27.6.09

Maria de Oliveira Barros II


A primeira dama de Natal
(José Correia Torres Neto *)

Natal, década de 40 - A cidade fervilhava de militares americanos e brasileiros. Aviões, hidroaviões, Catalinas e Jeeps patrulhavam a vida dos natalenses.
Instalava-se na cidade a paraibana de Campina Grande, Maria de Oliveira Barros (24/06/1920 - 22/07/1997). Começava neste ínterim a história da mais conhecida casa de tolerância do estado (do país ou do mundo?).
Entre as movimentações na Ribeira, nas pedidas de Cuba Libre no saguão do Grande Hotel, nas notícias pelas Bocas de Ferro, na Marmita, em Getúlio e em Roosevelt e na nova geração de meio americanos e meio brasileiros, lá estava Maria Barros enaltecendo-se na Cidade do Natal como a proprietária do melhor (ou maior) cabaré.
Tornou-se conhecida como Maria Boa. Mesmo com pouco estudo ela despertou o gosto por música, cinema e leitura. O seu "estabelecimento" era o refúgio aos homens da cidade, com residência fixa ou, simplesmente, por passagem por Natal e servia de referência geográfica na cidade.
Jovens, militares e figurões acolhiam-se envoltos as carnes mornas das meninas de Maria Boa. Muitas mães de família tiveram que amargar, em silêncio, a presença de Maria Boa no imaginário de seus maridos em uma época de evidente repressão sexual.
Vários fatos envolveram a personagem. Um episódio muito comentado foi a pintura realizada pelos militares em um avião B-25. Um dos mais famosos aviões da 2a Guerra Mundial, os B-25 eram identificadas com cores características de cada Base Aérea. Os anéis de velocidade das máquinas voadoras da Base Aérea de Salvador eram pintados com a cor verde. Os aviões de Recife, com a cor vermelha, e os de Fortaleza, com a cor azul. Para a Base de Natal foi convencionada a cor amarela. Os responsáveis pela manutenção dos aviões em Natal imaginaram também que deviam ser pintados no nariz do avião, ao lado esquerdo da fuselagem junto ao número de matricula, desenhos artísticos de mulheres em trajes de praia. Autorizada pelo Parque de Aeronáutica de São Paulo, a idéia foi colocada em prática. Pouco tempo depois, os B-25 de Natal surgiram na pista com caricaturas femininas e alguns até com nomes de mulheres. Alguns militares da Base escolheram o B-25 (5079), cujo desenho se aproximava mais da imagem de Maria Barros. Outras aeronaves também receberam nomes como "Amigo da Onça" e "Nega Maluca".
Quem custou a acreditar neste fato foi a própria Maria. Até que alguns tenentes decidiram levá-la até à linha de estacionamento dos B-25 logo após o jantar para não despertar a atenção dos curiosos. Ela constatou o fato. As lágrimas verteram de seus olhos quando viu à sua frente, pintada ao lado do número 5079, a inscrição "Maria Boa".
O mito "Maria Boa" rendeu trabalhos acadêmicos o de Maria de Fátima de Souza, intitulado: "A época áurea de Maria Boa (Natal-RN 1999)". O trabalho aborda o "fenômeno da prostituição infanto/juvenil, suas conseqüências e causas no desenvolvimento físico e psicossocial de crianças e adolescentes (...). Com o aprofundamento dos estudos percebemos o importante papel dos bordéis na prostituição, bem como o fechamento dos mesmos (...). Chegamos então ao cabaré de Maria Boa, já fechado. Tivemos, assim, a oportunidade de conhecer um pouco da saga da Sra. Maria de Oliveira Barros, uma profissional do sexo, com grande importância na história da prostituição de adultos, ou ainda, tradicional; das histórias contadas a seu respeito chamou-nos atenção para sua representação social, seu "mito" e sua ligação com o imaginário masculino. Com isso, passamos a averiguar mais profundamente uma participação na sociedade da época e buscamos reconstruir parte de sua história enquanto meretriz, cafetina, e proprietária da mais famosa casa de prostituição que o RN já conheceu."
O Professor Márcio de Lima Dantas publicou2002 o texto "Retratos de silêncio de Maria Boa". "(...) Para além da atitude ética de proteger sua família, o que faz parecer um jogo com a hipocrisia da sociedade, penso que, na atitude de se manter reservada, se inscreve outro aspecto digno de ser ressaltado. Falo do mito que entorna a personagem Maria Boa, de certa maneira, criada e ritualizada por ela mesma, dimensão de fantasia para além do empírico vivenciado. (...) Astuciosamente se fez conhecer por "Maria", o antropônimo mais comum no universo feminino, genérico e pouco dado a divagações semióticas. Ironicamente é o nome da mãe de Jesus... Quem não tinha conhecimento no Estado de uma proprietária de um requintado lupanar, e que se chamava Maria, a Boa. O mito, da constituição do éter, era aspirado por todos, preenchendo necessidades, ocupando lugares no espírito, imprimindo fantasias nos adolescentes, despertando em jovens mulheres às aventuras da carne, engendrando adultérios imaginários. Integrava, assim, o patrimônio individual e coletivo. (...)"
Eliade Pimentel, no artigo "E o carnaval ficou na memória" destaca a presença de Maria Barros nos carnavais de Natal: Lá pela década de 50, os desfiles passaram a acontecer na avenida Deodoro da Fonseca. Maria Boa desfilava com Antônio Farache em carros conversíveis, "
Em 2003 o cantor Valdick Soriano, quando entrevistado por Everaldo Lopes, registrou que quando esteve em Natal, pela primeira vez, cantou até para as meninas de "Maria Boa".
Maria Barros é história. Mesmo sendo paraibana é a Primeira Dama (ou anti-Dama) de Natal. Impera nas lembranças dos seus contemporâneos e se faz presentes nos prostíbulos que ainda resistem nas periferias da cidade ou travestidos de casas de "drinks" nos bairros mais nobres. Ela é citada no filme For All - O Trampolim da Vitória (vencedor do Festival de Gramado em 1997) de Luiz Carlos Lacerda e Buza Ferraz. O filme retrata a cidade do Natal em 1943 quando a base americana de Parnamirim Field, a maior fora dos Estados Unidos, recebe 15 mil soldados, que vão se juntar aos 40 mil habitantes da cidade.
Para a população local a guerra possuiu vários significados. A chegada dos militares americanos alimentou fantasias de progresso material, romance e, também o fascínio pelo cinema de Hollywood. Em meio aos constantes blecautes do treinamento antibombardeio, dos famosos bailes da base aos domingos, dos cigarros americanos, da Coca-Cola e do vestuário estavam os sonhos natalenses. Sem questionamentos, "Maria Boa" foi uma das principais atrizes no elenco desse belicoso teatro. A Primeira Dama Maria Boa... (*com notas do Blog).
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Recebi de Pery:
Neto,
Eu tenho uma informação que poderá servir para enriquecer esse assunto Maria Boa.
Fui colega no colégio de Abílio Fernandes filho de Nezinho Fernandes, um dos Diretores da firma Fernandes & Cia, ligada ao comércio de algodão.
Abílio certa vez me contou:
"Maria Boa foi trazida de Campina Grande por Nezinho Fernandes (meu pai) para trabalhar como babá ou doméstica na residência dele. Com o decorrer do tempo, Nezinho avançou o sinal com a jovem Maria (ainda não era Maria Boa) e para não ter complicação com a família, conseguiu acomodá-la numa residência, naturalmente patrocinada por ele."
Abílio não adiantou mais nada, porém creio que a partir daí, Maria, uma mulher inteligente, em lugar de assumir a vida de prostituta, assumiu a de cafetina que era mais rentável.
Certamente foi aí que se tornou amante do Dr. Manoel Vilar, um médico oftalmologista, o único que havia em Natal.
É apenas um retalho da vida daquela que fez história em Natal com o nome de Maria Boa.
Pery Lamartine

