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segunda-feira, 30 de junho de 2008

“O livro da vida”...

O povo aceita ou, melhor, aceitava com a maior naturalidade a doença e a morte, argumentando que “estava escrito”!
Sempre me fez uma grande confusão este comportamento, com o qual convivi durante a maior parte da vida e que ainda verifico, hoje em dia, quando falo com as pessoas de mais idade. Obviamente que a razão de ser deste fatalismo não se baseia em conhecimentos de natureza genética, mas sim numa educação religiosa, segundo a qual, à partida, o nosso destino estaria traçado lá para as bandas de cima! “Está tudo escrito no livro da vida. Não há volta a dar-lhe”! Ouvi esta lenga-lenga até à exaustão. Ainda ficava mais aborrecido quando vinham com a conversa da ressurreição lá para o fim dos tempos. Perguntava se as pessoas apareciam com os seus corpos doentes ou sãos e em que idade, a mesma quando morreram ou outra qualquer à escolha do cliente? E para que servia ressuscitar o corpo? Havia lugar para toda a gente? E o que é faziam a seguir? Enfim, perguntas fazia a torto e a direito, mas quanto às respostas, bá... não me convenciam!
A doença surge de um desequilíbrio entre a nossa constituição genética e o meio ambiente, condicionado pelo comportamento.
Estilos de vida saudáveis associados a uma dieta equilibrada e a mais exercício têm um efeito notável a nível genético. Ou seja, o factor genético pode modificar a sua expressão de uma forma dramática e até há pouco tempo impensável.
Um estudo recente permitiu verificar, ao fim de três meses de mudanças alimentares e de um exercício moderado, mudanças no funcionamento de centenas de genes, além da perda de peso, da redução da pressão arterial e melhoria de outros indicadores de saúde. O que é certo é que ocorreram mudanças da actividade de 500 genes, 48 foram ligados e 453 desligaram-se! A tal frase, “está tudo nos genes” tem que ser revista, porque é possível modificar a expressão genética que pode ser tanto responsável pela doença, quer pela promoção da saúde. A confirmar-se este achado, abrem-se novas e significativas esperanças mesmo para aqueles que já estão doentes, ao jogarmos com o “ligar e o desligar” de genes tão importantes na expressão da doença. Quem sabe, por exemplo, se certos “milagres” não resultam de modificações comportamentais, mais saudáveis, ou outros, capazes de alterar a expressão dos genes?
Este estudo abre novas perspectivas e lança esperanças na luta contra muitas maleitas, e a nível do “livro dos genes”! Afinal, é possível reescrever, a qualquer momento, o “livro da vida”, mesmo que seja contra a vontade de alguns... Ainda bem!

Fardeta minimalista!...


Referiu há dias o DN que um polícia foi alvo de processo disciplinar, por ser encontrado de calças rotas em pleno exercício da sua função. Ao contrário, penso eu, o agente deveria ser louvado, já que se limitou a procurar as melhores condições para exercer o seu múnus, lembrando-se que uma ranhura na vestimenta lhe daria arejo e conforto para melhor atender o cidadão na via pública. Mas o DN, que investigou o caso, não pensa assim. Atribui a ranhura à falta de liquidez do agente para renovar o hábito que o faz polícia, sendo que as calças vão encarecendo dia a dia e o subsídio é o mesmo de há 19 anos. Claro que eu penso que um sujeito que é principescamente pago com 750 euros mensais tem toda a obrigação de andar com a fardeta inteira e bem reluzente!...
E, se estiver curto de disponibilidades, tem que saber imitar a perspicácia de uma sua colega que, para não andar de sapatos rotos, os compra na candonga:”compro-os nos ciganos por 5 euros e são mais confortáveis. No depósito custam 23 euros”, referiu. Desconto ciganal, certamente em contrapartida de maior liberdade para expor e vender pacatamente o material contrafeito… Amor com amor se paga. Também as policiais blusas, assim compradas na feira, se vão reduzindo ao mínimo, depois da primeira lavagem, mas com a enorme vantagem de fazerem ver as polícias com olhares muito mais atentos.
Também ontem vi, na Praia Grande, 4 policiais garbosamente montados em bicicletas. Soube que o privilégio de pertencer à Divisão Velocipédica e andar na praia tem os seus ónus, nomeadamente o de se ter que reparar as bicicletas, por conta própria, claro, quando estas se avariam. Mas as vantagens são claramente maiores, pelo que tal Divisão não tem mãos a medir para seleccionar os candidatos. É que, usando calções e camisola de manga curta, uma parte importante do vestuário não é susceptível de se rasgar, e o risco de processo disciplinar sai consideravelmente diminuído.
De qualquer forma, compreendo agora nunca ver os polícias no encalço dos ladrões: é que, para além do incómodo, se rasgam as calças na corrida, ainda têm que as pagar, para além de levarem com processo disciplinar!...Mais vale estar quieto!...

Se a situação do País não fosse trágica, dava para rir a bom rir!

Já poucos se recordam dos Meninos de Huambo, "à volta da fogueira", cantados por Paulo de Carvalho. Uma canção que ficava no ouvido mas que sobretudo despertava, fácil, a emoção das coisas que falam das inocências, ilusões e esperanças da infância.
O País desvanecia-se sempre que o Sargentão Scolari tratava de "seus mininos" os matulões da selecção nacional (de quem as crónicas rezam modos de vida muito pouco inocentes)
Foi este sentimento que se pretendeu transmitir quando o iluminado de serviço no PSD resolveu sublimar a irrequietude de Pedro Santana Lopes na imagem do Menino Guerreiro.

Quanto se pensava que esta era a última das patéticas meninices, eis que Eduarda Maio descobre dar à biografia de Sócrates o título de Menino de Ouro do PS!

Inflação na zona Euro sobe para 4% - BCE pronto a disparar

São notícias de grande destaque hoje:
- A nova subida da taxa de inflação na zona Euro, agora para 4%, valor mais elevado de sempre;
- A situação financeira de crescente asfixia do sector das Famílias em Portugal, das mais endividadas da zona Euro, suportando serviços de dívida cada vez mais pesados, deixando antever um crescimento exponencial da taxa dos incumprimentos do crédito bancário a particulares ao longo dos próximos meses.
Este último tema é objecto de particular destaque na edição de hoje do DEconómico.

Estes temas estão obviamente correlacionados.

A subida da inflação para o valor mais elevado de sempre desde que a nova zona monetária foi criada, já lá vão 9 anos, torna agora inevitável o disparo de uma salva de aviso pelo BCE, com munição 0,25%, passando a sua taxa principal para 4,25%.
Devo confessar as maiores dúvidas quanto à eficácia desta medida para reduzir uma inflação que é resultante de um rápido e sustentado aumento do preço das matérias-primas importadas, determinado em primeiro lugar pelo imparável consumo das economias emergentes.
Mas tenho também a percepção de que o BCE não vai ficar por aqui, é muito capaz de aumentar mais vezes os juros até ao final do corrente ano.

A subida dos juros pelo BCE e também a crescente dificuldade em obter “funding” externo para apoiar o crescimento da carteira de crédito, vão acentuar as dificuldades financeiras de todos os sectores institucionais em Portugal - com especial relevo para as Famílias, sujeitas a encargos cada vez mais pesados das prestações de juros dos seus empréstimos.

O panorama é bastante negro, uma vez que coincide com um declínio acentuado da actividade económica em geral e em Portugal muito especialmente.
É neste momento utópica a previsão oficial de uma taxa de crescimento do PIB de 1,5% para o corrente ano: direi mesmo que é mais utópica do que era a anterior taxa de 2,2% quando foi anunciada como um dos pressupostos do OE/2008.
O crescimento não deverá chegar a 1%, poderemos mesmo ficar muito perto da estagnação.

Face a este cenário, torna-se indispensável rever, urgentemente, as prioridades da política económica em Portugal
Creio que seria boa ideia avançar com a formulação de uma Estratégia Nacional de Financiamento da Economia (assunto para próximo POST), que, entre outras coisas, coloque de vez na prateleira a loucura do Programão das obras públicas – apesar da fabulosa rendibilidade dos projectos em causa, que o nosso “Ideólogo do Betão” (M.L.) não se cansa de apregoar.

domingo, 29 de junho de 2008

"Eu é que sou de esquerda!"


Tão divertida como aqueles episódios do Herman José em que o personagem se chegava continuamente à frente sempre que as câmaras da TV reportavam um acontecimento e se apresentava com um entramelado "eu é que sou o prrreesidente da junta!!" é esta disputa concursal entre Sócrates e Louçã sobre qual deles é de esquerda.
É importante, direi mesmo decisivo, fundamental para a vida e felicidade dos portugueses, tirar a coisa a limpo. Pelo seguinte, que de resto toda a gente sabe.
Ser crismado de esquerda é assim como ter sido parido pela coxa de Minerva. Purificado de toda e qualquer impureza. Ser de esquerda é ter sido ungido com esse óleo sagrado que nos faz profundamente solidários com os pobres e os excluídos. Por-se ao lado dos desgraçados, dos minoritários mais exóticos. Declarar guerra aos interesses. Ser apóstolo da liberdade e do permanente direito à indignação, da igualdade de preferência na pobreza ou no remedeio que a fortuna corrompe.
Ser de esquerda é não ser de direita. E ser de direita é estar possuído de um mal congénito que jamais terá redenção.
Ser de esquerda é tudo isto e muito mais do que possa ser, ainda que vagamente, identificado com o imaginário dos grandes momentos de agitação social que põem termo à quietude dos tempos, tipo Maio de ´68.
Tudo, mas sem abdicar do direito individual à qualidade de vida. Da qualidade que proporciona o BMW, os almoços e jantares nos restaurantes mais in, da camisa ou dos sapatinhos de marca, das férias no estrangeiro.
E de um bom perfume.
Que a esquerda a fedorar a fuligem ou a suor do sovaco posto à mostra pelo punho erguido, é coisa do passado.
A esquerda moderna é perfumada. Cheira suavemente a rosas.

Leonor Beleza

Pouco se falou da nomeação da Dr.a Leonor Beleza para o Conselho de Estado onde substituiu a Dr.a Manuela Ferreira Leite.
Tenho da Dr.a Leonor a ideia de uma mulher notável, que tive o privilégio de conhecer como minha mestra de Direito da Família.
Leonor Beleza foi vítima da coragem com que assumiu funções governamentais num País onde alguns poderes efectivos não perdoam que os desafiem ou afrontem os seus interesses. Pagou o preço da acusação mais horrorosa que se pode dirigir a alguém.
Creio que, a par do reconhecimento dos méritos e da idoneidade da cidadã, esta nomeação é também um acto de justiça. Justiça que, não o esqueçamos, começou por ser feita em vida por António Champalimaud, num gesto tão inteligente como igualmente corajoso.
Aqui fica, singelo, o registo.

Pois é!...


Depois do heptacampeonato, a Taça.

Nas cores azuis e brancas continua a haver mais vida, para além do futebol!...

Cultura de "nível internacional"!...

