quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

...



Nas janelas botemos grades,
cadeados em todos os portões,
tranquemos a porta da sala,
de nossas vidas façamos prisões.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Sobre gatos e gatas

                                    
Não me gasto com o gosto dos gatos,
Nem com seus gestos inatos:
pois há gato que gosta de gata
E gato que gosta de gato.

Que se desgastem gatas e gatos
em seu mais felino trato:
se agatanhem nos muros altos:
miando, gemendo em seus atos.

Só o gatuno é que constata:
vigia o movimento no mato,
no teto, vê os afetos e tatos
e, podendo – os rouba, os mata.

A gata se preocupa com o fato,
defende-se com unhas de prata:
pois há gata que gosta de gato
e gata que gosta de gata.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Mais Valia (II)


O café e o cigarro
movem a máquina
chamada trabalho.
Seus benefícios
estão no pigarro
e no catarro,
que movem comícios,
rodas de carros
e homens de barro
cheios de vícios
em seus edifícios
feitos do escarro,
também do suplício
do suor do ofício
de quase-escravos,
que são o resquício
de um mundo bizarro.

Mas camuflá-lo
é só o artifício
dos que apunhalo,
que sem exercício
(ou sacrifício)
com cristas de galo
regem este hospício,
riem, tiram sarro,
fodem o orifício
dos que me igualo.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

terça-feira, 6 de novembro de 2012

...

A chuva cai sobre todos,
mas só no poeta
ela germina palavra.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Tormenta no Planeta Vermelho


a D. Everson e os demais marcianos por demais

A chuva ácida de Marte
corrói os meus pensamentos,
destrói concretos-momentos
e espalha ao léu suas migalhas

com o passar de seu tempo
é a tempestade que entalha
desertos, moinhos de vento
e carrancas pelas muralhas

Então, mostro a carne nua
espero que me moa o osso,
exiba o cérebro exposto
e eu peça: “Vem! Me destrua!”

Mas se tu não estás disposto
a dissolver-te em tua arte,
não provas seu amargo gosto,
por nojo, nem tiras a luva,
é melhor não vir a Marte
sem a tua capa-de-chuva.


segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Mandalas

O sol permeia minha veia
Doce, doce teia
Neural!
Sinapses!
Elipses!
Espiral!

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Cismado

Sol do caralho, Conde da Boa Vista,
cavalgo meu espírito fatalista

desprovido de qualquer sonho ou luto
como um navegante sem terra à vista
perdendo os dentes graças ao escorbuto.

É meio-dia na minha caixa craniana,
e dentro meu cérebro ferve, frita,
desolado com a estupidez humana.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

E o vento não levou...

Scarlett caminha vazia
pelo lixão da Muribeca,
sem isso a fome é tão certa
quanto o sol nasce no outro dia.

Ter um nome de Hollywood
não lhe poupou das pernas tortas,
nem dos urubus que à miúde
retornam ao alto de sua porta.

Incomoda uma dor no peito,
mas importa mais sua barriga.

No seu rosto, o olho já seco,
drenado pela própria vida,
não carrega choro, nem lume,
somente chorume.


domingo, 16 de setembro de 2012

terça-feira, 28 de agosto de 2012

O Patriarca

Meu filho,
o vento já dobra minha coluna
e os anos se acumularam em azulejos e tijolos
a tapar-me as pálpebras,
minha barba e cabelos adquiriram este tom
de outono e inverno
ou da fogueira depois da morte do último tição.

Só me resta rastejar,
temer a noite e seus perigos,
andar tateando os móveis
e esconder-me embaixo de minha cama,
enquanto me ronda
a ingrata amiga com sua foice.

Por isso,
deixo meu último conselho:
aproveite o seu dia
e não me tenha como exemplo.
Não tente, como eu,
se prolongar neste último verso.

sábado, 18 de agosto de 2012

O que fazer?

A mim, peço que me deixes num terreno baldio
e espere que os bichos venham e devorem minha face.
Depois, olhe bem em meus olhos e pergunte:

"Quem és tu, poeta descartável!?
Atado ao nada de ti mesmo
e fadado a um ato assim tão podre?
Agora, só contaminas esse lote com tua química
e daí, bem sabes, só brotarão tumores."

