sexta-feira, janeiro 17, 2014

A TELEVISÃO TORNOU-SE TÓXICA E ANTI-CULTURAL



A Televisão é uma das mais extraordinárias invenções do Homem, marcando decisivamente a vida das populações e um novo quadro da comunicação audio-visual. Por outro lado, tudo o que aconteceu na sequência da electricidade, electrónica, rádio, contacto entre comunidades, à distância e sem fios, veio revolucionar muitos quadros da reestruturação das sociedades em desenvolvimento ou em vias de desenvolvimento. Não apenas mas sobretudo. E o século XX, apesar das duas grandes guerras que arrasaram parte do mundo, sobretudo a Europa, beneficiou em parte com a própria tragédia, mesmo no imenso lamento pelos milhões de mortos e nos custos dos difíceis trajectos de reconstrução, em particular na Alemanha. Um apelo à paz, à harmonia entre os povos, a par das tecnologias favoráveis a vários tipos de desenvolvimento, tudo isso, com a Sociedade das Nações e depois a ONU veio contribuir para um período de estabilização, um tempo de paz, à medida que as descobertas de meios de construção e comunicação permitiram entender melhor o território, as cadeias de produtivas, novos enquadramentos do trabalho, da educação e da pesquisa científica. Aí se integraram muitos dos passos mais nítidos para a socialização do meio televisivo, design e tecnologia, enquanto a Rádio, já muito bem difundida, procurava tornar bem acutilante a nitidez da sua especificidade.
Foi uma época determinante na qual se chegou a imaginar um "mundo futuro" de importantes fecundações pela arte, pela ciência e por novas teorias do comportamento. Os povos apostavam na diversidade dos aparelhos apropriados à decisiva sedimentação das cidades, à melhoria das vias de comunicação por terra, através dos oceanos e do imenso espaço atmosférico. O crescimento de tudo isso induziu, em muitos outros percursos, a variação contínua de respostas às necessidades que estivessem ainda mal apoiadas, ou a partir delas, mercado a mercado, o inquietante processo que se dedicava a multiplicar respostas e a inventar novas necessidades, laterais, quase absurdas, mas cujo fascínio foi criando nas pessoas uma espécie de doença do consumo, apetências por mais do mesmo, sem a noção do equilíbrio e do desenvolvimento harmonioso das comunidades. 
Nesse quadro da roda dos encantamentos, a televisão passou a ser um objecto e um fim domesticamente essencial, cada vez em maior concorrência com outros meios da mesma raiz e sobretudo na base alucinatória da competitividade: programas, concursos, publicidade intensa, da brandura ao maior dos choques, entre lutas de personalidades, actores, séries, especulação noticiosa, debates, exposição do insólito, a sociedade desvendada, virada do avesso, rolando para uma bola de neve cada vez mais suja de ruídos e pesados imaginários -- sempre suspeitos, no auge das incríveis proezas de impossíveis heróis ou de cartáticos apocalipses.


Na Televisão portuguesa ninguém soube (nem podia no tempo do antigo regime) abarcar as hipóteses conceptuais e formais de começar a operar muito mais tarde do que noutros pontos do mundo. Por estranho que pareça, houve naquele tempo mais crítica de televisão (Mário Castrim, notável pela sua acutilância) do que a partir do regime democrático. E quanto mais liberdade se verificou no âmbito das disciplinas criativas (artes plásticas, literatura, cinema, teatro, música) menos os jornais e revistas dedicaram um interesse analítico e pedagógico em torno de todas essas questões. A Televisão (cega, surda e muda, apesar de colorida e digital) está a afundar-se no mesmo buraco negro (apenas ruidoso) para o qual escorre a própria cultura, aquilo a que chamamos civilização contemporânea. Eventos elaborados no sentido de um gosto massificado, que são procurados por multidões alucinadas, num domínio de som acima de toda a prudência concorrem com as Televisões e estas retrucam com os mais díspares programas ditos de entretenimento e que não passam, na grande maioria dos casos, de concursos nos quais os espectadores se sujeitam às mais absurdas torturas, tocando vermes, aranhas, cobras, ou aceitando que sobre eles se derramem detritos e líquidos hipoteticamente coloridos. Noutros casos (Big Brother, Casa dos Segredos) os pacientes são encerrados em acomodações toscas ou pop, vigiados por dezenas de câmaras 24 horas por 24 horas, compelidos a respeitar uma VOZ que os confessa e os leva a proceder contra os outros companheiros em acções não éticas, de traição e jocosidades grosseiras, entre muitas outras actividades ignóbeis, regularmente atiçados por uma condutora impensável, que troca avisos, inventa situações e insinua encontros entre rapazes e raparigas, sexo, namoros e inevitáveis intrigas. A clausura, sem contacto com o exterior por dois ou três meses, excita os protagonistas, atira-os uns contra os outros, reduzindo a sua educação à boçalidade, lutas verbais, assimetrias de comportamento, tudo na expectativa de cem mil euros de prémio. Não há debates exteriores sobre esta anormalidade, os seus efeitos no público e nas cobaias, aliás escolhidas consoante os objectivos mais controversos.
Durante manhãs inteiras, os diversos canais, arregimentando público local, gastam horas em quase nada, aos gritos, misturando alhos com bugalhos, entrevistando pessoas destroçadas, seguidas de músicos de ocasião ou de fenómenos risíveis, afinal insensatos . Há rodas da sorte, milhares de euros (à sorte) para quem telefone para o estúdio (números repetidos entre gargalhadas) e esteja assim durante toda a manhã à espera que o acaso lhe venha ter às mãos.
Todos os canais concorrem entre si, mostrando ao mesmo tempo coisas do mesmo tipo, cartelizando os próprios e grandes espaços de publicidade. As telenovelas (duas ou três por noite) são precedidas de intervalos de publicidade colados em massa, durante mais de 20 minutos. Não é coisa para cardíacos. Aliás, abruptamente, no decorrer de qualquer das novelas, a acção é cortada por anúncio breve -- 20, 30, 45 segundos, durante os quais explodem mais anúncios seja do que for. Aliás, o problema da publicidade atinge níveis ilegítimos dentro de qualquer programa eticamente correcto. O cinema desapareceu dos programas regulares, os debates em torno da situação nacional (sócio-política) misturam as mais variadas gentes, não têm coordenação capaz, os espectadores são confrontados por vezes com quatro intervenientes a falar ao mesmo tempo. O contraditório é interrompido, não há esclarecimento nem qualquer valor pedagógico, visualmente apoiado. Sem mais, um debate "mais sério" pode ser interrompido por emergências acéfalas em torno de casos do futebol. Futebol infecta tudo, respeitado acima das próprias tragédias. Os debates sobre futebol duram horas, ocupam dois ou três vias noticiosas, ao mesmo tempo, e a qualidade das falas (no conteúdo, na forma, na margem) deixa estarrecida qualquer pessoa de bom senso. A contagem dos minutos de um programa, no fim, é coisa inominável, sobretudo em confronto com os extensos concursos de arrasante esforço cançonetista, cantigas de outros, imitações por vezes brilhantes mas não aconselháveis a um sério plano cultural verdadeiramente criativo. As figuras que aceitam fazer rir, em cenários pacóvios ou atafulhados de néons e torturas lumínicas em movimento, é gente pouco informada sobre as boas correntes do humor, abaixo de toda a dignidade de fora e conteúdo, ou imitando "vozes meninas" e sufocadas ou enviesando os tons e as posturas. São coisas indescritíveis onde até aparecem talentos, mas inevitavelmente soçobrando na banalidade e grosseria. 
Mas o país consome cada vez de forma mais alarmante todas estas frutas espinhosas, matando uma sede que já não sabe identificar. Porque, fora do ecrã, até se sujeita a ver cinema em caixas de fósforos, por altos preços e tendo de suportar bandas sonoras distorcidas até à surdez. A televisão aborda as artes em pingos ocasionais -- 30 segundos para noticiar uma exposição, nada sistematizado no tempo e no espaço sobre teatro, livros, encontros em torno de questões científicas, sobre o ensino, sobre autores do país e do estrangeiro. A notícia dessas coisas pode não ser bombástica nem barulhenta, mas é cada vez mais indispensável em termos da consciência do meio e da cadência de alternativas que os grupos minoritários (com direitos expressos) seguem a sério.
A Televisão portuguesa  precisa de comissões avisadas para regular o barbarismo dos conteúdos e dos buracos negros de publicidade que enche ecrãs cada vez mais inúteis (e até prejudiciais) perante o serviço que "vendem" a um público destroçado sem o saber.