Sobre o Torneio “Maria Boa”

Provavelmente muitos, principalmente os mais novos ainda não ouviram falar da foto "Maria Boa", e muito menos tiveram a oportunidade de colocar os olhos sobre ela que é o Troféu do Torneio Maria Boa, constituído de vários jogos que testam a intelectualidade e a parte física dos pilotos e que se tornou um símbolo dentro da Aviação de Caça.
Com a entrega da Base Americana para ao Brasil, os oficiais Graco Magalhães, Durval, Vercillo e Teixeira Rocha, passaram noites e noites procurando negativos de moças de Natal. E logo encontraram a foto da mulher nua, que um sargento americano garantiu ser de Maria Boa.
O Teixeira Rocha se apossou da foto, colocou num quadro de madeira e ficou com ela na sua mesa. Neste tempo ele comandou uma parte imensa da Base, o “Supply and Maintenance”, ou seja, Suprimento e Manutenção. Era um mundo e havia mais de 15 daqueles barracões de madeira com material sobressalente que teria de ser identificado, pois era muita coisa de B-17, de B-24, de C-46 e C-47.
Nessa ocasião, já estava criado o 5o Grupo de Bombardeio Médio, e o Grupo de Caça, constante com os P-40, foi transferido para o Rio Grande. Os P-40 foram levados por pilotos de Natal e o último deles foi levado pelo T. Rocha que gastou mais de 40 dias para voltar, retido por panes repetidas, e o material tinha que ser mandado daqui.
Pois bem, quando o T. Rocha chegou a Natal o quadro já havia sumido de sua mesa. Lá pelos idos de 1954, estavam os caçadores do 2o/5o G.Av. (por coincidência, comandados pelo então Major T. Rocha), em expediente normal, quando chegou o então Maj. Hipólito com o quadro da Maria Boa. Ofereceu-o como troféu a ser disputado pelo Esquadrão contra o 1o/5o G.Av., Unidade de B-25, então comandada pelo Maj. Carrão, numa partida de futebol de salão a ser realizada no Campo da Navy, pois ali residiam quase todos os oficiais das Unidades. Jogo disputadíssimo e decidido num pênalti contra o 1o/5o, O quadro passou a ser do 2o/5o. Posteriormente essa Unidade foi transferida para Fortaleza e levou o troféu e posteriormente ficou embutida em uma parede do 1o/4o G.Av. lá em Fortaleza.
Desde então as disputas não têm sido tão cordiais, valendo qualquer meio pela posse da "Maria Boa". Incluem-se aí "furtos" e "roubos", técnicas, aliás, largamente utilizadas.
O Esquadrão detentor do troféu obriga-se a guardá-lo dentro de suas dependências e fora de quaisquer cofres, mantendo acesa a chama pela sua conquista. Pode também levá-lo a prêmio, sendo, neste caso, quem define as regras da competição.
Desde 1989 (quando foi colocada em disputa pelo 1º GpAvCa) o 3º/10º GAv. tem a honra de ser possuidor de tão digno prêmio, e informa a todos os que porventura estejam interessados, que a fotografia, já bastante avariada, passou por uma restauração em Novembro de 1996. A foto original da "Maria Boa" é entregue ao vencedor do torneio entre os esquadrões e ocorre normalmente na "Semana do 22 de Abril” na Base Aérea de Santa Cruz.
Possuir a foto é sinal de prestígio dentre os diversos esquadrões, e representa uma das mais importantes tradições cultivadas pelos Caçadores. A regra diz que a foto pode ser "surrupiada" por qualquer um dos perdedores... por isso é mantida na maior segurança pelo detentor do Torneio. (Fontes: Associação Brasileira de Pilotos de Caça /ABRA-PC e notas do Blog)

