terça-feira, 7 de agosto de 2012

Poeta, jornalista, orador, dramaturgo, contista, pintor e ponte chamada NEWTON NAVARRO



Não há nada mais no universo que seja tão estimulante quanto ouvir de um poeta, ainda mais daquele poeta: “Você é o poema encarnado de Berilo Wanderley”. Com meu vestidinho vermelho, no início dos anos 60, inaugurava-se uma história de amizade, ternura, admiração e cumplicidade,  que nos   acompanhou até a última noite do poeta, em 1992.
No silêncio do  salão vazio da Academia de Letras,a noite inteira ficamos só nós dois. Emocionada, entre lágrimas e sorrisos, fazia uma retrospectiva daquela nossa vivência e homenageava os nossos Berilo, Sanderson, Luís Carlos, Dorian Gray, Zila, Mirian, Celso e outros poetas do nosso bem querer. Como diria  Borges: “ Um tempo, porque, se o futuro e o passado são infinitos, não haverá um quando”.
Nas  minhas lembranças, imagens, fragmentos dos nossos encontros, às vezes nos bares da cidade ou nas sessões do cinema de arte.  E, sempre, a interpretação de Newton era ainda mais poética e verdadeira do que as próprias imagens  da nouvelle vague e seus diretores famosos.
A beleza estava que em cada coisa que ele destinava a compor, seja num poema, seja num  texto, por mais simples que fosse, em tudo estava o orador ou o dramaturgo ou o pintor a espalhar  beleza por onde passava.
Ainda fomos vizinhos no Jardim Nova Dimensão, pequeno universo de poetas, pintores e maravilhosos boêmios. E além de Newton, éramos vizinhos de Sanderson Negreiros,  Leopoldo Nelson, Ticiano Duarte, Diva e Djair, Rubens Lemos, João Gualberto, João Meira Lima. Daí a facilidade das minhas andanças pela casa do poeta, tardes e tardes conversando com Dona Celina, mãe de Newton. O assunto era sempre o mesmo: as graças do filho querido que começou a desenhar aos três anos de idade e aos oito anos já parecia ter a visão exata da firmeza do pintor a que estava destinado ser. Nas entrelinhas se multiplicava a ternura de uma mãe apaixonada, às vezes resmungando alguma má-criação do filho,que mal escondia a doçura de fã numero um do filho famoso.
O poeta avesso às imposições de regras e dados reais encontrou uma companheira que mudou o sentido da sua vida : Salete, seu anjo da guarda, era só admiração e ternura. Com ela, ele descobriu a lei do amor na sua própria liberdade. Livre e sem amarras, o amor de Salete por Newton, não parecia com o amor dos mortais e sim com o amor de Deus. Nem a morte conseguiu apagar a chama desse amor maior, que continuou no dia-a-dia de Salete, através de uma rosa vermelha  sobre a mesa de trabalho, as sandálias embaixo da cadeira expostas com carinho como se aguardasse seu dono, a emoção estampada no rosto, quando na homenagem da ponte Newton Navarro... Mistérios do amor que acompanhou Salete até seus últimos instantes.
E, sempre que olho a ponte iluminando  o horizonte distante, penso que agora, sim o poeta reencontrou seu anjo.