A Notícias Magazine, revista do DN, publica hoje uma excelente entrevista com o músico e compositor António Pinho Vargas.
Entre outros pontos muito interessantes, António Pinho Vargas desmonta todo o circo dos festivais da música erudita. A observação pode ser estendida, sem qualquer abuso, penso, ao cinema, à arquitectura, às exposições, ao próprio teatro. Aqui se deixa um excerto.
“…O mundo da música contemporânea funciona como uma espécie de núcleo duro, que é constituído por uns 15 ou 20 programadores de festivais de música internacional na Europa, ou seja, um clube restrito, quer para os compositores quer para os programadores. É como o circo da Fórmula 1… Os compositores que são programados em Estrasburgo, em Paris, em Berlim são sempre os mesmos e as promoções limitam-se a circular unicamente dentro dessas redes. Os críticos viajam com os compositores, são amigos deles, os vendedores de casa de partituras que os representam também, ou seja, trata-se de um circuito muito restrito. O que me espanta nos produtores portugueses é que jamais foram capazes de negociar uma troca. Se houvesse uma balança de pagamentos, uma análise import-export no campo cultural, Portugal teria o saldo mais negativo que é possível imaginar, porque só compra e não vende. E toda a gente acha isto normal, porque, isso sim, é a vida cultural de “nível internacional”. O que demonstra que há uma enormíssima carga de provincianismo nas elites culturais portuguesas”.
E quem não acha normal e quem se rebela contra a "cultura" que os programadores, ao serviço dos empresários, assim nos impingem passa por um verdadeiro troglodita, um inculto, alguém que deve ser banido, por não fazer parte do meio.

Tudo na mesma, como há 20 anos...

As coisas que não se passam! Fiquei pasmada com o que li na imprensa esta semana sobre as fardas das forças de segurança – PSP e GNR. São tantos os absurdos que praticamos e que teimamos em não resolver que já não sei mesmo porque fico espantada!
Este País em muitas coisas parou no tempo. O problema é que os tempos, entretanto, são outros. Queremos ser desenvolvidos e avançar a toda a velocidade rumo ao progresso mas esquecemos de cuidar do essencial.
Pois bem, tomemos nota do que se passa com as fardas que vestem as nossas forças de segurança:
1. Em 1989 o subsídio de fardamento era de 1.000 escudos/mês.
2. Em 2008 o subsídio mantém-se inalterado, 5,5 €/mês, isto é, 66 €/ano.
3. Decorreram 20 anos e o subsídio não foi actualizado.
4. As fardas são fornecidas pelas instituições mas são pagas pelos polícias.
5. Os gastos acima do subsídio são descontados em prestações mensais na remuneração dos polícias durante um determinado período de tempo.
Este extraordinário retrato levanta-me uma questão central. As fardas das forças de segurança são inerentes à função. Isto é, os polícias não podem desempenhar as suas funções sem farda. Ou podem? A resposta só pode ser, não podem, pelo que as fardas deveriam ser fornecidas e pagas pelas instituições, de acordo naturalmente com um determinado nível de necessidades e requisitos técnicos e bem assim de acordo com regras de boa utilização, conservação e manutenção.
Afigura-se-me imoral que os polícias tenham que custear o fardamento que as respectivas instituições estabelecem como obrigatório no exercício de funções.
Uma outra questão lateral, mas que no regime de financiamento existente ganha a maior relevância, prende-se com o facto de o subsídio actual não ser actualizado há 20 anos, revelando-se totalmente desajustado - não é preciso fazer muitas contas de matemática - à evolução do valor das remunerações e do custo de vida registados desde 1989 até à presente data.
Segundo contas feitas pelo DN o subsídio anual de 66 € não dá para pagar um kit de fardamento composto por:
um par de botas (37,43 €) +
um chapéu (5,41 €) +
umas calças (20,58€) +
uma camisa (7,52 €) +
um blusão (41,98 €), tudo num total de 112,92 €. E para se ter uma ideia do absurdo, atente-se à remuneração mensal de um polícia no início de carreira, 750 €. Para os mais endinheirados a opção (facultativa) por um blusão de cabedal monta em mais 200 €. Bem útil no inverno.
Enquanto o nível de conflitualidade se mantiver na discussão de questões tão básicas como o fardamento, que pode originar protestos e lutas variadas, não temos que nos admirar que os polícias possam estar preocupados e desmotivados e façam do fardamento uma matéria de reivindicação sindical!
É, realmente, o cúmulo!

sábado, 28 de junho de 2008

O direito ao sucesso!...

Segundo o Público de ontem, a célebre Directora Regional de Educação do Norte recomendou aos Conselhos Directivos que excluissem da correcção de provas os professores que se afastam da média.
Acho mesmo muito bem. A média deve ser pré-estabelecida, em ordem à obtenção de um verdadeiro sucesso escolar. Se o professor der classificações diferentes, deve mesmo ser severamente punido, por grosseira indisciplina.
Porque “os alunos têm direito ao sucesso”, diz a Directora da DREN!...
A Bem da Nação!...

As papoilas saltitantes!...I

Com uma "equipa-maravilha", o Benfica lá conseguiu ficar em 4º lugar, falhando clamorosamente o ingresso na Liga dos Campeões, seu grande objectivo.
Não tendo ido lá com jogadores, recrutou uma equipa de juristas que, por uns dias, conseguiram tal desejado feito.
Dado o êxito, a Direcção viu o furo e, em vez de bons jogadores, optou por reforçar a equipa de juristas. Já vai em quatro: João Correia, Paulo Gonçalves, José Luis Seixas e, como não podia deixar de ser, uma sonante vedeta estrangeira, Giampolo Monteneri.
Não duvido que, com tal plantel em campo, o Benfica recupere não só os campeonatos perdidos, como ganhe os próximos dez que aí hão-de vir!...
Se jogam ou não futebol, isso pouco interessa: afinal, os seus dez milhões de adeptos já há muito se desabituaram de ver tal jogo no ninho das águias!...

As letras perdidas


Reparei há pouco tempo que já perdi o treino de escrever com caneta e papel. Fico meia atarantada a olhar aquela brancura, impaciento-me com o tempo que é preciso para que as palavras encham as páginas, desespero-me se me engano.
No computador é tudo mais fácil, as teclas já mexem quase sozinhas e o acto de escrever deixou praticamente de exigir atenção. Sem um teclado e um écran, a escrita já é um atraso de vida.
O resultado é que quase já não se encontram manuscritos, cartas onde se alinhe uma letra bem desenhada ou uns gatafunhos que mostram o mau humor de quem os escreveu. A caligrafia espelha a personalidade nas letras redondinhas ou bicudas, pretensiosas ou escorreitas, correndo certinhas em linhas invisíveis ou a trepar oblíquas, a mostrar ambição. Dantes aprendia-se caligrafia para se domar a letra ao mesmo tempo que se disciplinava o espírito.
As vezes que eu e as minhas amigas nos entretivemos a “analisar” a letra das cartas de amor que umas e outras recebiam! Pela letra ou pelo vinco das palavras imaginávamos a intensidade dos sentimentos ou detectávamos hesitações, captava-se a mensagem muito antes de ler as palavras e estas, às vezes, não chegavam para apagar a primeira impressão... A primeira podia dar logo “morte súbita”, troçávamos da letra feia ou torta, desconfiávamos da arrevesada ou indecifrável, outras vezes apaixonávamo-nos logo pelo arabesco, nem era preciso ler as frases, os olhos ficavam a vaguear perdidos no endereço do envelope, "que bela letra, já viste?"
Além disso a letra era a antecipação da presença, chegava a carta e sabia-se logo de quem era, não era preciso ver o remetente para o coração começar a saltar…
Agora comunica-se depressa, um mail a correr, um telefonema, uma mensagem cifrada só com consoantes para caber no minúsculo écran. Já não sabemos como é a letra dos colegas, nem dos amigos, nem mesmo a dos filhos adultos, tão mudada desde que foi registada nos arcaicos cadernos de escola ou nos bilhetinhos ternos a assinalar o dia da mãe.
A padronização da vida moderna apagou o rasto das palavras manuscritas e reduziu ao anonimato cada mensagem, até à assinatura impressa no final do texto. Nem temos a noção do que perdemos!

“Polvo”...

Ultimamente tenho lido assuntos muito interessantes sobre os polvos. Tudo leva a crer que são animais inteligentes, pelo menos dentro dos invertebrados, já que não há mais nenhum que se iguale. Evidências? Caso de Louis que não larga o seu brinquedo, num aquário do Sul da Inglaterra, e que se irrita se tentarem tirar-lho. Outro, na Nova Zelândia, aprendeu a abrir garrafas retirando do interior alimentos. Também são ciumentos, podendo inclusive matar os atrevidos que quiserem a sua companheira bem escondidinha por ele numa caverna. São espertos ao ponto de se disfarçarem de fêmeas para se aproximar delas e escolher a sua preferida. Verdadeiros mestres em disfarces!
Fico meio assarapantado com tantos trabalhos sobre este animal, focando a forma como aprendem, a personalidade e a memória. Agora surgiu um trabalho intitulado “Consciência do cefalópode: evidência comportamental”. Cérebros complexos, comportamentos únicos, capazes de aprendizagens extraordinárias, de espécies que se separaram de um antepassado comum há 700 milhões de anos!
Começo a ficar com alguns problemas de consciência perante tantas provas de “inteligência”. Porquê? Porque adoro polvo! Em miúdo, sempre que ouvia a peixeira ou o peixeiro anunciar a sua presença corria de imediato para ver o que estava na cesta ou na caixa cheia de gelo e coberta com um oleado. Não era para ver a sardinha, o carapau, a faneca ou a pescadita, mas sim ver se traziam polvos. Ficava de boca aberta quando via o animal. Provocava-me uma certa sensação de repulsa e de medo, sobretudo quando pegavam no “bicho” com tantos braços e com uns olhos esquisitos. Mas mesmo assim queria vê-lo. O que era curioso é que tendo sido uma criança como outra qualquer, um verdadeiro pisco que, para comer, comia de duas maneiras, tinha sempre apetite para arroz de polvo. Adorava o prato confeccionado pela minha avó. Assim que entrava na cozinha e cheirava a polvo já sabia que naquele dia não tinha que ouvir sermão nem levar palmadas! As pontinhas mais finas dos braços eram para mim e deliciava-me pescar as ventosas maiores espalhadas pelo arroz. Presumo que foi nesta altura que “oficializei” o polvo como o meu alimento preferido. Desde então, tenho comido polvo de todas as formas e feitios, arroz de povo malandrinho, cebolada de polvo, feijoada de polvo, polvo à lagareiro, polvo de fricassé, polvo frito, polvo no churrasco, filetes de polvo, polvo estufado, salada de polvo, eu sei lá que mais! É tiro e queda. Se o cardápio apresentar polvo, não preciso de ler mais nada. Claro que já tenho enfiado alguns barretes, mas, enfim, é a vida!
Mas o raio do polvo não se reduz apenas aos aspectos gastronómicos. Recordo de ter lido livrinhos de banda desenhada em que polvos monstruosos, feios, com olhares tenebrosos, atacavam os navios, destruindo-os, enquanto esmagavam os tripulantes com os fortes tentáculos. Curiosamente, não sentia nenhuma emoção face à tragédia dos aventureiros atacados por Krakens que tinham, na mitologia nórdica, a fama de destruirem navios que poluíam o mar (às tantas foi a poluição que os liquidou!). Pensava: - Como seria um arroz feito com um polvo destas dimensões?
Mesmo hoje, o polvo continua a ser alvo de atenções artísticas, muito diversificadas, com destaque para a literatura infantil, caso do simpático Polvo Coceguinhas ou dos menos simpáticos mafiosos que estiveram na base da interessante série “O Polvo”.
Agora, com tanta “inteligência”, espero não ser incomodado pelo “deus dos polvos”!
Parece que Aristóteles não tinha grande opinião sobre estes moluscos, considerando-os como “criaturas estúpidas”, porque “aproximam-se da mão humana assim que mergulha na água”.
Pois é! Hoje em dia, continuam a haver criaturas estúpidas, só que, muitas destas, deixam-se apanhar pelos tentáculos de “polvos”, realmente, muito inteligentes, que não têm qualquer dificuldade em os “papar”.
Cá por mim, polvo por polvo, prefiro antes uma saladita... E já ia!