23.6.09

Prof. Tarcísio Medeiros


O Centro de Memória da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Norte Professor Tarcísio Medeiros, foi assim designado em homenagem ao seu primeiro servidor. Nascido aos 8 de setembro de 1918, em Natal, Tarcísio da Natividade Medeiros foi nomeado em 27 de junho de 1945 para o cargo de Oficial da Secretaria do Tribunal, nele permanecendo até aposentar-se, em 1970, como Diretor da Divisão Administrativa da Secretaria. Servidor da Justiça Eleitoral, durante toda sua vida funcional, prestou relevantes serviços à instituição e contribuiu, de forma inestimável com a cultura do Estado, como acadêmico e literário, tendo escrito vários livros e ensaios sobre a história do Rio Grande do Norte.
Foi membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras; sócio efetivo e redator da Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e do Instituto Histórico do Ceará; professor de História Geral, do Brasil, das Américas e do Rio Grande do Norte na Escola Técnica de Comércio de Natal, no Ginásio 7 de Setembro e professor adjunto do Departamento de História da UFRN. Em 1937 ingressou na Faculdade de Direito do Recife, interrompendo o curso ao ser mobilizado para servir à pátria, no período de 1942 a 1945, e à Força Expedicionária Brasileira. Concluído o curso, exerceu a advocacia por mais de trinta anos, inclusive como Procurador da LBA por vinte e cinco anos e Conselheiro da OAB/RN. Condecorado com várias honrarias de mérito cultural e medalhas como ex-combatente de guerra, o Professor Tarcísio Medeiros faleceu em Natal, em 26 de maio de 2003, aos 84 anos de idade.
Fonte: Centro de Memória da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Norte

20.6.09

Circuito Histórico de Natal

Cidade Alta e Ribeira

Fonte: Semurb


CIDADE ALTA:


Busto do Padre João Maria, Coluna Capitolina, Casa de Cãmara Cascudo, Solar Bela Vista, Capitania das Artes, Igreja do Rosário dos Pretos, Igreja Matriz Nossa Senhora da Apresentação, Praça André de Albuquerque, Memorial Câmara Cascudo, Instituto Histórico e Geográfico, Palácio da Cultura, Palácio Felipe Camarão, Museu Café Filho, Casa do padre João Maria, Igreja Santo Antônio (Igreja do Galo), Praça da Santa Cruz da Bica, Pedra do Rosário, Casarão de Junqueira Ayres, Sede da OAB, Casa do Estudante e Casa da Estudante.


RIBEIRA:


Praça José da Penha, Praça Augusto Severo, Casa onde nasceu Pedro Velho, Casa de Januário Cicco, Casa onde nasceu Café Filho, Antigo Palácio da Rua Chile – Museu de Arte Popular, Igreja do Bom Jesus, Estação da Rede Ferroviária, Antiga Rodoviária - Museu da Cultura, Antiga Escola Doméstica de Natal, Casa de Itajubá, Antiga sede do Banco do Estado (Bandern), Associação Comercial, Antigo Grande Hotel, Colégio Salesiano, Antiga Faculdade de Direito, Junta Comercial, Predio do antigo IAA, Receita Federal, Museu Ferroviário, Teatro Alberto Maranhão e Casa da Ribeira.

Infelizmente a maioria desses monumentos estão em petição de miséria pelo descaso de nossas autoridades. Enquanto isso a vitrine da Copa está em alta.


Bares e Cabarés de Natal nos anos 60.




Bares e Cabarés de Natal nos anos 60
(Bob Mota)

Pouco mais de dez por cento,
eu tenho da tua idade.
Minha querida cidade,
eu louvo a todo o momento.

