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Lida Abdul, «Global Pornography», 2002
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A
traição
As
muçulmanas europeias não existem
Entre a
queda do muro e a queda das torres, um mantra dominou o ar do tempo nos EUA: a
globalização transformaria o mundo inteiro num gigantesco Ocidente. Liderada
por liberais como Nye, Friedman ou Fukuyama, esta atmosfera de fim de história
garantia que o poder americano não precisaria do poder militar (hard power)
para transformar o mundo. Ao contrário do império britânico cantado por
Kipling, a globalização americana não necessitaria de mosquetes nem de salas de
aula para instruir os indígenas à força. O soft power, diziam, seria
suficiente. Por outras palavras, este idealismo liberal assumia que os nossos
valores converteriam os povos orientais através de uma osmose civilizacional:
se entrasse em contacto directo com os valores ocidentais, o “outro” perceberia
de imediato a superioridade da civilização ocidental e entraria num processo de
aculturação pelo seu próprio pé; a nossa cultura, desde o conhecimento
científico das faculdades até à liberdade sexual e laboral das mulheres,
venceria de forma natural as resistências das velhas culturas do Médio e
Extremo Oriente.
Apesar das
diferenças óbvias, os liberais americanos da globalização não eram muito
diferentes dos velhos liberais ingleses do Império. Tal como Bentham e os Mill,
os americanos do final do século XX assumiam que o “outro” era uma mera tábua
rasa à espera da centelha ocidental, assumiam que não existia uma agência moral
autónoma no “muçulmano”, no “chinês”, no “indiano”, assumiam que os povos
orientais continuariam no seu cochilo histórico até ao momento em que
recebessem uma transfusão de sangue eurocêntrico. Sim, ao contrário de James
Stuart Mill, Fukuyama não exigia a aculturação forçada, não exigia que o
“outro” fosse filtrado e instruído à força pelo tríptico de Kipling, lei,
escola, mosquete. Mas, num certo sentido, o seu eurocentrismo era ainda mais
aceso, pois assumia que a força nem sequer seria necessária. Os povos
adormecidos entrariam aos pulinhos nas catedrais do soft power.
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Sayyd Qutb
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Esta cultura
liberal nunca percebeu que o problema era precisamente a força deste soft
power. A proximidade entre culturas gerada pela globalização económica e
tecnológica (televisão satélite, internet, viagens baratas) não criou apenas
concórdia, também criou hostilidade. Basta olhar para o pai do islamismo
moderno, Sayyd Qutb (1906-1966). Qutb não criticou os EUA sem desconhecimento
de causa, não concebeu as cidades ocidentais enquanto Babilónias pestíferas a
partir de uma gruta no Nilo. Qutb odiava as cidades ocidentais, porque conheceu
Nova Iorque numa viagem de estudo no final dos anos quarenta. Onde um cidadão
ocidental via uma cidade cosmopolita, ele viu a desordem da “oficina
barulhenta”; onde um ocidental via mulheres livres, Qutb viu o demónio. A
inquietação feminina é fundamental. Qutb sentiu asco pelas mulheres emancipadas
no trabalho e soberanas na cama. Para este intelectual egípcio, uma mulher
insinuante num bar era a representação curvilínea de Belzebu; uma mulher a
trabalhar fora de casa era a prova máxima da decadência ocidental. Ou seja,
Qutb odiava o tal soft power, odiava aquilo que nós amamos. É por isso
que não faz sentido conceber o islamismo como uma reacção ao hard power
composto por F-16 a largar bombas em Mossul ou Cabul. Muito antes dessa
agitação geoestratégica, o islamita odeia os seios de Pamela Anderson que lhe
entram em casa através da parabólica, tal como odeia programas de televisão
sobre ciência, democracia ou igualdade entre sexos, três conceitos considerados
impuros e reveladores da arrogância do Ocidente, esse Ícaro que desafia Alá com
asas feitas de soberba pagã. E devemos sempre sublinhar que esta reacção
anti-ocidental é liderada pela elite que foi exposta ao Ocidente. Em “No País
das Mulheres Invisíveis” (Quidnovi), a médica e colunista Qanta Ahmed mostra
como o fanatismo anti-ocidental é mais aceso na elite saudita educada no
Ocidente do que nas tribos de beduínos. Filhos da elite privilegiada da Arábia
Saudita, treinados nas universidades americanas e inglesas, habituados a
escapadinhas sexuais na Europa, os colegas sauditas de Qanta celebraram o 11 de
Setembro ali mesmo no Hospital da Guarda Nacional do Rei Farad. Até
encomendaram bolos especiais, talvez com duas torres feitas de açúcar. Sabiam
fazer operações de peito aberto com tecnologia de ponta, mas não compreendiam a
diferença moral entre alvo militar e alvo civil, entre danos colaterais e
atentado terrorista.
