12 de janeiro
Redes sociais
A facilidade com que as redes sociais abrem espaço à espontaneidade, à reação a quente, reduz a reflexão, a maturação das coisas, simplificando e caricaturando as ideias. E aumenta o potencial de contraste de atitudes. Ao dizer isto não estou a tomar partido contra ou a favor de nada. Estou simplesmente a constatar o que me parece ser uma evidência.
14 de janeiro
Segunda feira
Aos domingo, invariavelmente, faço listas de tarefas para a semana. Às segundas, acordo “de peito feito”, pronto a concretizar muitas dessas obrigações. Acabo quase sempre o dia a constatar que, afinal, quase tudo (embora não tudo) o que estava em atraso em atraso ficou, porque novas coisas surgiram. De uma coisa tenho a certeza: no próximo fim de semana tudo se passará da mesma forma. Se há um vício antigo é que nunca desistimos de nos enganar a nós mesmos. No que me toca, porém, há agora uma substancial diferença face ao passado: não me preocupo tanto, e dou conta de que vivo feliz assim.
17 de janeiro
Condomínio
“Isso é um inferno!”, exclamou um amigo, com quem tive de apressar um telefonema, quando lhe disse que ia para uma reunião do meu condomínio. Afinal, tudo foi aprovado por unanimidade e foi reeleito, por discreta aclamação, o gestor que, desde há vários anos, tem ajudado a levar a bom porto a administração do prédio. O nome? A modéstia não me permite divulgá-lo...
21 de janeiro
Trump
Dois anos de Trump. Iniciei uma intervenção dizendo que a boa notícia era o facto de Trump não ter provocado nenhuma guerra (como há dois anos se temia) e a má notícia o facto de ele ter conseguido induzir uma inédita crise de confiança à escala global (como há dois anos se temia).
24 de janeiro
Jornais
Em Ferreira do Alentejo, deixou de haver jornais em papel à venda. Quantas ”Ferreiras do Alentejo” não existirão já por aí, cada vez mais?
28 de janeiro
Amanhecer
... e dizia aquele meu amigo: “o amanhecer é uma coisa deliciosa, mas a hora a que o colocaram é que é péssima!“
18 de fevereiro
Política externa
É impossível isentar a política externa das crises e das conjunturas. Mas, se queremos que ela seja um instrumento coerente para a construção do poder nacional, devemos cuidar em preservá-la das emoções cíclicas e, em especial, da demagogia.
22 de fevereiro
Religião
Frei Bernardo Domingues morreu hoje. Vou sentir a falta das nossas conversas, sobre tudo e sobre nada, nas quais ele nunca procurou, nem por um instante, contrariar (nem sequer ironizar) o ateu que sempre fui. Aliás, pensando bem, creio que religião foi um tema sobre o qual nunca falámos.
26 de fevereiro
Mulheres
Quando andei pelo governo, e já lá vão quase duas décadas, dois dos quatro chefes de gabinete que tive foram mulheres. As presenças femininas no meu gabinete eram tantas que, num determinado período, constatou-se que, além de mim e de dois motoristas, o resto do pessoal, das técnicas ao pessoal administrativo, era todo feminino. Creio que nenhum membro do governo, em democracia, bateu este “record”. Ao ponto de uma dessas amigas se queixar, um dia: “Fazem falta homens nas nossas salas de trabalho...”
28 de fevereiro
Brexit
Percebo que a unidade dos “27”, conseguida em torno do “pacote” que foi negociado com os britânicos, e que Theresa May não consegue “vender” internamente, tem um valor inestimável. Mas lembraria esta coisa simples e que creio que muito óbvia: tudo aquilo que foi negociado tem um valor zero se não conseguir ser posto em prática.
1 de março
Bruxelas
O mundo é bem pequeno e Bruxelas, no fundo, é, desde há muito, uma das minhas “casas” habituais de passagem (embora o nunca tenha sido de vida). Há minutos, estava eu a encher-me de livros, na magnífica “Filigranes”, quando ouvi, em bom português: “Com que então sempre interessado pela banda desenhada!”. Eu estava, de facto, a pensar como ia ter espaço para meter na mala o último “Blake & Mortimer” (já tinha comprado na Buchholz a tradução portuguesa, mas não resisti a adquirir o texto em francês deste “falso” Edgard P. Jacobs), quando este velho amigo português me surgiu ao encontro. Tivesse sido uns minutos antes, tinha-me apanhado a folhear um comprometedor Manara...