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Falar sobre boas notícias…

Faz falta falar de boas notícias! A aquisição da MobiComp pelo gigante Microsoft deve ser motivo de orgulho e esperança no futuro. Com esta aquisição é criado em Braga o primeiro centro de serviços móveis da Europa. Segundo anunciado pela MobiComp «a partir de agora, todos os utilizadores do mundo que usarem um telefone windows mobile, passarão a ter uma tecnologia made in Portugal incorporada». Segundo li há mais de 20 milhões de licenças vendidas.
A MobiComp é uma empresa portuguesa completamente dedicada ao desenvolvimento de soluções de negócio assentes em tecnologias de computação e comunicações móveis e vocacionada para a implementação de soluções inovadoras que tirem partido de processos e ambientes tecnológicos pré-existentes. É uma empresa portuguesa cuja vantagem competitiva é a inovação. Os seus produtos e soluções foram adoptados por líderes de mercado nos sectores das telecomunicações, serviços financeiros, media, retalho e logística.
Com a aquisição agora anunciada a MobiComp ficará melhor posicionada para crescer no mercado global, o que lhe permitirá aumentar o volume de negócios e reforçar a fileira da inovação em tecnologias ligadas às comunicações móveis.
Neste caso de grande sucesso fica bem patente o talento português e o reconhecimento mundial da qualidade da investigação que se faz em Portugal. A aposta na inovação e investigação é um caminho fundamental para o nosso desenvolvimento. Com talento, trabalho, e vontade de assumir risco, Portugal tem possibilidades reais de a médio prazo mudar a sua economia.
Parabéns à MobiComp pela coragem e pelo engenho de ter sido capaz de , num tão curto espaço de tempo, desenvolver soluções tecnológicas de classe mundial e atingir um lugar cimeiro no sector das tecnologias de comunicação.

Que fazer, pergunta o Expresso?

A edição de amanhã do Expresso vai tratar do tema da criminalidade jovem, a partir da verificação do facto de que “nos primeiros seis meses deste ano foram assassinados 16 adolescentes em Londres”, sendo a maioria das mortes cometidas por outros adolescentes. O facto levou à aprovação de uma lei, no princípio deste mês, que prevê que os adolescentes passem a responder criminalmente por porte de arma branca.
Apareceram de imediato os críticos da lei. O Expresso cita David Wilson, professor de Criminologia na Universidade de Birmingham, que refere que “as soluções têm de ser pensadas a longo prazo”, interrogando-se “como devemos lidar com uma geração que não confia nos adultos?».
Acho uma enorme piada a estas tiradas pretensamente intelectuais e falsamente profundas. Para tais pensadores, uma série de assassinatos de jovens por jovens é coisa de pouca monta, que não exige soluções imediatas, apenas soluções bem reflectidas a longo prazo. Claro que exige medidas imediatas!...
E, como é típico nestas situações, o ilustre criminologista praticamente desculpa os energúmenos, invocando o colectivo, isto é, a geração a que pertencem e a geração anterior, em que “os coitados” não confiam. Em síntese, os malfeitores são tornados vítimas e a culpa é dos agredidos, potencialmente todos nós. Claro que, de desculpabilização em desculpabilização, os cidadãos ficam fracos e desprotegidos, enquanto os delinquentes se sentem fortes e garantidos.
Sabem que podem fazer tudo nas escolas, que estas têm que os passar; sabem que podem drogar-se pelas esquinas, que o Estado os considera doentes e até lhes faculta salas para mais convenientemente se drogarem; e ficam agora a saber que a culpa dos assassínios que cometem começa na geração anterior, “em que não confiam”. Pelos vistos, não confiam na geração anterior nem na sua própria, em que escolhem as vítimas.
Pergunta o jornal: que fazer?
Dava uma primeira solução: começar por não confiar naqueles que nunca atribuem responsabilidades individuais, e para quem a culpa é sempre colectiva. A partir daí, as coisas podem arranjar-se melhor!...

A "Idade da Inocência" sai definitivamente de cena


A ' Unica' deste fim-de-semana vai abordar a moda do ambiente e o ambiente na moda.

Promete opinar sobre as razões da adesão às causas ambientais daqueles que dependem da moda como de pão para a boca, as estrelas como Leonardo DiCaprio, Brad Pitt ou Natalie Portman.
Percebo do resumo do artigo que o seu autor desconfia da honestidade e generosidade das intenções do estrelato quando adopta boas práticas ambientais e faz disso publicidade. Mais do que a crença na perdição do planeta e a esperança na sua redenção ecológica, por detrás do declarado amor à natureza estarão afinal razões de marketing pessoal, de promoção de imagem. Porque a protecção do planeta está na moda e não há estrela que se aguente no firmamento sem fazer parte dela.
Percebo também que o exemplo dos grandes nomes do show business chame mais a atenção para o tratamento dispensado ao tema (sendo certo que também existem os que, no mesmo meio, se fazem notar por acharem que o aquecimento global, a perda de biodiversidade ou todos os outros temas da actualidade ambiental não passam de patranhas!).
Mas a verdade é que a ´Única´ não precisava ir tão longe para observar o fenómeno. O ambiente é também o abono de família de muitas "estrelas" deste cantinho à beira-mar plantado.
Na política e fora dela, há por aí muita gente a ganhar a vida à custa da ecologia, sonhando um dia viajar de jacto privado, borrifando-se para as emissões.

Tal com as estrelas ecologicamente puras. As outras. As dos verdeiros filmes.

Política no feminino ou no masculino, novo preconceito?

A propósito da eleição de Manuela Ferreira Leira como lider do PSD, o Expresso trata o tema "Política no Feminino".
Não sei se as mulheres têm ou não uma maneira diferente de fazer política, receio até que isso seja já um novo preconceito, alimentado mais para pôr em causa do que para estimular essa participação feminina.
De facto, quando se diz que haverá “uma maneira diferente” isso tem implícito que se está descontente com a actual maneira, protagonizada pelos homens, e que se fica à espera de ver como é que as mulheres vão dar a volta a esta crise de confiança e crédito na classe política. De certo modo, este aviso soa a ameaça, ou bem que elas vão corresponder a essa expectativa ou então não valia a pena terem-se metido a caminho.
É esta generalização com base no género que me incomoda imenso. O que se deve esperar das pessoas que se decidem por uma participação política activa é que tragam algo de positivo em relação ao que havia, não pelo facto de serem homens ou mulheres mas pelo facto de terem um propósito e um carácter que marque a diferença.
Não contemporizo com todos os que se preparam para juntar à lista dos argumentos que vão analisar, a cada momento, os respectivos comportamentos na política, o que se refere à condição feminina ou masculina das pessoas envolvidas. Recuso sem hesitar os comentários que queiram concluir pelas virtualidades ou defeitos da participação feminina, em geral e para o futuro, só porque passou a haver uma mulher como líder de um dos maiores partidos nacionais, ou porque há mais deputadas nas bancadas.
A actuação dos líderes políticos deve ser avaliada como tal, sem condescendências que ninguém pediu e sem exigências que são despropositadas. Só quando deixarmos de considerar que essa participação é, em si mesma, um tema, é que deixará de haver fundados receios quanto à existência de preconceitos.

Desequilíbrio externo em forte agravamento - Programão "vira" delírio?

Foram divulgados na 3.ª Feira os dados provisórios das contas externas para o período Jan-Abril/2008, os quais mostram um forte agravamento do défice com o exterior, apesar da economia se encontrar praticamente estagnada (ou mesmo em recessão).
Assim, o défice da balança corrente evidencia um aumento de 41,75% em relação a idêntico período do ano passado (de € 4.678 milhões para € 6.631 milhões), sugerindo que no final do ano pode ficar bem acima de 12% do PIB.
O défice na rubrica dos rendimentos - o que melhor evidencia a nossa dependência financeira externa - subiu 36,3% (de € 1.959 milhões para € 2.671 milhões) e, a manter-se este ritmo, atingirá no final do ano a bela cifra de € 10.000 milhões, ou seja 6% do PIB.
Com este nível de dependência financeira do exterior, que deverá acentuar-se ainda mais nos próximos anos, o problema do financiamento de todos os sectores institucionais - Famílias, Empresas, Estado – está a transformar-se num pesadelo, o qual se precipitou com a crise dos mercados financeiros e de crédito.

Nada têm de surpreendente, assim, as notícias que vão chegando sobre:
- As dificuldades crescentes de milhares de famílias resultantes do excesso de endividamento;
- A ruptura financeira de dezenas e dezenas de Municípios (mais de 70 segundo notícia recente);
- A asfixia financeira das Universidades e Politécnicos, algumas das quais passaram a afectar ao pagamento de salários as verbas que lhes foram atribuídas para outras finalidades, numa clara violação da lei de execução orçamental a que ninguém parece dar atenção (ou preferem fazer de conta que nada se passa);
- As crescentes dívidas do sector da saúde à indústria farmacêutica e a uma miríade de outros credores, bem como a crescente a falta de médicos e a pressão sobre estes para que não prescrevam fármacos mais caros, a que se assiste nos hospitais públicos cuja gestão se vai tornando cada vez mais precária;
- O crescimento imparável das dívidas das empresas públicas, resultante de explorações fortemente deficitárias, em especial na área dos transportes (além dos já referidos hospitais), colocando o problema de saber como e quando vai o Estado assumir essas dívidas – que em grande parte já garante através do mecanismo do aval e que ascendem a muitos milhares de milhões de euros, provavelmente mais de 15 mil milhões.

O que neste contexto financeiro quase dantesco impressiona, e muito, é a insistência no Programão de obras públicas.
Visto a esta luz, o Programão começa a transformar-se num perfeito delírio - já nem haverá dinheiro para lançar essas obras, avançar à revelia destes sérios avisos é acto de perfeita insanidade...
Custa-me acreditar que não haja no Governo e noutros órgãos de soberania pessoas que não sejam capazes de ver o problema potencialmente insolúvel que estamos na iminência de criar a nós próprios...
Parece pois incontornável e urgente, nesta altura dos acontecimentos, uma reflexão nacional sobre este tema.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Coisas do outro mundo II

Bateram em juízes. Estou escandalizado!
Bateram nos magistrados. É inaceitável!
Aquilo que vimos no julgamento em Santa Maria da Feira, é um escândalo.
Mas vejamos...
O Sr. Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público culpa o Governo pelo que sucedeu.
O Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados aproveita a ocasião para desancar a PSP e a GNR.
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses culpa as instalações dos tribunais.
A mãe dos "meninos traficantes" mostra-se indignada com a "injustiça da pena".
E o Governo aparece com um ar constrangido, a justificar-se...
E quando batem nos professores?
E quando agridem os polícias?
E quando nos ameaçam com a maior das impunidades?
Coitadinhos...
Os delinquentes... coitados, ainda nos exigem que tenhamos pena deles e paguemos a sua reinserção social.
Não há justiça que resolva isto.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

A justiça funciona? O tanas!...