segunda-feira, janeiro 06, 2014

MORTE DE EUSÉBIO: IMPOSSÍVEL NÃO SENTIR

Eusébio
Ao presenciar o trabalho deste homem singular, seguindo de longe a sua prestação, é impossível não sentir esta vontade de o lembrar aqui, a preto e branco, tocando com os lábios a famosa bota de ouro.

domingo, janeiro 05, 2014

PARA RELER PLUMA CAPRICHOSA: DETROIT E NÓS

A questão é a eliminação do poder das constituições e das regras da justiça social, em nome da «emergência»


«Um Juiz do Tribunal de Falências para o Distrito do Michigan, um juiz federal, autorizou formalmente a declaração de falência a cidade de Detroit, e  decretou que, neste caso, a obrigação de pagar as pensões públicas deixava de ser intocável. As leis do Estado do Michigan e a Constituição proíbem que se toque nas pensões públicas. Um jurista perito em legislação municipal acha que a decisão pode vir a mudar a intocabilidade das pensões, não apenas no Michigan como em outras cidades com problemas em pagar pensões de funcionários públicos. Cidades como Los Angeles, Chicago e Filadélfia. A decisão do juiz federal considera que os benefícios  das pensões  são um direito
contratual e não estão abrangidos pela protecção especial num caso de falência municipal ao abrigo do Capítulo 9.
Detroit está na bancarrota. A cidade foi a 4ª maior e é hoje a 15ª. Perdeu centenas de milhares de habitantes (1,8 milhões  para 700 mil). Os serviços públicos deixaram de funcionar, circula apenas um terço das ambulâncias e a polícia consegue apenas fechar 9% dos casos reportados,  apesar do aumento  da criminalidade. Os bombeiros, que não têm mãos a medir, devido aos casos de fogo posto, estão mal equipados e sem meios. Udevastadorm gestor especial de falências, nomeadamente pelo Estado, Kevyn Orr, pretende iniciar já o plano de recuperação da cidade com base na decisão, pagando uma parte apenas dos 18 mil milhões em dívida (da cidade) e restaurando os serviços essenciais. Este plano chama-se «Plano e Ajustamento». A cidade vai vender património e reinvestir o dinheiro nos serviços públicos.


Para as famílias com rendimentos fixos, qualquer corte na pensão será devastador. Os sindicatos e os gestores de fundos de pensões prometem luta judicial, recorrendo a um tribunal superior, mas nenhum líder sindical tem dúvidas de que se a decisão vingar, o resto da América atacará as pensões.


 Os reformados e pensionistas ficarão sem apoios, sem comida, medicamentos, carro, e serão despejados das casas e dos lares. Um bombeiro que recebe uma pensão de invalidez depois de ter ficado gravemente incapacitado num incêndio, acha que a decisão, considerada ilegal e amoral, é o "canário na mina." Resposta oficial: "Não há dinheiro". Numa manifestação de protesto, liam-se nos cartazes as palavras Bank of America, um dos bancos americanos  resgatados  pelo contribuinte americano. Nesse caso, ninguém disse que não havia dinheiro.
O declínio de Detroit tem muitos factores. A cidade sustentava-se praticamente de uma única indústria, a automóvel (resgatada também pelo contribuinte americano) e acumulou lideranças municipais corruptas e incompetentes. Junte-se a isto a tensão racial, a pobreza e a desigualdade. A dada altura, Detroit pedia emprestado para pagar empréstimos anteriores, um círculo vicioso semelhante ao da dívida portuguesa e dos juros. Com a diferença de que Detroit não pagará a dívida toda nem os juros. E um dos últimos presidentes da  Câmara, Kwame kilpatrick foi condenado a 28 anos de recandidatar-se cadeia por crimes de extorsão, fraude e corrupção durante um mandato entre 2001 e 2008. As falhas da da liderança política foram, antes e depois dele, as grandes responsáveis pela falência de Detroit. O mayor que lhe sucedeu demorou pouco tempo no cargo e escusou, e o mayor actual teve de ceder poderes ao gestor especial de falências, Kevyn Orr.
A guerra prossegue agora nos tribunais, e as decisões finais das batalhas judiciais serão analisadas à lupa e aplicadas ou não nas outras cidades, com ou sem o sistema bancarrota. Na vida da democracia americana, nunca o princípio constitucional da inviolabilidade das pensões  tinha sido posto em causa, mas o próprio juiz que a decretou considera e das regras daque há sempre recurso para o tribunal superior. O que os sindicatos e fundos tencionam fazer. Dado o estado de emergência da cidade, o juiz acha que o processo deve ser acelerado. posto em fast track, para que a cidade não fique muito tempo paralisada pelos tribunais. A cidade e o "Plano de Ajustamento."
Não custa traçar paralelos entre o que está a acontecer na Europa e em Portugal, com os seus planos de ajustamento, embora no caso de Detroit ninguém fale em austeridade (seria irónico). O que importa reter é que o sistema dominante arranjou uma maneira definitiva de dar cabo dos direitos adquiridos das pensões públicas, um princípio sagrado desde a sua instituição. O que o futuro nos prepara é simples: a pensão é matéria aleatória. Há dinheiro mais do que suficiente na América para  salvar Detroit, e muitos exemplos do empreendorismo da cidade já se notam por todo o lado, numa espécie de renascimento urbano. A questão não é saber se há ou haverá dinheiro. A questão é a eliminação do poder das constituições e das regras da justiça social, em nome da "emergência".Lá como cá».
Revista do EXPRESSO de o4.01.2014| pluma caprichosa | Clara Ferreira Alves.