4 de março
Amigos perdidos
Há pouco, por uma qualquer razão, lembrei-me deles. Dos amigos que, entretanto, se foram. Não me refiro aos que morreram, mas aos que, com o tempo, se foram afastando, nos caminhos da vida. Não foram muitos, mas alguns eram mesmo dos “de toda a vida”, como algumas pessoas acham “bem” dizer. Em nenhuma dessa meia-dúzia de separações me pertenceu o gesto, tendo sido eles que tomaram a iniciativa de sair de cena. Às vezes, por razões que me pareceram fúteis, outros por um quid pro quo sem sentido, outros ainda por motivos que, à certa, nunca cheguei a perceber muito bem. Num ou outro caso, pela política, imaginem! Terei tido culpas “no cartório”? Quem sou eu para julgar as razões dos outros, quando, por vezes, nem as minhas consigo avaliar bem! Uma coisa já concluí: esta vida não é suficientemente longa para que tenhamos tempo para nos preocupar e ficar a matutar em tudo o que ela nos traga de menos agradável. O que lá vai lá vai! Resta olhar em frente, porque o caminho é por aí.
14 de março
Outro 25 de abril?
Com alguma frequência, ouve-se a alguém que está descontente ou indignado como o estado das coisas: “o que nós precisávamos era de outro 25 de abril!” Haverá maior elogio à efeméride?
20 de março
O “momento zero”
Foi um amigo que me chamou a atenção para isto. Voltou a acontecer-me hoje. Em todos os restaurantes, há, a certa altura, um “momento zero”. Trata-se de um vazio temporal, durante o qual os empregados se somem, talvez para fumar um cigarro ou para outras pausas mais básicas, em que o patrão se recolhe por instantes ao escritório, em que o pessoal do balcão, por qualquer razão misteriosa, se eclipsa. Não há ninguém na sala! Ou, se acaso resta alguém, estão recolhidos em espaços inacessíveis, sempre de costas voltadas ou, mesmo se de frente, assumem um olhar vítreo e distante, neutralizados por qualquer coisa que os torna inoperacionais para o que nos interessa. Ah! E então na altura dos cafés é uma tragédia: é quando geralmente acontecem os grandes “momentos zero”!
24 de março
Inocentes
Acho muito saudável que a direita portuguesa se reúna, se manifeste, crie partidos, jornais e tudo o que lhe der na real gana. Foi (também) para isso que se fez o 25 de Abril, uma Revolução sobre a qual há, pelo menos, uma imensa certeza: não foi a direita que a fez. Ninguém a pode acusar de estar “implicada” no golpe...
28 de março
Modelo Tancos
Ouvi, há dias, uma proposta criativa para uma solução portuguesa destinada à questão central do Brexit: a fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte. Seria o modelo Tancos: colocavam-se postos de vigilância, redes já esburacadas e, depois, ninguém via nada. Assim, haveria formalmente uma fronteira e ... não havia controlo nenhum!
2 de abril
Nélida
Nélida Piñon contou-nos hoje. Um dia, em Lisboa, apanhou um táxi, cujo motorista se revelou uma figura incomodativa e mal-educada. O seu comportamento agravou-se durante toda a viagem, roçando o insuportável. A escritora conteve-se até ao final. Depois de pagar a corrida, para imensa surpresa do homem, cujo primarismo não ia ao ponto de não entender o nível do seu próprio comportamento, ofertou-o com uma gorjeta de 10 euros. Mas acrescentou: “Estes 10 euros é para agradecer várias coisas: você não ser meu marido, não ser meu amigo, não ser meu conhecido e eu ter ficado com a certeza absoluta de que nunca mais o vou ver!”
4 de abril
China
A China é hoje um indiscutível gigante tecnológico, depois de anos de pateta caricatura como produtor de quinquilharias baratas. É um poder adversarial – político, económico, militar? Para os EUA, isso é uma evidência. A Europa, neste domínio, vive ainda um momento esquizofrénico: olha com apetite aquele que é o seu principal mercado, mas começa a acordar para o desafio estratégico que vê chegar.
25 de abril
45 anos
E se o "E depois do adeus", o Maia, o Carmo, o outro Marcelo, os tanques, a Grândola, as fardas, o Otelo, a Junta, o Spínola, o cravo, a Pide, o Zeca, a censura, o MFA, Caxias, o "povo unido", Peniche, o Cunhal, a tv a preto-e-branco e toda a parafernália de datas e de siglas pouco disserem aos que hoje passam "a salto" de Ryanair as fronteiras de Schengen, aos vidrados nos iPad, balanceantes dos iPod, logados nos iPhone, para quantos vão para hostels, sem saberem onde e o que foi Champigny, os bivaques da guerra colonial ou a triste sina nos paradeiros de exílio?