Não nutro qualquer simpatia por Vale e Azevedo. A sua conduta fê-lo ser condenado por diversos crimes, passou anos na prisão e parece que terá que passar alguns mais.
Mas, a meu ver, algumas das declarações que, nos últimos dias, fez sobre a justiça portuguesa chamam novamente a atenção para o completo desvario em que está metida.
A primeira declaração é que anda a ser julgado há oito anos. Claro que os actos puníveis que praticou também foram muitos, mas eles, ou remontam ao período em que foi Presidente do Benfica, ou são anteriores. Tendo começado a ser julgado por um acto, seria exigível que as investigações em torno de muitos dos restantes que, aliás, já tinham começado à época, terminassem em tempo útil. Tal não aconteceu: o resultado das investigações foi saindo a conta-gotas, sucedendo-se acusações, julgamentos, sentenças, novas acusações, novos julgamentos, novas sentenças, recursos, julgamentos, sentenças, um nunca mais acabar. E parece que os processos ainda não terminaram. Oito anos de julgamentos é, de facto, intolerável.
A segunda declaração é que, depois de cumprida uma pena, esteve em liberdade 17 segundos, tendo sido novamente preso, quando entrava para o carro, de regresso a casa, e perante as câmaras da televisão. Outro acto intolerável, pelo que revela de atitude burocrática prepotente, e pelo sadismo que revelou.
A terceira declaração é que fugiu para não continuar a ser perseguido pela justiça. Claro que foi ele que deu azo a que se visse perante os Tribunais. Mas tais atitudes do sistema judiciário só levam a que, cada vez mais, se desconfie da justiça e apareça justificada, perante a opinião pública, a fuga dos que têm possibilidade para tal feito.
Fátima Felgueiras também fugiu para o Brasil, para não ser presa. Regressou e continuou em plena liberdade. Seria grave o que fez, para merecer a prisão; deixou de ser grave, quando regressou, pois nada lhe aconteceu. Difícil de entender o absurdo da situação.
Entretanto, ouvi responsáveis dizer que a emissão do mandado de captura internacional de Vale e Azevedo demonstra que a justiça funciona. Está-se mesmo a ver!... Funciona? O tanas!...

Como reagir...

Photobucket
... ao aumento do preço dos combustíveis.
Assim, o Sr. Ministro Mário Lino já não precisa de tantas auto-estradas.

M F Leite: formação acelerada no MOPTC recomenda-se!

Na sequência da importante declaração política de M F Leite, no discurso de encerramento do último Congresso do PSD, pondo em causa a prioridade do Programão do Obras Públicas - € 40 mil milhões ao longo de uma década ou coisa parecida, de acordo com informação ontem divulgada pelo “ideólogo do betão” M. Lino – têm-se sucedido as declarações PRÓ e CONTRA tal pronunciamento de M F Leite.
Nas declarações CONTRA, salientam-se alguns dos valorosos proponentes da renovação da chamada “maioria absoluta” em 2009 - esta última um desígnio só equiparável, em termos de esplendor de felicidade proporcionada ao Povo, ao próprio Programão...
Entre os pronunciamentos CONTRA merece indiscutível destaque, até pela sua profundidade e fecundidade, o do titular do MOPTC, feito na 2ª Feira em Bruxelas salvo erro, acusando MF Leite de não entender que estas obras públicas “não são um custo”, são antes “investimentos” dos quais se podem esperar grandes benefícios para o País e para a actividade económica, contribuindo para o relançamento desta.
Trata-se de uma das mais avançadas formulações em torno da natureza económica destes projectos de obras públicas: não envolvem custos, nem de realização nem (supostamente, o conceito parece ser global) de exploração.
Por isso agora entendo a pressa e a defesa intransigente do Programão – e até se estranha que o Governo não se tenha dado conta desta realidade há mais tempo e tenha perdido tantos meses, por exemplo, com o problema da localização do novo Aeroporto.
Trata-se, quer na fase de investimento quer na fase de exploração, de acumular proveitos, só proveitos, sem que existam custos a considerar...que enorme benefício para o País!
E que pena o Programão encontrar-se ainda em fase de promessa!
O facto destes projectos poderem envolver despesa é pois irrelevante, pois essa despesa, ao contrário do que as normas contabilísticas erradamente recomendam, é tão fértil e virtuosa que nunca deve ser classificada como custo mas sim como proveito, sempre como proveito...
Não poderá mesmo essa despesa ser inscrita no OE como receita? Isso seria a cereja em cima do bolo!
Devo admitir, neste quadro de grandes desafios para a economia portuguesa, que M F Leite – apesar de ser uma pessoa “do passado” como “lucidamente” observou outro proponente da renovação da “maioria absoluta” – talvez ainda possa ter muito a ganhar com a frequência de um curso de formação acelerada no MOPTC, para ver se absorve estes novos conceitos.
M F Leite, aprenda por favor como é que M. Lino consegue transformar despesas em proveitos, pela mágica das obras públicas – com certeza desde que devidamente enquadradas em “bons” ou “magníficos” projectos de investimento.
O País teria certamente muito a ganhar com essa mudança de mentalidade de M F Leite, as forças do “progresso” e da “prosperidade” do País alegremente aplaudirão, tudo voltará à tranquilidade, o Povo ficará contente
Se por azar, o País continuar depois a atrasar-se e a empobrecer, como alguns agentes do pessimismo andam por aí a agoirar, arranjar-se-á sempre algum bode expiatório...não faltarão candidatos aptos para essa nobre função como bem sabemos.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Coisas do outro mundo

Kota Baru.
É um daqueles sítios de que nunca tinha ouvido falar.
Fica na Malásia e é a capital de um estado chamado Kelantan.
Neste Estado, governa um partido islâmico, Parti Islam Se-Malaysia (PAS) que tem vindo a tomar umas medidas peculiares.
Em 1996 o Conselho Municipal obrigou todos os supermercados a terem caixas separadas para homens e mulheres.
De seguida, foram proibidos os cabeleireiros unisexo.
Os cinemas passaram a manter as luzes acesas durante as projecções dos filmes.
O uso de bâton no emprego foi proibido.
Em Maio de 2002, o Presidente da Câmara Municipal proibiu a publicidade que apresentasse imagens de mulheres sem o véu islâmico.
Agora, através de um Decreto do passado dia 25 de Maio, as mulheres que usarem saltos altos, maquilhagens vistosas, bâton ou véus transparentes, estão sujeitas a uma multa que ronda os 120 euros.
Segundo os autores desta lei, estas medidas visam proteger a dignidade das mulheres e inibir a violência sexual.
Após várias reclamações, o Presidente da Câmara declarou que está disponível para fazer algumas concessões: autoriza o uso de saltos altos às mulheres que trabalham em restaurantes e escritórios, desde que estas coloquem borracha nas solas para não perturbarem os outros quando caminham.
Conclusão:
Há ruídos que são uma verdadeira tentação...

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Tanto desperdício!

É frustrante a ausência de melhorais estruturais na evolução do conhecimento da matemática dos estudantes portugueses. No estudo do Programa Internacional para a Avaliação da Matemática de 2006 publicado pela OCDE, Portugal situa-se em 37º do ranking, seguido em piores resultados pela Itália, Grécia, Turquia e México. Os resultados foram os mesmos revelados pelo estudo de 2003.
Estes resultados apenas confirmam o que já todos sabemos. Nada de novo, portanto! O panorama da matemática em Portugal é desolador. Mas bem mais desolador é o facto de o problema estar há muito diagnosticado e desde lá para cá não termos sido capazes de inverter este estado de coisas.
Hoje mesmo realizou-se o exame nacional de matemática do 12º ano. O coro de protestos que se ouviu ao longo do dia de alunos, pais e professores é a reacção ao baixo nível de conhecimentos exigido no exame.
Pais e professores, cientes das dificuldades da aprendizagem da matemática, não deixaram, e bem, de manifestar a sua preocupação pelo facilitismo colocado neste exame nacional. Esta reacção insere-se, aliás, na polémica em que têm estado envoltos os exames nacionais.
A correcção dos baixos níveis de aproveitamento que se registam na matemática será sempre um processo lento, tendo em conta o contexto social e cultural envolvente, e, ainda assim, para que registemos progressos, necessitamos de colocar mais recursos e mais atenção no seu ensino.
Não é com o facilitismo de um exame que o panorama vai mudar. Fazê-lo é dar um sinal errado e prestar um mau serviço à cultura de exigência que tanta falta nos faz. Mas é também um factor de injustiça, ao não permitir premiar os melhores alunos, que mais estudaram e se aplicaram ao logo do período escolar, e os professores que mais se esforçaram na preparação dos seus alunos. E há também que reconhecer que desta forma é desbaratado todo um esforço e sacrifício de muitos pais que gastaram tempo e dinheiro em ajudar os seus filhos a ultrapassar os défices da qualidade do ensino da matemática. Poderemos estar perante uma estratégia do vale tudo para melhorar a estatística. Nivelando por baixo! É o que se chama a cultura da medíocridade!
Talvez assim, Portugal suba uns pontitos no ranking da OCDE. Mas a verdade é que não é assim que estaremos a preparar os nossos jovens para enfrentarem com confiança os desafios profissionais.
A matemática é considerada uma aptidão básica para lidar com a vida. O importante é que seja corrigida a complexidade que é colocada na apresentação da função dos números. No sucesso de aprendizagem será fundamental o ganho de confiança e de auto-estima na resolução dos problemas. Se persistirmos no facilitismo não seremos capazes de inverter o problema da aversão e do insucesso que caracterizam a aprendizagem da matemática nas nossas escolas.

“Imposto da fraternidade”...

Ao ler um interessante artigo sobre o “Transtorno do défice de atenção com hiperactividade”, que é considerado como uma doença, pelo menos está contemplado no “Diagnosis & Statistical Manual for Mental Disorders”, o autor coloca a seguinte situação: É verdade que muitas crianças com este transtorno têm problemas nas sociedades modernas. Mas o que aconteceria se a sociedade fosse diferente? Com base num interessante estudo, em que foram estudados membros de uma tribo Queniana, os Ariaal, parte sedentarizou-se enquanto a outra continua na sua vida nómada, e através de uma determinada variante genética, que está ligada a “apetites” e tendências para consumir alimentos e drogas, à procura de novidades e sensações (novelty-seeking) e aos sintomas do “Transtorno do défice de atenção com hiperactividade”, o articulista conclui que os que apresentam a tal variante apresentam melhores índices de status nutricional entre os nómadas mas piores nos sedentários. Além do mais, especula que a presença da tal variante genética propicia aos portadores aumentar os impulsos, manifestar agressividade e revelar violência face a situações difíceis de prever, quando põem em causa a sua segurança, assim como outros tipos de comportamento que lhes permitem obter alimentos. Os próprios rapazes têm tendência em transformarem-se em guerreiros e aprendem mais depressa (mesmo sem escolas) num ambiente dinâmico. Perante esta análise, a situação descrita como doença poderá ter uma explicação evolutiva ao possibilitar que os nómadas se adaptem às circunstâncias ambientais.
O nomadismo constituiu a forma mais prevalente de vida ao longo da maior parte da nossa existência. O advento da agricultura, muito recente, cerca de 13.000 anos, modificou, radicalmente, esta forma de viver, mas os genótipos continuam a andar por aí.
No primeiro capítulo do “O Livro que Desceu do Céu”, de Ahmad ´Abd al – Waliyy Vincenzo, o autor, depois de apresentar o jovem Zayd, o rapaz que escreveu a primeira cópia do Alcorão, descreve a relação entre nómadas e sedentários, afirmando que “é um elemento fundamental da história de todas as civilizações tradicionais, e não só da islâmica”. Segundo este professor da Universidade de Nápoles “O nomadismo representa a condição ancestral, dos homens antigos, de natureza desprendida dos bens terrenos. O povo de Israel foi nómada até à construção do templo de Salomão, e o próprio Cristo afirmou: Os lobos têm covis e os pássaros do ar ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde pousar a cabeça”. Chamou-me particular atenção o facto de, na Arábia, os povos sedentários pagarem aos nómadas um “imposto da fraternidade”, em virtude de um antigo “pacto”. Poderia ser considerado como um tributo a pagar para não serem incomodados, mas não. Tratava-se de “uma verdadeira homenagem dos sedentários aos seus irmãos do deserto que davam continuidade à vida nobre dos antepassados, mantendo viva a sua memória”.
Afinal, quem sabe se aquilo que passámos a considerar como doença, e que é tratada vigorosamente, não é mais do que um desajustamento entre uma herança, de nobres antepassados, e uma sociedade não prevista? Quem sabe se um modelo de ensino, dinâmico, menos convencional, mais adequado às crianças com estas características não poderia ajudar a resolver os casos que por aí abundam? Quem sabe? No fundo, seria uma forma de aplicar, nos tempos modernos, o equivalente do “imposto da fraternidade”...

domingo, 22 de junho de 2008

M F LEITE - boas intervenções e intenções, mas o "Day After"...

