terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Instituições extractivas combatem o escrutínio

Um país dominado por instituições extractivas está condenado à pobreza e aquelas detestam qualquer tipo escrutínio, mesmo o que apenas coloque em causa o menor dos inúmeros prejuízos que elas causam.

 

Nunca é demais citar o livro de Daren Acemoglu e James A. Robinson Porque falham as nações. As origens do poder, da prosperidade e da pobreza (original publicado em 2012, com tradução portuguesa de 2013, da Temas & Debates) para explicar o mau desempenho de Portugal nos últimos 250 anos, mas também nos últimos 25 anos.

 

Nesta obra, os autores atribuem uma importância decisiva ao tipo de instituições que vigoram, podendo ser de dois tipos: inclusivas ou extractivas. Nas instituições inclusivas, o poder é distribuído de forma abrangente na sociedade e submetido a restrições, que refreiam as tentações de abuso. Nos países com instituições extractivas, existe um grupo que detém muito mais poder do que os outros e a fiscalização deste poder é fraca.

 

Em Portugal, é evidente o predomínio do “modelo” extractivo, mas poderíamos dizer que as coisas estavam a melhorar, mas infelizmente não o podemos fazer.

 

Antes de mais, é importante estabelecer uma ligação entre modelo económico e “grau de extractividade” da economia. Quando as políticas públicas se focam na abertura ao exterior, na competição internacional, a margem para extrair rendas é relativamente baixa, porque as empresas competem no mercado internacional, onde são os clientes (sejam eles empresas ou consumidores) que decidem quem vence. Quando há um foco na procura interna, sobretudo por via da despesa pública, em particular do investimento público, tudo muda de figura, porque é a “elite” nacional quem decide os vencedores.

 

As políticas focadas na procura interna, que vigoraram entre 1995 e a chegada da “troika” não foram só calamitosas em termos de estagnação económica e explosão da dívida externa (de 8% do PIB em 1995 até 110% do PIB em 2010), também aumentaram, em muito, o caracter extractivo da economia portuguesa. Uma adivinha para os leitores: qual o grupo económico português, focado no mercado interno e dependente dos favores do poder político, que melhor simboliza este período? (pista: teve um fim terrível).

 

Era muito importante não repetir os erros do passado e transformar o país e a sociedade num sentido menos extractivo. Um dos elementos mais importantes é a fiscalização do poder político, pelo que ser exigente com o governo e com as suas decisões deveria ser elogiado e praticado e não criticado.

 

Porque é que o governo anda a fazer finca-pé com a nomeação bizarra do procurador José Guerra?

 

Porque é que a ministra da saúde fala na requisição civil de meios do sector privado, em vez de fazer uma simples negociação? Não sabe que o respeito pela propriedade privada é um dos elementos decisivos que caracteriza as instituições inclusivas?

 

[Publicado no Jornal Económico]

sábado, 16 de janeiro de 2021

Perspectivas para 2021

 

Num panorama apenas moderadamente positivo, Portugal deverá destacar-se pela negativa, por três razões: pela debilidade e erros nas finanças públicas; pela exposição a Espanha; e pelo peso do turismo.

 

Os pontos altos políticos (previsíveis) de 2021 deverão ser a tomada de posse do novo presidente dos EUA (a 20 de Janeiro) e as eleições legislativas alemãs (a 24 de Outubro), que deverão colocar um ponto final no longo consulado de Angela Merkel.

 

Em termos da pandemia em curso, ainda no final de 2020 foi conhecida uma variante do vírus, aparentemente mais contagiosa do que a versão conhecida, podendo novas estirpes surgir nos próximos meses. Para além disso, os planos de vacinação deverão prosseguir em grande expansão, mas não é de excluir que as limitações das novas vacinas se tornem palpáveis. É uma incógnita em que medida reacções adversas poderão receber publicidade, acabando por limitar o número de pessoas que se voluntaria para esta profilaxia.

 

Em termos económicos, quer nos EUA quer na zona euro, estão previstos substanciais estímulos orçamentais e monetários, que deverão auxiliar a recuperação. No caso da UE, haverá também lugar à despesa associada à “bazuca” de fundos. Mesmo assim, só deveremos assistir a uma retoma parcial da recessão de 2020.

 

Os sectores dos serviços e o do turismo em particular são aqueles que deverão ter maior dificuldade em recuperar, porque a sua quebra não resulta das razões habituais de quebra de procura durante as recessões (mas antes de medo de contágio), pelo que também terão menores condições de beneficiar das políticas que ajudam a economia.

 

Neste panorama, apenas moderadamente positivo, Portugal deverá destacar-se pela negativa, por três razões. Em primeiro lugar, porque as finanças públicas enfrentam a pandemia a partir de uma posição de fragilidade, decorrente dos erros que nos conduziram à “troika”, em 2011, e de escolhas bizarras posteriores, de que se destaca a semana das 35 horas, para a qual não temos nem economia nem contas públicas que a permitam.

 

Tal como no resto da UE, Portugal deverá beneficiar dos fundos europeus previstos, mas a falta de margem orçamental para os alavancar com fundos nacionais deverá limitar, em muito, o seu alcance. Para além de corrermos o risco elevado de os desperdiçarmos em projectos que apenas estimulam a economia no curto prazo e não aumentam o potencial de crescimento de médio e longo prazo.

 

Em segundo lugar, porque o nosso principal parceiro comercial, Espanha, teve uma das maiores recessões da zona euro e deverá ter uma retoma limitada.

 

Em terceiro lugar, porque o turismo ganhou um peso assinalável na economia nacional. Mesmo na previsão mais optimista, o próximo Verão ficará ainda abaixo do normal e é possível que ocorram vários problemas: que os mercados emissores não recuperem a confiança nas viagens; a incógnita dos desenvolvimentos pós-Brexit, cujo impacto sobre a cotação da libra poderá também dissuadir um dos nossos principais clientes; o plano de vacinas português poderá atrasar-se e poderá afastar turistas.

 

[Publicado no Jornal Económico]