28 de fev. de 2011

poetas de segunda

... é o título do blog do poeta Danilo De Abreu Lima - "caminheiro - nas trilhas do mundo, na aventura da poesia", onde tive o privilégio de ser publicada hoje.

Gosto muito do poeta Danilo, mas o leitor Danilo tem o dom de me surpreender e emocionar, com suas leituras sempre tão sensíveis, sutís, generosas, talvez quem melhor me traduza ( ou me decifre?) como poeta.
Super obrigada, Dan. Um prazer e uma alegria enorme estar no 'poetas de segunda' com você. Abraço!

27 de fev. de 2011

quero estar só me deixem
como aquela amora temporã
no galho mais alto
faz-se em mim desejo de silêncio
forte pleno denso
mão
que me aperta a garganta
e os pássaros
aprisonados
tantos
em vão
se rebelam [ por ora
o vôo
não se dará
e o canto

26 de fev. de 2011

...

outra vez dei de cara
com o tempo
e a face dele
já não me pareceu
tão feia
fera domesticada
comeu na minha mão
migalhas

25 de fev. de 2011

paisagem

ervas daninhas
mourões
apodrecidos
onde pássaros pretos
pousam
completando o retrato
do abandono

24 de fev. de 2011

estrada [... rio

1.

passou
na paisagem feito um risco
de espátula
borrou
e o que seria estrada
tornou-se rio
lugar
onde não posso ir
sem que me molhem os pés

2.

suave
caminhar entre as águas
deixar-se ir
[...fluir

3.

agora eu sei
que todo rio vai virar mar
(se tiver sorte
e não morrer sufocado)
e se secar
será
finalmente estrada
[...que me leve

23 de fev. de 2011

há muito deixei de contar
os livros que li
vaidades
prefiro contar estrelas
passarinhos no fio
voares
lírios e pedras roladas
na beira do rio
delírios
rajadas de vento
amoras
querem me ouvir por quê
se tudo
o que digo é delírio
e nada faz sentido
se tudo é fruto
colhido
no labirinto estreito
do meu cérebro cansado
pasto seco
onde a flor se negou
a nascer

22 de fev. de 2011

. . .

amanhece em mim:-
outra vez posso ver
o sol

21 de fev. de 2011

fotofóbica

o dia de sol é um rasgo
nas minhas
fotofóbicas retinas
turvas da noite ainda
que insiste
em se alongar além
da conta
por que tudo em mim
parece ser
além [ou aquém
das contas
faço pouco do sol
então
atrás dos meus óculos
[de sol
queria guarda
chuvas [de chuvas
pequenas
um bem-me-quer
queria [só
pra dizer bom dia
[bom dia
que te quero ainda
viver [só os gerânios
me respondem
pendentes
cicatrizes [quase
secas
nas paredes brancas
bolores
únicas flores [mas
onde
se esconderam os beija
flores
meio-dia já [se foi

19 de fev. de 2011

a minha matemática mente
faz de conta

o tempo todo

aleatória
mente

mente

18 de fev. de 2011

. . .

tenho pousado meu coração
sob o leito
do rio
ouço bater o coração
da terra
tambores
fazem vibrar meu coração
um pote
de barro
[até aqui de água

17 de fev. de 2011

pátria

pátria
é o velho casarão em que nasci
de onde me exilei para sempre
quando soprou o vento
que soprou as cortinas e destelhou a casa
derrubou as paredes e espalhou poeira
que arranhou meus olhos de menina [ainda
vermelhos

16 de fev. de 2011

. . .

faz sol e ainda é cedo
ah... manhãs

amanhã
ninguém sabe a manhã

flor que será pisada
assim que brotar

e a tarde quem sabe?
eu não.

14 de fev. de 2011

rosas de silêncios brotaram
vermelhas
como são os silêncios
vermelhos – [quando brotam]
quando secarem – [se]
vou cultivar palavras
neste mesmo canteiro
quando encontrar sementes – [se
não parar a chuva
e os silêncios crescerem – [baobás]
construirei minha casa – [ sobre
virão os pássaros
de ébano
cujo canto se chama - escuridão]

12 de fev. de 2011

descubro finalmente
para onde vão os passarinhos
que abandonam os ninhos
ainda de madrugada
para não voltar:
— se atiram no abismo
[ ... tão breve o canto
tão limitado o vôo

11 de fev. de 2011

. . .

só queria saber
para onde vão os passarinhos
quando deixam seus ninhos
ainda de madrugada
para não voltar

10 de fev. de 2011

por que o vermelho é a cor mais encarnada ...

... ellenizada. :)

. . .

a noite quente
me faz voltar à infância --
tantas janelas

9 de fev. de 2011

ruídos

os relógios insistem em seus ruídos
arrastando ponteiros

e horas

os relógios deveriam ser silênciosos
num mínimo de respeito

aos instantes mortos

7 de fev. de 2011

entre flor e nada

nada
havia no caminho
rodeado de nadas
sertão
surgiu a flor

e de que vale
a flor
no vale rude
onde a chuva não chega
e o vento
se nega a soprar

entre flor e nada
verso
tão seco quanto
ou mais

Um poema de Latif Hamet

Eu vou mãe.
Se não regressar
serei flor desta montanha
torrão de terra
para um mundo
maior do que este

(…)

Eu vou mãe.
Se não regressar
a minha alma será palavra
para todos os poetas.

6 de fev. de 2011

. . .

frágeis como a flor
que despenca no abismo
rompem-se os ovos
no ninho
e o passarinho
que cantava sol
agora canta a eternidade

. . .

rarefeitos ares
cantares
estrelas
antares
raros feitos
cantos
aos pares
candeias
incensos
voares per
feitos
ninhos
(raros
pássaros
incendeiam
o dia)

5 de fev. de 2011

. . .

sorver
das águas puras
numa manhã de sol

nascente

(sentir
que a vida
ainda pode ser

sentida)

. . .

flutuar
na pele fina de algum rio
ainda

claro — (se houver)

4 de fev. de 2011

. . .

mergulhar no cerne do sentir
investigar a fundo
o fundo
dos mares de nós
— abismos

. . .

águas vivas queimar
buscar a pérola

inventariar
naufragados navios

— memória e ferrugem

. . .

tramar impossíveis resgates
sonhar

velas brancas vento e sol

chegar

3 de fev. de 2011

. . .

pintou
seus olhos de azul
do céu
choveu
depois fez sol
choveu
depois fez sol
choveu
e o azul dos olhos
escureceu

(marinho)

2 de fev. de 2011

. . .

cio da palavra
gestação
nascimento
e vida
que depois
de parida
é para sempre
— ou não

coleção João Luis Roth (1)



Escritas Plásticas - Federico Garcia Lorca

“Poesia é amargura,
mel celeste que emana
de um favo invisível
que as almas fabricam.

Poesia é o impossível
feito possível. Harpa
que tem em vez de cordas
corações e chamas.”

. . .

flor amarela
no vão das pedras
suaviza o cinza
sempre tão ríspido

(e a pedra)
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