Bem longe de Guimarães, acompanhei alguns ecos do que por lá se foi passando durante este fim-de-semana no que ao Congresso do PSD diz respeito.
Pareceram-me oportunas e de um modo geral merecedoras de aprovação as duas intervenções, inicial e final, de M F Leite (MFL).
Na final, MFL endereçou uma forte crítica ao “Programão de Obras Públicas” que tem vindo a ser anunciado pelo Governo, pondo em causa a sua prioridade política e questionando mesmo a existência de recursos financeiros para o realizar.
Como eu aqui dizia há poucos dias, este “Programão” constitui mais uma prova – talvez a prova final, se esta for avante dificilmente iremos ter outra - da iliteracia dos nossos “responsáveis” políticos em matéria de regras de convivência numa zona monetária com as características da zona Euro.
Na situação de exaustão financeira em que o País se encontra, (i) com o Estado Central, as Autarquias, as Famílias e as Empresas em dependência financeira já aflitiva mas em agravamento acentuado nos tempos mais próximos, (ii) a economia estagnada, (iii) uma política monetária própria de um ciclo expansionista, (iv) uma moeda muito forte, totalmente desajustada para uma economia com graves problemas estruturais nos quais sobressai a fraca competitividade externa dos bens (sobretudo) e também dos serviços produzidos internamente – um Programão de Obras Públicas é mesmo a última coisa de que nós precisamos.
Por outras palavras, esse Programão pode ser a coisa de que nós precisamos para acabar de vez com quaisquer perspectivas – actualmente já muito ténues, tenho de admitir – de algum dia a economia portuguesa vir a ter um comportamento dentro da zona Euro que não seja o empobrecimento gradual e irreversível.
Assim sendo, o Programão acabará lamentavelmente por suscitar a questão de saber se a economia portuguesa tem condições de se manter na zona Euro ou se não será preferível uma terapia de choque, do tipo da que sofreu a Argentina há cerca de 10 anos, com custos enormes durante dois ou três anos mas que acabou por produzir resultados…
Parece-me pois que, sem prejuízo da correcção e da justeza do seu discurso político e das boas intenções de que se encontra possuída, MFL enfrenta um problema muito sério caso venha a ter responsabilidades de Governo, como parece cada vez mais provável: onde estão os recursos para dar resposta às prioridades políticas que elege?
Com o Programão a todo o vapor, o País hipotecado até “à ponta dos cabelos”, sufocado debaixo de um défice de rendimentos nessa altura na casa de 7 a 8% do PIB – a “ajudar” um défice GLOBAL de qq coisa como 15% do PIB sem fundos estruturais - o que restará a MFL fazer?
Numa situação dessas nem um Bloco Central – se é que vale a pena reedita-lo - terá soluções para um País frustrado, brutalmente endividado, desencontrado com a sua história, incapaz de acreditar no futuro.
O “Day After” vai ser mesmo o grande problema de MFL…
E tudo a coincidir com os 100 anos da República – as comemorações prometem!

O PSD e a Selecção Nacional

A semana foi marcada pelo fim dos festejos do Campeonato da Europa de Futebol e pelo começo, espera-se, de uma nova era no PSD.
No futebol, as coisas não correram bem, mas é ao futebol que recorro para falar do PSD.
Unanimemente é referido que um jogador se salientou, entre todos os demais: Deco. Deco foi consistentemente o melhor jogador nos três jogos realizados. Foi o que mais se esforçou e correu (e aqui a tecnologia não deixa mentir), jogou para a equipa e não para ele (o recorde do número de passes assim o demonstra), foi brilhante nas aberturas e rupturas que proporcionou nas defesas adversárias, e assim meteu golos e proporcionou situações flagrantes de marcar, aproveitadas umas, falhadas outras. Apesar de ser o que mais correu, jogando no meio campo, mas nunca recusando ajuda à defesa ou ao ataque, ainda lhe sobrou génio para algumas jogadas e passes de antologia. Preocupou-se com a equipa e não com fogachos individuais. E mostrou ter a cabeça na função que desempenhava, e não no mundo das transferências de milhões. Não teve o favor das parangonas dos media, mas a sua qualidade basta e deles nunca precisou nem preciasa.
Espera-se da nova equipa do PSD que tenha a atitude do Deco.
Que jogue em equipa e não se esgote em extravagâncias de figuras e figurantes, que só levam à derrota deles próprios e do Partido.
Que trabalhe para o País, como já dizia Sá Carneiro, e faça política em função dos portugueses e não dos militantes ou dos barões.
Que, ao contrário da Selecção, com 5 capitães fracos, tenha uma liderança forte, mas dialogante e estimulante, como estou certo que irá acontecer.
E que não se esgote naqueles que fazem política há décadas, que já pouco têm para apresentar ou fazer, mas leve para a política novas forças e nova gente.
Que não actue em função dos jornais ou telejornais, mas em função do seu programa e do seu próprio calendário. Os portugueses vêem para além dos jornais.
E que cada um dos novos dirigentes não pense com o que pode ganhar com a política, mas pense exclusivamente no serviço que, através da política, pode e deve prestar aos portugueses.

Da série "Os Castigadores"

Leio que o senhor presidente da Comissão do Mercado de Valores Imobiliários (CMVM) defendeu numa entrevista ao Diário de Notícias e à TSF o agravamento das penas relacionadas com os crimes de mercado.
Não há neste País responsável que não reclame por agravamento das penas criminais e não julgue que o calabouço é a melhor terapia para os males sociais. Ainda que não se observe qualquer alteração dos valores essenciais merecedores de tutela juridico-penal ou justificativos da alteração do quadro sancionatório.
Neste caso dos crimes de mercado, o senhor presidente a CMVM acha mal as sanções não irem além de 3 anos de prisão e lamenta que muitas vezes a liberdade seja trocada por uma singela multa.
Somos um País curioso, onde a um tempo nos queixamos das cadeias cheias e apelamos a penas alternativas à prisão; e no momento seguinte lamentamos a leveza da lei penal que não previne, a ninguém assusta nem adverte, os inquéritos que concluem pelo arquivamento ou julgamentos que não atiram para os calabouços os criminosos que, apesar de não serem acusados de coisa alguma ou julgados inocentes, "todos" sabemos que o são! Basta que um dos habituais Torquemadas da comunicação social assim o sentencie.
Aliás, este domínio da criminalidade económica e financeira é um exemplo de que, muitas vezes, os pedidos de alteração da lei penal não são mais do que biombos para disfarçar a incapacidade, incompetência ou inércia das instituições que têm por missão fazer tudo para que não ocorram infracções. A vigilância dos reguladores e dos organismos de controlo previne mais do que a severidade das sanções. E no entanto vigilância dos mercados e controlo da observância das suas regras é coisa que não temos patentemente tido.
O recente caso do BCP - e de outros que se diz à boca pequena que em breve verão a luz do dia - pôs a nú não a falta de lei e seguramente não a falta de enquadramento sancionatório, mas a fragilidade das entidades e dos seus responsáveis que deveriam velar pela honestidade, segurança e verdade dos mercados, em especial a CMVM mas sobretudo o BdP.
Façam estas entidades e os seus responsáveis o que a lei e a sociedade lhes pede que façam, e podem crer que teremos um mercado melhor.

Surreal

Ouvi as notícias sobre as mudanças que a Câmara Municipal de Lisboa pretende para a zona ribeirinha.
E uma delas sobressaiu.
Querem enterrar a linha do comboio para Cascais na zona de Belém.
Fiquei radiante!
Vão tirar aquele monstro, vai desaparecer aquela barreira.
Vamos ter uma cidade fantástica!
Mas depois caí em mim.
Será que Lisboa precisa disto?
Não é esta a cidade que está um destroço?
Em que as ruas mais parecem um campo arqueológico, tantos são os buracos?
Em que a Câmara não tem dinheiro para pagar aos fornecedores?
Estarei enganado?
Ou será que estes senhores perderam a noção da realidade?

sábado, 21 de junho de 2008

Foi-se, antes da posse...

José Miguel Júdice abandonou a liderança da sociedade de gestão da zona ribeirinha antes mesmo de tomar posse, apesar de ser o rosto de um projecto de reabilitação onde se promete gastar as centenas de milhões de euros que o País não tem para comemorar condignamente os 100 anos de implantação da nossa esbanjadora república.
Apesar de ser um indiscutível especialista em assuntos ribeirinhos, Júdice saiu para gaúdio de muitos.
Não pode, antes de todos, deixar de estar satisfeito o Zé "faz falta", esse que, segundo a Al Jazeera é mais herói de Lisboa que o entalado Martim Moniz. O Zé foi claro em rejeitar desde a primeira hora a hipótese de Júdice coordenar qualquer obra que não fosse na qualidade de capataz.
Satisfeitos ficaram também Helena Roseta e os seus cidadãos por Lisboa que igualmente não hesitaram em expressar a sua discordância pela escolha - Júdice não se cansa de o repetir para afastar veleidades de misturas indevidas! - do Senhor Engenheiro José Sócrates.
Mas aqueles que sentiram que a fortuna finalmente lhes sorriu foram António Costa e Manuel Salgado que já desesperavam perante a resistência de Júdice às mais evidentes demonstrações de que o consideravam um estorvo. A mais evidente foi a abstenção do Presidente da Câmara na votação sobre o plano apresentado pelo seu mandatário nas eleições, que cedo surpreendeu em Júdice um indominável elefante em loja de porcelana. E não esqueçamos que Costa foi também célere em fazer saber que a Câmara não entraria com um tusto no capital social da empresa "Frente Tejo".
Até que enfim, António Costa, Manuel Salgado e Sá Fernandes puderam concelebrar. E ontem mesmo patentearam esta nada desprezível afirmação de poder face a Sócrates, borrifando-se nos planos do Governo para a zona e apresentando aos jornalistas as suas ideias para a frente riberinha, numa viagem pelo rio entre a zona de Alcântara e a Expo, agora que foi promulgado o diploma que viabiliza a transferência de poderes sobre o domínio público marítimo para o município.
Quer-me parecer que este episódio faz parte de um plano para outras, futuras, transferências de poderes... Mas é só uma ribeirinha impressão.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Boa sorte

Em 6 de Março de 2005, escrevi neste blog um texto desejando boa sorte a José Sócrates.
E associei-lhe cinco razões numa espécie de guião que desarmaria a oposição.
Passaram 1202 dias.
José Sócrates não teve sorte.
Parece que se sucedem as desgraças - e não julguem que estou a pensar no futebol.
Hoje, temos mais problemas que em 2005. No desemprego, na pobreza, na estagnação económica.
Nem a questão do deficit é um dado adquirido.
Hoje, temos uma sociedade mais intranquila que em 2005. No pessimismo que grassa, na ausência de perspectivas, nas desgraças que se sucedem.
Os portugueses começam a viver em aflição.
Hoje, temos uma vivência mais insegura que em 2005. Nas ameaças que sentimos, nos assaltos que são notícia, nos actos de vandalismo a que assistimos, na fragilidade e precariedade que nos rodeia.
Nestes 3 anos Portugal regrediu.
E as desilusões multiplicaram-se.
Este país assemelha-se àquele desgraçado que cada vez que tentava colocar a cabeça fora do buraco levava uma “cacetada”.
Já andamos nisto há demasiado tempo.
Não temos o direito de culpar José Sócrates por tudo o que sucedeu.
Mas se estivéssemos a vivem um bom momento, ele seria o primeiro a vangloriar-se.
Faz parte do jogo.
Ora, neste fim-de-semana, o jogo deverá mudar.
É saudável que exista oposição.
Mesmo que digam que Manuela Ferreira Leite é muito parecida com José Sócrates.
Esta simples comparação, que considero falsa, encerra uma evidência.
É o reconhecimento de que surgiu uma alternativa.
Boa sorte Dra Manuela!

quinta-feira, 19 de junho de 2008

“Aroma de café”...

