Chuva, chuva a norte, chuva ao centro, chuva a sul. Assim ditavam as previsões meteorológicas para o fim de semana da páscoa.
As dúvidas atormentavam-nos as ideias, à Daniela e a mim.
- E que tal o sul, SUL?
- Onde?
- El Chorro, por exemplo.
- Mmmm...
Vistas!
Pendurado num camalot 0,75, tento repousar alguns segundos. Olho para baixo e observo a fissura perfeita que corta a mega placa vertical com quase 50 metros. Desejava estar mais em forma para poder encadear esta extraordinária fenda.
Respiro fundo e retorno aos entalamentos de mãos para mais alguns metros de escalada.
Terminamos a via e começamos a procurar a reunião de rapel que se encontra instalada no lado oposto do penedo.
A outra margem da garganta oferece-nos a visão das paredes mais espectaculares do El Chorro.
As grandiosas paredes por cima dos tuneis.
E os incriveis tuneis!
Um ultimo rapel coloca-nos no “Caminito del Rey”, uma surreal passadeira que percorre a Garganta de los Gaitanes, suspensa sobre um precipício de cortar a respiração.
Um olhar desde os tuneis para "Caminito del Rey"...
...abismo assegurado!!
Com os últimos minutos de luz solar, pensamos onde podemos ir saciar a fome.
O estacionamento do parque de campismo de El Chorro, junto à represa encontra-se apinhado de viaturas. Adivinhamos o rebuliço de gente que neste fim de semana prolongado resolveram, como nós, escapulir-se da chuva intensa prevista para as terras do norte.
Na verdade, nem sequer o El Chorro, situado a sul da Andaluzia e conhecido pelo seu clima benigno, conseguiu ficar livre da massa de humidade que invadiu toda a Península Ibérica. Na sexta-feira choveu bastante, o que para nós nem foi muito negativo pois permitiu uma fugaz visita à emblemática cidade encantada de Granada.
Descobrimos um pequeno restaurante na margem oposta ao parque de campismo e refugio de El Chorro. Neste lugar mais tranquilo, em frente a um prato bem servido, fizemos a revisão do dia vivido na fantástica “Rayito de Luna, 6c”.
A Garganta de los Gaitanes.
A “Rayito...” foi aberta em 1984, por Andrés Ortega, Javier Rodriguez e Rafael Gamarro, quando apenas existiam três vias equipadas em toda a escola. Esta via ficou votada ao abandono durante bastante tempo. Por estar situada mesmo por cima das águas do lago formado pela barragem, as dificuldades de acesso eram obvias. Até ao momento em que foi equipada uma tirolesa em cabo de aço, mesmo à entrada da garganta. Essa tirolesa foi renovada recentemente, o que motivou abertura de outras vias no sector.
Um cú pesado! "Já tou velho para estas cenas!"
A Tirolesa... radical!
A travessia da tirolesa, incluidas as anterior e posterior “Ferratas”, demoram o seu tempo e a utilização de uma roldana para cabo de aço (que não dispunhamos) é fortemente aconselhável. Este factor, a juntar à obrigação de carregar os friends (coisa rara em El Chorro) não incentivam a repetições da “Rayito de Luna”. Na verdade, para mim e para a Daniela, pouco apreciadores da “confusão”, estes tornaram-se factores positivos.
Quanto à via, trata-se de um “ex-libris” raro. É uma via de fissuras, situada numa zona em que o forte são as desportivas de chorreiras, extra-prumos e as placas técnicas.
O primeiro lance... equivocado. O original está mais à esquerda (verificámos que não fomos os primeiros!).
O segundo largo... já no bom caminho!
A Daniela no terceiro lance.
O seu ultimo lance, constituído por uma mega-fissura que corta na diagonal uma grande placa, é considerada única em “El Chorro”. Com efeito, num mundo pejado de plaquetes, como o demonstra a grande maioria das zonas de calcareo de Espanha, esta linha sobressai pela sua quantidade mínima de expansivos, apenas existentes nas reuniões e dois exemplares, no inicio e a meio do ultimo largo, num local onde a fissura atinge as dimensões de um “Off-widht”. Os verdadeiros entalamentos de mãos vêm a seguir...
E a super-fissura!
Ainda...
O ponto negativo desta via está directamente relacionado com a própria localização geográfica. Apesar de ser escalada poucas vezes, a “Rayito de Luna” está longe de constituir uma aventura remota e isolada. Voltada para a estrada sinuosa que liga Ardales a Álora, qualquer escalada nesta parede transforma-se num chamariz para os turistas que por aqui passam. Muitos curiosos param os seus carros em meio da faixa de rodagem e, saem para fotografar os escaladores em plena faina.
De todos modos, o ruído ocasional do trânsito está dentro dos limites razoáveis, nunca atingindo proporções que transformem esta escalada numa experiência desagradável.
A “Rayito de Luna” é de todo uma via aconselhável.
Da próxima vez que visitarem “El Chorro” não tenham vergonha de juntar ao habitual Kit de expresses, um bom conjunto de friends... grandes incluídos!
Paulo Roxo