1956
Durante o Festival de Cinema de Cannes em 1956, a jovem Brigitte Bardot visitou o estúdio do pintor Pablo Picasso em Vallauris. Este encontro foi acompanhado pela revista Life.
'O pintor e a modelo', de 1963, no CCBB. / PAULO WHITAKER (REUTERS)
Os quatro andares do Centro Cultural Banco do Brasil, um prédio de 1901 construído no centro de São Paulo, estão tomados pela influência de Pablo Picasso (1881-1973) na arte moderna espanhola. A exposição Picasso e a Modernidade Espanhola -Obras da coleção do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofía traçam, em cerca de 90 obras, a trajetória do pintor espanhol por suas diversas fases até chegar ao auge de sua obra, com Guernica.
Uma das mais famosas do mundo, Guernica é um grande painel de 3,5 metros de altura por 7,8 metros de largura, feito em preto, branco e cinza, em 1937, durante a Guerra Civil Espanhola. Retratou a expressão da dor e dor horror causados pelo bombardeamento alemão no País Basco. O quadro não faz parte da exposição, mas alguns estudos e esboços sim, como Cabeça de Cavalo.
Embora o quadro original não esteja lá, pelo grau de importância deGuernica e sua influência na arte moderna da Espanha, há um andar inteiro dedicado a essa obra. São vídeos, projeções e sons que permitem que o público interaja e se aprofunde melhor na obra.
Caminhando pelos outros andares, estão, além de obras de Picasso de diferentes fases, outros quadros e esculturas de artistas que também exerceram influência sobre a arte moderna espanhola, como Dalí, Miró, Domínguez e Gris.
Além de Guernica, Picasso é relembrado com seus retratos de figuras femininas. Muitas de suas mulheres são as mulheres retratadas tendo o rosto como foco principal da obra. Dois narizes é uma das marcas das pinturas de Picasso. Sua Mulher sentada apoiada sobre os cotovelos(1939) deixa claro que o fundamental para o artista era a expressão facial: As cores e traços usados no rosto são bem diferentes das usadas no tronco. Poderia tratar-se até mesmo de quadros distintos, tamanha é a diferença entre as partes do desenho. Cabeça de Mulher (1910), Busto e Paleta (1932), Retrato de Dora Maar (1939) e O Pintor e a Modelo (1963) também estão expostos.
Além das mulheres, Picasso tinha uma obsessão por minotauros, retratado como seu alter ego. Esse personagem surgiu substituindo os arlequins retratados por ele até os anos 30.
O pluralismo é uma das maiores marcas de Picasso, que atravessou por fases diferentes ao longo de sua carreira, como a fase azul e a fase rosa - distintas não somente pelas cores, mas pelo sentimento que cada uma delas transmite, sendo o azul uma cor fria e que não foi escolhida à toa, já que Pablo Picasso enfrentava um período de depressão na época. O cubismo, surrealismo e o classicismo também foram representados peculiarmente ao longo da trajetória do seu trabalho.
A entrada é gratuita, mas tenha tempo para investir. Uma fila considerada curta – e aparentemente pequena, de fato – levou 50 minutos para chegar à entrada.
Todas as pinturas, gravuras e esculturas expostas vieram da Espanha, do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofía, em Madri, e são todas do período do modernismo.
Guillaume Apollinaire, Max Jacob, Gertrude Stein, Jean Couteau, Louis Aragon ou Michel Leiris são apenas uns poucos nomes dos muitos escritores com os quais Pablo Picasso teve uma estreita relação e que contribuíram a convertê-lo já em vida como um dos maiores artistas da história. A partir de sua morte, em um chuvoso domingo de abril de 1973, aos 91 anos, em Notre-Dame-Vie, em Mougins (França), as exposições dedicadas a Picasso não deixaram de acontecer em todo o mundo: antológicas, retrospectivas focadas em cada uma de suas múltiplas etapas ou temas, seus períodos azul, rosa ou branco e negro, seus retratos, sua relação com a tradição e a vanguarda, seus cadernos, suas máscaras, suas cerâmicas, suas viagens. Seu imenso talento junto à sua enorme produção alimentam ano após ano os projetos dos museus mais diversos do planeta.
Maite Ocaña (Barcelona, 1947), uma das mais prestigiadas especialistas na obra do pintor malagueño, é a curadora da exposição dedicada às oficinas do artista. Ocaña começou a trabalhar no Museu Picasso de Barcelona em 1972 e pode dizer que quase toda sua vida profissional está unida ao pintor. Só nesse museu, 79 exposições foram dedicadas a ele durante seu meio século de existência. A especialista não participou de todas, mas atesta, com uma resposta entusiasmada, ser amante da arte.
A que se deve esse interesse permanente por Picasso?. “É a figura central de toda a arte do século XX”, responde a especialista. “Sua capacidade de investigação unida a sua profunda admiração pelo passado o fazem único. Já foi importante para os artistas de sua geração. Os escritores colaboraram à difusão de sua obra de uma maneira determinante. Relacionou-se com muitos e os que não o conheciam pessoalmente, se interessaram por sua obra. Foi assim então e seguiu o sendo depois”.
Ante o imponente Autorretrato com paleta (1906) com o que abre a exposição, propriedade do Museu da Philadelfia, Ocaña lembra que se trata de uma das peças mais importantes de seu período primitivista: rosto com forma de máscara ibérica e corpo volumétrico. “Tem quase forma arquitetônica, como o retrato que realizou de sua amiga Gertrude Stein, a escritora norte-americana que tanto ajudou na difusão de sua obra”.
Ocaña está convencida de que por mesmo que várias exposições lhe sejam dedicadas, Picasso continuará sendo por muito tempo uma fonte inesgotável de novas propostas que seguirão interessando ao público. “Sua obra admite novas leituras, ensinos, comparações“. Não acha que, salvo exceções, seu nome seja utilizado em vão para atrair visitantes. “Há muito para se descobrir. Nesta exposição mostramos um alto número de obras nunca vistas porque são propriedade de particulares. Pode contemplá-las de perto uma vez na vida, é um bom pretexto para se aproximar e ver a exposição”.
Sua cotação no mercado dos leilões, sempre nos primeiros postos há muitos anos, aumenta também no interesse dos museus por expor sua obra. Na semana passada no Sotheby’s de Londres, Picasso rompeu um novo recorde com Composition au Minotaure, comprado por 12,5 milhões de euros, o preço mais alto alcançado por uma obra sobre papel do gênio malagueño.
O quadro La habitación azul (O quarto azul), dePablo Picasso, do período 1901-1904, não era tão azul quanto parecia ser. A tela, propriedade da Philips Colletion, foi submetida a raios infravermelhos que mostraram que debaixo da pintura conhecida havia outra, muito diferente. Os cientistas e especialistas descobriram um quadro oculto debaixo da pintura. As imagens infravermelhas que o estudo adiantou, revelam um homem com gravata com o rosto apoiado na mão, com três anéis em seus dedos. Agora a pergunta que os conservadores da galeria de Washington esperam responder é: "Quem é ele?" Um mistério que os pesquisadores estão dispostos a esclarecer. Querem descobrir o 'fantasma' da pintura.