Natal, és um monumento,
a transpirar de emoção.
Guardo no meu coração,
também na minha retina,
minha Natal pequenina,
meu amor quatrocentão.

Falando tão bem assim,
da minha linda cidade,
com toda sinceridade,
acrescento, outrossim.
E não falo só por mim;

Natal, prá teus filhos, és;
inspiração nota dez.
E esse poeta apresenta,
na década de sessenta,
seus bares e cabarés.

Era o vício que se tinha,
visitar depois da aula,
Francisquinho, Zéfa Paula,
Acapulco e Francesinha.
Otávio, Raquel, Aninha,
Arpege, Plaza, Ideal,
Rita Loura, que legal.
Margô, lembro em minha loa,
Virgínia e Maria Boa,
que era a melhor de Natal.

A Ribeira era um tesouro.
Lá na Quinze de Novembro,
com saudades, eu relembro,
Magrifh e Rosa de Ouro.
Quem ía furar o couro,
no Bar da Tripa passava.

Na Pensão Coimbra dava,
um beijo numa pequena,
no Beco da Quarentena,
certamente se encantava.
.

17.6.09

Odemar Guilherme Caldas Junior

Foto: Cine Rio Grande - Anos 50

Carta ao amigo Odemar Junior
(Augusto Coelho Leal)

Amigo quando você partiu, não tive coragem de lhe visitar nos últimos dias que passaste conosco. Não sei se fui covarde, não sei... Mas acho que a velhice já estava me tornando um velho chorão. Eu não queria chorar perto de você, porque às vezes que lhe via, você mesmo sentindo dores não reclamava, olhava para mim sempre com um sorriso. Na verdade nem sei se você partiu, porque os justos permanecem entre nós. Isto eu sinto quando vou ao seu apartamento, você continua vivo, perto de Olga e seus quatros filhos, que são figuras maravilhosas. Aqui você cumpriu sua missão, foi bom amigo, bom pai, bom marido e na vida profissional um dos mais competentes.
O nosso conhecimento existia desde criança, das peladas nas ruas Maxaranguape ou Campos Sales. Mas nossa amizade solidificou-se em 1965 no primeiro ano do curso de engenharia. Eu, você e Sadock Albuquerque, um trio inseparável, que quase com freqüência se juntava Jovelino Marques formando um quarteto digno de tomar todas as cervejas de seu Damasceno do bar “A Palhoça”, ali na Av. Deodoro, vizinho ao Cinema Rio Grande. Quando saíamos para tomar umas e outras fazíamos festa, era alegria geral. Os mais comportados como Manoel Neto, Janilson Carvalho, Antonio Gomes, Laércio Medeiros, Xavier Siqueira, Geraldo Melo, Aldemir Villar, Edílson Medeiros, Carlos Letieri, José Batista, Valmir Freire, Adilsom, Fernando Leitão e outros, tiravam um tempinho e iam, nos fazer companhia. Foi na camionete Chevrolet Brasil do Sr. Edgardo Medeiros pai de Edílson que entramos para o Guinness Book. Colocamos dezesseis machos dentro da boléia, virou uma lata de sardinha e fomos beber. Na primeira parada quando se abriu uma das portas foi todo mundo caindo na calçada, mas a alegria continuou lá na “A Palhoça,” tomamos um “porre” com o primeiro “astronauta” brasileiro que aos berros gritava que o homem não chegou a Lua. Tinha a voz de Laércio, cantando e “roendo” Tudo de Mim - As brincadeiras no Centro Cearense, com o velho Toinho Dantas “Careca” alto funcionário da Assembléia Legislativa, com o apoio do General leitão. Mas tudo tem seu fim, fui eu o primeiro a abandonar o grupo, pois logo depois me casei, tive que assumir a responsabilidade. Você foi o primeiro a partir, a nos deixar aqui na terra. Imagino a sua chegada no céu – lá é lugar dos justos - sendo recebido pelos seus pais Odemar Guilherme Caldas e Laura, além do irmão Alfredo, o velho Odemar dizendo para você, como ele costumava dizer – Essa não meu filho! Você veio muito cedo.
É isto amigo, a menor distância entre duas pessoas é o amor, e isto você tinha por todos, amigos e familiares, por isto, você estava sempre perto de todos. Infelizmente o espaço é pequeno para escrever sobre você, da nossa amizade, das nossas famílias. Como não tive coragem de estar perto de você nos seus últimos momentos neste mundo, te mando parte de um poema escrito por Ana Luisa Bailac. “Ah! Como é linda a amizade / Principal fruto da felicidade/ Nasce como uma criança/ Cheia de pureza e firmeza/ E juntos entramos nessa dança / Conseqüência simples da natureza”.
Adeus amigo, até o dia de juízo.
(Odemar Guilherme Caldas Junior, era Engenheiro Civil pela UFRN, turma de 1969)

13.6.09

Faz tempo...

