31 de maio de 2010

Dúbio

Outro dia esmaguei uma pétala de rosa sobre a língua porque precisava descobrir o gosto daquela textura aveludada. Achei um tanto estranho aquela delirante mistura agridoce, mas num gesto incontido ainda coloquei mais algumas pétalas na boca como quem não resiste à vulva do poema. Se há alguma transgressão nisso? não sei.  Lembro que, eram as rosas que o meu chefe tinha comprado para a esposa dele.
Mas o melhor das pétalas e dos lábios é o sentido dúbio. Isso me remete a um poemito de uma moça - Martha Medeiros, que para o instante é irresistível:

“Beije-me as coxas,
pálpebras, dedos, lóbulos
os dois

Beije-me os seios
um e outro, que são ciumentos
ambos

Beije-me os lábios
superior e inferior
os grandes e os pequenos

Todos.”

27 de maio de 2010

Um maio idêntico a um setembro


Não importa que tempo é esse que tenho contado e esperado.
Não quero nada ou preciso de tudo.
Certo é que não posso me perder do meu abraço.
Nem me soltar dessa enorme vontade de ser as coisas.
De agarrar tudo, até as unhas estarem sagrando e os dentes doendo.
Guardo sempre todos os momentos bons para apenas um
Que não sei qual é, o que é ou quem é.
Não importa também saber das coisas
Desde que eu possa continuar essa dança sem véus.
Não é preciso mesmo saber das pessoas.
É tão indigno uma pessoa respondendo sempre as mesmas coisas, querendo sempre igual.
É tão enervante essa imobilidade, esse marasmo moral que transcende a morosidade de um maio idêntico a um setembro.

Valéria Sorohan

24 de maio de 2010

A cidadã típica telespectadora


Imagine a seguinte sequência de cenas: a ação transcorre num fim de tarde de um dia qualquer. A cidadã típica termina mais uma jornada de trabalho.
Sua vida é pautada pela rotineira trindade do "bulot - metrô - dodô" (trabalho - transporte - descanso). Ao chegar em casa, e antes de dormir, decide assistir um pouco de tv. Liga o aparelho e...o que aparece na tela? Uma ilustração de suas ideias fundamentais sobre o louco desvario da tragicomédia erótica entre os sexos.
O filme é como um espelho para ela, uma superfície luminosa onde tudo pode vir a ser projetado. Mas há uma única coisa, porém, que nele nunca se reflete. A imagem da cidadã típica telespectadora, personagem excluida, ausente do campo visual.

Valéria Sorohan

21 de maio de 2010

Difusão


O poema não é azul

Nem verde.

O poema é verter-te azul

E ver-te.


Valéria Sorohan

18 de maio de 2010

Mãos que falam



Mãos que falam,

Palavras que precisam ser lidas,

 ouvidas.

Mãos que tocam,

Na imaginação de quem está

do outro lado.

Outro lado que tem,

Mãos que teclam...


(Valéria Sorohan)


Falta muito para sexta-feria.
Sexta-feira ainda tem hífen?
Hífen ainda tem acento?

14 de maio de 2010

Pretérito perfeito do indicativo... verbo mentir


jhjhkjjjbhhjjhgvffitftf tffccghfuyguyguyfufgcchcgfgiiuyuyuyiuiuiuuyuufufytfytyytftttfuj/s#%lkjkljlkjlkjlçkjkjlkjlkjlkjlkjlkjlkjlkjlkjjlkjlkjljlkglkjlkjljljiuoijojiodoieoijfoiujfoifjoodfij%o*ijod#m@jdjajp

Não adianta bater nas teclas de forma livre, textos são exemplos de reflexões e estas estão pesadas no momento!

12 de maio de 2010

Estórias nossas


Eu ficava intimidada quando você me dizia oi, e eu não sabia se repetia, ou se inventava um outro oi. Só queria mesmo era ficar quieta e te ouvir.
E tinha vontade era de não ser nada de não fazer nada nunca, a não ser ficar estática dentro da sua voz noturna, que me contava sempre estórias novas, jamais ouvidas, estórias suas. Às vezes eu precisava, não que eu precisasse por mim, carecia falar para que você continuasse, pois que você parando eu morria.
Você escutava coisas que o ar te dizia, eu escutava o ar e você me traduzia. É mesmo verdade, eu cortava as palavras, encurtava as frases, roubava o sentido de tudo e partia tudo ao meio, para que você tivesse espaço. Meu Deus, como eu queria ter espaços, todos do mundo para te ter sempre meu. Eu dormia muito mais do que precisava, para você entrar em meu sono, roubar meus sonhos e depois inventar estórias nossas.

por Valéria Sorohan

10 de maio de 2010

Além do alcance



Quero me confundir com o céu
Flutuar no espaço que há entre o real e o irreal.
No espaço que há entre minha mente e meu corpo.
Sem culpa.
Sem pensar.
Sem querer.
Sem ser nada.
Nada, nada, nada.

por Valéria Sorohan

7 de maio de 2010

Estado de mãe

Imagem da artista Susana Tavares

Aos nove meses, a criança se desprende do útero da mãe e nasce.
Toda gente sabe disso - o médico parteiro, a enfermeira que cortou o cordão umbilical, os parentes ansiosos por saber se a criança era menino ou menina.
Toda gente sabe que a criança nasceu, menos a mãe.
Para ela, a criança continua sendo parte do seu ser, continua a se integrar à sua carne, aos seus tecidos.
Durante anos preparou-se para esse momento:
A maternidade.

Valéria Sorohan

5 de maio de 2010

Cotidiano blá blá blá

- O que é isso?
- Ah, é a caixa que usaram pra embalar meu presente.
- Posso ficar com o plástico-bolha?
- E pra que você quer isso..?
- Ué! Pra estourar, é claro. Pra que mais?
Minha mãe faz cada pergunta às vezes...


- Não cara, não adianta tentar me convencer.
- Mas Deus é amor, Deus é luz, só "Jesuis" salva, e na Igreja ...
- Tá,  eu já tenho minha religião e já sigo o meu Deus.
- Mas a sua religiâo tem uma visão errada e...
- Tá dizendo que o Deus da tua igreja é melhor que o da minha?!
- Bom, é o Deus verdadeiro...
Conversa  com um evangélico fanático  que tentou me catequizar


Não lembro exatamente o que ele fez, mas chamei meu irmão de "pentelho".
Ele odeia essa palavra, mas como ele não me espanca (mais), valeu da psicologia direta.
- Você sabe o que significa isso?
- O que?
- "pentelho".
- Alguém chato, ué.
- Não. Pentelho é o cabelo do saco.
- Ai, nada a ver.
- É verdade.
- Ai que horror...

3 de maio de 2010

Vontade de ir além



Tenho pensado muito sobre o futuro.
Melhor que ficar presa em um presente impregnado por um passado que já não quero mais lembrar.
Aprendi que fantasiar é bom!
Atualmente ando pensando em anjos que vivem brincando nos meus sonhos,
eles beijam demônios do céu da minha boca.
Quem sabe me deparo com algum deles nas esquinas da vida.
E quer saber? Não vejo a hora disso acontecer.

Por Valéria Sorohan