Escrevo-te na intenção de desvendar-me. Pintar quadros de uma existência que precede a essência e que forjamos todos os dias. Faço poemas para os outros, tendo de mim mais ou além do que sou, mas faço e escrever-te é tentar atirar contra mim mesma. Somos feitos da mesma matéria. Retalhos da mesma carne. Somos dois multiplicados, ora subtraídos, diluídos em outros e existindo de novo.
Proponho-me ao exercício da interpretação. Excluir os fatos para subordiná-los como conseqüência do que somos. E assim abro margem para divagações. Misturamos-nos, temperados pela mesma dor e o mesmo sangue, numa universalidade que nos faz únicos diante dos outros. Assim também te proponho ao experimento do olhar, calcular desmedidamente as ações e depois assumir não só os ricos como também as falhas.
Depois do café, do cigarro e do banho, tomando aquela velha sensação que de tudo já havia sido dito, mergulhei no espelho da fatalidade e deixei que o silêncio não culpasse os culpados. Separei os fatos, diluí com tinta e pimenta e puxando da terceira gaveta um bloco de folhas em branco, uma caneta e comecei o momento intranqüilo da confissão. Não sabia ao certo a quem endereçaria, talvez a mim ou a você, que no final, era a mesma coisa. Sempre fizemos um em dois, longe daquela figuração romântica. Estava certa, tudo aquilo e isso que despejo, vomito ou simplesmente confesso não havia um endereço para chegar, para ser recebido, apenas existia enquanto vivo. Talvez fosse para os olhos famintos de quem precisasse de algo para devorar, talvez fosse para alguém que engoliria as palavras como pedras para que pouco a pouco fossem dissolvendo e ganhando sentido e pensar assim insuflava a determinação de ir até o fim e suportar a conseqüência.
Mas ainda sim escrevo pensando que você era o endereçado, que você em algum momento, no trânsito, na cama, em algum deserto, leria com olhos de medo esse desalinho todo que provocou por tão longos anos. Penso na sua invisibilidade, em suas mãos muda a tatear em mim sentido, em sua fala pequena a agredir minhas ações e lembro como era difícil existir com você por perto.
Pronto. O silêncio outra vez a manchar a ocorrência dos fatos. Entrego-me, fazer isso é a única coisa que me resta. Deixar que minha interpretação avançasse sobre nossa realidade construída. É impossível não existir antes. E ser essa imensidão me faz mergulhar cada vez mais fundo na profundeza dos meus e teus olhos, que não vejo, mas imagino. Pronto, mais um tiro no escuro, com vítima certa, apesar de tudo. Falar dos teus olhos é falar em abismo, de uma escuridão, que hoje esclarece os fatos, que os desmontam primeiro, para depois me possibilitar interpretá-los sem culpa, mas nunca sem medo.
Foi por causa dos teus olhos, hoje, especialmente mais misteriosos e calmos amendoados como os meus cabelos, que deixei de ver em ti o caminho fervoroso dos meus dias. Esses olhos que roubaram os meus gritos de prazer ou de dor, olhos miseráveis, a espreitarem o meu acidente. Olhos luminosos a escurecerem minha fala, por eles é que não pude lutar, por causa do repleto vazio que nele abriga. Naquele vazio que vem de um nada maior, um nada que é tudo, que denuncia que dilata como a pupila prestes a se apaixonar. Foram esses olhos, eterno apocalipse, que favoreceu o acontecimento fatal, apenas a olhadela desinteressada do teu assombro que em mim retumbou como desmoronamento. Isso apenas me basta. A lembrança desse olhar faz-me recolher por um instante as palavras, como se estivessem espalhadas no chão e guardá-las sob a custódia da ignorância ou da culpa, ou seria do medo? Não sei.
E despejando aqui sobre os olhos daquela interpretação que disse antes, penso que na sua suposta organização limpa, tomando um drink, depois de ouvir um bom clássico, é a mim que involuntariamente vais recorrer. É o caos apoteótico da minha existência que o fará companhia nas longas noites que faz dos teus dias. São nas alegorias da minha personalidade que você, tão metódico e categórico, recorrerá para calar a desordem que se aproxima a cada dispontar da minha ausência.
“- Não se preocupe, será o nosso segredo. Não irei maldizer da tua fraqueza maior, estou apenas interpretando”. Apenas dando a razão liberdade para que seja mais simples ou complexa, dependendo da dimensão e da altura que se olha. Não se assuste com a certeza, certezas sempre foram falhas e perder é um vício. Não se limite a pensar também que tudo é apenas um enorme esforço do meu inventar, embora goste das engenhosas invenções, sei o limite entre o real e a fantasia. O que houve entre nós sempre esteve antes no meio desses dois extremos. Daqui de onde olho é o que posso ver. Talvez eu tire os óculos e mais tarde veja com mais compaixão e menos zelo.
