O BE, num rasgo de rara criatividade, vem propor a nacionalização da Galp e da EDP. Parece que ainda não explicou como se fariam e porque se fariam estas nacionalizações. Tracemos então alguns cenários.
A parte que não é do Estado da Galp e a EDP vale hoje em bolsa cerca de 9,5% do PIB. Se a nacionalização for a preços de mercado isso iria catapultar a nossa dívida pública de 70% para 80% do PIB, facto que o mercado de capitais não veria com bons olhos (ou seja, todos passaríamos a pagar mais caro pelas nossas dívidas) e ainda menos se a actuação posterior do governo viesse a destruir o valor das empresas nacionalizadas, o que seria o mais certo de acontecer. Se um governo do BE optasse, em alternativa, por indemnizações mais baixas (como se fez no passado), por exemplo pagando-as com títulos com taxas de juro abaixo do mercado, os investidores estrangeiros que investiram maciçamente nestas empresas sentir-se-iam roubados. Aliás não seriam apenas esses. Todos os investidores estrangeiros (e os maiores nacionais, os que têm facilidade de aproveitar a liberdade de circulação de capitais) sentiram que os direitos de propriedade estavam ameaçados em Portugal. Se há tantos países no mundo a aliciarem investidores estrangeiros, só um louco viria colocar dinheiro num país onde regras básicas dos negócios não são respeitadas. Teríamos mesmo uma fuga maciça de capitais, ainda por cima quando a nossa dívida externa já é de 100% do PIB. Em resumo, seja como for que se faça a nacionalização, há fortes riscos de todos ficarmos a pagar um preço elevado por elas.
E agora, para quê nacionalizar? Antes de mais relembre-se que ambas as empresas têm actividades muito mais extensas do que a mera distribuição de energia aos consumidores. Um governo nacionalizador pode-se ver tentado a diminuir as margens da distribuição (aplausos), financiando esta actividade com as restantes, globalmente diminuindo os lucros. Duvida-se que um governo deste tipo force estas empresas a aumentarem a sua eficiência, o que muitas vezes passa por despedimentos (vaias e assobios) ou, pelo menos, contenção das contratações. Um governo que fique dono a 100% destas empresas dificilmente resistirá à tentação de aí colocar alguns “camaradas” (olhares de alguma perplexidade), para assegurar de perto o “interesse público” (alívio). O que este governo certamente faria era reduzir drasticamente as remunerações da administração (aplausos de pé, palavras de ordem que o pudor me impede de reproduzir). É altamente improvável que as poupanças na administração compensassem os restantes aumentos de custos.
Em resumo, o mais natural é que da nacionalização destas empresas resultem entidades gerando menos valor, com lucros que deverão ser insuficientes para pagar o acréscimo de encargos da dívida pública. Relembre-se que este acréscimo de encargos tem duas componentes: 1) por um lado há mais dívida; 2) tanto a nova dívida como a antiga são encaradas como mais arriscadas, pagando um spread maior. A destruição de valor das empresas nacionalizadas vai aliás ter um papel importante nestas perspectivas de maior risco.
Ou seja, convinha que o BE explicasse mais detalhadamente como e para quê pretende nacionalizar a Galp e a EDP.