Foto: Praça Pedro Velho (destaque para um dos "tanques")

FAZ TEMPO...
(Bartolomeu Correia de Melo)

Era ainda menino-velho guenzo e feio quando chegou do interior praquele sobradinho sem quintal. Logo ele, criado solto entre fruteiras, que nem caga-sebite... O jeito era ganhar a rua, zangando pai e esgoelando mãe. Embora que, por medo de papa-figo, pouco se aventurasse além dum grito de distância. E pusera-se então a reinar feliz, posseiro de calçadas e terrenos baldios, jogando bola-de-gude no inverno e bola-de-meia no verão.
Como já tinha a vista rombuda, era demais cegueta no jogo de biloca. Daí que arrumou uma roleta, na qual se apostavam as ditas bolinhas de tilar. Findou sendo dono de invejável fortuna em bolas-de-vidro, estampas de sabonete “Eucalol” e notas de carteira-de-cigarro. Tinha muitas - mazaroio assim - daquelas vermelhas da marca “Columbia”, que valiam três de cigarro “Continental” e cinco das amarelas de “Astória”. Se bem que todo aquele capital não valesse nem meio velocípede, sonho azul jamais possuído. Passada a mania das bilocas, trocou toda riqueza por time de botões de quenga, dando ainda baladeira como volta. Time esse, tempos depois, confiscado em pago dum zero em aritmética. Penosa perda, pois, além do bom prumo de campeão, os nomes dos botões faziam acróstico do nome dele: Jurubeba, Bolachão e Alicate; Rolabosta, Tapioca e Ortelã; Lagartixa, Ovo-goro, Macacão, Espanta-coió e Urubuzinho.
Nos quatro aceiros do bairro, tanto pintou lambanças e quanto bordou lembranças...
Aquela ruazinha ladeirosa e esburacada, descendo até virar precária escadaria, desaguava enxurradas na Ribeira. Porém, dali se avistava riqueza-mor da paisagem natalense, mais parecendo uma pintura de Thomé. Era quando o sol vadiava restos de hora, no contraluz das palmeiras do Salesiano, pondo carmins cor-de-estio nos confins do além-rio. Naquilo se espichavam, que nem sombras barrocas, as primeiras e vagas tristezas de menino-velho.
Então, Petrópolis era bairro seminovo, ainda meio misturado, no dizer da mãe neta-pobre. Casonas modernosas, de terraço e jardim, tangendo ladeiras abaixo acanhadas casinhas de porta e janela. Aquele sobradinho, modesto mas enxerido, brotado no alto da descida, tinha varandim remediado, feito de cobongós. Jeito ainda meio suburbano, algo assim sobrevivente, quase além dos ganhos do pai e aquém dos sonhos da mãe. Ali perto da bodega de Ubaldo, nas bandas da Rádio Poti, logo abaixo do sapotizeiro de seu João Lourenço; vizinho-direito da família Rayol, vigiado pelos gansos de dona Lia de seu Joaquim Victor de Holanda.
Na ruazinha de nome deslembrado passavam pregões de garrafeiro e tingo-lingos de cavaco chinês. Descia seu Olívio da Confeitaria Delícia, deixa-que-chutando, a driblar pocinhas de lama. Subia o vate Bezerra Júnior, passo ainda firme, metrificando versos resmungados. Seu Gurgel, bedel do Atheneu, no pino do meio-dia, muito rosado, suado e zangado. Esfriando o mormaço, chegava aquela brisa camarada, boa de empinar coruja. Depois, já no lusco-fusco, surgia o velho Cambraia, feito risonho reclame da noite, gritando seu ramerrão:
- Olholhope, o Jorná de Natá, o Jorná de Natá; olholholhope, o Jorná de Natá!...
Depois do jantar, a meia-lua pousava inteira sobre os vagos mistérios da Ribeira... Seu Luiz Romão tocava na vitrola - fanhosa e avexada - valsinhas quase em ritmo de baião. Sonolento, o pai olhava as horas lá no relógio luminoso da estação. A mãe angicana, solfejando baixinho cantigas da vitrola, esperançava relampeios no rumo do sertão. Nesse enquanto, o irmão bonzinho escrevia tarefas de escola, ele vadiava, solto na buraqueira, abusando do direito de correr mil brincadeiras.
O patrão do pai e a lavadeira da mãe moravam por perto, naquele bairro ainda inacabado. Os filhos deles eram seus contrários nos jogos de pião e de botão e irmãos-de-sangue nas peladas tira-teima e guerras de carrapateira. Ele achava nos amigos pobres maior esperteza e melhor sinceridade, embora os ricos parecessem mais hábeis e interessantes. No fundo, sentia casta inveja de ambos, pois que achado tímido e simplório. No meio deles se gratificava, como que dissolvido no grupo, compartilhando inatingíveis qualidades. E aquilo bem que lhe bastava; ser apenasmente o Prof. Garrancho, insossa magreza de óculos, terceiro reserva de goleiro e soldado raso nos tiroteios de mamona. Uma turminha de cobras, criados entre os barrancos e areais daquelas quadras. Quase sempre ganhava na bola e no pique para os da Guaratuba, da Condor, da Bica da Telha e até para a estrangeira Camboim. Mas sempre perdia, no braço e na baladeira, para a vizinha turma da Tabica, rival maior, que era mesmo cipó-de-araruta. E haja cada apelido... Lambreta, Tarzan, Didica; Bolo-Preto, Bicudo, Chico Sapo; Cabo Guido, Bacurau, Fermento, Magnésia, Chapuleta... Timão de pariceiros de grandes jornadas.
Mas aquilo, como tudo gostoso ou proibido, durou pouco mais que um pouco.
Era ainda rapazinho-novo, magro e malamanhado, quando deixou aquelas esquinas, onde os postes de ferro soavam como sinos e os rabos de corujas enfeitavam a fiação. Ruazinhas descalças, molequeira na bola-de-meia, rapaziada nas últimas serenatas, moçada nos folguedos de pastoril. Ali se enturmara, aprendendo os outros, tão diferentes, na feliz igualdade da meninice. Tempo de domingos alegres e primeiras sextas-feiras; doçuras de frutas roubadas e amarguras de boletins vermelhos. No azul-maroto dum olhar sonso de menina-moça, apaixonou-se pela mão direita...
A vida que tantos juntara, a todos separou, no rumo de cada destino. Aquela turminha deu mesmo de tudo; de trambiqueiro a deputado, de empresário a biscateiro, de jogador a professor, de médico a agente funerário. Alguns, ainda hoje, lhe acenam da outra calçada; se bem que nem todos cruzem a rua para o abraço. Outros passam-lhe rente, fitando o vazio no instante do olá; por vezes, só espiam pelas costas. Aonde andarão os que sumiram sem notícias?... Contudo, sempre espera que esses avistados lhe falem primeiro; talvez porque, quando os reencontra, sinta voltarem aqueles longes dias. Afinal, em tais quandos, eram bem mais importantes; mais certeiros na baladeira, mais ligeiros nos dribles, mais despachados nas arengas, mais sabidos nas putarias... Ele apenasmente retornado ao Prof. Garrancho, magreza de óculos, goleiro frangueiro e rexingado, mas feliz e honrado em fazer parte da turma.
Nunca mais viu nem o azul daquele olhar que alumiava safadeza, nem sentiu falta da mão direita. Aquele menino-velho do sobradinho, ali ficado na beira da descida, resta muito e apenas professor, escrevivente de relembranças. Ainda quedo entre o sonho da riqueza e o medo da pobreza, como nos dias de velocípede e bola-de-meia. Sem mais ilusões de domingos alegres, segue a roleta da vida, perdendo a pureza das primeiras sextas-feiras.
Saudade tinindo que nem pedrada em poste de ferro.
Faz tempo...

