Estava prevista para o dia 16 de Setembro de 2006 no recinto de lazer da SMC,Lda. Não aconteceu por razões organizativas, esperando o momento ideal.
Segue na íntegra o texto:
Sras. e Srs.,
A missão que me foi incumbida hoje não é fácil. Tratando-se de Neto uma figura de grande relevo. Quero antes referir-me à figura de um heroi... Qualquer dicionário dir-nos-á que o herói difere-se de indivíduos comuns pela sua capacidade de realizar proezas que exigem a abundância de alguma virtude crucial aos seus objectivos - fé, coragem, vaidade, orgulho, força de vontade, determinação, paciência, etc. O herói será tipicamente guiado por ideais nobres e altruístas - liberdade, fraternidade, sacrifício, coragem, justiça, moral, paz. Eventualmente buscará objectivos supostamente egoístas (vingança, por exemplo); no entanto, suas motivações serão sempre moralmente justas ou eticamente aprováveis, mesmo que ilícitas.
O heroísmo é um fato profundamente arraigado no imaginário e na moralidade popular. Feitos de coragem e superação inspiram modelos e exemplos em diversos povos e diferentes culturas, constituindo assim figuras arquetípicas. Situações de guerra, de conflito e de competição são ideais para se realizarem feitos considerados heróicos.
A título de exemplo, a França dominada pela Inglaterra surgir uma Joana d'Arc. No nosso caso, Agostinho Neto, a figura de que vos estou a falar.
Agostinho Neto, nacionalista, Percursor da luta de libertação nacional, primeiro Presidente da República de Angola, médico e poeta é Uma figura de larga dimensão social, política e cultural, por isso mesmo difícil de caracterizar.
Primeiro, dizer que esta será a vigésima quinta vez que se assinala no país o dia do herói nacional em homenagem ao fundador da nação.
A.Neto, Nasceu a 17 de Setembro de 1922, na aldeia de Kaxicane, município de Icolo e Bengo, próximo de Catete. O pai era pastor e professor da igreja protestante e sua mãe igualmente professora. Após ter concluído o curso liceal em Luanda, Neto trabalhou nos serviços de saúde, tornando-se rapidamente uma figura proeminente do movimento cultural nacionalista que ao longo dos anos quarentas conheceu uma fase de expansão.
Decidido a formar-se em Medicina, Neto fez poupança durante vários anos e foi com essas economias que embarcou para Portugal em 1947, tendo se matriculado na Faculdade de Medicina de Coimbra. Portanto, Neto Estudou primeiro em Coimbra e depois em Lisboa, depois de ter ganho uma bolsa de estudos dos Metodistas Americanos dois anos depois da sua chegada a Portugal.
Politicamente, Muito Cedo iniciou as actividades clandestinas e experimentou a prisão pela primeira vez em 1951, ao ser preso quando reunia assinaturas para a Conferência Mundial da Paz em Estocolmo.
Retomando as actividades políticas após a sua libertação, Neto tornou-se representante da Juventude das colónias portuguesas junto de um movimento da juventude portuguesa, o MUD juvenil. E foi no decurso de um comício de estudantes a que assistiam operários e camponeses que a PIDE o prendeu pela segunda vez em Fevereiro de 1955, sendo posto em liberdade dois anos depois.
Por altura da sua prisão em 1955 foi lançado um livreto com os seus poemas e o caso da prisão do poeta angolano desencadeou uma vaga de protestos em grande escala. Realizaram-se encontros; escreveram-se cartas e enviaram-se petições assinadas por intelectuais franceses de primeiro plano, como Jean-Paul Sart, André Mauriac, Aragon e Simone de Beauvoir, pelo poeta cubano Nicolás Gullén e pelo pintor mexicano Diogo Rivera. Em 1957 foi eleito Prisioneiro Político do Ano pela Amnistia Internacional.
Em 10 de Dezembro de 1956 fundaram-se em Angola vários movimentos patrióticos para formar o MPLA, Movimento Popular para Libertação de Angola que lançaria a luta armada contra Portugal fascista.