quinta-feira, janeiro 02, 2014

PORTUGAL FESTEJA, CONSOME, TROIKANDO

Aqui temos, quase três anos depois da abertura real da crise e do avanço colossal da troika, Portugal vivendo, em plena balbúrdia, as festas tradicionais do Natal e da Passagem do Ano: fogo de artifício, fogos nos rabos e nas cabeleiras, popularmente mas a par das noites em hóteis de luxo, mulheres lindas, vestidos a condizer, uma cozinha esquálida, obras de artes plásticas, entre pequenos cubos e cilindros, pinceladas a condizer, chupáveis juntamente com frutos miniaturais vindos do Extremo Oriente. Andar pelas ruas naquela noite, rasando os sem abrigo, a malta embriagada, as multidões de roupas coloridas, bandas e cómicos numa idade média em pleno Terreiro do Paço, fogo de artifício por todo o país, Bom Ano, mau ano nunca, banhos frios para resistir às gripes e aos resgates, delírio como nunca se viu na chamada época faustosa, em contraste com a hirta marcha da troika e a crença (muito seca e singela) dos ministros que anunciam o futuro em pleno ardor de fé. Amém.

sábado, dezembro 21, 2013

ACORDO ORTOGRÁFICO: FALSO AJUSTAMENTO

Miguel Sousa Tavares

Quando tentou cumprir o acordo ortográfico toda a sua imagem
ficou gravemente poluída por sucessivas perdas de corpo e alma

Cumpre-me saudar este jornalista e escritor por se ter mantido fiel à língua portuguesa. Ele sabia que uma língua, que é uma alma viva, não se «actualiza» na secretaria, com dicionários em volta, nem sob os imperialismos que bamboleiam a fonética lusa do outro lado do Atlântico.

     como lidar com estas palavras:
setor  |  sector

No primeiro caso, é claro que se trata de uma anómala abreviatura feita nas escolas, quanto ao professor, pelos alunos:  
Setor, como é que se transfere para o AO a palavra percepção?
Setor, porque é que está errada a palavra sector na frase sector dos arquivos arquitectónicos?

Miguel Sousa Tavares acompanha sempre a sua crónica no Expresso com uma nota final que reza assim: "Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia."

A Assembleia  da República tinha agendada para ontem a «apreciação» de mais uma petição contra a entrada em vigor do Acordo Ortográfico -- escreve aquele jornalista.
«Não sei bem o que possa significar, no léxico jurídico-parlamentar, uma «apreciação». Mas tratando-se do AO, não tenho dúvidas de que os deputados continuarão a fazer tudo para evitar uma votação. Alguns deputados (...) talvez se tenham atrevido a dizer que, de facto, ninguém quer o acordo entre a lusofonia -- nem Angola, nem Moçambique, nem o Brasil; ninguém em Portugal, que trabalhe com a língua (escritores, professores, editores, jornalistas) quer ou entende para que serve o AO, excepto umas raras sumidades académicas que não existiriam sem esta oportunidade; que, do ponto de vista linguístico, o AO é um delírio de aberrações e idiotices que nenhum dos seus defensores consegue sustentar numa discussão séria; e que, até juridicamente, o AO não pode entrar em virgor pois que o expediente inventado para o fazer sem o número requerido dos seus signatários viola o próprio tratado que o instituiu. Mas a maioria dos deputados aposto que terá ficado calada e não terá mostrado qualquer interesse na questão; uns por ignorância do que está em causa; outros porque acham que já é tarde para voltar atrás; outros porque acham politicamente correcto este acto de submissão colonial ao Brasil -- (onde os poucos que estão por dentro da questão sentem desprezo por nós); e outros, talvez a maioria, porque não está para se chatear com o assunto, E o assunto é apenas a defesa da língua portuguesa, que é um dos indicadores fundamentais da nossa identidade e da tal soberania, que Cavaco, Portas e Passos Coelho tanto apregoam. Também não encontro palavras para descrever a violência que é ver como a arrogância de tão poucos e a indiferença de tantos se consegue impor, por inércia ou por cobardia, a todos aqueles que fazem desta língua maravilhosa que herdámos o seu instrumento de trabalho. Quem lhes deu tal direito?»

esta crónica, de Miguel Sousa Tavares, foi citada do
jornal Expresso de 21-12-2013

quarta-feira, dezembro 11, 2013

MORREU NADIR AFONSO, ARQUITECTO E PINTOR DE ESPAÇOS ONDE A GEOMETRIA SE TORNAVA PAISAGEM E SONHO


    Nadir Afonso,
    Arquitecto e pintor


Nadir Afonso Rodrigues nasceu em 1920 e faleceu hoje, dia 11 de Dezembro de 2013. Iniciou os seus estudos de arquitectura na Escola de Lisboa (Belas Artes) ainda segundo os termos da reforma de 32. Muito dotado para o entendimento das problemáticas relativas ao domínio das disciplinas do espaço e da cor, diplomou-se em arquitectura e trabalhou com Le Corbusier e Oscar Niemeyer, personalidades do conhecimento do  mundo, aliás de grande relevo no século XX. Além do mais, Nadir empenhou-se desde cedo no campo da representação votada ao espaço, à pintura, à memória urbana. Estudou pintura em Paris, tendo assumido uma aproximação de trabalho com Vasarely, o criador da arte op, além de personalidades como André Bloc e Fernand Léger. A dinâmica cinética devida aos estudos de Vasarely inspiraram bastante Nadir Afonso. Ele é visto, justamente, como um dos pioneiros da arte cinética. Daí, em boa medida, ter sido autor de uma teoria estética, publicando diversos livros nos quais sustenta que a arte é puramente objectiva e regida por leis de natureza matemática. Ele defende a ideia de que a arte não é um acto de imaginação mas de observação, percepção e manipulação da forma. Muitas vezes, esta tese envolveu ensaios contraditórios, sobretudo por não haver razão, nas razões apresentadas, para se excluir dos pressupostos indicados na teoria os factores derivados da imaginação.
Nadir Afonso foi considerado um espírito invulgar, mesmo em termos de reconhecimento internacional. Está representado em muitos museus e as suas obras mais famosas integram a série chamada Cidades, belas peças que, de início, o artista negava serem representações de carácter urbano. Em volta dele, na SNBA, num Salão de Arte Moderna, alunos de Belas Artes insistiam «não são mas parecem». E ficaram parecendo, brilhantemente até hoje, porventura pelos tempos fora ou da História. Lugares do mundo. Espaços onde a geometria se tornava espaço e sonho.

MORREU SOARES BRANCO, ESCULTOR E HOMEM AMÁVEL

SOARES BRANCO
Morreu no passado dia 4 o escultor Soares Branco. Tinha 87 anos e era escultor pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa. Escola onde leccionou durante largos anos, sempre nas disciplinas de índole artística ligadas à escultura e ao desenho. Era um colega sóbrio e de bom trato. Era um homem amável. 
Domingos de Castro Gentil Soares Branco foi aluno de Simões de Almeida (sobrinho) e de Lepoldo de Almeida, já na Escola de Belas Artes. Depois, concluído o curso, foi desenhador na Escola Médica de Lisboa, trabalho raro entre artistas com formação deste tipo. Foi então escolhido para Belas Artes. Ao longo do seu percurso como escultor foi 2º classificado do Prémio de escultura Soares do Reis, SNI. A sua obra teve altos e baixos, mas beneficiou de um tempo de encomendas que permitiu a muitos artistas desta geração desenvolver soluções de arte pública. Entre os colegas, Soares Branco foi sempre correcto e cumpridor, ganhando amigos mais novos à medida que o tempo passava. Tinha uma forte ideia desses valores e do fundo de artifício do seu diálogo com a Oficina.