Mas para
nós, europeus, o problema não estava nas pessoas que comemoraram o 11 de
Setembro em Riade ou Gaza. O problema estava e continua a estar nas pessoas que
celebraram o 11 de Setembro em bairros de Paris, Londres, Amesterdão, Berlim,
Hamburgo. Até porque o 11 de Setembro foi conduzido pela célula de Hamburgo. E,
já que estamos em Hamburgo, recorde-se que um jornal de Hamburgo, o “Hamburger
Morgenspost”, foi atacado com cocktails molotov dias depois do ataque ao
“Charlie Hebdo”. Estamos a falar de um dos poucos jornais que reproduziu na
íntegra os cartoons de “Charlie Hebdo” logo após o ataque. O problema esteve
sempre aqui, algures numa marquise de Hamburgo ou Roterdão e não numa gruta no
Afeganistão.
O “outro”
não tem cabeça
Se a América
vivia fascinada com a ideia da globalização como império invisível, a Europa
labutava no mito da globalização assassina. Segundo Negri, Amin, Ramonet,
Boaventura, a “globalização predatória” era a arma que o Ocidente usava para
sugar a riqueza do Resto do Mundo; nós, os pestíferos ocidentais, estávamos a
enriquecer à custa dos não-ocidentais. Quem desafiasse este mantra era de
imediato escorraçado e acorrentado à galé que albergava as vozes ilegítimas,
eurocêntricas, neoliberais. Sucede que o mantra estava errado. Tal como diziam
os ilegítimos remadores da galé, a globalização teve um efeito democratizador:
o Resto do Mundo entrou numa trajectória de enriquecimento, centenas de milhões
de chineses, indianos, indonésios, brasileiros e até africanos saíram da
pobreza; o Ocidente perdeu poder relativo e a mesa dos crescidos da ordem
internacional já não é um exclusivo de cadeiras ocidentais.
Além de
estar errado, o mantra da “globalização predatória” criou um problema ainda
maior: viciou o ar do tempo nas lentes económicas; tudo passou a ter
explicação económica; tudo passou a ser explicado pela opressão económica do
Ocidente. Os valores religiosos ou culturais do “outro” deixaram de contar; o
“negro”, o “muçulmano” ou o “oriental” deixaram de ser agentes morais com
consciência própria e passaram a ser meros títeres dos ventos estruturais
lançados pelo Ocidente. Em consequência, as sociedades europeias perderam a
capacidade de criticar os povos orientais. A própria linguagem que permitiria
semelhante crítica moral não estava disponível. Nem sequer tínhamos os
instrumentos semânticos (ex.: “barbárie”, “terrorista”, “inimigo”, “imoral”)
para esboçar um juízo de valor em relação a fenómenos ocorridos em países
muçulmanos ou africanos.
As grandes
vítimas desta forma de pensar eram as mulheres nascidas na categoria do
“outro”. A violência que sofriam às mãos de homens não-caucasianos era um
fenómeno secundário e só podia ser abordado através do ângulo da exploração
económica da globalização e, claro, pelo prisma das guerras que os americanos
lançavam com o objectivo de manter os pilares desta opressão. Quando lia coisas
como “Desonrada” (Livros do Brasil) de Mukhtar Mai, este ar do tempo
desculpabilizava o marialvismo islamita e justificava tudo com a globalização.
Sim, a repressão sentida por raparigas como Mai em aldeias perdidas no
Paquistão tinha de ser enquadrada na ofensiva das multinacionais americanas,
essas entidades que empobreciam os homens paquistaneses, levando-os assim a
cometer actos de violência misógina. Por artes mágicas, era a Nike que
despoletava a seguinte sucessão de acontecimentos: se um rapaz paquistanês
namoriscasse sem autorização uma rapariga de um clã superior, o tribunal da
aldeia decretava que uma irmã desse rapaz devia ser violada pelos homens do clã
ofendido. Da mesma forma, só a economia do petróleo podia explicar o que
sucedeu a Touria Tiouli, autora de “Despedaçada” (Campo das Letras). Esta
fraco-marroquina foi violada por três homens no Dubai, mas, em vez de perseguir
os criminosos, a polícia prendeu Tiouli, acusando-a de “relações sexuais fora
do casamento”. Este é um evidente absurdo moral, mas nós, europeus, não
tínhamos sequer a linguagem necessária para fazer esse juízo kantiano (Kant passou
a ser racista); no máximo, podíamos fazer uma pequena nota de rodapé sobre a
misoginia islamita no final da peroração habitual sobre os malefícios da
globalização.