14 de maio
Cerejas
“Já estamos no tempo das cerejas, sabia?”, disse-me a empregada do hotel, algures na Cova da Beira. E acrescentou: “Na minha terra, em Alpedrinha, elas amaduram mais cedo”. Gostei do orgulhoso “amaduram”, em lugar do “amadurecem”. Não lhe perguntei se conhecia a canção de Montand e hino da Comuna de Paris, “Le temps des cerises”, porque, nos tempos que correm, já ninguém conhece o que eu conheço e, a cada dia, dou-me conta de que cada vez conheço menos coisas que quase todos conhecem. E também não ousei recordar-lhe que, como lá se diz no poema, “é bem curto o tempo das cerejas”.
15 de maio
Agustina
Há uma década, no Brasil, fui jantar com Hélder Macedo, que estava de passagem. No final da noite, ao nos cruzarmos com Agustina Bessa Luís no hall de um hotel do Rio, o Hélder cumprimentou-a e, delicado, comentou: “A Agustina é uma pessoa fantástica: consegue não ter inimigos”. A escritora, divertida, retorquiu: “Não tenho, mas faço-os!” E deu uma bela gargalhada.
24 de maio
Cúmplices
Foi mais uma campanha eleitoral em que as televisões, em lugar de apresentarem verdadeiras reportagens, com planos reveladores da real dimensão das mobilizações, fizeram quase sempre o frete às candidaturas, filmando de molde a criar a ilusão de multidões. É muito triste, pouco profissional e não ajuda a separar o trigo do joio.
31 de maio
Dívidas
Num país em que um grande devedor à banca pública passeia impunemente a sua arrogância pelo parlamento, ter brigadas pelas estradas para cobrar pequenas dívidas fiscais transforma-se num ato de escandaloso autoritarismo.
5 de junho
Marcelo
Um dia, em Paris, com Marcelo presente, ao tempo comentador, Eduardo Lourenço disse que ele se assemelhava a alguém que, numa pequena localidade, estava numa janela, vendo passar as pessoas na rua e, sobre cada uma, se ia pronunciando. E acrescentou: “Às vezes, da varanda, ele vê passar, na rua, Marcelo Rebelo de Sousa e, claro, também o comenta...”
10 de junho
O ar do tempo
Há um país que se sente mal neste país. Há um país que acha que o país o não segue ou, quando acaso episodicamente o faz, nunca consegue pôr o país a seu jeito. Há um país com uma infindável raiva, que acha que o país o não compreende, que vive num mal-estar endémico, em “blues” eternos. Há um país que acha que tem uma ideia salvífica para o país, a mezinha mágica para pôr isto direito, mas que o país, pateta, não consegue nunca entender. Há um país sobranceiro, arrogante, feito de gente que, afinal, apenas gostava que o país fosse aquilo que eles acham que o país devia ser. E que, talvez não por acaso, não é.
13 de junho
Politicamente correto
Ou muito me engano ou já não deve tardar muito que os polícias do politicamente correto venham por aí lançar dúvidas sobre a legitimidade de se continuar a mostrar o Santo António com uma criança ao colo...
5 de julho
Maria do Céu Guerra
Parabéns, Céu! Com que então, “a actriz da Europa”?! Num tempo em que uma tristeza profunda ainda te marca os dias, como os teus amigos bem sabem, este reconhecimento internacional, mais do que prestar-te justiça, vai fazer-te bem. A verdade é que tu és tu, com ou sem prémios, tens o teatro dentro ti e é através dele que, em grande parte, te sentes a cumprir a vida, muito para benefício de quem te admira a arte.
10 de julho
Competir
A felicidade faz-se hoje bastante da adesão aos sucessos que outros protagonizam, de quem nos assumimos próximos, coletivamente juntos na vitória, sempre com a derrota de outros como aparente contraponto indispensável. Para quem, como eu, tem a anti-competição como sólida e permanente doutrina de vida, confesso-me um tanto perdido neste ambiente. Mas será isto a alienação de que falava um clássico fora de moda? Talvez seja, mas esta comemoração das vitórias mais não é, para muitos, do que o complemento natural de existências simples, que seriam ainda menos relevantes se não se juntassem nessa onda gloriosa coletiva. É triste reconhecer isto, mas julgo que é a realidade.