quinta-feira, dezembro 05, 2013

MORREU MANDELA, ILUMINANDO A HISTÓRIA

Nelson Mandela

Morreu um dos seres humanos mais decisivos para que possamos apurar, com ele e depois dele, o verdadeiro sentido da nossa melhor natureza e do futuro. Prémio Nobel da Paz, preso durante longos anos por defender a paridade entre os homens, os seus direitos sociais e espirituais, no respeito pela grandeza civilizacional. Foi presidente da África do Sul, num testemunho exemplar, admirado por todo o Mundo. Contra a separação das raças e a discriminação perversa entre os povos, Mandela será sempre um símbolo maior da Humanidade, marcando para sempre o Continente Africano no sentido de honrar o fundo dos seus diversos materiais, em harmonia de perfil e partilha. Nelson Mandela, cuja raridade se conjugava com a força ética, fou e será um dos mais poderosos símbolos da luta contra o regime segregacionista do Apartheid, sistema racista, sem rosto, oficializado em 1948. Mandela foi um inimitável na sua postura de negação dessa força absurda, combatendo sobretudo através do seu perfil moral, ou, como disse o Presidente da ONU, «um dos maiores líderes morais e políticos do nosso tempo.» Morreu a 5 de Dezembro de 2013.

quarta-feira, novembro 27, 2013

FRANCISCO CONDENA CAPITALISMO QUE EXCLUI


PAPA FRANCISCO
 
Os efeitos ou defeitos da Globalização estão a verificar-se numa extensa e preocupante crise mundial, a par dos desastres principais provocados pelos homens (de todos os níveis civilizacionais) em todo o planeta Terra, paisagem anunciadora de uma espécie de apocalipse em futuro não muito longínquo, na atmosfera, nos oceanos e nos continentes. Uma medonha ideia expansionista, em todos os sectores das comunidades humanas, tem contribuído, entre guerras, para a hipertrofia das tecnologias, antigas e de ponta, armamentos devastadores, ódios entre povos, má gestão dos territórios e das suas relações que deveriam pugnar pelo equilíbrio, bom senso e harmonia. A inteligência humana, sem dúvida considerável, tem pouco a ver, infelizmente com os perfis da personalidade de cada homem, aspecto sem medida e sujeita aos mais aterradores sinais de mutação, para o crime, para a luta por posses insensatas, para ganhos em monopólios capitalistas em constante ideia de concorrência, quer legal quer ilegal, desde uma simples dose de heroína a um qualquer arsenal de armas nucleares com o poder de destruir por completo tudo o que nos foi dado, não se sabe porquê nem para quê -- menos ainda por quem.
Perante a actual situação do mundo, das várias crises em todas as latitudes, sociedades empobrecidas e grandes estruturas de produção falindo em cadência impensável, o Papa Francisco, personalidade singular e cuja ideia para o seu magistério se tem revelado aberta, dirigida à sensatez das comunidades e da própria Igreja Católica, tem elevado os níveis de intervenção e proposta quanto a uma melhor forma de encarar a vida solidária e os sistemas estruturais de organização social, moderna, contida sobre os valores de espírito e reservada relativamente aos brutais consumos, ao gigantismo do capitalismo que exclui, que gera terrorismos e assimetrias infernais.
 

A exortação evangélica «A Alegra do Evangelho», assumida pelo Papa Francisco, lembrando os termos que fundamentaram o Cristianismo e a consequente Igreja, convoca a ligação espírito e homem, define uma posição que consagra os lados positivos de um regresso às origens, lembrando mesmo o sentido da reforma protestante no século XVI. Francisco mostra claramente que as forças espirituais (na área do Bem) só podem condenar um «capitalismo que mata». E Francisco diz: «A crise mundial, que investe nas finanças e economia, põe a descoberto os seus próprios desequilíbrios e sobretudo a grave carência de uma orientação antropológica que reduz o ser humano apenas a uma das suas necessidades: o consumo.».

 
EXCERTOS de A ALEGRIA DO EVANGELHO
 
Uma economia que mata vem da exclusão e da desigualdade social. Não é possível que a morte por enregelamento dum idoso sem abrigo não seja notícia, enquanto o é a descida de dois pontos na bolsa,
 
Enquanto não se eliminar a exclusão e aa desigualdade dentro da sociedade e entre os vários povos, será impossível desarreigar a violência. Acusam-se da violência os pobres e as populações isoladas dos meios e dos processos de relação. Mas, sem igualdade de oportunidades, as várias formas de agregação e de guerra encontrarão um terreno fértil para que, mais tarde ou mais cedo, se verifiquem violência ou a explosão da tensões.
 
O Bispo de Roma declara-se, por inerente competência, a permanecer aberto às sugestões tendentes a um exercício do seu ministério que o torne mais fiel ao significado que Cristo pretendeu conferir aos outros perante as necessidades e maiores privações de valores humanos e espirituais.
 
Estes dados concorrem para um acerto com a ideia, entretanto validada pelas vozes inconformistas, de que a força exercida em todo o mundo pela finança, pelas orientações económicas, pela obsessão do valor espúrio da competitividade e pela força colossal das fontes hegemónicas que especulam com o dinheiro, através de empréstimos à escala dos países, gente sem rosto, defendida atrás de agências orwellianas de notação, operando como num jogo vídeo, dão corpo às maiores vilanias travando créditos, subindo sem regras os juros, face escondida de um capitalismo do terror e da assimetria.
E sobre isso pondera Francisco:
Quando a sociedade -- local, nacional ou mundial -- abandona na periferia uma parte de si mesma, não há programas políticos, nem forças da ordem ou serviços secretos que possam garantir indefinidamente a tranquilidade.
 
Um velho a quem penhoraram a pensão que usufruía, podendo ajudar dois netos, suicidou-se, deixando um recado não se sabe a quem: os desertos são chegados.
 