É por isso
que artistas muçulmanas como a afegã Lida Abdul causavam e ainda causam um certo
desconforto. Como a própria Abdul reconhece, o público ocidental nem sempre
acolhe o seu trabalho, porque as fotografias e vídeos que expõe não entram na
categoria do exótico ou porque não reflectem as agruras económicas vividas
pelos povos muçulmanos. Nas suas obras, Abdul procura aquilo que todo o artista
deve procurar: atingir um eco universal a partir de um contexto concreto,
procurar uma parábola intemporal a partir de uma realidade histórica. Mas
parece que o meio artístico ocidental nem sempre aprecia esta ambição
transcendente do “outro”. É como se Lida Abdul não tivesse direito ou
inteligência para atingir o nível conceptual que existe em Paris ou Nova
Iorque. É como se ela só tivesse autorização para recriar as péssimas condições
de vida dos afegãos e as pernas estropiadas por bombas americanas. É como se
Abdul só pudesse ser um espelho passivo do complexo do homem branco.
O resultado
final desta falácia intelectual foi a incompreensão total do 11 de Setembro.
Como o “outro” não podia pensar pela sua própria cabeça, como não se admitia a
existência uma agência moral, religiosa e autónoma nos povos orientais, o maior
ataque terrorista da história do Ocidente foi encarado como uma justa resposta
dos exércitos maltrapilhos de Fanon e Negri contra o Império capitalista. O
facto de Bin Laden e Mohammed Atta pertencerem a uma elite rica e educada não
parecia perturbar ninguém. A esquerda da globalização predatória era tão
paternalista como os liberais do fim de história.
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Lida Abdul, «White House», 2005
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A esquerda
reacionária
A par da
tese da globalização predatória, outra estirpe de esquerda fez o seu caminho
nestes anos. Estamos a falar da esquerda multiculturalista. Apoiada no
relativismo epistemológico e cultural de Said e Foucault, esta escola de
pensamento empenhou-se na destruição activa do Direito Natural. Pela via
religiosa ou secular, a velha tradição do Direito Natural garantia que todos os
indivíduos nascem com direitos inalienáveis, direitos eternos e válidos em
qualquer país ou cultura; antes de ser um cidadão, antes de ser membro
de uma religião, um indivíduo tem direitos universais que não dependem
da validação de políticos, imãs ou bispos. Assumindo que esta tradição era mais
um pérfido tentáculo das estruturas de poder eurocêntricas, a esquerda
multiculturalista começou a impor a ideia de que não existe uma moral acima do
relativismo das culturas, pois cada cultura desenvolve a sua própria moral.
Nesta grelha de pensamento, o homem ocidental não pode criticar as outras
culturas porque não existe qualquer critério de avaliação universal, objectivo
e verificável; não existe qualquer norma ética ou racional capaz de transcender
a imanência da tradição vivida numa dada comunidade. Cada cultura, nação ou
religião é uma verdade autónoma e orgânica que se auto-valida em circuito
fechado, uma ilha de “nós” num oceano de “eles”. O que é espantoso nesta
metamorfose da esquerda é que os progressistas não perceberam (ou não quiseram
perceber) que estavam a entrar nos terrenos da velha direita nacionalista e
mesmo pré-fascista.
Em “Direito
Natural e História” (Edições 70), Leo Strauss afirmou que, apesar da derrota
alemã na II Guerra Mundial, as ideias alemãs permaneceram no centro do debate
europeu. O filósofo de Chicago tinha razão: o ataque relativista ao Direito
Natural e a noção de que não existe uma transcendência moral ou racional acima
da cultura histórica eram os dois pilares da direita romântica alemã que reagiu
ao universalismo da Revolução Americana, da Revolução Francesa e do liberalismo
inglês representado pela linhagem progressista de Mill e pela linhagem
conservadora de Burke. Ora, na segunda metade do século XX, os filhos
multiculturalistas de Said e Foucault reproduziram à esquerda este esquema
romântico de Herder, Fichte, Tönnies, Spengler, Jünger, etc. Tal como estes
velhos reaças, a esquerda multiculturalista reergueu a glória vitalista da gemeinschaft
(comunidade) contra a Gesellschaft (sociedade). Sim, a esquerda
multiculturalista construiu-se com base no erro clássico do reaccionário:
reduziu o indivíduo a uma única identidade (religião/comunidade), desprezando
todas as outras identidades (ideologia, patriotismo, profissão, clube de
futebol, bairrismo, hóbis). Para os multiculturalistas, o muçulmano é só isso:
o muçulmano. É como se a cultura fosse uma variável tão imóvel e sufocante como
a biologia. É como se a “comunidade muçulmana” fosse um destino genético.