Depois, me amarre em suas costas
e carregue até tua casa,
só por delicadeza,
me apresente a todos teus amigos:
"Olhe, este era meu amigo,
era como um irmão para mim
ou o pai que nunca conheci!" 

A outro diga:
"Não te envergonhes,
pode olhar sua boca aberta...
Por que não encarar os tapurus em seus lábios?
Por favor, não se reprima!
Vomite se achar necessário!"

Então, quando me considerares inútil
até para os teus chegados,
recite um poema meu qualquer,
cante uma canção que eu gostava
sobre os porcos nas nossas asas,
ou o brilho dos diamantes,
uma dessas que me fazia lembrar que estava vivo.

E se por acaso eu me mexer
ou aparentar dançar com meu cadáver torto,
não se preocupe, saberei: "ainda estou morto"
e não voltarei para dizer-te nada
ou assustar-te nas noites mais frias,
mas é que a música ficou gravada em meus pés
e a dança era uma parte mais fluida em mim do que a palavra.

Porém, se nada disto acontecer
não tenhas medo,
acalme teus companheiros
meu corpo seguirá vazio,
tão desalmado quanto sempre.
Não gastes mais teu tempo a recordar o inexistente,
passe para o próximo momento:
a vida é isto.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

A Serpente

Será que a serpente sente
que foi uma condenação
arrastar o seu duro ventre
entre as folhas secas no chão?

Será que ela está consciente
de seu tamanho pecado
e ainda guarda dormente
na boca a língua do Diabo?

Será que se arrependeu,
por isso ela se fere:
como um castigo de Deus
arranca a própria pele?

Será que ainda tem conversas
escusas com Satanás?
Se juntam todas as terças
e criam pecados mortais?

Será que ela se enrosca
em seu tridente medonho?
E tem carícia nas costas,
riquezas, como num sonho?

A serpente só se importa,
na verdade, com sua toca
e com sua vítima morta,
espremida toda torta,

dando uma boa refeição.
O seu ataque sorrateiro
não é por outra condição,
com o seu bote certeiro

ou aleja ou mata o cristão.
Médico, padre ou coveiro
sabem que não há salvação
se ela está num oitizeiro,

pois neste dia tão fatídico
não terá em qualquer lugar,
nenhum soro anti-ofídico
que consiga lhe curar.

Mas toda e qualquer serpente
sabe, em seu rastejar
sinuoso e intermitente,
quando ficar ou avançar.

E gosta de ser serpente,
prefere o áspero piso
a ter de ser como a gente
que mente forçando o riso.








quarta-feira, 18 de julho de 2012

Um poeminha curto II


O único problema de ser
só mais um sob o sol
é, às vezes, se esquecer
que a chuva canta em si bemol.





domingo, 1 de julho de 2012

Madeira

Cai madeira, cai madeira!
Quanta besteira
é derrubar uma floresta inteira.

Cai madeira, cai madeira!
Quanta besteira
é estuprar a selva com uma escavadeira.
Cai jatobá, cai jaqueira,
corta o jagube, a madureira
e lá de longe eu a esperar:

Cai madeira, cai madeira!
Quanta besteira
é queimar o tronco da amoreira
ou duma trepadeira,
que já carrega em sua semente
o clarão de uma fogueira.

Cai madeira, cai madeira!
Quanta besteira
é destroçar o interior de uma figueira,
da chacrona ou da aroeira,
que cura a cabeça e a bicheira,
o corte e a asneira.

Melhor seria ter mais soja e parreira,
mais prédios, mais bancos, mais cadeiras,
mais gente a viver na Tamarineira,
mais cápsula, mais motos, mais pedreiras
nos corações de homens enterrados
e chorados por velhas carpideiras.

Cai madeira, cai madeira!
Quanta besteira!
Melhor seria plantar só bananeira
para ver se o mundo, pela vez primeira,
vá pra um lugar que nunca se esqueça
que melhor seria estar de ponta-cabeça.