sexta-feira, 19 de agosto de 2011

As Hespérides são moças algarvias

    Foto Cata-Vento ( Senhora da Rocha- Armação de Pêra)
 
No Garb realça o azul deuses morenos
À doçura dos figos submetidos.
Vieram gregos. Ficaram Sarracenos.
Nardos enfolham seus nomes esquecidos.
 
À noite ordenham luas nos terraços,
Dão leite à sombra. Abrolham os perfumes.
Silêncio. Só de um lírio ouvem-se os passos.
Madruga a pesca, rompe um mar de lumes.
 
Esvoaçam suas túnicas de abelhas
Entre vinhas, seus bêbados recintos;
E quando a amendoeira nas orelhas
Põe flores, deram-lhe os deuses esses brincos.
 
Vem de turbante o sol e toma posse
De corpos, cactos, milhos e vinhedos.
Excita o açúcar na batata-doce
E despe as almas gregas dos penedos.
 
Ouro firme, crepúsculos de cinabre
Senhorio de azul. Balcões mouriscos.
Ferve a prata na pesca. O cheiro abre
No ar quente uma vulva de mariscos.
 
Jardins da Hespéria? Ninfeu de ondas macias,
O mar. As ninfas guardam os pomares.
As Hespérides são moças algarvias
Todas jasmim, da testa aos calcanhares.
 
Garb de praia e pele magia e lendas,
Branco de extasiadas geometrias.
Absorto o tempo. São gregas as calendas
Com pálpebras de mouras gelosias.
 
Laranjas, cal, areia e rocha ardente
Têm sede da luz que dá mais vida.
Índigos deuses. Ardor. Tudo é presente.
Causa clara de beira-mar garrida.
 
 Natália Correia (1923 – 1993)

sábado, 13 de agosto de 2011

Coisas de Tavira






A casa da minha avó.


Repito estas palavras
e as escadas de pedra
enchem-se de luz:
vejo a avó sentada
na sala a costurar.

Já não espera ninguém.

Os filhos estão com ela
e os netos vão a caminho.

Voam pelos terraços
Onde outrora brincavam
roubando amêndoas e figos
postos ali a secar.


Yvette K. Centeno

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Uma Enorme Pétala Que Oscila

                                 A Praia dos Três Irmãos ( Alvor - Portimão)- imagem Google

Não sou turista
mas como tu
estou aqui só de passagem

Olho para ti, verde mar
e penso:
se a alma se revela no ímpeto de um gesto
tu, mar
és um gesto que se desconstrói
uma ponte só para ti mesmo

Tu, mar
és uma enorme pétala que oscila
e eu
antiga Alice audaciosa
mergulho no teu cego arfar
num violento gesto de amar
tremendo de fascínio e medo


Praia dos Três Irmãos, inverno de 2002

Ana Hatherly