As grandes
vítimas deste irracionalismo de esquerda foram as mulheres muçulmanas. Esta
pulsão reaccionária conhecida pelo eufemismo de “multiculturalismo” impediu uma
crítica séria a atrocidades como aquela que se abateu sobre Asia Bibi, uma
católica paquistanesa que foi condenada à morte porque ousou beber água de uma
vasilha destinada a muçulmanos. Esta história contada em “Blasfémia” (Alêtheia)
é chocante, mas ainda é mais chocante pensar a situação através do prisma
multiculturalista: Asia Bibi estava a apanhar bagas, ficou com sede, bebeu da
vasilha comum, foi rotulada de “porca católica” e, de seguida, foi condenada à
morte pelo ancião da aldeia, mas nós, ocidentais, temos de respeitar o episódio
porque há aqui um “contexto” cultural validado pelas suas próprias premissas;
porventura, até devemos ficar comovidos com a misericórdia final do ancião: “se
não queres morrer, deves converter-te ao islão”. Mas, verdade seja dita, o lado
mais negro desta fraude intelectual não estava na relação entre os
progressistas europeus e as mulheres a viver nos arrabaldes do Paquistão ou nas
torres do Dubai. O problema estava na relação entre esta agenda multiculturalista
e as muçulmanas europeias. Durante décadas, a esquerda europeia viu com bons
olhos a implementação informal mas efectiva de um sistema legal paralelo
baseado na sharia; durante décadas, os multiculturalistas exigiram que os
Estados (sobretudo Inglaterra, Holanda, Alemanha) financiassem o imobilismo
cultural das “comunidades muçulmanas” através, por exemplo, de escolas de fé. E
este cenário até acabou por provocar uma situação caricata: o Estado que lançou
guerras no Médio Oriente em nome da Liberdade à maneira de John Stuart Mill era
o mesmo Estado que financiava escolas de fé corânicas que pregavam o
obscurantismo qutbista no centro de Londres. Estamos a falar da Inglaterra de
Tony Blair, o homem que foi liberal e multiculturalista ao mesmo tempo, o homem
que falava de uma Liberdade em abstracto para o Grande Médio Oriente enquanto
permitia a clausura das mulheres muçulmanas que viviam a poucos quilómetros do
n.º10 de Downing Street. Viviam e vivem. Passados catorze anos sobre o 11 de
Setembro preparado em Hamburgo, pouco ou nada mudou.
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Lida Abdul, «What We Saw Upon Awakening», 2006
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Nazneen
No romance
“Brick Lane”, Monica Ali construiu o arquétipo literário destas muçulmanas
europeias através da personagem Nazneen. Oriunda do Bangladesh, Nazneen é
forçada a casar-se com um homem que já vivia em Londres. Parece que os homens
do Bangladesh a viver em Londres são assim: gostam de importar esposas das
aldeias da pátria antiga, pois assim garantem uma mulher-anjo, ingénua,
moldável, espancável, com um pureza que as bengali contaminadas pela vida inglesa
já não têm. Para citar Chanu, o marido, Nazneen é uma “rapariga da aldeia,
totalmente intacta”. Nazneen casa, tem filhos, nunca sai do seu apartamento
perdido numa torre já de si perdida, não fala inglês e continua a ver-se a si
mesma como mercadoria. Foi educada para não desejar coisas e até para sentir
culpa quando pensa pela própria cabeça. “Se Deus quisesse que nós fizéssemos
perguntas, tinha feito de nós homens”, ensinou-lhe a mãe. Dentro dos conformes,
Nazneen assume o papel de incubadora e de calista: depura os calos dos pés de
Chanu todas as noites; corta pequenas fatias daquele pele amarelecida como se
estivesse a cortar cebola com uma lâmina; de quando em vez, há sexo funcionário
e reprodutor depois da pedicure. Na cena-chave desta clausura, Nazneen visita o
centro de Londres trinta anos depois de chegar à cidade. Sim, trinta anos
depois. É como se aqueles míseros quarteirões tivessem a dimensão de “Sete
mares e treze rios” (o título da edição da Dom Quixote). Quando as filhas (Bibi
e Shahana) começam a dar sinais de rebeldia, Chanu exige o regresso da família
ao Bangladesh. É a forma que ele encontra para travar a aculturação das
raparigas, sobretudo Shahana, a rebelde que insiste em viver como uma inglesa,
que recusa o sari e que ameaça fugir. Depois de peripécias várias, Nazneen
escolhe o lado das filhas. As três ficam em Londres, Chanu regressa. A heroína
de Monica Ali liberta-se da prisão mental quando assume que “ficar ou ir
depende de nós as três”.
O processo
de libertação de Nazneen está relacionado com algo que ela considera misterioso
ao início: a privacidade. Esta jovem bengali fica boquiaberta com a liberdade
privada das suas vizinhas brancas. O véu delas é diferente, é um véu moral e
até jurídico que lhes permite criar um espaço só delas onde podem fazer o que
bem entendem, desde tatuar o braço até fazer amor com diversos namorados.
Nazneen não compreende este véu privado, porque o seu apartamento é um
prolongamento da comunidade; as anciãs da torre entram sem pedir licença,
dão-lhe ordens até na educação das filhas e fazem campanha activa contra a tal
privacidade. A Sra Islam, moralista-mor da torre e agiota nos tempos livres, é
a rainha deste cilindro comunitário que esmaga qualquer nesga de privacidade.
