o jornal o (perda de) tempo publicou ontem no seu caderno magazine uma excelente matéria assinada por bruno loureiro. nela, aparecem comentários de makely ka, zéfere, alguns editores e este salamalandro que vos fala. o assunto é o mercado editorial e sua difícil-dificultosa relação com os poetas nascentes (e/ou vice-versa).
é preciso dizer que loureiro merece louros pelo trabalho. enquanto conversávamos, pude ver que ele perscrutava o assunto com curiosidade, levantando as questões primordiais, como um detetive, e pelo resultado, deu pra ver que ele correu atrás. é raro um jornalista que faz isso. normalmente, eles estão apenas preocupados em reafirmar o que já sabem ou que estão engastados num não-saber-agindo-
como-quem-sabe-porque-a-verdade-jornalística-é-eterna-e-única-acima-
de-todas-as-outras.
mesmo assim, na página impressa, aparecem equívocos e distorções. na legenda sob a minha foto, o editor declara que estou “desiludido com as leis de incentivo e os concursos literários”. ora bolas, eu jamais diria uma bobagem dessas. as leis de incentivo são uma excelente conquista para quem produz e vive de bens culturais. são passíveis de críticas, é claro, como tudo nesta vida (e especialmente no nosso país da batucada). mas eu não diria propriamente que estou “desiludido”. na verdade, podem achar paradoxal, mas eu nem mesmo lamento o estreito espaço que existe para os “neófitos”.
o que eu queria dizer, e não está expresso no artigo, é que o poeta iniciante que se ilude com a idéia de recorrer à lei pode ficar decepcionado com o resultado. e que, se o escritor pretende realmente publicar suas palavras, que recorra a algo mais certo, e isso em linguagem poética quer dizer que ele deve “fazer justiça com as próprias mãos”. é assim há muito tempo, não há nada de mais. pelo contrário, é sinal de a(r)titude. e o papel do artista na nossa sociedade não é o de sair publicando livros por aí: é fazer com que a bomba exploda em algum lugar. e isso não acontece se não houver atitude.
eu poderia ficar aqui citando uma imensa lista de nomes: borges, juan gelman, manuel bandeira, drummond, paul éluard e por aí vai. infelizmente (ou felizmente) todos eles tiveram que bancar o seu primeiro livro. c’est la vie. é como me disse o meu amigo ian guest: “não adianta ficar lutando contra os buracos na calçada”.
concordo com o juan: o simples fato de existir pessoas fazendo poesia já é um ato subversivo, mas isso não quer dizer que essa pessoa vai arranjar editores da noite pro dia porque revelação é uma coisa e subversão, outra muito diferente. e, não dá pra esperar que aconteça como na música, na prosa e nas artes dadas ao consumismo: o escritor precisa mesmo é ralar ralar ralar. não apenas para ser um bom escritor: alguns dos nossos melhores poetas, de pedro kilkerry a sebastião nunes, quase não são lidos.
a lista dos mais vendidos é uma das manifestações do que eu chamo de “desvios psíquicos da imprensa de rapina”: só tem serventia na sociedade consumista. e o público leitor de poesia (multidão de sanchos panças), no momento em que estão procurando versos para ler, não se encaixa nessa dita sociedade. “o sucesso não vem por acaso”, não é seu lair?
mas, enfim, podemos sobreviver a esse jornal. afinal, imprensa é assim mesmo. não se preocupa muito com a exatidão das palavras, muito menos com o que vão pensar (d)os seus entrevistados. e pra terminar bonito essa bonita postagem, vou citar o jorge luís borges (quem diria!) que diz: “passemos à poesia; passemos à vida. e a vida, tenho certeza, é feita de poesia.” (atenção: feita de poesia, não de jornalismo) e para completar os dizeres do velho jorge: “livros são apenas ocasiões para a poesia”. precisa dizer mais?