KLÊNIO BARROS
A trajetória do jovem trombonista potiguar, que saiu de Cruzeta,tornou-se professor de música e agora parte rumo à Europa
A EMOÇÃO DE TOCAR SENTIMENTOS
Por
Pedro Vale DO NOVO JORNAL
Pedro Vale DO NOVO JORNAL
Se Klênio Barros pudesse descrever em uma palavra o que significa música para ele, o vocábulo escolhido seria “emoção”. Para o trombonista de 25 anos, fazer música é mais do que tocar as notas certas no tempo adequado: o que importa são os sentimentos que os que tocam conseguem despertar nos que ouvem. E foi essa grande emoção tanto no ouvir quanto no fazer música que fez com que aquele menino de Cruzeta chegasse à capital do estado, conquistasse a noite natalense, se tornasse professor universitário, lançasse um disco próprio e agora se prepare para fazer, em setembro, um curso de mestrado em Portugal.
Antes de descrever as conquistas do cruzetense, entretanto, voltemos alguns anos atrás. O gosto pela música surgiu em Klênio ainda quando ele era muito pequeno e nem se imaginava fora de Cruzeta, município de 8 mil pessoas da região do Seridó, localizado a 219 km de Natal. “Lá em casa eu sempre acordava com o som do radinho de pilha da minha mãe. Eu me levantava, tomava café e me arrumava pra escola ouvindo o baião, xote e forró pé-de-serra de Dominguinhos e Luiz Gonzaga”, recorda o músico. Porém, foi somente aos 13 anos que Klênio realmente foi tocado pela música. Ele ainda lembra da ocasião com clareza. Cruzeta estava em festa, no auge das comemorações da Festa da Padroeira, e no meio das atrações tocava a Banda Filarmônica 24 de Outubro, formada por membros da Escola de Música de Cruzeta.
Enquanto os outros adolescentes passavam, escutavam por alguns minutos e logo se dispersavam, Klênio se sentiu absolutamente hipnotizado por um instrumento específico: o trombone de vara. “Bati o olho no trombone e me encantei. Enquanto os outros instrumentos de sopro possuem orifícios que servem para regular as notas, a música do trombone é feita só pelo deslizar da vara. Imaginei que aquilo devia ser dificílimo, mas achei fantástico e decidi que queria tocar aquilo”, lembra.
Inspirado pela vivência, o cruzetense passou a visitar frequentemente os ensaios da banda. Certo dia ele ficou sabendo que uma turma de teoria musical havia sido aberta na Escola de Música, e o menino não tardou a se inscrever. As aulas eram ministradas pelo maestro Bembem, que desde aquela época é o regente da Filarmônica 24 de Outubro. “No interior o pensamento geral é que músico é uma carreira sem futuro, sem perspectiva. Eu mesmo pensava assim. O maestro Bembem foi o responsável por mudar meu ponto de vista e foi incentivado por ele que decidi seguir a carreira”, conta Klênio.
Ao ser informado de que a vaga de trombonista da Filarmônica havia ficado vaga, o jovem não hesitou em participar do teste para preencher a vaga. O resultado foi um fracasso completo: “Não consegui nem soprar o trombone”, relata Klênio aos risos. “Outro cara conseguiu a vaga”, completa.
Contudo, essa primeira derrota não foi capaz de acabar com o ânimo do cruzetense: tão logo o rapaz que havia assumido o posto de trombonista largou a banda, ele se candidatou a preencher a vaga e, desta vez, foi escolhido. Embora estivesse satisfeito na banda, logo surgiu em Klênio o desejo de se aperfeiçoar na sua arte e, incentivado principalmente pelo maestro Bembem, o rapaz - então com 14 anos - resolveu participar de um curso técnico da Escola de Música da Universidade Federal do RN. Seus pais não gostaram da ideia a princípio: “Achavam que todo músico é cachaceiro, esse tipo de coisa”, explica. Com o tempo, entretanto, eles perceberam que o filho estava de fato determinado e deixaram que ele se inscrevesse no curso técnico de trombone.
Klênio cursou pós-graduação e está prestes a embarcar rumo a Europa
NATAL E ALÉM
O curso era ministrado duas vezes por semana, e Klênio teve que se virar para conciliar os estudos de ensino médio em Cruzeta com as aulas de trombone na Escola de Música. “Toda semana eu precisava fazer as quatro horas de ônibus entre Cruzeta e Natal. Como as aulas de trombone eram em dias de semana, eu também perdia dois dias letivos da escola em Cruzeta”, conta.
O jovem também tinha pouco dinheiro e não tinha onde ficar na capital; sua salvação foi o Giulvando Pereira, seu professor de trombone e mais conhecido como Azeitona. Pereira praticamente adotou o pupilo, oferecendo-lhe teto e comida. Antes de concluir o curso técnico, o aprendiz a trombonista se formou no ensino médio e prestou vestibular de bacharelado em Música, com habilitação em Trombone, na UFRN.
Passou de primeira na prova e se deslocou definitivamente para Natal, onde passou a morar em uma residência universitária. Através da universidade, Klênio fez amizade com outros músicos, expandiu sua rede de contatos e não demorou a tocar nos bares e botecos da noite natalense. “Essa fase foi um período muito produtivo da minha vida. Tocava com grandes nomes como Jubileu, Chico Beethoven e Eduardo Talfic. Através de Chico, fui convidado para tocar na banda de Valquíria Santos, com quem fiquei por uns oito meses”, lembra.
As apresentações não se limitavam ao Rio Grande do Norte: com Valquíria, Klênio tocou em Alagoas, Piauí, Paraíba e outros estados nordestinos. Ao deixar a banda, já havia atingido um certo reconhecimento profissional e, segundo descreve, seu telefone nunca parava de tocar.
No entanto, o cruzentense não demorou a se fixar novamente em outro conjunto musical. Pouco depois de ter deixado a banda da forrozeira Valquíria Santos, Klênio foi convidado para tocar a música latina do Perfume de Gardênia, banda com a qual chegou a ficar cinco anos. “Saí em 2010 por problemas pessoais, mas cresci muito no Perfume de Gardênia. Gravei três discos e um DVD com a banda, a gente tocava todo sábado em Recife... Sem contar com os contatos que a gente fazia. Junto com Jubileu no trumpete e Chico Beethoven no sax, cheguei a tocar com bandas como Cavaleiros do Forró, Saia Rodada e Cidade Negra”, relata o jovem.
Logo após sair do Perfume, Klênio fez um teste para professor substituto de trombone na universidade (Azeitona, que ainda exercia o cargo, o deixou para fazer um mestrado em João Pessoa) e foi aprovado. Embora lecione até hoje na universidade, logo o trombonista terá que sair para dar lugar ao professor Azeitona, que retorna neste segundo semestre.
Klênio Barros possui um disco de música instrumental completamente de sua autoria, intitulado “Klênio Barros em Segredos”. A obra, com 11 faixas recheadas de choro, samba e gafieira, foi lançada no ano passado, durante o 17º Festival de Trombone, realizado em Natal/RN.
Mas a jornada do cruzetense não acaba por aqui: há cerca de dois meses ele foi selecionado para fazer um curso de mestrado em “Práticas Interpretativas do Século XX e XXI” na Universidade de Aveiro, em Portugal, começando em setembro. Em sua corrida na qual apenas o céu é o limite, a maior preocupação de Klênio é com dona Maria Jaecy, sua mãe: “Ela está feliz por mim, mas também está nervosíssima porque eu vou pra longe. Coisa de mãe”, ri o músico.
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