Ora, cá fora, na vida real do Médio Oriente e nas “comunidades muçulmanas” da
Europa, a via sacra das mulheres começa aqui. “No País das Mulheres
Invisíveis”, Qanta Ahmed vislumbra este problema na mulher mais bonita das
Arábias: Ghadah. Depois de um início de vida conjugal no Canadá, Ghadah e o
marido voltaram à Arábia e o choque foi inevitável:
“Não temos
tempo para viver só em família. Nenhum! Às vezes até me dá vontade de gritar.
Quero dizer, adoro os meus pais e os meus parentes, mas é evidente que um
casamento, uma família, precisa de ter tempo só para si, um espaço só para si.
E aqui sinto que não temos nenhum, que pertencemos aos outros”.
Em “Fim de
Tarde em Mossul” (Ed. Presença), a jornalista Lynne O’Donnell fala-nos de duas
inglesas que fizeram o percurso inverso ao de Nazneen e de Ghadah: foram viver
para o Iraque porque casaram com dois iraquianos. A principal queixa destas
duas mulheres, Pauline e Margaret, volta a ser a falta de privacidade. “As
pessoas da família aqui pensam que a minha casa é a casa deles”, diz Pauline.
Aparecem a qualquer hora do dia e da noite sem avisar, exigindo conversa, café,
comida. Qual é o resultado desta profanação da privacidade? Se não existe na
rua e se em casa não tem um espaço só para si, a mulher acaba por ser
propriedade colectiva da família, faz parte do cenário, é o palco onde os
outros representam a peça do dia-a-dia. Nem sequer é figurante, é o palco. Sem
surpresa, esta concepção de Mulher acaba por gerar um facto insofismável:
quando as Ghadah se revoltam, quando saem de casa, quando desafiam os pais e
maridos, muitas famílias reagem através de assassínios descritos através do
eufemismo “crimes de honra”; o mundo islâmico representa a esmagadora maioria
dos crimes desta natureza à escala global; a “comunidade muçulmana” é
responsável por 96% destes crimes na Europa.
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Lida Abdul
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Não é
“violência doméstica”
Nas cidades
europeias, o final feliz de Nazneen e Shahana nem sempre encontra reprodução na
realidade, até porque nem todos os maridos e pais muçulmanos são tão
bonacheirões como Chanu. As vidas das Naznnen reais são mesmo perigosas. Em
2006, Banaz Mahmod foi assassinada pelo pai, Mahmod Mahmod, pelo tio, Ari
Mahmod, e pelo primo, Dana Amin; mataram-na com um cordão de sapato e deixaram
o seu corpo num jardim de Birmingham. O que fez ela para merecer isto?
Separou-se do marido e começou uma vida nova com outro homem. Na Alemanha, o
flagelo é idêntico. Hatun Suruçu foi baleada pelos próprios irmãos numa paragem
de autocarro em Berlim em 2005. O que fez ela para merecer isto? “A puta queria
viver como uma alemã”, diziam. Aos 23 anos, Hatun divorciou-se do primo que lhe
tinha sido imposto pelos pais aos 16 anos no casamento forçado da praxe; também
deixou de usar lenço, recusou a vida de dona de casa (inscreveu-se numa escola
profissional) e começou a namorar um alemão. Num claro eco de Sayyd Qutb, a
família decretou que Hatun havia cometido o pecado dos pecados: deixou-se
conspurcar pela vida impura do Ocidente. Matá-la era uma questão de honra.
Hatun não é
um caso isolado. Na última década e meia, a Alemanha conheceu centenas de casos
idênticos. Por norma, os familiares escolhem o irmão mais novo para o papel de
assassino da irmã devassa, porque sabem que a justiça alemã não pode ser dura
com menores de idade. Estes meninos acabam por crescer como “heróis de honra”
da família e dos bairros que vivem num universo paralelo. Há relatos de
crianças que chegam à escola sem compreenderem uma sílaba de alemão; há relatos
de bairros controlados por um sistema legal paralelo e informal assente na
sharia e tutelado por “mediadores islâmicos”. Estes mediadores, anciãos de
aldeia a viver em marquises, realizam casamentos à margem da lei e, aos olhos
da comunidade, aqueles casais ficam mesmo casados. Algumas associações de
protecção de mulheres muçulmanas afirmam que estes casamentos paralelos já
representam 20% da população muçulmana de Berlim; as associações também
declaram que os tais “mediadores islâmicos” (outro belo eufemismo) nunca tomam
o partido das raparigas que recusam casar com os primos impostos pelas
famílias. Não surpreende. Estamos a falar de comunidades onde as meninas são
forçadas a casar a partir dos doze anos e onde os meninos aprendem a apelidar
de “puta alemã” qualquer rapariga que recuse usar o véu.