sábado, novembro 23, 2013

CUIDADO, ESTÃO AÍ A VIOLÊNCIA E A DITADURA


Mário Soares, memorável Presidente da República Portuguesa, sempre recordado com respeito, reacendeu a sua força política, com mais de oitenta anos, e tem barafustado contra a situação do país e a "delinquência" do actual governo. Reunindo uma multidão de cidadãos (e muitos admiradores) na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa, Soares abriu a sessão com um discurso de dez minutos no qual exprimiu a ideia de que a Nação, vergada à Troika, caminha para o abismo, está perto de entrar em violência, a qual poderá banir todo o governo sem piedade, a par do perigo iminente de se estabelecer no seu lugar uma  nova  Ditadura.
«Mário Soares considera que o actual Governo ignora o texto Constitucional, trivializando palavras alheias ao repetir que a Constituição, apesar de estar nela consagrado o direito ao trabalho, não é por isso que ela nos assegura esse valor. As privatizações, segundo o ex-presidente, são a venda do país a retalho, e os cortes das pensões põem o Estado Social em causa. Para Mário Soares, todos estes males, num gesto de acuso fulminante, devem ser anulados justiceiramente com a mera demissão do Presidente Cavaco e do Governo de Passos.
A grande bonomia de Mário Soares desfez-se assim, sem  aviso nem cortesia.
Cavaco já protegeu mais a Constituição do que o próprio Soares ou o saudoso Sampaio. As iras e as palavras vãs deste nocturno congresso pela Constituição,  Estado Social e Direitos Humanos concentraram-se no absurdo convite feito  ao actual Presidente para que se demitisse e levasse com ele o próprio Governo: assim, como na estapafúrdia quadratura do círculo, logo se percebeu que aquela radical demissão, preconizada por Soares, logo instalaria no país  um tempo sem Lei nem Roque, condimentado por um novo PREC e enterrado em bancarrota, abandonado pela Troika, reduzido a negros orçamentos de cêntimos. Há palavras sem sentido, inconstituconais, que não se devem pronunciar, sequer ao vento da metáfora e da maior onda nazarena. As revoluções não se desarmam nem armam à paulada. Violência produz insanidade e não gere nenhuma verdadeira salvação. De resto, naquela noite, na Aula Magna e a propósito da justeza de alguns combates fonéticos, não havia a menor brisa de Ditadura. Apesar dos dislates dos partidos da maioria e da oposição.
Terá Mário Soares razão, justamente numa altura complicada, em vésperas de tanta coisa nem boa nem má, coisa nenhuma, como se deduziu da luta anunciada por Pacheco Pereira? Outrora morno e de sono sábio, o político Soares grita em nome de uma vaga de fundo. Jedi vinha ajudá-lo e foi descansar com o velho profeta e ainda grande «animal político». Ele o disse: «esta é uma questão de patriotismo e de consciência. O povo, espantado, não se julga em condições de arcar com mais guerras e pede justiça, todos o sabemos.» Jedi, o génio do bem, vindo do fundo das estrelas, acalma os ânimos e fica por ali, à espera da Troika, para nos defender das receitas baseadas em feroz e eterna austeridade. Francisco, do Vaticano, também espreita e faz perguntas. Os partidos envelheceram e já está na forja um outro, para melhores e mais fecundas coligações. Mário Soares, ainda antes do fim do ano, terá de falar para o seu Partido Socialista, do qual o povo começa a desconfiar, achando-o já sem credo nem gente maior. Oremos.



CUIDADO, SOARES AVISOU-NOS: A VIOLÊNCIA ESTÁ A
CHEGAR, ABRINDO CAMINHO A UMA NOVA DITADURA

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domingo, novembro 03, 2013

AS CONTAS ORÇAMENTAIS E O ESTADO SEM CONTA

 
 O corte no dinheiro não serve qualquer projecto de reforma do Estado

 
   Após o corte

Depois da longa e atormentada viagem das facadas genocidas sobre a espantada população portuguesa, cada vez mais pobre e cada vez mais refém de uma Europa de volumosos Tratados  incumpridos e contraditórios, as pessoas das classes mínimas encolheram-se nas dívidas, entregaram à finança as casas e os bens que haviam adquirido ao abrigo das promessas de Bruxelas, aliás após a ventania das regras de abate de barcos de pesca, vinhas, fruta não calibrada e luzidia. O mar todo à nossa frente, oceano dos oceanos percorridos pela Nação até aos cinco continentes, e os barcos estilhaçados em troca não se sabe bem do quê, nem marinha mercante, nem apoio aos portos. Muitas plantações foram dizimadas em nome de um futuro cotado e melhor, dinheiro, enfim, na mão dos pobres aceitantes, sobretudo os trabalhadores da agricultu- ra, tesourada e rapidamente desabitada. Era uma espécie de reforma ou um ataque à soberania do país: porque tais medidas só podem ser tomadas caso a a caso, científica e sociologicamente. O corte, assim, assimétrico, assemelha-se a roubo, não favorece nenhuma União. Entre nós, o deserto aumentou, os pobres deixaram o chão, julgando-se ricos, e bem cedo contemplaram as mãos vazias, cada vez mais velhas e de novo vazias.
O dinheiro veio, às pazadas, mas não era para aqueles a quem a gorjeta, na avaliação por baixo das suas culturas, já definhava entre as couves meramente caseiras. E veio o alarme, a emigração, o famoso plano de ajustamento, uma espécie de estratégia para empobrecer o país e fingir que, dessa maneira, algo sobrava a fim de se pagar a dívida soberana. Os soberanos eram os Credores, de súbito agarrados a altos júris, trato de agiotagem global, redes de anotação e mando sem conversa sobre os países mais despojados. Era, e é cada vez mais, uma invenção maquiavélica, lá para os lados da América, enquanto a  Europa, gerida de esguelha, entre resgates manobristas e absurdos, nada fazia de semelhante para olhar mais de perto os triplos AAA, os CCC e o lixo. Um jogo infantil que desertifica os espaços verdes e obriga a vagas de fugas, quer do dinheiro, quer das pessoas.
Mas agora chegou o novo orçamento do Estado (em Portugal), feito pelo governo que tem andado a trabalhar para nós, esvaziando casas e algibeiras, sem conseguir objectivamente pôr ordem no déficit e retornar a um crescimento capaz de reconverter em parte os equilíbrios. Sugerindo haver já uns ténues sinais positivos na economia, vestígios, não sinais, o novo orçamento é mais do mesmo, uma fortuna sem nome obtida por cortes nos salários e nas pensões, mesmo pensões que já foram cortadas e que vão baixar em cerca de 50% do que eram. Não tem sentido, se o que retiram de outros lados mais institucionais não passa de um décimo do outro balúrdio, ou coisa parecida. Isto acontece, em boa medida, porque os Mamutes do dinheiro, desde longe, conquistaram a política e meteram-lhe uma arreata ao posto de pedra em São Bento. E nada disto foi medido a par dos efeitos colaterais: baixa-se uma pensão em mais 10%, depois do IRS e dos outros cortes, mas permite-se que os velhos e novos proprietários de prédios para arrendar possam inventar rendas que sobem sem pudor 500 ou mais por cento, igualando-se aos proventos exteriores do arrendatário. Ninguém tem de pagar os erros dos senhorios, se eles compraram casas a 8% de lucro, às vezes prédios inteiros, e não reconverteram nada disso perante as mudanças estruturais da sociedade, ficando à espera de um governo liberal que os libertasse sem responsabilidade. Os despejos (palavra que diz tudo e se associa a fezes) vão tocar a muitos, as filas já começaram, o desespero também.
Com este orçamento, os sinais ténues de crescimento vão afundar-se de novo e Portas terá de recolher aquele papel primário a que chamou projecto para a Reforma do Estado. Como é que um homem que tantas vezes escreveu com propriedade e oportunidade no Independente, hoje capaz de interessantes trocadilhos com o significado das palavras, boa dicção, cultura apreciável, nos vem entregar um mísero esbocete (também dito guião a propósito de nada) que se propõe ser dedicado à Reforma do Estado. Aquilo talvez sirva para um papel teatral, frases programáticas e ditos curtos como réplica para o futuro. Chega  a  parecer  um  exercício  liceal baseado, sem  verdadeiros capítulos  ou  geometrias de organogramas com leituras interactivas, consolidando conteúdos, funções, objectivos principais. Soltam-se os rouxinóis e uma grande percentagem do que é dito procura consolidar os ditames já assentes ali, afinal andamento do programa orçamental e de um futuro programa do governo. Nenhuma Reforma do Estado se extrai daquele documento. 
José Seguro, da oposição PS, continua a baralhar as palavras e as teimosias, porque um contraditório inteligente, de alternativas coesas a desfazer neoliberalismos duros, lentos, mastigados no baixo serviço da língua e dos contratos e da cultura, poderia abrir apelos, despertar algumas mentes e a pobre taxa de sucesso em que se encontra.