Gosto de saborear e beber um bom café. Comecei cedo. Primeiro com o “garoto”, quando andava na Escola Primária. Recordo que à noite ia ver televisão ao café da estação e bebia uma chávena que era mais leite do que café, café de saco, cheiroso, cujo aroma perfumava todo o estabelecimento. Sabia bem. Ainda hoje guardo esse sabor, mais do café do que do leite, bebida que nunca foi do meu agrado. Dez tostões era quanto custava. Por volta das dez da noite, o mais tardar, a contragosto e sem sono, ia para casa, porque no dia seguinte a escola estava à minha espera e para um miúdo acordar cedo era um tormento agravado pelo facto de me deitar tarde. Ia sempre ensonado e maldisposto como é fácil de prever. No entanto, a caminho da escola passava junto a um local onde procediam à torrefacção do café. Parava uns instantes e inspirava profundamente, deliciando-me com aquele aroma que impregnava toda a estrada. Quando chegava à escola até parecia que estava mais bem-disposto e mais acordado!
Anos mais tarde - andava no Colégio - aprendi a beber café. Ao princípio, por recomendações familiares, bebia apenas um carioca. Com o tempo passei ao café, que passou a ser um ritual e uma forma de socialização. Curiosamente, o preço mantinha-se a dez tostões!
Andava no 6º ou no 7º ano, quando fui à aldeia de um concelho vizinho passar as férias do Carnaval. A mãe do meu amigo ao ouvir a nossa conversa sobre tomar um bom café depois do jantar, antes de irmos para o Quartel dos Bombeiros, deve ter desatado a correr para comprar no café do povoado uma embalagem, como mais tarde fiquei a saber. Até aqui nada de especial, a não ser quando me contemplou com uma avantajada malga cheia de um café negro a fumegar. A senhora, de condição muito humilde, fez aquilo que costumava fazer com o café de mistura tipo chicória. Não quis ser indelicado e, pensando que era um malga do tal café de mistura, bebi-o, mas havia qualquer coisa de estranho, o sabor era diferente e o fundo estava cheio de borras. O meu colega não bebeu, porque ia beber uma chávena quando chegássemos aos Bombeiros. E assim foi. Quando chegámos bebemos uma bica. Passado pouco tempo fiquei atrapalhado, porque sentia tudo a tremer. Pensei que se tratava de um tremor de terra e agarrei-me a um poste de aço do recinto. Mas como não passava acabei por verificar que era eu que tremia. E de que maneira. Pior do que ter febre. Falei com o colega que também estranhou a minha agitação motora para a qual não tinha explicação até que me lembrei do café da senhora. – Olha lá como é que a tua mãe fez o café? Respondeu: - Sei lá! Mas agora recordo que ela disse que ia ao café. Às tantas foi buscar café bom e fê-lo como se fosse chicória. – Estou tramado! Não consigo deixar de tremer. Tenho que me ir deitar. E assim foi. Não gozei a festa, passei toda a noite acordado e de manhã lá fui no trama para casa. Só da parte da tarde é que adormeci.
Estas reminiscências sobre o café da minha infância e adolescência não ficam por aqui. Muito mais poderia contar. Quem despertou estas recordações foi um artigo segundo o qual, os ratos privados de sono apresentam redução de certas moléculas expressas por onze genes a nível cerebral. Quando são sujeitos apenas ao aroma as tais moléculas derivadas da acção de nove genes voltam ao normal e em duas delas até aumentam. Apesar de não haver estudos em seres humanos, muitos desses genes têm os seus equivalentes entre nós. Assim, o facto de alguém se sentir cansado pode ser devido à tal redução das moléculas. A apetência para tomar um café pode explicar a reactivação dos genes fazendo com que o individuo se sinta melhor. Aqui está uma explicação para os amantes do café. O mais interessante é que nem precisamos de o beber. Basta cheirá-lo. Sendo assim o melhor é perfumar os locais de trabalho, as escolas, os gabinetes dos ministros e a própria Assembleia da República com aroma de café. Ficariam mais despertos, mais criativos e menos fatigados. Sem riscos para a saúde, nem efeitos secundários...

Momento...

A la sombra de «saturno»
Benedicto XVI volvió a recurrir al sombrero «saturno» para protegerse del sol durante la audiencia general celebrada ayer en San Pedro. Aclamado por los fieles congregados en San Pedro, el Papa quiso detener su recorrido para besar — en la imagen — a un bebé.
(publicado hoje no ABC)
*
O momento captado é de rara beleza nos tempos que correm. As coisas boas, bonitas e eternas - como esta - deveriam lembrar-nos a simplicidade, a constância e a reconciliação que deve ser a vida. Ali não há idades: como se vê - uns mais, outros menos - todos estamos entre o recém-nascido e o velhinho.

Avestruz agoirenta: forte pio vem de Londres

Foi hoje anunciado que o Royal Bank of Scotland (RBS), integrado no Grupo Santander, está a alertar os seus clientes para um iminente “crash” nos mercados bolsistas e de crédito.
Segundo o Banco, o “crash” poderá ocorrer durante os próximos 3 meses, à medida que os bancos centrais vão ficando cada vez mais paralisados pelas subidas da taxa de inflação.
Ao ler esta notícia lembrei-me do honroso epíteto “ave agoirenta” que o actual e sem dúvida simpático Presidente da Assembleia da República me dispensou quando, no início da presente década, procurei alertar, com alguma insistência, para as tremendas implicações dos erros de política económica - então em fase de grande exuberância – sobre o desempenho futuro da economia portuguesa.
Imagino o que sua Excelência pensaria ou diria, se tivesse conhecimento desta catastrófica previsão do RBS...
Quem sabe se não criaria um novo epíteto, de “avestruz agoirenta”, para ilustrar a magna dimensão do agoiro...

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Secretariado Nacional da Propaganda!...

Afinal os novos estudantes são uns génios na matemática: 91% de notas positivas nos exames do 4º ano de escolaridade!...
Muitos, e também o Presidente da Associação de Professores de Matemática, Prof. Dr. Nuno Crato, dizem que as provas foram "fáceis". A Ministra, em contraponto, não desmentiu, apenas disse que foram "rigorosas". Claro que a facilidade também exige algum rigor!...
Neste jogo de palavras, o que é certo é que o êxito é retumbante. E o aproveitamento verdadeiramente sensacional!...
Assim se faz o sucesso escolar, a Bem da Nação e da Propaganda Nacional!...

Crise dos combustíveis: exemplo vem da Coreia?

1. Nesta crise mundial dos combustíveis – um choque económico cujas consequências ainda não somos capazes de avaliar em toda a sua extensão – achei curiosa a resposta encontrada pelo Governo da Coreia do Sul.

2. Entrará em vigor na Coreia, a partir de 1 de Julho próximo, um conjunto de medidas de apoio aos grupos de cidadãos e de empresas mais atingidos pela crise, num montante global estimado de USD 10 mil milhões (aprox/ € 6,6 mil milhões), a saber: (i) descontos na tributação do rendimento das famílias com rendimento anual inferior a Won 36 milhões (1 USD= 1023 Wons) e as empresas em nome individual com rendimento anual inferior a Won 24 milhões; (ii) pagamento de subsidio equivalente a 50% do agravamento do preço dos combustíveis a partir de uma determinada data aos autocarros de transportes de passageiros, aos transportadores rodoviários de mercadorias, aos agricultores e a outros grupos de mais baixos rendimentos; (iii) pagamento de indemnizações a duas companhias de electricidade e gás estatais pelas perdas sofridas com o congelamento dos preços da energia determinado desde o início do corrente ano.

3. Estas medidas serão aplicadas durante um ano - entretanto será feita uma reavaliação da situação - e o seu financiamento é assegurado por um excedente de receitas fiscais em relação ao que havia sido orçamentado e também pelo aumento das receitas do imposto sobre combustíveis que decorrem da subida dos respectivos preços.

4. O Governo coreano admite reduzir o imposto sobre os combustíveis, mas só no caso de o preço do barril do petróleo ultrapassar USD 170,00.

5. No caso da Europa, o choque petrolífero a que estamos assistindo é um violento choque assimétrico, aliás duplamente assimétrico:
- Afecta muito mais uns países do que outros - Portugal é, por diversas circunstâncias, dos mais duramente afectados;
- Dentro de cada País afecta mais uns sectores do que outros, o que é perceptível quanto mais não seja pelo ruído dos protestos que se vão ouvindo.
6. Devo confessar que me tem impressionado a falta de capacidade de resposta da
União Europeia face a um problema desta dimensão, que certamente teria
requerido já uma análise rápida e algumas medidas compensatórias, justificadas para os
países/sectores mais afectados.
7. A única mensagem que conhecemos a este respeito, de fontes mais ou menos
oficiais – em Portugal até da Oposição – é que não se deve baixar o imposto sobre os
combustíveis: isso seria transmitir um sinal errado ao mercado, alterando artificialmente os
preços relativos, para além de privar o Estado de receitas tão necessárias para...continuar a
desbaratar recursos!
8. O problema não é apenas nem principalmente de reduzir o imposto sobre
combustíveis, entendamo-nos - é o de definir e por em vigor uma resposta capaz, comum,
face a um problema muito grave, em vias de tornar-se ainda mais grave e cuja solução
pode acabar por ser a pior de todas – cedências atrás de cedências aos grupos
de interesses com maior capacidade de mobilização para provocar distúrbios
em locais públicos – será essa a "solução" que a União Europeia tem “na manga”?
9. Poderá servir para alguma coisa o exemplo da Coreia? Ou, com a habitual sobranceria
europeia, consideramos a Coreia, das economias mais avançadas do Mundo,
economicamente analfabeta?

terça-feira, 17 de junho de 2008

Mas onde é que está a novidade?