11.6.09

Faculdade de Direito

Foto: Prédio da OAB
Faculdade de Direito (Carlos Gomes)

A sua concepção é atribuída a um ilustre potiguar, Prof. Luiz Correa Soares de Araújo, educador consagrado e líder do escotismo em nossa terra, que tendo uma visão do futuro deu a idéia da criação de um Curso de Direito no Estado.
O sonho começou a ser concretizado através da Lei Estadual nº 149, de 15 de agosto de 1949, quando então governador o Dr. José Augusto Varela, que subscreveu o diploma legislativo.
Uma vez criada a Faculdade, foi nomeada uma comissão com vistas a iniciar a viabilidade do seu funcionamento, composta pelos professores Antônio Soares Filho, Gil Soares de Araújo, Floriano Cavalcanti de Albuquerque e Adolfo Ramires, os quais prepararam os papéis necessários para conseguir uma estrutura administrativa.
A sua regulamentação foi aprovada pelo Decreto nº 2.138, de 23 de abril de 1951.
Várias autoridades se interessaram pelo processo, como João Medeiros Filho, Alvamar Furtado de Mendonça e Nestor dos Santos Lima, Miguel Seabra Fagundes e Floriano Cavalcanti de Albuquerque, todos sem recebimento de qualquer remuneração.
A autorização para funcionamento foi conferida pelo Ministério da Educação e Cultura através do Decreto federal nº 36.387, de 25 de outubro de 1954.
Foi instalada a Faculdade, solenemente, no Teatro Carlos Gomes em 21 de dezembro de 1954, passando a funcionar no Instituto de Educação do Atheneu Norte-riograndense, sob a direção do Professor Paulo Pinheiro de Viveiros e Otto de Britto Guerra. Daí para o prédio definitivo do antigo Grupo Escolar Augusto Severo, na Praça que tem o mesmo nome, nº 261, no bairro da Ribeira, somente em 21 de abril de 1956.
O primeiro Concurso de Habilitação (Vestibular) ocorreu em 1954, com 105 inscritos e somente 36 aprovados. O certame foi realizado tendo como examinadores Manoel Varela de Albuquerque, Edgar Ferreira Barbosa, Francisco Ivo Cavalcanti; Otto de Brito Guerra, Padre Emerson Negreiros e Monsenhor João da Mata Paiva, Maria Gurgel e Américo de Oliveira Costa, Aldo Fernandes Raposo de Melo; Ivone Barbalho e Vitorino Francisco Rutigliano, José Gomes da Costa.
Antes mesmo do início das aulas, foi criado o Diretório Acadêmico Amaro Cavalcanti, em data de 12 de março de 1955, sendo eleito o primeiro presidente o estudante Ernani Alves da Silveira.
A Primeira Aula de Sapiência aconteceu em 15 de março de 1955, proferida pelo Professor José Ferreira de Souza, catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de Janeiro e da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Distrito Federal. O ano letivo começou regularmente em 16 de março de 1955, com a aula de Introdução à Ciência do Direito, proferida pelo Desembargador Floriano Cavalcanti de Albuquerque.
Após ser inspecionada por Comissão do MEC, a Faculdade foi reconhecida em 15 de maio de 1957.
Os primeiros professores da Faculdade de Direito de Natal foram: Floriano Cavalcanti de Albuquerque, Otto de Brito Guerra, Manoel Varela de Albuquerque, Aldo Fernandes Raposo de Melo, Edgar Ferreira Barbosa, João Vicente da Costa, Véscio Barreto de Paiva, Paulo Pinheiro de Viveiros, Milton Ribeiro Dantas, Emídio Cardoso Sobrinho, Alvamar Furtado de Mendonça, Antonio Soares Filho, Raimundo Nonato Fernandes, Carlos Augusto Caldas da Silva, Luís da Câmara Cascudo, José Áureo Lins Bahia, José Gomes da Costa, Anselmo Pegado Cortez, Claudionor Telógio de Andrade, Nestor dos Santos Lima, João Maria Furtado, Gil Soares de Araújo, Francisco Ivo Cavalcanti, Djalma Aranha Marinho, Francisco Bruno Pereira. Alguns desses logo atingiram a compulsória e outros pediram exoneração.
