quarta-feira, 27 de julho de 2011

Mãefilha filhamãe

Às vezes me pego fazendo um gesto, pode ser com os braços ou pernas, um jeito de olhar ou de virar a cabeça, sentar na poltrona ou levantar dela, seja o que for, me sinto como minha mãe. Explicando melhor, é como se fosse ela fazendo o movimento, ou melhor, como eu a via fazendo. É minha mãe vivendo em mim e eu vivendo nela. Pode ser bom, mas também pode não ser. Prefiro pensar que é uma memória ou a carga genética que me cabe, porém continuo sendo eu, nem mais e nem menos.

Essas reflexões passaram pela minha cabeça quando li Uma Duas, o primeiro livro de ficção da jornalista e escritora Eliane Brum, que narra a complicada relação entre mãe e filha, os laços que as unem – e separam, o conflito de sentimentos que vão do amor ao ódio e vice-versa. Pelo menos era isso o que dizia a sinopse e, de certa forma, era desse material que o livro se compõe. No entanto, o que li nas 175 páginas foi muito além disso e, confesso, que fiquei embasbacada.

Da estranheza inicial ao incômodo, passando pela dor e pela emoção, cheguei ao encantamento e êxtase, li Uma Duas quase que de uma tacada só: em quatro dias, levando-se em consideração que leio somente no metrô, no caminho da cada para o trabalho e do trabalho para casa, com uma média de 50 minutos em cada turno, um pouco mais, talvez, avaliando às vezes que me deixei passar da estação de desembarque só para não interromper a leitura.

Composto com tipologia diferenciada, com letras em vermelho, ora mais fortes (negrito), ora mais suaves ou ainda em itálico, o livro é narrado em três pessoas: um ”suposto” narrador, a filha e a mãe, respectivamente nas três situações da tipologia mencionada acima.

O vermelho sugere sangue, por se tratar de uma narrativa difícil que expõe sentimentos nem sempre visíveis em uma sociedade de aparências. Nisso a autora, conhecida por descrever, com emoção, histórias da vida real, consegue transpor para a ficção os segredos mais insondáveis – e nem sempre bonitos – do relacionamento entre mãe e filha.

A história começa com a filha, que é jornalista, começando a escrever um livro de ficção, revelando já nas primeiras linhas o desejo de se libertar da mãe, porque a sente em seu próprio corpo, como que impregnada. A dificuldade nessa libertação marca o tom do sofrimento, esculpido a sangue:

“...Começo a escrever este livro enquanto minha mãe tenta arrombar a porta com suas unhas de velha. Porque é realidade demais para a realidade. Eu preciso de uma chance. Eu quero uma chance. Ela também.
Quando digito a primeira palavra o sangue ainda mancha os dentes da boca do meu braço. Das bocas todas do meu braço. Depois da primeira palavra não me corto mais. Eu agora sou ficção. Como ficção eu posso existir...”

A narrativa passa então para o suposto narrador e ficamos sabendo que Laura, a filha calada e cheia de cicatrizes pelo corpo (uma forma de se libertar do corpo da mãe), já não vive com sua progenitora, Maria Lúcia. Esta, também de poucas palavras, é encontrada em condições lastimáveis – e bastante doente – em seu apartamento, o que faz com que a filha tome a decisão de abandonar o emprego para cuidar – e de certa forma se vingar e se livrar da dominância – da mãe. Começa então o embate, com cada uma expondo, pela escrita, suas verdades, suas confissões, suas histórias, numa crueza total de sentimentos, revelando baixeza e sordidez, como quando a mãe confessa ter afogado os filhos que teve antes de Laura:

“O monstrinho júnior se arrastava sobre o meu corpo e queria sugar os meus seios. O monstrinho pai dizia que eu precisava deixar, mas eu não deixei. Não mesmo. Aquela coisa já tinha me sugado pelo lado de fora. Gritei que o jogaria na parede se não o tirasse de cima de mim. E o homenzinho teve a ousadia de me olhar com ódio, nem disfarçou. Quando ele saiu para trabalhar, e eu tive forças para me arrastar peguei o pedaço de carne e afoguei na privada. Sim, eu fiz isso. E nunca me arrependi. Só descobri que estava absolvida quando li uma reportagem de Laura sobre depressão pós-parto. Não me importei. Eu nunca me senti culpada por isso. Fiz outras três vezes ainda...”