13 de julho
Calado
Bolsonaro tirou um dente e foi aconselhado a manter-se três dias sem falar. Recordo-me de uma figura política portuguesa, bem conhecida mas já há muito desaparecida, de quem alguém, um dia, disse: “Se não abrisse a boca, passava por ser um estadista”. Não creio que, no caso do presidente brasileiro, o conselho pudesse ter qualquer efeito.
15 de julho
Racismo e preconceito
Feitas as contas, a publicação do artigo de Fátima Bonifácio acabou por ter alguma virtualidade: provocou o “outing” de um certo reacionarismo cavernícola, que logo acorreu a desculpabilizar a senhora e a colar-se-lhe à diatribe, com alguns, mais medrosos, com o expectável “não, mas”, não fosse alguém confundi-los com o outro lado da barricada. Que falta nos faz O’Neill!
17 de julho
Céus!
Hoje, recebo a bofetada que é a desaparição inesperada de mais um amigo. Cada vez tenho mais mortos amigos. A sorte é eu não ser religioso. É que, se o fosse, estaria agora a bradar aos céus.
18 de julho
Camões e coisas assim
Pela insistência, obsessiva e deslumbrada, com que não cessa de fazer referência a esse seu momento de efémera glória, fica a ideia de que o autor do discurso do último 10 de junho terá saído daquela cerimónia, em definitivo, aos ombros de si próprio.
20 de julho
Bonda
Parece que o próximo James Bond vai ser uma mulher, negra. Nada a objetar, com duas condições: que o Martini continue a ser “shaken, not stirred” e que o namorico como Moneypenny se não perca.
21 de julho
Estado meu
Quando se observa que o afã guloso pelos financiamentos públicos, nomeadamente os fundos europeus, surge frequentemente naqueles que mais diabolizam o Estado, fico a pensar se o lema dessa gente, afinal, não será: "Menos Estado, melhor Estado e o que sobrar que seja para nós..."
22 de julho
Europa
A Europa criadora de soluções é hoje vista por muitos como a Europa fautora dos seus problemas. Se a isso somarmos as notórias clivagens internas, nomeadamente na reação aos efeitos assimétricos das crises coletivas, os imponderáveis efeitos do Brexit e a orfandade geopolítica criada pelo afastamento afetivo dos EUA, conviremos que está criada um caldo de crise endémica que não augura nada de bom.
4 de agosto
Guantanamo
A indignação arrefece com o tempo: que será feito dos presos em Guantanamo, que por lá estão, sem julgamento, desde os tempos de George W. Bush, sem que as suas condições de detenção possam ser monitorizadas pelas organizações internacionais que se ocupam dos Direitos Humanos? Nem os tão incensados democratas americanos, Obama incluído, com eles se preocuparam...
5 de agosto
Diplomacia a sério
O ministro francês dos Negócios Estrangeiros qualificou como “emergência capilar” a decisão de Bolsonaro de cancelar, à última hora, o encontro que tinha com ele para ir cortar o cabelo. Uma grande diplomacia é também isto.
6 de agosto
Semi-frio
O ministro das Relações Exteriores do Brasil foi a Roma, em maio, e constatou que estava frio. Daí, concluiu que o aquecimento climático é uma balela. Já Trump tinha chegado à mesma conclusão, aquando dos nevões nos EUA. No passado, estas coisas só aconteciam nas anedotas.
7 de agosto
Livros, para que vos quero!
Ora essa! Claro que dobro as páginas dos meus livros! E sublinho-os e tomo notas neles a tinta, quando me dá na gana. E gosto de ver surgir os vincos nas lombadas, por ter encostado a capa à contracapa, enquanto os leio. Ah! e não há ninguém que goste mais de livros do que eu, aposto!
15 de agosto
Contra o vento
Andar ao contrário dos outros pode ser estranhamente cómodo. Hoje, era um corrupio de gente para a praia, connosco a afastarmo-nos dela, dentro do ar condicionado. Entrava-se em Lisboa por uma ponte limpa de tráfego. Isso do nosso lado, claro: de Alcântara subiam para ela filas lentas e compactas, em direção às areias da Costa ou aos Algarves do costume. E a Lisboa que me interessa está hoje, deliciosamente, sem trânsito, sem gente, confirmando, se necessário fosse, ser o melhor lugar do mundo para se viver. Isso sente-se, em especial, nos dias em que se ruma contra o vento, mesmo que não haja vento...