“Médicos regressam a Espanha e começam a faltar nos hospitais”! Foi hoje chamada de primeira página do Público. Mas qual é a novidade? O que é que está a acontecer de novo? Nada. O problema da falta de médicos do SNS em determinadas especialidades há muito que está diagnosticado, assim como também é um problema, que se tem vindo a acentuar, a desequilibrada distribuição territorial dos médicos em função das necessidades existentes. Também neste sector, à semelhança do que aconteceu noutros sectores estratégicos, não fomos capazes de antecipar a evolução da demografia e das necessidades ou se fomos negligenciámos as medidas políticas que se impunham no sentido de corrigir as assimetrias que inevitavelmente ocorreriam se nada fosse feito.
A verdade é que estamos hoje a pagar um défice preocupante de falta de médicos que dados mais recentes apontam se venha a agravar nos próximos anos. Para além dos problemas endógenos ao próprio funcionamento do SNS que contribuem para a transferência de profissionais para a actividade privada, a política seguida durante muitos anos, e que creio continua, do estabelecimento de um apertado número de vagas para ingresso nos cursos de medicina hipotecou o futuro. Sempre me questionei sobre o sentido de se exigirem notas de 19 valores para o acesso aos cursos de medicina, conduzindo os jovens rejeitados pelo sistema, com vontade e vocação para a profissão, a optarem - aqueles que dispõem de recursos financeiros para o fazer - por realizar os seus estudos de medicina em universidades no estrangeiro. Que políticas foram efectivamente adoptadas pelo governo para corrigir, agora e no futuro, a falta de médicos do SNS? Que planos consistentes foram lançados? Que resultados são esperados?
A propósito das nossas omissões estratégicas começamos também a constatar que é tempo de os governos desenvolverem programas estruturantes para incentivar a especialidade médica de geriatria. Somos um país que está a envelhecer muito rapidamente e que deveria estar preocupado em formar médicos especializados para lidar com a saúde dos velhos. Este é um domínio em que estamos muito atrasados sem que se compreenda porque é que, ao contrário do que estão a fazer muitos países europeus, não nos preparamos para lidar com o aumento da esperança de vida de modo a assegurar elevados níveis de bem estar na velhice? Porque é que nos estamos a atrasar? Enfim, perguntas que podem encontrar resposta na falta de visão, de vontade, de sensibilidade...Qualquer que seja, sem razão!

Direito natural!...

Segundo o DN, o Benfica vai pedir trinta milhões de euros à Federação Portuguesa de Futebol (FPF), caso se confirme a presença do FC Porto na próxima edição da Liga dos Campeões.
Claro que o Benfica deve participar na Liga dos Campeões, por indelével direito natural.
Claro que a Federação é culpada por não reconhecer esse direito. E deve pagar.
Claro que o facto de o Benfica ter sido o quarto classificado do Campeonato nada tem a ver com o assunto. Mas a Instituição tem que ser compensada pelos danos mateiais e morais da tão pífia classificação da "melhor equipa dos últimos dez anos". Direito natural.
Nota: Quanto à questão de fundo, e como já tenho referido, uma coisa é a lei e outra a ética. Prezo mais a ética. Mas são as leis que regem as instituições e o país. Muitas vezes, e quando são más, infelizmente!...

Com três letrinhas apenas se escreve a palavra mãe

A vida é realmente muito curiosa, dá voltas e mais voltas e de repente encontramos bocadinhos que julgávamos perdidos para sempre e que voltam, sorrateiramente, ficam ali a rir-se de nós como se tivessem ficado à espreita para nos enviar um sorriso de outros tempos.
Reparei nisso quando começámos a levar a minha mãe connosco ao fim de semana e ela voltou a integrar a nossa vida com uma proximidade que se tinha naturalmente esbatido desde que cada um seguiu a sua vida.
A princípio concentrava as atenções nas netas, dava-lhes mimos e fazia recomendações e deixava-se mimar e entreter por elas, deixando que eu tomasse conta de todas.
Agora, que as netas estão longe, voltou as atenções para mim. E, com toda a naturalidade, senta-se no alpendre enquanto eu ando por ali a cirandar e vai dizendo de vez em quando, com o tom que usava quando os filhos eram pequenos: - “Põe o chapéu, o sol está muito forte!” ou então, quando saímos para um passeio –“leva um casaco senão ficas com dores de garganta”. E eu gosto de me sentir filha única, assim com os cuidados dela só para mim.
Às vezes vai lá ter a irmã e ficam as duas a contar mil e uma histórias, a falar de gente que eu já não conheci, ou de que tenho apenas vaga ideia, mas é como se estivessem todos ali, a dar sentenças sobre o jardim e a gozar o sossego do fim da tarde na casa da família.
A minha tia leva o meu bolo preferido, é ela que o faz , cheio de frutas cristalizadas que lhe dão a oportunidade de rezingar porque já é difícil encontrar quem as venda, “agora é tudo artificial, ninguém quer ter trabalho”, e acabamos a por a mesa cá fora para o chá, quando não está vento.
Este fim de semana acordou de manhã e achei-a um pouco calada. “Dormiste bem, o que é que tens?” perguntei preocupada, sempre tem 83 anos, se calhar já estranha mudar de casa 2 dias por semana.
E respondeu-me com aquele tom de censura que me deixava furiosa quando eu era pequena, e exactamente as mesmas palavras que eu e as minhas irmãs lhe ouvimos mil vezes. – “Quem é que pode dormir com a tua tosse? Ouvi-te tossir duas vezes, vê lá se te alimentas que assim não sei onde vais parar! Mania das dietas!” e foi para a cozinha arranjar-me um copo de leite.
Fiquei a rir-me à socapa, a pensar que ela consegue o milagre de me fazer sentir criança outra vez…

Quando o homem respeita a natureza...

Foram uns dias bem passados, numa retirada curta da azáfama do dia-a-dia, num lugar em que a natureza, na certeza da sua beleza, brota maravilhas que serão flores mais tarde da nossa memória.
Foram uns dias calmos e serenos envoltos numa grande intensidade de espanto e de magia pela capacidade inesgotável da natureza surpreender pela sua generosidade e grandiosidade e de admiração pela capacidade demonstrada pelo homem de, ao logo do tempo, a ter respeitado, de a ela se ter rendido, tudo fazendo para a enaltecer e dela desfrutar, numa união harmoniosa sem reclamações de parte a parte.
Uns dias assim fazem bem ao corpo e à alma, constituem um bálsamo para as rotinas que a vida nos impõe e fazem-nos compreender melhor o seu sentido.
São dez da manhã, o céu está limpo, pintado de um azul muito luminoso. A temperatura amena e uma aragem fresca aconselham um agasalho leve mas aconchegante. O lago está sereno, sem fim, de um azul ainda mais azul que o do céu.
O passeio começa à hora certa, devagarinho, à descoberta, em cada avanço e em cada paragem, de um quadro idílico de formas, de sombras, de recortes paisagísticos e de profundidades entre a montanha recheada de florestas e o lago e de uma variedade infinita de cores e tonalidades que combinam a presença de jardins e de casario que não se cansam de decorar os quilómetros de margens que nunca acabam. Os sons no meio do silêncio e os cheiros aromáticos numa atmosfera primaveril completam o cenário.
O itinerário cumpre-se com paragens em locais que pela sua beleza natural, artística ou histórica justificam a visita. Locais – pequenas aldeias, vilas, ilhas, penínsulas - que oferecem palácios e villas - verdadeiros museus - que outrora, recuando séculos no tempo, o homem com delicadeza e sensibilidade aí construiu em estilos ora gótico ora romântico, rodeados de belos, imensos, luxuriantes e raros jardins, de uma arquitectura fina e de muito bom gosto na escolha das flores e árvores que os decoram. Locais que convidam a desfrutar as vistas a perder de vista em pontos mais elevados, meticulosamente escolhidos no passado distante, mas sem hesitação, pela deliciosa sensação de beleza do olhar perdido na grande imensidão das montanhas, do lago, das suas águas e margens, na busca de tudo ver e tudo sentir, de descobrir as novas maravilhas da próxima paragem. E o que dizer do habitat animal? Hospitaleiro, gracioso e elegante com os seus pavões, gansos e pássaros que não param de se exibir.
Os hotéis de charme fazem o sonho do turista que procura um sítio repousante, pois uma tal beleza requer tempo e serenidade para ser sentida.
O passeio termina pelas sete horas da tarde, sem atrasos, sem cansaço, sem urgência de acabar, como que algo que não deveria ter chegado ao fim, com a sensação de que muito ficou por sentir, porém com a certeza de que o que foi visto e vivido foi grande para perceber que aquele local é um paraíso. A não esquecer e a compreender que o homem quando quer estima a natureza como fazendo parte de si próprio!
O Lago Como, no norte de Itália, é uma jóia a visitar. É uma verdadeira “obra de arte”, da pintura, da arquitectura e da poesia. Um lugar ao qual gostaria de voltar. Uma sugestão de rara preciosidade que, não correndo grande riscos, posso recomendar. Claro, para quem gosta destas coisas!

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Câmara Clara/Cântico Negro

O programa de Paula Moura Pinheiro, Câmara Clara, transmitido nas noites de domingo na RTP2 é um bálsamo para os sentidos no nauseante panorama da TV actual, transformada numa competição de absurdos e de manifestações de mau gosto entre todas as operadoras (competição onde nenhuma ganha, por mais que se esforce, porque sendo o nível o mesmo o resultado é o sempre o empate).
Um dos momentos de rara excelência aconteceu no programa de ontem: a conversa com Germana Tânger, senhora de clarividentes 88 anos, que diz (não declama!) poesia como poucos dizem, e que ali o demonstrou com um poema de Fernando Pessoa.
Recordou-se outro génio da palavra dita e sentida, João Villaret. Para quem gosta, colhido por aí, na rede, o Cântico Negro de José Régio, dito da forma inolvidável de que Villaret era capaz

domingo, 15 de junho de 2008

Os exames das florzinhas de estufa

Os exames nacionais finais do ensino básico e secundário começam na próxima terça-feira, com as provas de Português, e são protegidos por 7.000 militares da GNR.
Com a época, logo aparecem os comentadores e os tratadistas, os pedagogos, psicólogos e metodólogos, e todos os muito bem pensantes a alertar para os traumatismos e o horrendo stress que os exames provocam nas tenras mentes de quem se sujeita a tais absurdas provas.
A situação é hoje relatada em artigo de Mário Cordeiro, professor de Pediatria, no DN de hoje-Notícias Magazine.
“Exames, exames…é o stress total. Filhos angustiados, pais em pânico, horários em desordem, quartos a parecerem cenários de pós-guerra, discussões a estalarem por tudo e por nada. É assim a vida de muitas casas onde há jovens a aproximar-se da receada hora dos exames…”
Enfim, é gentinha desta que a nossa educação está a criar: florzinhas de estufa, que se enervam e estiolam a qualquer aragem…Sugiro que os ponham sempre numa redoma: na escola, no trabalho, na vida. E tenham-lhes um psicólogo sempre à mão, preferentemente com os mesmos problemas. Consolar-se-ão uns aos outros!...
Cá por mim, começo agora a ficar traumatizado por não ter ficado traumatizado com os exames que fiz!...
Até porque arranjar um qualquer traumatismo psicológico é mesmo a única forma que me resta de não ficar fora do sistema e ser considerado um troglodita execrável…

sábado, 14 de junho de 2008

“Japoneses inventam carro a água”

Como não sei, ainda, colocar vídeos, convido os leitores a consultarem o site da BBC Brasil onde poderão ver uma pequena reportagem sobre um automóvel movido a água.
A empresa japonesa Genepax apresentou, nesta quinta-feira, um protótipo para um carro movido a água.
Segundo a empresa, com um litro de água consegue andar a 80 Km/hora, por uma hora”.
Parece que procuram patrocinadores. O nosso PM bem podia aproveitar a ocasião. Em breve teríamos o problema dos combustíveis fósseis resolvido. Água não falta e parece que serve qualquer uma. Até chá! Os motores destes carros não são esquisitos! E podíamos, também, vingar-nos dos pançudos dos árabes, vendendo-lhes água ao preço do petróleo. O pior é como é que o Estado iria arrecadar o equivalente ao imposto sobre combustíveis...

“Risco de preservativo furado”...



