Soneto - Rodolfo Alves de Faria
A sombra geme aqui. Ruínas este soneto.
A arcaria da frase é um esgarado momo
e, sobre este papel, erguem-se os versos como
velhos muros de pedra ou restos de esqueleto.
A imagem lembra um curvo e triste cinamomo,
onde a hera da dor se enrosca ao tronco preto
e passeia, através da quadra e do terceto,
a saudade que reza, em religioso assomo.
Senta-se a mágoa sobre os escombros dispersos
do hemistíquio onde bate o coração dos versos
e em derredor rasteja o verme dos gemidos;
e como um braço, amor, que no outro braço arrima,
cai, em música estranha, a rima sobre a rima,
num sonoro rumor de mármores partidos.
Rodolfo Alves de Faria (n. Maceió, Alagoas, 23 de março de 1971 - f. Maceió, Alagoas, 25 de junho de 1899)
Poema extraído de «A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria é a Língua Portuguesa. Introdução, coordenação e notas de António Ruivo Mouzinho. Edições Unicepe - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, 2004.