Esta
barbárie foi construída com o beneplácito dos responsáveis pela integração e
dos média que recusaram sempre fazer críticas à “comunidade turca” mesmo quando
se tratava de expor a mais abjecta misoginia. Felizmente, este racismo
invertido do multiculturalismo só podia desesperar as turcas-alemães que lutam
pela sua liberdade. Serap Çileli é um desses casos. Durante os anos 90, Çileli
tentou publicar artigos e livros sobre a condição feminina dos bairros turcos,
até porque ela própria fora forçada a casar aos 15 anos, mas o meio literário e
jornalístico recusou sempre os seus textos. “As pessoas”, diz Serap, “tinham
medo de serem apelidadas de nazis caso levantassem questões sobre os
muçulmanos. Tudo o que eu escrevia era rejeitado, até pelos jornais; diziam-me
que estava a escrever sobre uma minoria e eles tinham medo de serem apelidados
de racistas”. A perversão moral deste raciocínio fala por si. Serap é turca,
experimentou as agruras do casamento forçado, estava a criticar o marialvismo
islamita a partir de um ponto de vista muçulmano, estava a defender a
emancipação das mulheres, mas mesmo assim o meio intelectual alemão só
encontrava uma palavra para descrever os seus ensaios e livros: “racismo”.
Outra autora turco-alemã, Seyran Ates, é ainda mais dura na crítica à
mentalidade multiculturalista. Para esta autora e advogada especializada nos
“crimes de honra”, a posição da esquerda feminista é insustentável. Por um
lado, critica a Igreja católica e o machismo do homem branco, mas, por outro
lado, fecha os olhos à repulsiva condição das mulheres muçulmanas. Ates levanta
o véu e permite-nos ver a traição do feminismo ocidental em relação às mulheres
muçulmanas.
Esta traição
tem uma escala babilónica, porque a maioria das vozes feministas também está
presa nos dois complexos ideológicos do costume: ou são multiculturalistas
convictas, ou são defensoras do “politicamente correcto”, a versão descafeinada
do multiculturalismo. Se são multiculturalistas a sério, as feministas
argumentam que o véu e demais misoginias islamitas são uma representação
legítima de uma cultura que temos de respeitar; isto quer dizer que, na
prática, só defendem os direitos das mulheres brancas que são vítimas da
alegada opressão cristã, capitalista e do homem caucasiano (o homem
não-caucasiano, como se sabe, é o bom selvagem). Quando não caem neste
fanatismo ideológico, as feministas deixavam-se ficar na estação agridoce do
politicamente correcto, acabando por dizer que não existem diferenças entre a
violência machista da maioria branca e a violência machista da minoria
islâmica, isto é, tentam colocar os “crimes de honra” dentro da grande
categoria da “violência doméstica”. Numa infeliz aliança com as organizações
islamistas, demasiados grupos feministas colocam a tareia da Rihanna ou a morte
da Dona Joaquina em Carrazeda de Anciães ao lado do assassinato de Hatun Suruçu
ou Banaz Mahmod. É uma equivalência infeliz porque existe uma diferença de
natureza entre a chamada “violência doméstica” e os “crimes de honra”. É claro
que os homens da maioria branca matam mulheres. Muitas tascas portuguesas, por
exemplo, ainda se regem pelo “ela estava a pedi-las” quando há provas ou
rumores de adultério. Mas estes assassínios são actos isolados de um único
indivíduo, o marido, que obviamente não encontra cúmplices materiais no sogro
ou cunhados. Além disso, estes assassínios não são manifestos culturais ou
religiosas contra a “cultura ocidental”. A conversa muda de figura nos “crimes
de honra”. Estamos a falar de actos colectivos e familiares. O pai junta-se a
irmãos, filhos e tios para matar a própria filha e a restante família apoia o
assassino e não a vítima. Em 2008, em Hamburgo, Ahmad esfaqueou a irmã Morsal
vinte e três vezes. A justiça condenou-o a prisão perpétua e a decisão causou
indignação na família que estava ao lado do irmão assassino e não ao lado da
irmã assassinada. Sim, existe uma diferença entre “violência doméstica” e os
“crimes de honra” muçulmanos. Mas feministas ocidentais e islamistas continuam
a argumentar que a mera constatação desta diferença é um acto “racista”.