Esta rapaziada do marketing lembra-se de cada uma que não passa pela cabeça do diabo.
Agora, nos Estados Unidos, aproveitando a boleia da campanha eleitoral em curso, Barack Obama e John McCain, a empresa Practice Safe Policy lançou no mercado preservativos com as figuras e nomes dos candidatos! Também são acompanhados de alguns avisos, do género “oferecem mais protecção do que o serviço secreto”. No caso dos “preservativos McCain”, “velho, mas não vencido” (não sei se são preservativos fora de prazo!), “testados no campo de batalha”, numa alusão à participação do republicano na Guerra do Vietname, mas que se pode confundir com a reutilização dos mesmos! Relativamente aos preservativos “democráticos”, marca Obama, apresentam avisos do género: “Quem disse que é necessário experiência?” De facto, pode não ser preciso ter experiência, mas é melhor que alguém ensine a utilizá-los, caso contrário pode sair disparate!
De qualquer modo, o fabricante alerta para o facto de que “não são 100% seguros”! Claro que isso é mais do que evidente.
Esta notícia despertou-me uma série de questões. Por exemplo, o que é que um democrata irá utilizar? Preservativos “democráticos” ou “republicanos? Claro que a pergunta não deve ser feita relativamente aos republicanos, porque, de um modo geral, não são grandes apologistas destes meios contraceptivos e de protecção contra as doenças sexualmente transmissíveis. Voltando aos democratas, estou convicto de que optarão mais pelo latex “McCain”! Não perguntem porquê. É um “feeling”!
Mais outra pergunta. O que é que faria o fabricante caso a candidata fosse a democrata Hillary Clinton? Produziria diafragmas ou preservativos femininos “Hillary”?
Ponho-me a pensar se uma iniciativa deste género não teria sucesso em Portugal. Como temos figuras públicas aos magotes, as mesmas podiam ser utilizadas nas simpáticas caixas acompanhadas de diversos avisos à navegação. De acordo com a situação escolheriam a “marca” mais adequada ao momento. Não vou exemplificar, porque poderia ser mal interpretado pelas pessoas que me estão a passar pela cabeça! Caso houvesse entre nós fabricantes de “marcas nacionais”, utilizando figuras de algumas individualidades, deveria ser obrigatório aplicar nas caixinhas o seguinte aviso: “Perigo! Risco de preservativo furado”...
E bem furado!

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Carta da Corcunda para o Serralheiro (Maria José, heterónimo de Fernando Pessoa)

"Não sei quem me sonho" (Fernando Pessoa, "Chuva Oblíqua")
Fernando Pessoa gastou a sua vida a sonhar-se outras pessoas, a experimentar várias máscaras, a vestir-se com a pele dos que observava e a ocultar-se assim aos olhos de todos. Não sei se chegou a viver uma vida própria, acho que não e terá sofrido por isso, mas o seu génio e a sua arte permitem-nos a nós viver com ele uns e outros.
De tantas peles que vestiu, usou por uma vez a de uma mulher, Maria José, uma deficiente presa no seu corpo incapaz de inspirar o amor, alguém que vê passar o mundo da sua janela, também ela se sonha ser outra, ser como os outros, como ela imagina que são os outros. É assim essa carta:

Senhor António:
O senhor nunca há de ver esta carta, nem eu a hei de ver segunda vez porque estou tuberculosa, mas eu quero escrever-lhe ainda que o senhor o não saiba, porque se não escrevo abafo.
O senhor não sabe quem eu sou, isto é, sabe mas não sabe a valer. Tem-me visto à janela quando o senhor passa para a oficina e eu olho para si, porque o espero a chegar, e sei a hora que o senhor chega. Deve sempre ter pensado sem importância na corcunda do primeiro andar da casa amarela, mas eu não penso senão em si. Sei que o senhor tem uma amante, que é aquela rapariga loura alta e bonita; eu tenho inveja dela mas não tenho ciúmes de si porque não tenho direito a ter nada, nem mesmo ciúmes. Eu gosto de si porque gosto de si, e tenho pena de não ser outra mulher, com outro corpo e outro feitio, e poder ir à rua e falar consigo ainda que o senhor me não desse razão de nada, mas eu estimava conhecê-lo de falar.
O senhor é tudo quanto me tem valido na minha doença e eu estou-lhe agradecida sem que o senhor o saiba. Eu nunca poderia ter ninguém que gostasse de mim como se gostasse das pessoas que têm o corpo de que se pode gostar, mas eu tenho o direito de gostar sem que gostem de mim, e também tenho o direito de chorar, que não se negue a ninguém.
Eu gostava de morrer depois de lhe falar a primeira vez mas nunca terei coragem nem maneiras de lhe falar. Gostava que o senhor soubesse que eu gostava muito de si, mas tenho medo que se o senhor soubesse não se importasse nada, e eu tenho pena já de saber que isso é absolutamente certo antes de saber qualquer coisa, que eu mesmo não vou procurar saber.
Eu sou corcunda desde a nascença e sempre riram de mim. Dizem que todas as corcundas são más, mas eu nunca quis mal a ninguém. Além disso sou doente, e nunca tive alma, por causa da doença, para ter grandes raivas. Tenho dezanove anos e nunca sei para que é que cheguei a ter tanta idade, e doente, e sem ninguém que tivesse pena de mim a não ser por eu ser corcunda, que é o menos, porque é a alma que me dói, e não o corpo, pois a corcunda não faz dor.
Eu até gostava de saber como é a sua vida com a sua amiga, porque como é uma vida que eu nunca posso ter — e agora menos que nem vida tenho — gostava de saber tudo.
Desculpe escrever-lhe tanto sem o conhecer, mas o senhor não vai ler isso, e mesmo que lesse nem sabia que era consigo e não ligava importância em qualquer caso, mas gostaria que pensasse que é triste ser marreca e viver sempre só à janela, e ter mãe e irmãs que gostam da gente mas sem ninguém que goste de nós, porque tudo isso é natural e é a família, e o que faltava é que nem isso houvesse para uma boneca com os ossos às avessas como eu sou, como eu já ouvi dizer.
Houve um dia que o senhor vinha para a oficina e um gato se pegou à pancada com um cão aqui defronte da janela, e todos estivemos a ver, e o senhor parou, ao pé do Manuel das Barbas, na esquina do barbeiro, e depois olhou para mim, para a janela, e viu-me a rir e riu também para mim, e essa foi a única vez que o senhor esteve a sós comigo, por assim dizer, que isso nunca poderia eu esperar.
Tantas vezes, o senhor não imagina, andei à espera que houvesse outra coisa qualquer na rua quando o senhor passasse e eu pudesse outra vez ver o senhor a ver e talvez olhasse para mim e eu pudesse olhar para si e ver os seus olhos a direito para os meus.
Mas eu não consigo nada do que quero, nasci já assim, e até tenho que estar em cima de um estrado para poder estar à altura da janela. Passo todo o dia a ver ilustrações e revistas de modas que emprestam à minha mãe, e estou sempre a pensar noutra coisa, tanto que quando me perguntam como era aquela saia ou quem é que estava no retrato onde está a Rainha de Inglaterra, eu às vezes me envergonho de não saber, porque estive a ver coisas que não podem ser e que eu não posso deixar que me entrem na cabeça e me dêem alegria para eu depois ainda por cima ter vontade de chorar.
Depois todos me desculpam, e acham que sou tonta, mas não me julgam parva, porque ninguém julga isso, e eu chego a não ter pena da desculpa, porque assim não tenho que explicar porque é que estive distraída.
Ainda me lembro daquele dia que o senhor passou aqui ao Domingo com o fato azul claro. Não era azul claro, mas era uma sarja muito clara para o azul escuro que costuma ser. O senhor ia que parecia o próprio dia que estava lindo e eu nunca tive tanta inveja de toda a gente como nesse dia. Mas não tive inveja da sua amiga, a não ser que o senhor não fosse ter com ela mas com outra qualquer, porque eu não pensei senão em si, e foi por isso que invejei toda a gente, o que não percebo mas o certo é que é verdade.
Não é por ser corcunda que estou aqui sempre à janela, mas é que ainda por cima tenho uma espécie de reumatismo nas pernas e não me posso mexer, e assim estou como se fosse paralítica, o que é uma maçada para todos cá em casa e eu sinto ter que ser toda a gente a aturar-me e a ter que me aceitar que o senhor não imagina. Eu às vezes dá-me um desespero como se me pudesse atirar da janela abaixo, mas eu que figura teria a cair da janela? Até quem me visse cair ria e a janela é tão baixa que eu nem morreria, mas era ainda mais maçada para os outros, e estou a ver-me na rua como uma macaca, com as pernas à vela e a corcunda a sair pela blusa e toda a gente a querer ter pena mas a ter nojo ao mesmo tempo ou a rir se calhasse, porque a gente é como é e não como tinha vontade de ser.
O senhor que anda de um lado para o outro não sabe qual é o peso de a gente não ser ninguém. Eu estou à janela todo o dia e vejo toda a gente passar de um lado para o outro e ter um modo de vida e gozar e falar a esta e àquela, e parece que sou um vaso com uma planta murcha que ficou aqui à janela por tirar de lá.
O senhor não pode imaginar, porque é bonito e tem saúde o que é a gente ter nascido e não ser gente, e ver nos jornais o que as pessoas fazem, e uns são ministros e andam de um lado para o outro a visitar todas as terras, e outros estão na vida da sociedade e casam e têm baptizados e estão doentes e fazem-lhe operações os mesmos médicos, e outros partem para as suas casas aqui e ali, e outros roubam e outros queixam-se, e uns fazem grandes crimes e há artigos assinados por outros e retratos e anúncios com os nomes dos homens que vão comprar as modas ao estrangeiro, e tudo isto o senhor não imagina o que é para quem é um trapo como eu que ficou no parapeito da janela de limpar o sinal redondo dos vasos quando a pintura é fresca por causa da água.
Se o senhor soubesse isto tudo era capaz de vez em quando me dizer adeus da rua, e eu gostava de se lhe poder pedir isso, porque o senhor não imagina, eu talvez não vivesse mais, que pouco é o que tenho de viver, mas eu ia mais feliz lá para onde se vai se soubesse que o senhor me dava os bons dias por acaso.
A Margarida costureira diz que lhe falou uma vez, que lhe falou torto porque o senhor se meteu com ela na rua aqui ao lado, e essa vez é que eu senti inveja a valer, eu confesso porque não lhe quero mentir, senti inveja porque meter-se alguém connosco é a gente ser mulher, e eu não mulher nem homem, porque ninguém acha que eu sou nada a não ser uma espécie de gente que está para aqui a encher o vão da janela e a aborrecer tudo que me vêm, valha me Deus.
O António (é o mesmo nome que o seu, mas que diferença!) o António da oficina de automóveis disse uma vez a meu pai que toda a gente deve produzir qualquer coisa, que sem isso não há direito a viver, que quem não trabalha não come e não há direito a haver quem não trabalhe. E eu pensei que faço eu no mundo, que não faço nada senão estar à janela com toda a gente a mexer-se de um lado para o outro, sem ser paralítica, e tendo maneira de encontrar as pessoas de quem gosta, e depois poderia produzir à vontade o que fosse preciso porque tinha gosto para isso.
Adeus senhor António, eu não tenho senão dias de vida e escrevo esta carta só para a guardar no peito como se fosse uma carta que o senhor me escrevesse em vez de eu a escrever a si. Eu desejo que o senhor tenha todas as felicidades que possa desejar e que nunca saiba de mim para não rir porque eu sei que não posso esperar mais.
Eu amo o senhor com toda a minha alma e toda a minha vida.
Aí tem e estou toda a chorar."
("Carta da Corcunda para o Serralheiro", texto publicado na revista Egoista, número especial, Junho 2008)