segunda-feira, outubro 21, 2013

CRÓNICA REVOGÁVEL DA CRISE SOBERBA

uma imagem que atormenta o homem
uma imagem que atormenta o fim do homem

fila de autocarros na passagem da ponte
 25 de Abril, manifestação da CGTP

19 de Outubro 2013, em Lisboa

Há cada vez mais faladores falando nas televisões sobre as lamas que elas próprias vomitam e transmitem, entre doses mamutianas de publicidade. São gente sem origem  ou sem rosto, marionetes da imprensa escrita e falada, opinadores das dúvidas actuais, embora capitalizando euros sem conta em volta dos conceitos medievais que os governantes do nosso país defendem com brio fundamentalista por causa da dívida soberana. Os faladores comentadores comentam falando acerca das sucessivas medidas cortantes que vão desabando sobre milhares e milhares de portugueses, funcionários públicos, novos e velhos, nos salários e nas pensões, tudo em massa e tudo pelas ordens olímpicas de credores encobertos, enormes, gananciosos, cuja tradicional corrente de créditos foi de súbito travada, um pouco por toda a parte, cobardemente, sob o jugo das famosas agências de cotação, claramente histéricas e nada subtis. Começou tudo onde teria de começar, nos EUA, entre fraudes financeiras indizíveis e pelo seu expansionismo negro a grande parte do mundo, já de si endividado e trocando as fronteiras pela cancerígena globalização. Os tratados que configuravam atrapalhadamente a União Europeia foram sendo esquecidos e as mãos alvas  da Alemanha e da França deram-se ao luxo de pensar e mandar por eles, os tratados, emitindo ordens, penalizações, níveis de deficit, planos "troikanos" de ajustamento austero e feitos de roubos benemértos, calculadamente. O mundo ardia sem perceber como, nós na linha de fogo, sem império, pobres antecipadamente pela ordem da Europa sobre os bens de trabalho e produção, barcos, searas, vinhos, mares, gente, terras ou culturas. Deram-nos dinheiro para restaurar patrimónios, infraestruturas, vias de rodagem, serviços, se calhar sevícias disfarçadas. E tudo recomeçou pela mão do Passos e do Gaspar e do Portas. Tinham tesouras fabricadas em Dresden, geriam cavalgaduras recentes, da JSD, JSDD, JSKD, entre outras. A linha liberal enrolou-se em voltas de lana caprina, afastando-se da coroa «grisalha», ministros do tempo de Mário Soares, antigo lider do PS e agora arauto da caverna da oposição, arredores dela, bramando palavras de apito, porque tudo é demais, até parece «delinquência». Já a esperança se esvai e a ministra das Finanças, esbelta de falas rápidas, diz que lá para diante tudo se arranjará. Logo os povos passaram a manifestar-se em oceanos de pessoas, descrendo de terem que passar fome para pagar em pouco tempo a dívida insana, com juros altíssimos, impróprios de qualquer civilidade, no conjunto somando o dobro ou o triplo da própria dívida, soberana e desalmada. Ninguém percebe nada, nem Deus.
Ora os faladores explicaram mal os casos normais de personalidades angolanas que, colocando dinheiro em Portugal, entre elas se desentenderam, accionando processos em Luanda e depois em Lisboa. As coisas andavam nas bocas do mundo dos dois países e hoje as gargantas desafinam, parecem falar de fanatismos clubistas. Rui Machete, nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros, ao falar na Rádio de Angola, adocicou o caso dos processos, que a fundo ninguém conhece, pediu desculpa por coisas mal entendidas e menores. Desabou tudo em blasfémias, o Jornal de Angola acusou os intelectuais portugueses de corrupção. E o hoje Estado Independente compra milhões de coisas na avenida da Liberdade, em Lisboa e arredores, porque em Luanda e em toda a Angola ninguém adjectiva feio. A grande fortuna do país, onde o povo gosta de muita gente de cá que fala português como eles e da sua diáspora por cá, como a nossa por lá. Oxalá os angolanos possam nivelar melhor as diferenças entre pobres e muito ricos, pois há nesse peadaço de África poder para isso. Eduardo dos Santos falou para dizer que as coisas por aqui não iam muito bem, coisa que é do mundo inteiro, incluindo Angola, a própria América ou a China. Os Agolanos que compram e investem largamente nas lojas luxuosas de Lisboa sabem bem dos seus irmãos bem colocados que vivem em Portugal, ocupando linhas de decisão e poder notáveis, muitos dos quais já sedimentaram para o futuro uma vida aqui. Falando simples, por mim penso que se a nós não cabe emitir lições de moral, a verdade é que Angola também não tem esse direito, nem todas as mãos são alvas, sem um torrãozinho de sujidade. Ninguém tem tal coisa assim, sejamos justos. Os nossos procuradores são vítimas da grande liberdade em redor, mas esse preço é minimizado, pois eles procuram zelar pela justiça, sem distinguir generais de soldados, entre melindres difíceis de gerir. Como se reclamou para iguais personalidades em Luanda. O discurso chantagista não deve acontecer nem lá nem cá. As escritas de ambos os lados devem esquecer os euros e os dólares e os quanzas, porque qualquer dia Deus acorda desta longa e suprema ausência, zurzindo toda a gente em todos os continentes. Acabará com o petróleo e derramará dilúvios para harmonizar os restos em bonomia, uma Arca de Noé para cada pedaço de terra. Já dizia a Bíblia, que foi sobretudo falada para adormecer os meninos maus vindos do tempo neolítíco, entretanto neo-liberal. Então, Obama, acaba com isto e os teus empedernidos republicanos. Olha que vamos todos terminar como talibãs.