A história prossegue, com as tensões se acentuando e chegando ao clímax, mas embora o ódio entre as duas seja tão aparente, ainda é possível encontrar amor nessa relação. Da mesma forma que é possível entender as razões, tanto de uma quanto de outra para os ressentimentos que as cercam.

Costumamos gostar de um livro na medida em que nos identificamos com ele. Confesso que foi difícil de me identificar, afinal nunca tive problemas sérios de relacionamento com minha mãe, não no nível da história do livro. De certa forma, porém, consegui me identificar nas entrelinhas, nas histórias de pessoas que conheço e também na delicada relação com familiares, embora ela não seja tão massacrante e agressiva quanto à exposta na obra.

Uma Duas é um livro intenso, forte, incômodo, emocionante. Enfim, uma boa estreia de Eliane Brum na ficção.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Debaixo dos espinhos

A primeira vez que ouvi falar de A elegância do ouriço, da escritora francesa Muriel Barbery, foi há dois anos. Estava em uma livraria de shopping com duas amigas e uma delas contou que esse era um dos melhores livros que lera. Foi o bastante para me interessar, mas ainda não inteiramente para ler. Apenas o incluí na minha lista.

Há poucos meses, entretanto, outra amiga comentou em seu blog sobre a adaptação para o cinema do mesmo livro e, então, pensei: tenho de ler agora, pois sempre que me acenam mais de uma vez sobre uma publicação é porque chegou a hora de lê-la. Não podia mais adiá-la.

Sugeri, então, o livro em um dos encontros do Clube de Leitura Bookworms (http://migre.me/5kaAB) que frequento, mas havia outras indicações tão boas que a escolha recaiu em outro livro. No penúltimo encontro levei outras sugestões, assim como minhas companheiras de leitura, e uma delas se lembrou de A elegância do ouriço, mas como não havia consenso resolvemos fazer um sorteio e o livro ganhou. Que bom!

A autora, Muriel Barbery, estreou na literatura em 2000, com o romance Une gourmandise. A elegância do ouriço, seu segundo livro publicado em 2006, causou sensação literária na França. Professora de filosofia na Normandia, mas fascinada pela cultura japonesa, em 2008 ela foi viver com seu marido no Japão.

Seu livro, A elegância do ouriço, cativou-me desde o início. Já sentia a profundidade de sua narrativa, centrada em temas filosóficos, mas, talvez por isso mesmo, demorei a emplacar, apesar de já me sentir fisgada pela história. Só quase pelo meio do livro é que a leitura deslanchou, chorei muito e descobri um imenso prazer com a obra, tanto que me senti completamente seduzida pela literatura, ou seja, por essa arte que usa a linguagem escrita como meio de expressão. Acho que consegui compreendê-la melhor a partir do livro.

A história gira em torno de duas personagens principais, que vivem em um prédio elegante no número 7 da Rue de Grenelle, na França: Renée, a zeladora baixinha, gorda, feia, ensimesmada, e Paloma, a caçula da família Josse, uma menina de 12 anos, quieta, sensível e inteligente, mas que por não ver sentido na vida decide colocar um fim nela ao completar 13 anos.

A narrativa segue alternada e depois entrelaçada, com as vozes de Renée e de Paloma no texto assinaladas com tipografia diferente para cada uma. Por meia delas ficamos conhecendo um pouco mais de Renée, uma mulher simples por fora, mas refinada, culta e sagaz interiormente. Ela, apesar da infância pobre e de quase não ter frequentado escola, conseguiu deter o conhecimento por meio dos livros e da leitura autodidata. Dada sua condição social, no entanto, sempre acobertou esse lado, que é totalmente ignorado e desconhecido pelos moradores ricos do edifício. Ela vive, assim, uma vida clandestina no seu espaço, compartilhado pelo gato com nome de um escritor russo, Leon.

