terça-feira, 19 de agosto de 2008

Eu divago sempre, mas o mundo é real.



O divagar é a viagem da alma... Quisera ele que a frase tivesse saído de qualquer livro ou página amassada de jornal. Era um peso talvez grande demais, ser forçado a conviver com seus pensamentos e suas divagações, ele não tinha controle algum sobre aqueles, ele não via surpresa nessas. E, por mais infundado que pareça, já previa o sentimento e o palpitar que cada lembrança lhe seria capaz de transmitir num dado momento. O fato é que não conseguia parar de pensar; ele fazia o esforço, afinava as orelhas ao som do vento, às buzinas dos carros, à sua própria voz... Nada, somente um mar de divagações. Não demorava muito, logo após a encruzilhada de imagens e cheiros, ele se lembrava da pontada exata que viria a sentir; e tudo durava um piscar de olhos... Talvez cronômetro algum fosse capaz de medir. Seus fluidos, entretanto, captavam todo o descarregar, fosse de adrenalina ou lágrimas, e o registravam no infinito cristal da eternidade. Não era agradável, não era simples, mas havia uma vantagem: era familiar. Como se houvesse um horário programado, era tranqüilamente perceptível.
E lá mesmo, enquanto os carros continuavam a se movimentar, as pessoas ainda teciam ofensas às escondidas, ou declaravam seu amor abertamente. Parcelas da alma perdidas num mundo real, "indivagável". Às pessoas que não se contagiavam, restava desejar semelhança, ou sentir pena... Era tudo tão familiar... E eis aí o problema de o mundo ser real. À menor mudança de clima, a divagação não salva ninguém, e ninguém consegue prever seus atos por um motivo: no momento da realidade, nada é familiar.
Não havia se dado conta disso, tinha um vício no "conhecido", era impossível lidar com a realidade... Em seu íntimo, cascatas de torções, parcelas de espírito se contorcendo, úmidas, em uma maratona para transmitir a um momento concreto a utopia intocável... o resultado era o medo: era não saber se portar, era o choro que partia seu diafragma e gelava seus ossos. Não entendia o movimento dos planetas, que tão rapidamente transladavam e se voltavam para seus olhos, não encontrava elasticidade própria ao encarar uma bela dança, mas era o cheiro, o cheiro de futuro incerto, o que mais o incomodava... Não era familiarizado...

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

O incerto se encontra em mim





Se o mundo fosse perto, e se a vida fosse clara

Certamente então seria certo, e esse medo que me invade a cara

Não daria a impressão de infértil, fingimento de que passa, ou sara.

Ele pensa que o resto é resto, vira o rosto ao escutar teu nome

Na verdade, não é nada honesto... Em teu rosto, e somente nele

É que há conforto quando ele dorme.

Mas se o mundo fossse claro, e se a vida fosse fácil

Sem receio que seria faro, e esse peito então seria tátil

Não faria parecer tão raro, e meu choro então seria grácil.

Ele chora como todo dia, e se arranha de sufoco e dor

Como pode, como poderia, esquecer o gosto ou cor.

E se o mundo fosse fácil, e se a vida fosse riso

Todo corpo então seria hábil, não seria necessário um vício;

Era um rosto, era um corpo, eram gostos, aliás

Ah, meu tempo, volta tempo, volta logo, por favor, me faz olhar pra trás

Quero tanto ver o rosto que fazia algo a mais

De quem fujo hoje em dia, ao não saber o que se faz,

Se a vontade é só uma, a única que não posso fazer mais.

...Volta ao meu mar de garoa, eu não quero mais chorar, eu não quero a vida à toa, eu não sei o que pensar, eu quero chuva, eu preciso navegar, eu preciso impedir minha garoa de cessar. É justo nesse momento que as palavras vão findando, que meus olhos vêm caindo, o meu som vai se esvaindo, e os meus sonhos vão fechando.

sábado, 2 de agosto de 2008

O âmbar das noites, as marcas do chão



Porque é noite... e já passou-se o tempo de andar

Sozinho.

É fábula real, é novena de quintal, é a roupa que seca no varal

Ao vento.

Tal qual som, de cascalho quebrando, esmagado por pés

Na chuva.

Porque é noite, e as marcas do chão são cobertas por mar...

Garoa.