A incapacidade do capitalismo para controlar os delinquentes que ele próprio cria, uns arvorados em neoliberais, outros apenas bandidos, provocou, como todos sabemos, mais uma crise no sistema. Desta vez a coisa foi assustadora para a classe dominante. Independentemente de muitos deles não terem parado de ganhar dinheiro a rodos, o espectáculo de bancos a falir, ou a serem “nacionalizados”, ainda que por pouco tempo, deixa-os num estado de nervos caótico.
De qualquer maneira, o pior de tudo, foi começarem a ouvir por todo o lado gente até aí muito sossegada, que inesperadamente começou a ventilar a hipótese de o sistema estar falido, de as teses daquele barbudo Marx terem sido prematuramente declaradas como mortas, de ser preciso mudar de sistema económico, de ser, talvez, interessante, voltar a ouvir com uma nova atenção as propostas dos partidos que, por todo o mundo, já o diziam bem antes de chegar a crise...
Foi o pânico! Houve que lançar mão de tudo. Fazer com que as pessoas não se sintam seguras em nenhum emprego. Fazer com que fiquem agradecidas por o terem. Fazer com que haja sempre uma fila interminável de candidatos a meia dúzia de postos de trabalho, constituída por gente disposta a tudo para os conseguir. Deixar avolumar o sentimento de insegurança até ao ponto de, para além de agradecidos aos patrões, os cidadãos começarem a sentir-se mais seguros rodeados de polícia e dispostos a abdicar de liberdades e direitos. Culpar os pobres pela sua situação. Culpar os imigrantes, os árabes, os pretos, os sindicalistas, os comunas... tudo, menos a sacrossanta economia de mercado.
Na dúvida e para aliviar o stress social que todas estas medidas provocam, é preciso apostar forte na alienação. De forma milionária. Atirando milhões e milhões para cima de miúdos, com o pretexto de serem “desportistas”. Inundando as televisões com toneladas de novelas e programas de entretenimento cujo nível vai baixando de mês a mês. Investindo na música “indigente” que a toda a hora tem representantes nos vários canais dessas mesmas televisões. Enterrando os livros bons que se vão escrevendo, sob pilhas de lixo “light”, escrito por vedetas disto e daquilo, ou mesmo simples figurantes do “jet-set”. Atascando os escaparates em revistas “cor de rosa”, onde podemos saber dos arrufos, dos amores, das tricas, dos boatos e da localização ao milímetro do local “inconfessável” em que a jovem actriz ou cantora pimba espetou, para a posteridade, o seu mais recente e ousado piercing.
A sorte ajudando, artistas com a dimensão dramática de um Michael Jackson, sucumbem não se sabe bem como e porquê, permitindo ao sistema que controla a nível global os meios de comunicação, montar este show comercial obsceno à volta da vida e morte dessa patética vítima do próprio sistema, marioneta trágica nas mãos do capitalismo.
Todo o asco que me provoca esta campanha mundial de alienação, misturada com a infame exploração comercial do artista morto, quase me faz esquecer que houve um tempo em que gostei de Michael Jackson.