19 de agosto
A greve
A greve dos transportadores de combustíveis acabou. Pelo menos, por agora. Quem é que, afinal, tinha razão? Não sei, tanto mais que não acho que um cidadão comum tenha de ter opinião sobre tudo o que mexe no país. Nesta crise, o que eu queria, muito simplesmente, é que a greve acabasse. Como ela acabou, estou satisfeito. Ponto.
29 de agosto
Real questão
Estranha-se muito que Isabel II ceda a todos os caprichos de Boris Johnson. É não perceber o essencial: a condição implícita para as monarquias contemporâneas poderem subsistir em regime democrático (leia-se, na Europa e no Japão) é a cedência aos eleitos de todo o poder de intervenção em matérias de Estado. Assim, nos dias de hoje, todos são ... “rainhas de Inglaterra”. Até a própria!
1 de setembro
Cardeal
Agrada-me que o país tenha um cardeal que já encontrei nas noites do “Procópio”.
2 de setembro
Spooooorting!
Ser sportinguista é ser portador eterno de um insondável mistério: que mal fizeram ao mundo os sportinguistas para merecerem sofrer, como sofrem, dia após dia, e, não obstante isso, viverem no singular paradoxo de terem imenso orgulho naquilo que são e nem lhes passar minimamente pela cabeça serem outra coisa diferente disso?
3 de setembro
Cabem todos?
Tenho uma imensa dificuldade em poder admitir que a religião católica, onde reconheço que há tanta gente de bem, que se apoia em princípios decentes e solidários (princípios em que fui educado e em que me reconheço, embora sem a menor matriz religiosa de suporte), aceite no seu seio, sem uma denúncia pública, sem uma estigmatização mínima perante os seus pares, algumas figuras que não passam de nódoas morais da sociedade. Mas dizem-me que é assim que os católicos vêm as coisas.
2 de outubro
França
A França parece apreciar ser representada por quem, ao mesmo tempo, goste genuína e quase chauvinisticamente dos franceses, lhes transpire orgulhosa e exageradamente as qualidades e, na medida do possível, os consiga fazer sentir menos culpados pelos seus defeitos. Chirac, que agora se foi, era exatamente isso. Não tenho a certeza de que Emmanuel Macron o seja.
16 de outubro
Trump
Trump é a cara descarada da vergonha perdida de uma América egoísta e autocentrada que, pelo menos com ele, está rapidamente a desperdiçar a autoridade moral que lhe assegurava a liderança de um mundo que, graças a ela no passado, pôde chamar-se a si próprio de livre.
23 de outubro
Maçonaria
Começo a não ter paciência para as teorias conspirativas sobre a Maçonaria, que agora por aí surgem com regularidade. Nunca fui tocado pelas "luzes" da subordinação espiritual ao "grande arquiteto universal". Mas creio que não é por ser mação que um cidadão é pior ou melhor que os outros. Bandidos ou pessoas de bem há-os por aí em todas as confissões, crenças ou "fezadas".
3 de novembro
Laforêt
Quando soube da morte de Marie Laforêt, pensei: “Lá se foi mais uma do meu tempo”. Não era, mas depois percebi por que razão tive esse reflexo: os olhos. Os olhos não têm idade, nunca envelhecem. E as mulheres com aqueles olhos são todas do meu tempo...
8 de novembro
Passado
Dou-me frequentemente conta de que tendemos a guardar na memória apenas o melhor do passado. Há talvez uma boa razão para isso: é que, no passado, o nosso futuro era melhor.
18 de novembro
Isto deve ser da idade...
Há cada vez mais coisas sobre as quais tenho dúvidas: sobre a atitude a tomar face à sem-abrigo que tentou matar o filho, a autorização ou não do traje da desportista muçulmana, se, afinal, o aeroporto deve ser ou não no Montijo, se se deve proibir ou não a exploração de lítio, etc. Quando vejo tanta gente com tantas e tão profundas certezas sobre tudo, dou comigo a pensar: isto deve ser da idade...
25 de novembro
25 de novembro
Compreendo quem saúda, no dia 25 de novembro, a criação de condições de estabilidade político-militar para que Portugal pudesse vir a ter um regime democrático. Não tenho o menor respeito político por quem usa o 25 de novembro para disfarçar a derrota histórica que teve no dia 25 de abril.
25 de dezembro
Desculpa sazonal
“Isto agora mete-se o Natal de maneira que já só em janeiro”