A primeira turma, 1959, com denominação de Turma Clóvis Bevilaqua, seu patrono e paraninfo Edgar Ferreira Barbosa, teve a seguinte a sua composição: Ivan Maciel de Andrade, Ana Maria Cascudo, Zélia Madruga, Genilde Urbano, Eider Furtado de Mendonça e Menezes, Luciano Nóbrega, Elmo Pignataro, Francisco Dantas Guedes, Othon Oliveira, Jaime Hipólito Dantas, Geraldo Isaias de Macedo, Reginaldo Teófilo da Silva, Ernani Alves da Silveira, Murilo Moreira Veras, Francisco de Assis Teixeira, Arnaldo Arsênio de Oliveira, Pedro Martins Mendes, Nice Menezes de Oliveira, Emilson Torres dos Santos Lima, Valdir da Silva Freire, Hebe Marinho Nogueira Fernandes, Jaime Galvão Revoredo, Pedro Cortez de Araújo Amorim, Arilda Tânia Cavalcanti Marinho, Antônio Emerenciano de A.Sobrinho, Nildo João Mathias Alff, Terezinha de Almeida Galvão, João Eudes Pessoa, Arthur Luiz de Araújo, Enélio Lima Petrovich, José Cabral Pereira, Cleóbulo Cortez Gomes, Geraldo Guedes Dantas, José Daniel Diniz, Antonio Francisco Correa, Irineu Martins de Lima, Francisco Berilo Pinheiro Wanderley e João Damasceno de Oliveira.

5.6.09

A sisudez universitária

Antiga Faculdade de Direito na Praça Ausgusto Severo

A sisudez universitária
(Nei Leandro de Castro - Escritor)

Uma noite dessas, a convite da poeta, professora e amiga Ana de Santana, fui conversar com alunos de letras da UnP. Foi um encontro muito agradável, iniciado com uma demonstração de bom humor de meia dúzia de alunas, que se apresentaram como se fossem personagens do romance As Pelejas de Ojuara. Muitos risos, seguidos de exemplos de seriedade e competência no estudo do tema abordado. A coordenadora do curso, Célia Maria Medeiros, e a orientadora Ana de Santana estavam presentes, muito presentes. Os alunos demonstravam conhecimento e também pintavam e bordavam, na maior descontração. Cheguei à conclusão de que a sisudez dos mestres do meu tempo não deve existir mais nos cursos universitários de hoje.

Na época de minha faculdade de Direito, os professores achavam que a liturgia do cargo era estar sempre sério, sisudo, e dar aulas como se estivessem numa corte. Às vezes, uma corte marcial. Sem entrar no mérito da competência, as aulas eram cansativas e quase sempre chatas, pela seriedade exagerada dos mestres. Floriano Cavalcanti, professor de Introdução à Ciência do Direito, entrava em classe ao lado de Kant, utilizava em suas explanações um vocabulário que escapava a muitos, saía de classe de braços dados com Kant. Em uma de suas aulas, um alagoano muito talentoso, chamado Sávio, perguntou: “Mestre, o senhor conhece o filósofo Jean-Paul Sartre?” O professor Floriano, contrariado pela interrupção, respondeu do alto de sua sapiência: “Não o conheço e para mim, entendeu você, não constitui desdoiro não conhecê-lo.”

Paulo Viveiros, professor de Direito Romano, tinha uma gesticulação dramática e um tom de voz tonitruante. Erguia e baixava os braços, modulava a voz de acordo com o desenrolar do tema, parecia um orador de Roma antiga. Também era carrancudo, porque na Roma dos Césares os mestres deviam ser assim.Raimundo Nonato Fernandes, que vive a glória dos seus quase 90 anos, era uma barreira de difícil acesso. Com ele, quem não estudasse muito seria reprovado sem dó nem piedade. Ah, minhas intermináveis noites de estudo, mesmo detestando a matéria, mesmo detestando o curso, para não ser reprovado em Direito Administrativo.