Seyran Ates
e Serap Çileli não são as únicas autoras que se sentem abandonadas. Hirsi Ali é
outro caso famoso de abandono. De resto, a sua autobiografia (“Uma Mulher
Rebelde”, Ed. Presença) é uma história de desilusão com a esquerda. Natural da
Somália, Hirsi Ali chegou à Holanda no início dos anos 90 depois de sofrer os
danos da sua cultura natal (excisão genital, casamento forçado). Cedo ingressou
naquele que lhe parecia o partido natural para a sua posição crítica em relação
à misoginia islamita – o Partido Trabalhista. Estava enganada. No dia 12 de
Setembro de 2001, Hirsi Ali encontrou o líder dos trabalhistas, Ruud Koola, que
de imediato quis mostrar a sua compreensão: “não achas estranho que toda a
gente pense que a culpa é do Islão!?”. Hirsi Ali teve ali a sua epifania e
começou de imediato a tentar acordar os colegas de partido. Começou a avisá-los
em relação aos perigos do multiculturalismo, uma política pública que
legitimava e financiava comunidades inteiras que não respeitavam os direitos
mais básicos das mulheres e dos homossexuais. Quando ouviam este discurso, os
colegas trabalhistas de Ali franziam os olhos e diziam que não, aquilo era um
discurso “direitista”; estavam paralisados pela necessidade de se mostrarem
sensíveis às culturas das minorias, fosse qual fosse a essência dessas
culturas, fosse qual fosse a condição feminina vigente nessas minorias. Quem
está mal, muda-se. Hirsi Ali acabou por ingressar no Partido Liberal e, após o
assassínio do amigo Theo Van Gogh, emigrou para os EUA. Já não se sentia segura
ou respeitada na Holanda. Os seus vizinhos exigiram em tribunal que ela saísse
da própria casa.
Hirsi Ali,
Seyran Ates e Serap Çileli e as milhares de vítimas dos “crimes de honra”
foram, são e serão traídas por uma esquerda bloqueada na questão islâmica. Este
espectáculo de incoerência dura há décadas e deverá continuar por mais algum
tempo: os alegados progressistas defendem o modo de vida mais reaccionário e
misógino do mundo. Naquele que continua ser o livro definitivo sobre o assunto
(“Identidade e Violência”, Tinta-da-China), Amartya Sen expôs ao ridículo esta
esquerda reaccionária com um exemplo muito simples: imagine-se que uma rapariga
muçulmana de Londres, uma Shahana real, quer namorar com um rapaz inglês; este
desejo é travado pela família, pelos alegados líderes religiosos da “comunidade
muçulmana” e pelos ideológicos multiculturalistas da esquerda britânica. Como
salienta um espantado Sen,
“é
precisamente a proibição dos pais que parece receber a defesa mais clara e
visível dos alegados multiculturalistas, com base na importância de honrar as
culturas tradicionais, como se a liberdade da jovem não tivesse relevância.”
Além de
trair as muçulmanas, esta esquerda também atraiçoa os intelectuais muçulmanos
que procuram reformar e racionalizar o Islão. Esta indústria intelectual que
grita “islamofobia” a cada momento acaba por reconhecer os radicais islamistas
como os líderes legítimos do Islão, deixando de parte os reformadores como Sayd
Bahodine Majrouh, o Voltaire afegão que recolheu os poemas de um género popular
cantado em segredo pelas mulheres afegãs – os landay. Em “A Voz Secreta das
Mulheres Afegãs” (Cavalo de Ferro), podemos ler estes poemas que gozam com a
repressão masculina. Não, não são poemas da mulher-anjo desejada pelos
islamitas, não são sussurros místicos e inocentes. São ânsias carnais. Estas
mulheres querem sexo, cantam sobre sexo porque – muito simplesmente – não o
têm. Os homens passam o dia a discutir assuntos tribais e religiosos; à noite, dormem.
É um coro de donas de casa desesperadas: “Não haverá um louco nesta aldeia? /
As minhas calças cor de fogo ardem-me nas coxas”. Estas pequenas quadras têm um
poder de fogo superior a toda a armada americana, porque submetem ao ridículo o
código de honra islamita a partir da cama dos mullah: “Que o mullah grite a sua
chamada à oração matinal / Enquanto o meu amante quiser, não me levantarei”.
Como se sabe, estas mulheres são assassinadas se forem apanhadas com o tal
amante. E, como seria de esperar, Majrouh foi assassinado por islamitas no
mesmo ano da fatwa lançada sobre Salman Rushdie (1988), outro intelectual
traído. Tal como o próprio recorda na sua autobiografia (“Joseph Anton”, Dom
Quixote), Rushdie sentiu-se abandonado pelos seus pares, pelo meio intelectual,
e figuras como Cat Stevens e John Le Carré colocaram-se objectivamente ao lado
dos Ayatollah.
Entre 1988 e
2015, a posição de John Le Carré tornou-se cada vez mais poderosa. Este
predomínio ficou evidente na polémica dos cartoons e ainda se vê na forma como
mulheres da linha de Hirsi Ali e Qanta Ahmed são rotuladas de traidores da sua
própria cultura. Não deixa de ser curioso: as intelectuais muçulmanas que
rompem com o Islão (Ali) ou com o islamismo radical (Ahmed) são destratadas
como “direitistas” ou “vendidos ao Ocidente”, tal como os dissidentes dos
países comunistas há trinta ou quarenta anos. Nos anos 60, 70 e 80, os
dissidentes na linha de Havel, Sakharov ou Soljenitsine eram criticados ou
ignorados pelos marxistas ocidentais que viviam no conforto do mundo NATO; de
forma quase cómica, aqueles que conheciam de facto o comunismo recebiam
lições de moral dos intelectuais marxistas que nunca viveram de facto em
países comunistas; hoje em dia, as mulheres que viveram e vivem de facto
as agruras do islamismo são silenciadas, secundarizadas ou mesmo rotuladas de
“vendidas” pelos intelectuais pós-marxistas que têm as seus cátedras
financiadas pela indústria da “islamofobia”.