Em 1958, Agostinho Neto doutorou-se em Medicina e casou no próprio dia em que concluiu o curso com a cidadã portuguesa maria Eugênia Neto. Nesse mesmo ano, foi um dos fundadores do clandestino Movimento Anticolonial (MAC), que reunia patriotas oriundos das diversas colónias portuguesas.
Neto voltou a Angola com a mulher e o filho de tenra idade (Mário Jorge) a 30 de Dezembro de 1959. Ocupou, então, a chefia do MPLA a exercer a medicinanbuma altura em que muitos integrantes do movimento tinham sido forçados ao exílio nos anos que antecederam o seu regresso ao poaís.
Em 8 de Junho de 1960, o director da PIDE veio pessoalmente prender Neto no seu Consultório em Luanda. Uma manifestação pacífica realizada na aldeia natal de Neto em protesto contra a sua prisão foi recebida pelas balas da polícia. Trinta mortos e duzentos feridos foi o balanço do que passou a designar-se pelo Massacre de Icolo e Bengo.
Receando as consequências que podiam advir da sua presença em Angola, mesmo encontrando-se preso, os colonialistas transferiram Neto para uma prisão de Lisboa e, mais tarde enviaram-no para Cabo Verde, para Santo Antão e, depois para Santiago, onde continuou a exercer a medicina sob constante vigilância política. Foi, durante este período, eleito Presidente Honorário do MPLA.
O MPLA lançou uma implacável campanha em prol da sua libertação, apelando para a solidariedade mundial para com Neto e todos os prisioneiros políticos angolanos.
Sob esta forte pressão, as autoridades fascistas viram-se obrigadas a libertar Neto em 1962, fixando residência em Portugal. Todavia, pouco tempo depois da saída da prisão, a eficaz organização do MPLA pôs em prática um plano de evasão e Neto saiu clandestinamente de Portugal com a mulher e os filhos pequenos, chegando a Léopoldville (Kinshasa), onde o MPLA tinha a sua sede exterior, em Julho de 1962. Em Dezembro desse ano, foi eleito presidente do MPLA durante a Conferência Nacional do Movimento.
Em 1963, Já eleito presidente do MPLA, Neto lança-se a uma intensa actividade quer no interior, quer no exterior do País. Dirigiu pessoalmente as relações diplomáticas do Movimento, podendo assim visitar numerosos países e contactar grandes dirigentes revolucionários que nele reconheceram o papel dirigente de um povo heróico que travava uma guerra justa pela independência nacional, pela Democracia e pelo Progresso Social.
Com a "Revolução dos Cravos" em Portugal e a derrocada do regime fascista de Salazar, continuado por Marcelo Caetano, em 25 de Abril de 1974, o MPLA ( a FNLA e a UNITA) assinaram um acordo de cessar-fogo com o Governo Português.
Agostinho Neto regressou à Luanda no dia 4 de Fevereiro de 1975, sendo alvo da mais grandiosa manifestação popular de que há memória em no país. Dirige, pessoalmente, a partir desse momento toda a acção contra as múltiplas tentativas de impedir a independência de Angola, proclamando a Resistência Popular Generalizada.
E a 11 de Novembro de 1975, após 14 anos de dura luta contra o colonialismo e o imperialismo, o Povo Angolano proclamou pela voz do Presidente Neto a independência Nacional.
A figura de Neto, como militante total, corajoso revolucionário e estadista eminente não se limita às fronteiras de Angola. Ela projecta-se no contexto africano e mundial, onde a sua prática e o seu exemplo servem de impulso à luta dos Povos que, no Mundo, estão ainda submetidos à humilhação, ao obscurantismo e à exploração.
Assim é que, nas tribunas internacionais a voz de Neto nunca deixou de denunciar as situações de dominação colonial, neocolonial e imperialista, pela Libertação Nacional, a favor da independência total dos Povos, pelo estabelecimento de relações justas entre os países e pela manutenção da paz como elemento indispensável ao desenvolvimento das nações.
Pelo seu empenho na libertação dos povos, Agostinho Neto na África de expressão portuguesa é comparável à Léopold Senghor na África francesa.