Edgar Barbosa, brilhante como professor, brilhantíssimo como ensaísta, jamais deu um sorriso na faculdade de Direito – pelo menos, na presença dos seus alunos. Era muito sério, compenetrado, envolvido totalmente na matéria que lecionava. De vez em quando, ele se permitia sair dos temas de Direito Constitucional e fazia pequenas incursões pela literatura, sua paixão, sua verdadeira vocação.

Para não fugir à regra, havia mestres que faziam a exceção daquela sisudez universitária. O mais marcante, sem dúvida, era Véscio Barreto. Bom professor e uma figura cheia de humor, de presença de espírito. Consta que uma aluna sapeca, dessas que se sentam na primeira fila, disse baixinho ao professor Véscio: “Professor, a sua braguilha está aberta.” E Véscio, sem perder o rebolado: “Preste atenção à aula, menina...” No final do ano, Véscio Barreto dizia a seus alunos: “Eu não reprovo ninguém. Mentalmente, coloco uma cangalha em cada um de vocês. Os inteligentes tiram a cangalha logo, logo. Os burros vão carregá-la para o resto da vida.”

1.6.09

A vida boêmia de Natal


A vida boêmia de Natal - 1939
(Elísio Augusto de Medeiros e Silva)

Por volta de 1939, início da II Guerra Mundial, os cabarés mais famosos de Natal situavam-se na Ribeira.
Bastante freqüentados, eram muito populares, fazendo parte integrante da vida boêmia da cidade, que se iniciava depois das 9 horas da noite, quando as famílias já tinham se recolhido.Na vida noturna provinciana encontravam-se as prostitutas, os cáftens e os gigolôs, que também serviam de inspiração aos poetas e escritores.
Naquela época, a cerveja era vendida ao preço de mil e quinhentos réis, sendo uma das bebidas mais consumidas pelos pândegos da boemia.
As mulheres da zona pediam martini aos acompanhantes, que era servido ao preço de cinco mil réis a dose. A popularização do uísque ocorreu somente depois, com a chegada dos americanos a Natal.
Nos cabarés, às vezes, aconteciam pelas madrugadas brigas e pancadarias, entre os freqüentadores, sendo necessária a presença da polícia, para acalmar os mais exaltados.Normalmente, dentro das pensões alegres existia uma figura andrógina, alegre, com requebros e trejeitos femininos, cabelos oxigenados, muito conhecida pelos freqüentadores. Por aquela época, uma era conhecida por "Afago verde".
Nesse tempo, as parteiras eram responsáveis por grande parte das vidas que surgiam. O parto era feito em casa, com o resguardo de vários dias e muita canja de galinha. Em partos mais difíceis, surgia o médico, com a sua inseparável valise e o estetoscópio.As pensões alegres eram freqüentadas por pessoas de diferentes níveis sociais. À noite, já com o dólar correndo solto, surgiram os vendedores clandestinos, que vendiam perfumes, isqueiros, sabonetes, whiskys, cigarros, etc.
As músicas mais tocadas nas radiolas de ficha eram os tangos e maxixes, que, aos poucos, foram sendo substituídos por swings, blues e fox trotes, já na década de 1940.
Naqueles anos, apareceu na zona uma novata: morena, de olhos e cabelos negros, que circulou por várias casas noturnas e despertou a paixão de muitos freqüentadores. Os seus pretendentes eram selecionados pela disposição de abrir a carteira. Contam que ela terminou os seus dias abandonada e esquecida no Beco da Quarentena, tomando injeções diárias de "914", aplicadas por um enfermeiro da Saúde Pública aos portadores de sífilis. A profilaxia era uma lavagem à base de permanganato.
As notícias da guerra, via BBC Londrina, transmitidas pela Agência Pernambucana, antes da inauguração da REN - Rádio Educadora de Natal, eram geralmente acompanhadas pela "Canção do Expedicionário", que traduzia a saudade da pátria e a esperança de vitória dos Pracinhas Brasileiros, na Itália. Por ali se tinha notícias dos últimos acontecimentos da II Guerra Mundial na Europa.
No Cine Polytheama, na Praça Augusto Severo, Ingrid Bergman, Diana Durbin, Judy Erland e outros artistas encantavam os telespectadores.
O movimento do Porto, ali perto, era intenso, guarnecido pelos fuzileiros navais que, sob o tema "Adsumus", que significa "aqui estamos", eram admirados e respeitados pela população, em virtude do exemplo de dedicação e profissionalismo em defesa da pátria.
As notícias da noite corriam velozes, de boca em boca, e terminavam no Grande Ponto, ou no Bar Cova da Onça, na Av. Tavares de Lira, onde o garçom "Cara larga" atendia aos clientes, na parte de trás do Estabelecimento. Muitas dessas histórias já modificadas pelo povo.
Assim era a vida noturna da Natal boêmia do início dos anos 40.