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Lida Abdul
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Compromisso
Como é que
podemos chegar a um acordo? Como é que podemos encontrar um chão comum entre a
velha arrogância liberal que via no “outro” uma tábua rasa e o actual
multiculturalismo que vê no “outro” um espelho passivo da culpa ocidental?
Talvez valha a pena recordar Edmund Burke, um liberal à moda antiga, um liberal-conservador
que era – ao mesmo tempo – um adversário da arrogância iluminista à James Mill
e um inimigo do romantismo relativista de Herder. Burke defendia a governação e
os valores britânicos, mas recomendava cautela à arrogância imperial, visto que
existiam elementos válidos nos valores indianos. Temos de recuperar esta velha
prudência burkeana. Em “Two Faces of Liberalism”, John Gray tenta esse
exercício e recorda-nos que diferentes concepções de Bem podem coexistir na
mesma sociedade. Não, não devemos considerar que uma cultura é o Inimigo só
porque defende uma concepção de Bem diferente da nossa. Contudo, este
pluralismo deve ter limites. Sem limites, o pluralismo cosmopolita
transforma-se em relativismo. Mas como é que traçamos esse risco? Ou melhor:
onde é que traçamos o risco entre pluralismo e relativismo? Só é possível
resolver a equação através de exemplos práticos. Neste sentido, devemos olhar
para o par que toda a gente tem na cabeça: o muçulmano e a sua mulher a viver
na Europa.
Não apreciamos
e até podemos considerá-las repugnantes, mas podemos tolerar a existência de
comunidades patriarcais que colocam a mulher num lugar subalterno. Não
apreciamos, até podemos considerar repugnantes alguns aspectos, mas os nossos
espaços legais podem aceitar essa diversidade. É assim com as “comunidades
ciganas” há anos. Pode ser assim com a “comunidade muçulmana”. Ou seja, podemos
aceitar a condição doméstica das Nazneen. Não concordamos com essa realidade,
mas podemos aceitá-la se existir consentimento da parte da mulher. Devemos ter
a humildade para conceber que pode estar ali outra concepção de Bem. Não
podemos estar sempre a traçar riscos na areia, até porque a tolerância é isto:
aceitar realidades de que não gostamos. Tolerar não é amar acriticamente
o “outro” em toda a sua diversidade; tolerar é respeitar o “outro”
apesar de odiarmos partes da sua natureza. Há, porém, limites à tolerância e ao
esforço contextualizador. Se tudo fosse relativo, o canibalismo seria uma
questão culinária; se tudo fosse cultural, o apedrejamento de mulheres seria
uma questão de pontaria; se tudo fosse relativo ao contexto, o único ponto a
debater na excisão genital seria o grau de desinfecção da lâmina. Portanto, se
podemos aceitar a subalternidade das Nazneen, não podemos aceitar os casamentos
forçados das Shashana aos doze anos. Se podemos aceitar o véu, não podemos
aceitar a excisão genital de meninas como Bibi. Se podemos aceitar que a mulher
ande dois passos atrás do marido, não podemos aceitar desculpas culturalistas para
actos tão graves como uma violação. Mas, infelizmente, isto já é uma realidade.
Na Austrália, um afegão chamado Esmatullah Sharifi violou duas raparigas. O
tribunal de primeira instância condeno-o à pena máxima, mas o tribunal de
segunda instância aceitou a argumentação relativista do advogado de defesa. O
juiz reduziu a pena porque Sharifi é oriundo de uma cultura sem “uma noção
clara do conceito de consentimento da mulher no momento do acto sexual”. É a
glória do multiculturalismo: um crime contra uma mulher passa a ser um fenómeno
cultural se for perpetrado por um homem sem pele branca.
O panorama é
este e não há sinais de mudança mesmo depois do 7 de Janeiro de 2015. A BBC,
por exemplo, recusa apelidar de “terroristas” os assassinos que mataram doze
pessoas no “Charlie Hebdo”. O termo correcto, diz a estação inglesa, é
“militantes”. Em Paris, no final de Janeiro, uma peça da artista francesa
Zoulikha Bouabdellah foi retirada de uma galeria de arte para não ferir
susceptibilidades. Um grupo local de muçulmanos avisou que a presença daquele
peça poderia desencadear “violência incontrolável”. O que mostra a peça? Saltos
altos pousados num tapete de oração.
A traição
continua.
Henrique Raposo
(ensaio originalmente publicado
na revista Ler, no início deste ano,
aqui reproduzido com autorização de Henrique Raposo – obrigado e um abraço, Henrique!)