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terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Mensageiros da Noite ?


Um general que ocupa um lugar de destaque no dispositivo de segurança no nosso país foi entrevistado na SIC, porque escreveu no “Expresso” um artigo relativizador da democracia.

É claro, que à superfície o seu discurso foi fiel à democracia. Pareceu até generoso para com o actual governo, valorizou os partidos, embora os achasse todos em péssimo estado. Mas o seu diagnóstico, os exemplos escolhidos, os ecos narrados, as notícias dos desabafos recebidos, gritavam o contrário, mostrando que a SIC não se enganara, quando desencantou aquele general, para conseguir um pouco mais de crispação na opinião pública e um pouco mais de audiência.

A jornalista não se equivocou, quando, perante uma declaração de fidelidade à democracia e de desvalorização dos “generais”, disse que os regimes não são eternos.

O general citou gente de esquerda para corroborar as suas indignações. Mas aludiu, como que de passagem, ao seu cansaço, não se sabe se como ameaça discreta, se como desistência prometida.

O general citou escândalos de banqueiros, de ordenados chorudos, doutores e engenheiros, a insatisfação de classe média ( a do povinho não, que cheira demasiado a esquerda). Arrasou os partidos e em particular o” bloco central”, mas para não assustar prematuramente, deixou –se dizer que nos partidos até havia gente honesta.

Como por acaso, disse que a raiz do mal de hoje estava em não terem sido feitas reformas entre 1995 e 2001. Não explicou porquê, não disse que reformas. Como, por acaso, apenas referiu os anos do governo Guteres.

Noticiou que alguns interlocutores que lhe haviam sugerido soluções golpistas que declarou recusar. Mansamente, é certo. Pediu a Cavaco para se candidatar, por razões de credibilidade ética e patriótica.

Subtilmente, o “observador-mor”, semeou um pouco mais de insegurança, com um contido ar de modesto salvador da Pátria.

O que há a dizer? Que acabou o tempo dos golpes de Estado? Que a Europa significa paz, mas significa também democracia?

Se a esquerda democrática sabe que a democracia não é uma virtude, mas a condição de humanidade, desenvolvimento e futuro de qualquer país, não pode continuar a dormitar molemente perante afloramentos salvíficos anti-democráticos, por mais melífluos que sejam. E nunca deve esquecer que a direita é apenas tão democrática quanto necessário e tão relativizadora da democracia quanto possível. Portanto, na hora da verdade estará no essencial sozinha.

Antes de deixarem exacerbar sem medida os seus conflitos, governo e partidos de esquerda, governo e sindicatos, governo e povo de esquerda, devem perceber que há uma sombra verdadeira que espera sempre pela sua hora. Uma sombra discreta, por enquato contida, mas que ainda se não apagou por completo.

Por isso, devem lembrar-se que não estão sozinhos, que as sociedades actuais são mais complexas, mas não deixaram de ser capitalistas. Não têm a democracia inscrita no seu código genético, conformam-se com ela por imposição popular. E não devem esquecer que a direita fará o que puder para tornar mais fácil a cristalização e o aprofundamento das desigualdades, se necessário através de um qualquer justicialismo, mesmo que ironicamente revestido pela vulgata neo-liberal , ou até pelo jargão modernaço da “terceira via”.

O general disse que passou já o tempo dos generais e dos cardeais, mas se realmente estivesse convencido disso, não tinha sentido necessidade de o dizer. Não sabemos se para o repudiar, auteticamente, se para o relembrar.

A esquerda em geral, e o PS em primeiro lugar, têm que ser mais agressivamente democráticos, tornando absolutamente claro que nem generais, nem cardeais, nem banqueiros, nem multinacionais, ditarão regras ou darão instruções ao povo português. Quem quiser entrar em pleno na política institucional escolhe um partido existente ou funda um novo. Fora disso, paira o risco do regresso das ameaças de caserna.

De facto, a democracia não se discute. Defende-se e melhora-se. Mas se isto é o essencial, daí não se pode deduzir que os partidos de esquerda, em geral, e, muito particularmente, o PS não tenham que se reformar, profundamente.

Governo e partidos de esquerda, governo e povo de esquerda, têm que saber que a política não é só conjuntura; e que, sendo entidades distintas, estão intimamente conjugadas entre si, quer o queiram quer não. O Governo tem que perceber que a democracia não é uma simples formalidade que apenas periodicamente precise de ser activada. Os críticos do Governo têm que perceber que, quando exacerbam a sua oposição, alegando ditaduras imaginárias, estão a abrir o caminho aos que realmente gostariam de reimplantar entre nós um regime autoritário que nos metesse na ordem.