Os japoneses usam a palavra 'azul' descrever a luz verde dos semáforos. Esta particularidade deriva de, antes do período moderno, existir apenas uma palavra para os tons de azul e verde (ao). Por volta do século XI surgiu na literatura uma outra palavra para designar um tom esverdeado de azul (midori). Este tipo de conceito é comum também em português (e.g., escarlate é um tom de vermelho, mas não é normalmente considerado uma cor independente). Já no século XX, em parte por influencias culturais externas, midori foi promovida a cor, apesar de ainda restarem cicatrizes antigas como a designação da cor dos referidos semáforos. Esta falta de distinção ocorre noutras linguagens. Na Bíblia Hebraica ou na Odisseia de Homero, não existe palavra para azul. [1]
O mapa das cores é um espaço contínuo de tonalidades, e as cores são um sistema discreto de classificação. Existe sempre uma perda nesta discretização que, por sua vez, é cultural e historicamente contingente mas também dependente da forma como funcionam os nossos olhos e o nosso cérebro. Mas qual a influência da cultura? Brent Berlin and Paul Kay, nos anos 1960, procuraram regras universais que regiam como as culturas lidam com o espaço cromático. Eles descobriram que existem entre 2 e 11 nomes para as cores principais. E que quando existiam X cores, estas tendiam a ser as mesmas.
Segundo o diagrama, se uma cultura usa apenas duas cores, estas serão o branco e o preto (claro/escuro). Se uma cultura usa três cores, a terceira tendencialmente é o vermelho. E assim sucessivamente. Quando se chega à sexta cor é o momento em que o azul se separa do verde. Das 98 línguas estudadas, 92 seguiam este padrão.
E em português? É curioso como temos nomes para vários tons relacionados com vermelho (escarlate, laranja, púrpura, violeta, roxo, magenta) mas quase nada para o verde. No entanto, se olharmos para a seguinte foto dificilmente podemos afirmar que predomina uma única cor (verde) quando realmente há vários tons de verde e que apenas nos falta vocabulário para os nomear.
A cor é uma noção subjectiva, não existe 'lá fora', tendo apenas presença na imagem que o cérebro constrói para mapear o que o rodeia. O mesmo se passa com sons, sabores, a sensação de calor e outra informação recolhida pelos nossos vários sentidos. O vocabulário para cor, porém, ajuda-nos a processar de forma distinta uma parte do 'nosso' mundo, o umwelt (a selecção natural tende a eliminar os sentidos menos úteis em ralação à região habitada pela respectiva população). Um conjunto rico de palavras para cor permite uma maior qualidade da percepção, uma recolha mais fina da informação disponível. A foto acima seria mais rica se a língua portuguesa tivesse dez palavras distintas para verde. E a cor é apenas uma dimensão possível. Um botânico ou um jardineiro retirariam ainda mais detalhe da mesma foto. Àparte das nossas limitações cognitivas, uma cultura e uma língua mais ricas conceptualmente tornam a nossa visão do mundo numa experiência também ela mais rica.