quinta-feira, outubro 17, 2013

É PRECISO CALAFETAR A CARAVELA PORTUGUESA




Portugal criou as mais diversas embarcações, entre as quais as caravelas, belas naves de navegar e de que todos nos lembramos. Desenhámos e modelámos em bom pinho outras peças de maior calado, as naus, grandes veleiros que transportavam tropa, mercadorias e demais dentes através dos oceanos, o Índico, o Atlântico, ligando Lisboa a África, ao Brasil e à Índia. Sofreram muito os nossos marinheiros, edificaram-se fortalezas nos pontos fulcrais da costa deste império. Para os que governavam o país, entre a corte e os soldados, o povo, os camponeses, os que andavam por fora (sem comunicações céleres) sobravam um pouco os nossos primeiros imigrantes, emigrantes, moços que por vezes viviam povoando as terras, mandado nelas, casado com mulheres de lá, morrendo longe. Afinal como agora, numa altura em que nada nos resta dessa memória, tudo se foi esquecendo, até na Escola, tudo foi dando lugar à mediania, à República e à Ditadura. A Ditadura, ao querer honrar aqueles tempos, foi sempre incompetente na escolha dos artistas e dos monumentos, apesar de subsistir para todos (os que tivessem olhos) o mosteiro dos Jerónimos e outros casos assim. Mas era só para olhar, esquecendo. E o que foi mesmo para olhar, foi a Exposição do Mundo Português, que deixou sequelas, novas fantasias, novos academismos.
Estamos enfim na Europa, enganados mais uma vez, porque esse espaço é um antigo teatro de duas Grandes Guerras (com a Alemanha como adversário principal) e nunca aqui se ganhou um verdadeiro sentido de solidariedade, sendo mais uma vez a Alemanha o motor centralista de tudo, sem que os tratados funcionem, nem o euro, nem os resgates. E por isso Portugal, a quem abateram a frota pesqueira, a marinha mercante, grande parte da agricultura e alguns outros bens da nossa tradição e da nossa natureza, sendo afinal o verdadeiro rosto que a Europa tem virado para o Oceano a ocidente, está hoje empobrecido, abandonado por novas vagas de emigrantes, o casco roto, as velas rasgadas, a carga vendida ao desbarato, sem rei nem roque, sufocando pelas assombrações do Governo, na falta do dinheiro escondido, pelas fundações e institutos ou empresas públicas. 
Um dos nossos principais políticos desta viagem dita democrática, Mário Soares, foi tudo um pouco, redentor e Primeiro Ministro e Presidente da República, está entretanto na onda dos 90 anos e continua escrevendo e «descolonizando» tudo em volta. Não sei se recebe a sua reforma de Presidente nem o subsídio do Estado para a sua Fundação. É aventureiro ainda, muito depois de ter permitido, entre Governos Provisórios, que se consentisse na trasladação violenta da população branca que se encontrava em Angola, lá deixando bens, indústrias, tudo, e a isso chamando descolonização. Vê-se, com o devido respeito que nada disso aconteceu, basta ouvir o Presidente de Angola, Eduardo dos Santos e o Jornal de Angola que nos acusa de vivermos sob o mando de elites intelectuais corruptas e um garbo intolerável de paternalismo. Esta do paternalismo era do tempo das revoluções e das guerras pela independência. Já não tem cola, é preciso inventar melhor. E se Mário Soares, que o país continua a saudar, se esqueceu da necessidade de contenção ou da fala apropriada para tratar governantes nacionais e estrangeiros? Não seria bom que os rapazes do governo, a quem ele chamou  delinquentes, palavra juridicamente irrevogável, lhe  movessem um processo por difamação ou falta de respeito. Houve mais graças destas e pela parte do mesmo autor. Eu estou em desacordo com o Governo, posso chamar-lhe os nomes que quiser em casa, mas em público e publicadamente não me atreveria, apesar do mal que já me fizeram -- porque em nada vivi acima das minhas possibilidades, asneira que apenas cobre anteriores entidades de gestão e certos grupos de casino ou empreitadas deslizantes. 
Delinquentes? E os mercados? E as empresas de anotação? E os erros da Europa, o escárnio com que nos tratam os SENHORES do Norte? Essa dicotomia e o modo como um só país manipulou os destinos da Europa, impedindo medidas, convocando reuniões, passando ao lado do Parlamento e da Comissão? Que plano é este da Troika e que júbilo os nossos amigos europeus exprimiram perante o actual Orçamento de faca e alguidar? Eu acho sinceramente que a escala mamutiana dos juros da dívida, que a tornam impagável, deviam ter tectos de concertação internacional, porque os actuais, por qualquer minuto esquizofrénico dos mercados, são de um nível de agiotagem sem nome.
Um abraço ao Dr. Mário Soares: a perspectiva da sua linguagem de hoje deve ser corrigida. Porque este Governo pode ganhar pontos de desculpa e o senhor pode perder o nosso  antigo respeito. Ou então solicite a dos Santos para nos dizer se tem conservado bem o património que milhares de portugueses tiveram de abandonar, sem preço, à avalanche de gente que foi empurrada para uma estúpida ponte aérea, sem futuro nem passado. Falo da maioria, dos verdadeiros inocentes.

terça-feira, setembro 24, 2013

PAÍS SEM DINHEIRO E OS MARRETAS DO RESGATE

                                  Passos, o nosso Primeiro


Medina, o nosso Carreira


Medina Carreira, bom arauto das análises económicas e nunca pronunciador da mais vulgar descoberta de soluções substantivas, disse ontem que não há dinheiro, Portugal não tem dinheiro, e por isso é inevitável cortar segunda ou terceira vez as pensões dos que alguma vez trabalharam, sob tutela do Estado, para o país. Um amigo meu telefonou-me e disse-me que estava à beira da falência, porque a sua pensão de professor universitário tinha sido cortada logo no início do actual processo de ajustamento e iria, com os novos cortes, ficar reduzida a 1200 euros, o que colidia com o aumento irracional da renda da casa de 100 para 1000 euros, pelo que lhe restavam uns inacreditáveis 200 euros e ninguém acreditaria, nem as Finanças nem o Primeiro Ministro, que ele, sua  mulher e filho, pudessem ter no Banco apenas 5000 euros. Vivera tempos difíceis com doenças dos velhos pais, um a seguir ao outro, situação que o obrigara, além da bondade do Serviço Nacional de Saúde, a tratar em casa tanto a sua mãe, com um cancro irreversível mesmo depois das arrasantes quimioterapias, e o pai, três anos seguidos, com o pavoroso mal de Alzheimer.
Fiquei a pensar nisto e em muitas outras coisas semelhantes, no contraditório e selvagem mundo de hoje, um mundo sem razão. O Primeiro Ministro anda a meter medo a toda a gente, porque um novo resgate não é uma harmoniosa continuação do tal ajustamento: é sobretudo uma bruta reedição daquela  austeridade mítica, forma de arrasar equilíbrios, classes e patrimónios históricos e culturais. O FMI, que não aplica à prática as suas deduções técnicas dos últimos tempos, a ideia da austeridade bruta e rápida que apenas traz autodestruição, tem troikas metódicas, laminares, sem nenhuma perspectiva do particular e do humano. Nunca resolveria os equilíbrios que salvariam o meu amigo reduzido a 200 euros. Medina também não, a ronronar com piada e a mostrar evidências, obviedades: bem diz ele que basta fazer as contas. Ele soma e sobretudo subtrai. A troika subtrai, em nome de credores sem rosto, de mercados esquizofrénicos e irracionais, de gente que empresta dinheiro e tem depois um espaço sem lei, sem medida, para exigir o pagamento em dois anos, três anos, custe o que custar. A juros paranoicos.

sábado, agosto 24, 2013

O DELFIM E OS SÁBIOS DA LÍNGUA PORTUGUESA




«Andar a esconder adjectivos não tem sentido.»
  