Agostinho Neto foi também um esclarecido homem de cultura para quem as manifestações culturais tinham de ser, antes de mais, a expressão viva das aspirações dos oprimidos, para denunciar situações injustas.
A atribuição do Prémio Lótus, em 1970, pela Conferência dos Escritores Afro-Asiáticos e outras distinções atribuídas a algumas das suas obras de poesia, são mais um reconhecimento internacional dos seus méritos neste domínio cultural.
Também na República Popular de Angola, a eleição de Neto como Presidente da União dos Escritores Angolanos cuja proclamação assinou, traduz a justa admiração dos homens de letra do jovem País, pelo seu mais destacado membro, que tão magistralmente encarou a "SAGRADA ESPERANÇA" de todo o povo
Agostinho Neto Morreu a 10 de Setembro de 1979 em Moscovo, e foi sepultado aos 17 de Setembro.
A carreira política de Neto foi acompanhada de uma intensa vida porofissional como médico e poética retratado o homem negro, a escravidão a exploração e o desejo de repor o que nos foi tirado pela presença colonial.
Assim é que tanto a medicina quanto a poesia foram instrumentos de uma luta que se forjou, sobretudo, pelo direito à vida.
Sua obra literária pertence a uma forma especial de poesia, cujas principais preocupações foram instigar, pelo verso, a prática revolucionária capaz de gerar transformações e afirmar uma identidade cultural nacional, necessária para a revolução política que fervilhava em Angola.
Assim, encontramos nos escritos do Maior poeta nacionalista uma interrogação e uma negação da condição do homem colonizado e explorado. Expressões que marcam
"O Choro de África" de que sempre se assumiu como libertador seguindo passos de seus antecedentes e contemporâneos. (Senghor, Keniata, Lumumba, Nierere, entre outros).
Podemos perceber que a esperança de Agostinho se alimentava numa espécie de renascimento. A mãe, no caso a representação da África, não pode mais esperar pela partida ou pela morte de seus filhos e cabe aos mesmos a inauguração de um novo tempo, de uma nova liberdade. Neto dizia em Renúncia “Impossível” que
“ (…) E o que é mais importante:Salvei o mundo"! Assim, constrói-se a literatura do poeta, como um ponto nascedouro, próprio de uma pátria a ser fundada. Ricos em oralidade, seus poemas constituíram-se como cânticos capazes de organizar seus compatriotas para um conflito armado que durou de 1961 até 1975.
Uma vez começada a guerra pela independência Neto apela à resistência e à confiança para que não se traíssem os ideais. O poeta argumenta ainda o porquê da atitude contra o opressor:
Não direi nada/ nunca fiz nada contra a vossa pátria/ mas vós apunhalastes a nossa/ nunca conspirei nunca falei com amigos/ nem com as estrelas nem com os deuses/ nunca sonhei/ durmo como pedra lanzada ao poço/ e sou estúpido como as carnificinas vingativas/ nunca penséi estou inocente/ não diréi nada não sei nada/ mesmo que me espanquem/ não diréi nada/ mesmo que me oferejam riquezas/ não diréi nada/ mesmo que a palmatória me esborrache os dedos/ não diréi nada/ mesmo que me ofereçam a liberdade/ não diréi nada mesmo que me apertem a mão/ não diréi nada mesmo que me ameacem de morte/…
Conseguida a independência, Neto lança-se à conquista da liberdade de outros povos oprimidos. E encontramos slogans do seu tempo como:
“Na Namíbia, na Rodésia e na Africa do Sul está a continuidade da nossa luta”.
Ou ainda
“Angola é e será por vontade própria, trincheira firme da Revolução em Africa”, slogans que foram seguidos de uma práis, tal foi o nosso envolvimento na luta pelas independências do Zimbabué ( antiga Rodésia do Sul) da Namibia e eliminação do Apartheid na Africa do Sul e constituiçãos da organização "Países da linha da frente" precursora da SADCC, actual SADC… Como podem ver São inúmeros os ângulos de abordagem sobre Agostinho Neto, pelo que prefiro, por hoje, ficar por aqui e continuarmos a conversa já num sentido mais horizontal.
Muito obrigado.
Luciano Canhanga “Soberano”