No carro ela dirige sozinha. A vida vai passando, as coisas vão passando, e os problemas que contornam a cabeça dela não deixam que tenha tempo de apreciar as pessoas na rua como fizera tantas vezes antes.
O som do carro em silêncio, demonstrava que nem mesmo a música podia salvar-lhe daquela angústia.
No meio de tanta confusão na cabeça, ela se perde pela segunda vez no percurso. Tenta racionalizar e não entrar em completo desespero, não achar que é a pessoa mais estúpida do mundo, não achar que está pirando. Mais pira.
Miúdas, as lágrimas vão saindo do seu rosto, invadindo óculos, invadindo a alma.
Ela tenta não perder o controle do carro, pois todo o resto já tinha ido pro brejo.
Imagina que seria perfeito que a cabeça da gente tivesse um botão de desliga. Um piloto automático, um GPS de sentimentos que só levasse a gente pra onde a gente quisesse ir e nada mais.
Enquanto carros voam do seu lado, a história do GPS vai vagando na cabeça dela. Ela que já tinha perdido a cabeça na esquina passada.
Vai imaginando como seria mais fácil, se desse o braço a torcer e comprasse logo uma dessas coisas que te dizem de pronto o destino, que mostram para onde ir, que no primeiro erro já traçam uma nova rota, um novo percurso. Menos problema pra pensar, menos trabalho, menos roubada.
Talvez fosse bom ter um GPS pra ela, pra vida dela. Ela que andava tão fora de controle, tão fora de rumo. Alguém pra recalcular a rota, pra mostrar o caminho, pra mostrar aonde ir.
Parada no semáforo ela só volta a si após uma generosa buzinada do carro de trás. Colocou o braço pra fora, tentando demonstrar que sentia muito. Mas do outro carro não dava pra ver as sobrancelhas levantadas e o sorriso amarelo de quem perde perdão. Mais lágrimas derramadas, agora o drama se unia a situação.
Nessas horas, dava pra sentir até pena de si mesmo. Mas não achou que era cabível àquela hora da tarde, entrar numa dessas.
Rodou mais umas duas quadras até arranjar coragem de perguntar para uma senhora onde, diabos, ela estava. A resposta, que saiu tão doce da boca da velha, pareceu atravessar-lhe o coração como uma faca.
Estava do outro lado da cidade. Olhou em volta.
Nunca tinha visto nada nem parecido com aquele lugar.
Agradeceu e partiu, tentando lembrar-se das “duas à direita, uma a esquerda” que a velha havia indicado. Tá bom pensava, como se isso fosse me levar pra algum lugar.
Mesmo assim seguiu o caminho indicado. Havia uma praça.
Havia ainda sol suficiente para iluminar o lugar e deixar a grama e as árvores ainda mais verdes, crianças corriam por ali, babás, taxistas. Um lugar comum.
Havia também um punhado de flores multi coloridas plantadas no chão, um pequeno lago no meio de tudo, e todas as pessoas ali vivendo, alheias a ela, alheias ao mundo.
Resolveu parar.
Sentou-se sozinha num banco, secou as lágrimas. Observou aquele fim de dia lindo que se apresentava e chegou à conclusão que não precisava coisa nenhuma de um GPS, ela precisava mesmo de estar ali, com ela.
E ainda bem que aquela velha, sabia muito bem do que ela estava precisando.
Duas à direita, uma a esquerda a velha disse, mas não deu tempo de ouvir ela dizer: “Salve a sua vida”.
Luciana Landim
Ouvindo_Je Cherche Un Homme - Eartha Kitt