Proponho-me ao exercício da interpretação. Excluir os fatos para subordiná-los como conseqüência do que somos. E assim abro margem para divagações. Misturamos-nos, temperados pela mesma dor e o mesmo sangue, numa universalidade que nos faz únicos diante dos outros. Assim também te proponho ao experimento do olhar, calcular desmedidamente as ações e depois assumir não só os ricos como também as falhas.
Depois do café, do cigarro e do banho, tomando aquela velha sensação que de tudo já havia sido dito, mergulhei no espelho da fatalidade e deixei que o silêncio não culpasse os culpados. Separei os fatos, diluí com tinta e pimenta e puxando da terceira gaveta um bloco de folhas em branco, uma caneta e comecei o momento intranqüilo da confissão. Não sabia ao certo a quem endereçaria, talvez a mim ou a você, que no final, era a mesma coisa. Sempre fizemos um em dois, longe daquela figuração romântica. Estava certa, tudo aquilo e isso que despejo, vomito ou simplesmente confesso não havia um endereço para chegar, para ser recebido, apenas existia enquanto vivo. Talvez fosse para os olhos famintos de quem precisasse de algo para devorar, talvez fosse para alguém que engoliria as palavras como pedras para que pouco a pouco fossem dissolvendo e ganhando sentido e pensar assim insuflava a determinação de ir até o fim e suportar a conseqüência.
Mas ainda sim escrevo pensando que você era o endereçado, que você em algum momento, no trânsito, na cama, em algum deserto, leria com olhos de medo esse desalinho todo que provocou por tão longos anos. Penso na sua invisibilidade, em suas mãos muda a tatear em mim sentido, em sua fala pequena a agredir minhas ações e lembro como era difícil existir com você por perto.
Pronto. O silêncio outra vez a manchar a ocorrência dos fatos. Entrego-me, fazer isso é a única coisa que me resta. Deixar que minha interpretação avançasse sobre nossa realidade construída. É impossível não existir antes. E ser essa imensidão me faz mergulhar cada vez mais fundo na profundeza dos meus e teus olhos, que não vejo, mas imagino. Pronto, mais um tiro no escuro, com vítima certa, apesar de tudo. Falar dos teus olhos é falar em abismo, de uma escuridão, que hoje esclarece os fatos, que os desmontam primeiro, para depois me possibilitar interpretá-los sem culpa, mas nunca sem medo.
Foi por causa dos teus olhos, hoje, especialmente mais misteriosos e calmos amendoados como os meus cabelos, que deixei de ver em ti o caminho fervoroso dos meus dias. Esses olhos que roubaram os meus gritos de prazer ou de dor, olhos miseráveis, a espreitarem o meu acidente. Olhos luminosos a escurecerem minha fala, por eles é que não pude lutar, por causa do repleto vazio que nele abriga. Naquele vazio que vem de um nada maior, um nada que é tudo, que denuncia que dilata como a pupila prestes a se apaixonar. Foram esses olhos, eterno apocalipse, que favoreceu o acontecimento fatal, apenas a olhadela desinteressada do teu assombro que em mim retumbou como desmoronamento. Isso apenas me basta. A lembrança desse olhar faz-me recolher por um instante as palavras, como se estivessem espalhadas no chão e guardá-las sob a custódia da ignorância ou da culpa, ou seria do medo? Não sei.
E despejando aqui sobre os olhos daquela interpretação que disse antes, penso que na sua suposta organização limpa, tomando um drink, depois de ouvir um bom clássico, é a mim que involuntariamente vais recorrer. É o caos apoteótico da minha existência que o fará companhia nas longas noites que faz dos teus dias. São nas alegorias da minha personalidade que você, tão metódico e categórico, recorrerá para calar a desordem que se aproxima a cada dispontar da minha ausência.
“- Não se preocupe, será o nosso segredo. Não irei maldizer da tua fraqueza maior, estou apenas interpretando”. Apenas dando a razão liberdade para que seja mais simples ou complexa, dependendo da dimensão e da altura que se olha. Não se assuste com a certeza, certezas sempre foram falhas e perder é um vício. Não se limite a pensar também que tudo é apenas um enorme esforço do meu inventar, embora goste das engenhosas invenções, sei o limite entre o real e a fantasia. O que houve entre nós sempre esteve antes no meio desses dois extremos. Daqui de onde olho é o que posso ver. Talvez eu tire os óculos e mais tarde veja com mais compaixão e menos zelo.