sábado, 21 de julho de 2018

a sombra...




hoje anda como quem morre
sem encontrar direcção
é a sombra duma  lembrança
no retrato uma recordação
secou o sol o seu rosto
onde cabia por inteiro
secos ficaram os olhos
não há mar, mas um ribeiro
já não são os seios duros
nem as mãos colhem frutos
passa por ela a sombra rente
seus sonhos são agora prematuros
morre tão completamente
no rosto olhos sem brilho, enxutos

sufoca o grito na garganta
a vida a meio parou
a sombra já se agiganta
sua pele o outono manchou
traz o corpo na prisão
e a alma em liberdade
perdida no seu cansaço
só o sonho e a saudade
tomam conta da sua mão

sentimentos e emoções
ao longo de anos acumulou
indagações ao divino sem resposta ficou
a quem entrega o destino?
em crepúsculo a vida, num
inverno se tornou.

natália nuno
rosafogo


terça-feira, 17 de julho de 2018

que o poema não me ignore...



quando o corpo tropeça
a alma guarda as memórias
e é como se um enxame de saudades
viesse p'la mão do vento a trazer-me alento,
e tudo recomeça
vem aquela lembrança que não esquece
que traz com ela a luz e me afasta da sombra
surgem pétalas de luz na escuridão
disfarço o vazio que há em mim
e ninguém sabe o que me vai no coração
a minha alma desorientada
é como o canto nocturno duma cotovia
cinzenta num inverno de nostalgia
quando o corpo tropeça
é tanto o tédio,
que as palavras desbotadas saem de mim
vindas dum labirinto da mente
sem fim.

entre pétalas de solidão,caminho p'lo tempo,
que o tempo apagou
mas a luz me dá a mão
no declínio a vida desatou
em mim a saudade
e até o brilho dos olhos me tirou de verdade
mas quando o sol declina nas horas tardias
no sonho me encontro ainda menina.

natalia nuno
rosafogo


o vazio em mim...




sem uma só lágrima
não encontro o pranto
agora choro por dentro
enquanto a vida
como vôo a precipitar-se
se escoa e revoa até cansar-se,
e a mim só resta esperar
enquanto a morte urde a trama
e numa manhã qualquer
me diz: anda mulher!
- por mim chama!

a abundância das estações terminou
não há mais o espanto no olhar
não há mais o coração a palpitar
como outrora,
abruptamente chegou  a hora.
liberto lembranças enredadas na teia
da nostalgia
deixo as palavras foragidas, em liberdade
os pássaros virão chorar por mim todo o dia,
e eu partirei com saudade.

natalia nuno
10/12/2003







subida nostálgica...



já as sombras das árvores se deitam
e a tarde empalidece
e, a enlaçar-e apenas a saudade
pois no presente nada mais acontece
sobre as tílias um ar quente,
inconscientemente, ponho-me a fantasiar
noutro tempo que era tamanho
e passava tão devagar...
hoje traz asas na corrida
e depressa me leva a vida.

que escada enorme foi esta vida
tanto degrau, tanto degrau na subida
agora, vai a uma ponta
oiço meus ais, por entre vendavais
escadaria imensa que agora me amedronta,
trago o sol doendo nos olhos
e lágrimas caem ao chão
subida nostálgica, que me afronta o coração

a vida dobrou-me, dobrou-me,
e eu julgando morrer, cansada de subir
enquanto me afasta, me rouba as certezas
do que está por vir...
é agora outono, não me apresso
subo devagar e não esqueço
que subo para atrás já não voltar
a felicidade não deu ponto sem nó
ficou longe e eu aqui tão só...
sou passado, vento que dobrou a esquina
sou o sol que já declina
para trás ficou a alegre menina em flor
a tenra idade e o fulgor da mocidade,
no velho albúm, conservo o seu sorriso
mato a a saudade, ouvir-lhe a voz
para me sentir viva...preciso!

natalia nuno
rosafogo





segunda-feira, 16 de julho de 2018

os sonhos na mão...


preciso falar das noites
quando as recordações latejam
na mente e passam por mim como pardais
esvoaçantes, apressadamente.
suspensa, deixo-me em pensamentos irreais
num estremecer de vida
e é como se fosse um tempo novo
a memória vibra como uma campainha
no silêncio caminha e se distende
enquanto o peito fala e as mãos escrevem
o que  ninguém entende
só os pássaros que em mim bebem
vão fazendo a viagem de penas soltas
recrio e dou voltas e volto a ser criança
criança que embala o sonho
que não dá descanso às palavras
que guarda na lembrança com amor
o adro a praça, o rio e as águas verdes
que deram ao seu olhar a cor.

falo das noites, quando as lembranças
são mais vivas, e as saudades surgem
intempestivas, ou afagando meu pensamento
e nele vão deslizando...
a noite me envolve, o sono não chega
e é minha mãe que o cobertor me aconchega
os sonhos eu teço num breve tecer
quem sabe amanhã possa já não ser
dobro e desdobro nos olhos primaveras
lembranças se enredem em mim
como folhas de heras
daqui a pouco nascerá o dia, celebrarei
a chegada, colho mais uma saudade
e ponho-me a cismar lá mais para a tarde
e é como se fosse um tempo novo...

natalia nuno
rosafogo