14.1.08

Mafalda Resende, Bióloga, Copenhaga, Dinamarca

Adoro este blog. Quando me sinto um bocadinho sozinha e com saudades de casa venho aqui, leio mais uma história e penso que afinal há aí tantas pessoas como eu...

Estou em Copenhaga há 4 anos. Quando acabei o curso estive cerca de um ano em Portugal à procura de emprego mas não tive sorte nenhuma. E a verdade é que ainda tinha vontade de ter mais uma aventura fora de Portugal. Principalmente porque na minha área tinha a ideia que era muito valorizado começar por laboratórios de países que tivessem mais dinheiro para investigação e por isso melhor equipados e supostamente com mais hipóteses.
Então, acabadinha de chegar de um Erasmus em Creta, Grécia, e recém licenciada, mandava currículos tanto para Portugal, como para Inglaterra como para USA, era tudo... Concorri também a uma bolsa promovida pelo Instituto Camões dada pelo governo Dinamarquês para um laboratório em Copenhaga que investigava Malária. Consegui essa bolsa e depois de muito pensar decidi partir para a Dinamarca. A única das minhas hipóteses onde não conhecia mesmo ninguém...
Ainda tinha muita vontade de aprender culturas novas e conhecer pessoas diferentes, por isso mesmo que tivesse conseguido trabalho em Portugal tenho a completa noção que mais cedo ou mais tarde sairia outra vez.
O meu Erasmus deve ter sido o ano mais rico em aprendizagem de toda a minha vida. Tanto, que considero que Erasmus devia ser mesmo uma disciplina obrigatória para todo e qualquer currículo e devia haver subsídios para ser possível ser feito por toda a gente.
Já o primeiro ano na Dinamarca foi completamente diferente. Fui parar ao primeiro mundo – (Os países nórdicos) - mas esqueceram-se de me avisar que o primeiro mundo em termos de conforto afinal é em Portugal. Aqui calhou-me uma casa sem duche!!!! (a senhoria deu-me um cartão para a piscina municipal p os meus banhos), nem pensar ter dinheiro para fazer coisas normais como ir ao cinema ou jantar fora, e andar por todo o lado de bicicleta com a neve frio e chuva a congelar-me completamente. Foi duro... Principalmente porque a rede social demorou tempo a crescer. No laboratório as pessoas não estavam propriamente à espera da minha chegada para me convidarem para tudo e me mostrarem a Dinamarca, e fui aprendendo aos poucos e poucos o que era afinal a frieza nórdica.
Conheci muitos Portugueses espectaculares na mesma situação que eu e que tornaram a minha vivência aqui muito boa.
Aprendi muito. Adoro as condições de trabalho na Dinamarca. No estágio que fiz tinha uma bolsa pequena que me dava só para sobreviver, mas o chefe ofereceu logo para me pagar a casa sem quase me conhecer.
Aqui, os jovens formados, cheios de ideias e acabados de sair da universidade são uma mais valia, e não um fardo. Não passa pela cabeça de ninguém, em NENHUMA área do conhecimento, trabalhar só para ganhar experiência sem ganhar um ordenado...
As pessoas põem a sua vida e os seus interesses pessoais à frente de tudo (não é o espírito de sacrifício que é normal em Portugal) – Por exemplo – Na maioria das vezes aos 18 anos saem de casa, arranjam apartamento para dividir com amigos ou desconhecidos e pedem empréstimo ao banco para viverem e estudarem ou então trabalham enquanto estudam (Não é comum os pais ajudarem...). E é possível! Porque os empréstimos têm renda muito baixa e podem ser pagos durante quase a vida toda, e os trabalhos para estudantes existem e são bem pagos.
E é toda uma filosofia de vida diferente da nossa. Aqui pode mesmo estudar quem quer! E as pessoas vão para a Universidade porque gostam mesmo de aprender... Não como única saída para um futuro cinzento...

Quase a fim do estágio conheci o meu namorado e decidi ficar mais uns tempos. O amor continuou e propus-me para doutoramento no mesmo instituto. Concorri a bolsa da FCT mas não ganhei e concorri para outra da Universidade de Copenhaga e acabei por ficar com essa.
Já estou quase a acabar o doutoramento e por isso a dúvida paira no ar, adorava voltar para Portugal mas não estou bem a ver quando. Quando é que haverá uma oportunidade real de voltar com o meu namorado Dinamarquês que também é biólogo. São duas pessoas com uma profissão quase impossível em Portugal...
Aqui temos os dois emprego garantido a fazer o que gostamos e a viver com condiçoes.

Não compreendo nem aceito comentários do estilo – Nós que estamos fora virámos as costas ao nosso país. Não contribuímos para ele. E temos o dever de voltar para ajudar a salvar Portugal.
Os jovens licenciados são mesmo quem tem MENOS poder no nosso país! Não podemos salvar nada simplesmente porque não nos deixam... É raro termos dinheiro para investir em indústrias novas. E é o cabo dos trabalhos para arranjar um emprego, e quando arranjamos somos tratados como escravos e não nos é dada a independência e o poder de decisão para mudar nada!!

Aqui na Dinamarca sobe rapidamente quem é verdadeiramente bom a fazer o seu trabalho. Valorizam-se as ideias, a mente aberta, o espírito de iniciativa e como resultado tem-se um país com uma economia fresca em pleno desenvolvimento e que dá verdadeiras condições de vida aos seus habitantes.

Acho que a Europa vai ficar um pouco como os Estados Unidos no sentido que uma pessoa nasce num país da Europa, estuda noutro e vai mudando de país como quem muda de estado quando há um trabalho que o chame mais. Por isso não vejo com demasiado dramatismo o facto de os jovens saírem de Portugal, alguns voltarão outros nem por isso mas será uma tendência cada vez mais frequente andar de um lado para o outro.

www.brilhonosolhos.blogspot.com
mafaldaresende(arroba)gmail(ponto)com

2 comments:

mnvalente said...

Os jovens licenciados sao quem tem menos poder em Portugal agora. Mas daqui a 20 anos, vamos estar nos no comando e acredito sinceramente (chamem me optimista) que sera bem melhor.

DM em Caracas said...

Minha querida Mafalda! Só hoje vi o teu post aqui!
Sabes o que mais custa? É ir a Lisboa, tentar estar com toda a gente, tentar absorver todas as estórias perdidas e todas as ocasiões que foram vividas sem nós...
Cá longe não custa tanto, porque estamos a viver a nossa própria vida, mas de vez em quando a saudade aperta: aquele amigo a ter o bébé, aquele outro a casar, os sobrinhos a terem sucessos na escola, no rugby ou noutras coisas e nós sem estarmos lá para partilhar de tudo isso!