SE QUER SABER MAIS CLIQUE NA PALAVRA 


sexta-feira, agosto 09, 2013

CORTES, DESERTOS E AS REFORMAS POR FAZER


Chegou uma nau muito atrasada, trazia mortos a bordo de mistura com especiarias para venda aos outros impérios, sempre através de gente de travessias curtas e distribuições gananciosas, entre a Inglaterra e outras monarquias do Norte. Portugal tinha um Império, sempre mal gerido, é verdade, mas cheio de invenções e batalhas e descobertas. Desta vez ficámos à espera, mordendo enguias e fulanizando eventos nobres, outros populares, actos ímpios da Primavera. Mas a Europa estava por moldar e só depois do século XIX se viu, no avanço da revolução industrial, qualquer coisa de jeito, uns comendo outros, uns separando-se dos outros, era quase a Europa, a Península ainda dividida do lado de Castela, Portugal unificado mas empobrecido, a nobreza caçando, pintando, com gente pela rédea ou fazendo empobrecer o rei por se apalaçar cada vez mais. E assim matámos um rei e empurrámos a República para a rua, partidos, lutas, criações modernas, barafunda como hoje e pouco depois uma ditadura entre brandos costumes, gente remediada ou pobre, pagando indústrias maneirinhas, continentes à nossa mercê mas caros de frequentar para sempre. E vieram as guerras da Europa, Primeira e pouco tempo depois a Segunda, a Alemanha andava cheia de si, até amparou o Hitler, um agente não sabe de onde, que proclamava que a raça ariana iria conquistar o mundo por um longo período de mil anos. Morreram quarenta milhões de pessoas, o Hitler suicidou-se, os países aliados ocuparam o país, logo se arranjaram para deixar o que era justo e pagaram para que a Alemanha se construísse. Assim foi e continua, a leste do grande projecto da União Europeia, agora a falhar sob a tutela de Ângela Merkel, senhora da antiga Alemanha de Leste e que governa a unificada Alemanha, mais a própria Europa, ajudando a dissipar as solidariedades e os tratados de há 60 anos para cá, de tal sorte decidindo com Sarkozy (que já foi) as grandes assembleias entre países do euro, ministros todos, eles acima de Presidente e Banco central, ordenando não sei como, desbaratando a construção em desconstrução e países arruinados como a Grécia, Portugal, Espanha, Itália, Irlanda, Chipre, entre os que disfarçam. Países em resgate, troika igual para todos, cortes a sangrar, gente a pagar impostos, duas, três vezes, um governo roubado da grandeza socialista, com Sócrates e o PEC 4 a perecerem na última maravilha dos combóios dos 300 à hora. Era o desvario de não perder a honra entre tanto boato e tantos recuos sob o disparar das línguas no vento das fugas.
Vieram o Passos e o Portas e o Gaspar, os principais mareantes da nau que afinal se afundava e que já estava nas mãos, pela terceira vez, do FMI, um plano feroz de empobrecimento do país para correcção do déficit e abrir condições para iniciar o pagamento da dívida. O país rendeu-se, de joelhos, alguns voltados para Meca, comunistas e sindicalistas ocupando festivamente as ruas com manifestações engalanadas e muitas palavras de ordem. Parecia o PREC sem Copcon nem o povo é quem mais ordena. 
Havia dois anos de pelintrice, Gaspar (finanças) falando cada vez mais em cortes, (cortes enormes, colossais) até se ter demitido com uma carta cínica, de falência pessoal e dedo apontado a outros como um cata-vento. A enigmática figura da entretanto nomeada Ministra das Finanças, Maria Luis Albuquerque, foi logo acusada (por uma palavrosa e ensandecida oposição) de génio do neoliberalismo. E logo ela foi chamada à «Comissão dos swaps,» ali foi espadeirada pela Ana Drago durante quatro horas, na mais impiedosa e humilhante batalha de palavras que jamais me foi dado ver. Pensei logo, porque o Portas já se demitira por não gostar desta gente e até do próprio teimosismo do Passos: isto vai mesmo para o maneta, dizia-se. Mas ainda não era a hora e o Presidente da República criou um jogo charada para os meninos se reunirem, incluindo o avesso Seguro (o homem que apitava eleições já), coisa que eles fizeram a contra-gosto, enquanto Cavaco saltitava soberania pelas ilhas Selvagens, cheias de ecossistemas e cagarras. Quando voltou só havia cábulas escritas, ouviu cada um dos parceiros, mandou que Passos reunisse o governo remodelado, revogada a irrevogável demissão de Portas: tudo feito em 24 horas e reiterado em 24 minutos.
Mas a malta comentadora, televisões, congressos, professores, toda a gente do Bloco e do PC, alguns independentes, todos barulhavam contra, governo podre, bancos exíguos, para a rua tudo, é preciso negociar a dívida, não aos cortes, que é isso de 4,7 mil  milhões de euros COMO  reforma do Estado?
Peço desculpa: era aqui que eu queria chegar: não há nada para fazer a reforma do Estado correndo com funcionários antes de se saber quantos os necessários, quanto custa refazer estruturas, ordem e graduação das gentes, o que fazem, para quê e para que país, incluindo uma constituição novinha em folha. Os 4,7 mil milhões é para o que quiserem (pagar juros, abrandar o déficit, juntar em espectáculo para recolher credibilidade nos mercados, tudo menos a reforma do Estado). O Estado é uma realidade nuclear do país, com a sua forma, a sua rede de serviços e prestações, tem de ser pensado, ajustado a um novo contexto e a novos objectivos, sobretudo desenhado, municiado, adestrado. Já ouviram falar em organogramas? O Estado não se monta sem ter primeiro o seu organograma e a narrativa técnica e filosófica dos seus conteúdos. Saber onde se organizam os pontos de projecto e decisão, os lugares da logística, os funcionários necessários e onde, no centro e no país em geral, com que ligações e mínimo gasto. Que serviços integra e presta. E, no fim de todo o projecto desenhado e narrado e calculado (quanto custa) poderá falar-se em números. E isto não deve ir em bruto para a Assembleia da República, onde se grita cada vez mais e os partidos cavam a própria sepultura na indigência teórica e populista a que chegaram. São clubes de futebol em dívida e a swapar jogadores. Fico nulificado quando vejo o bom Mário Crespo a ter no seu programa o tema dos swaps, durante oito dias seguidos, como agenda de trabalho, entre vozearias. A comunicação social atingiu, sem pensar a sério sobre nada, o vértice do pouco, sem reinventar os dados da reflexão.
E ainda uma coisa. Ao governo actual: se vão cortar pela segunda vez pensões, façam favor de ver se há constitucionalidade nisso. E sobretudo avisem por escrito as vítimas. Não recebi nada sobre tudo o que intempestivamente  me comeram de forma subreptícia e iníqua. em perda, enquanto os cortes da governança vieram sem notícia, deixando a fome alastrar pelas caves. É isto que querem fazer hoje. E as rendas? Não falo das PP. Falo das casas, habitação é um direito: as rendas têm de subir caso a caso, com percentagens que não matem mais gente e criem maiores assimetrias. Uma renda de 100 euros (prédio com vinte anos, duas assoalhadas, em Telheiras) não pode, é crime, subir para 1000 euros. Senhora Ministra das Finanças: gostei da sua velocidade a pensar e a falar com uma boa parte de razão; mas neste caso devia ser um pouco mais activa, picando os seus colegas e renegociando desde já a assombrosa lei das rendas.
Espero para ver. A nau que chegou ali perto do farol inclinou e parou: trazia mortos e vivos. E os vivos tinham salários cortados e em atraso, o capitão fora mandado fazer isso no «limite», dando apenas água aos desapossados jazendo nos porões. Em terra já fazem isso há que tempos, encolhendo os ombros aos que emigram cada vez para mais longe, para a enorme Austrália. E já viram portugueses doutores nos desabrigos de Detroit.