Já Paloma se mostra na história por meio dos registros feitos em dois diários: “Pensamentos profundos” e “Diário do movimento do mundo”, onde pontua, antes de executar o plano de suicídio, suas impressões a cerca da vida e das coisas que a cercam para, de alguma forma, tentar ver algum sentido no mundo e, talvez, desistir da ideia, embora a tenha bem clara – e decidida – na mente.

Outros personagens povoam a história, como os familiares de Paloma – o pai, um político socialista, a mãe, uma dondoca, a irmã, doutorada em letras –, os demais moradores do edifício, como o crítico de gastronomia Pierre Arthens, que está morrendo, e Manuela, uma empregada doméstica com ares aristocráticos, única amiga de Renée.

A rotina do edifício, no entanto, se vê alterada pela chegada de um novo morador, um japonês misterioso, sábio e bondoso, Kakuro Ozu, que vai por em xeque a clandestinidade de Renée e reverter a vida de Paloma, salvando ambas da mediocridade em que vivem. Ele tem dois gatos, cada um com nome de personagens do romance Ana Karenina, do escritor russo Leon Tolstói - Kitty e Levin.

As vozes de Paloma e Renée a princípio separadas acabam pouco a pouco entrelaçadas na trama, até que se casam. Temas como vida e morte, chá, filosofia, estética, diferenças de classes, adolescência, poemas e jogos orientais, filmes e livros e simbologias como aquário e camélias ocupam as páginas do livro, dando um sentido mais abrangente à trama.

Nesse entremeado de vozes, hora me identifiquei com Renée, hora com Paloma, talvez um pouco mais com Paloma que faz uma das reflexões mais profundas e belas, mas ao mesmo tempo terríveis, que li:

“... Porque o que é bonito é o que captamos enquanto passa. É a configuração efêmera das coisas no momento em que vemos ao mesmo tempo a beleza e a morte.

Ai, ai, ai, pensei, será que isso quer dizer que é assim que temos de ver a vida? Sempre em equilíbrio entre a beleza e a morte, o momento e seu desaparecimento?

Estar vivo talvez seja isto: espreitar os instantes que morrem.

Ou ainda:

Perseguir os sempre no nunca.”

E , de fato, é isto mesmo: perseguir os sempre no nunca.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Por dentro do CUBO3

Quando resolvi fazer este blog pensava em exercitar e aprimorar a escrita, colocar-me mais no texto e, é claro, compartilhar com outros leitores as histórias das minhas leituras. Aos poucos fui pegando gosto por ele e a boa acolhida por parte dos seguidores estimulou-me a continuar dia após dia.

Este espaço tornou-se para mim uma espécie de fuga. Fuga de uma realidade, que muitas vezes se torna árida, embora a realidade esteja sempre presente nos posts que faço. Afinal, são minhas experiências e impressões – verdadeiras – que escrevo, mas transformadas num potente lenitivo contra a vida real.

E o que é melhor, possibilitou-me conhecer e contatar outros blogueiros do mundo literário, com os quais troco ideias e acompanho suas postagens e visões sobre livros e leituras.

Enfim, mas porque estou escrevendo tudo isso, parecendo até que vou dar um tempo no blog? Não, não é isso. Muito pelo contrário. É que a visibilidade do blog levou-me a ser convidada para escrever uma coluna semanal no CUBO3 ( http://cubo3.com.br/ ), uma iniciativa bacana, da talentosa Deborah Magnani, artista multimídia, com foco em animação e interfaces digitais, que trabalhou comigo quatro anos atrás.

Lembro que na época ela havia comentado sobre o projeto e que gostaria da minha colaboração escrevendo artigos. Não me senti muito animada, na verdade tive medo de não dar conta e ainda não sabia ao certo o que escrever. Mesmo o blog, demorei a ter disposição para fazê-lo, mas agora, mais fortalecida, já sinto que posso expandir um pouco mais meus horizontes e arriscar-me em novos desafios.

O CUBO3 traz uma visão aberta e diferente sobre os mundos da arte e da cultura popular. Trata de cinema, literatura, quadrinhos, música, artes plásticas, tecnologia e animação, mas, sobretudo, de pessoas e lugares, tradição e originalidade, improvisação e inventividade.

Esta é a segunda semana que um artigo meu é publicado no CUBO3. O primeiro, como experiência, foi um post que fiz aqui no blog, no início deste ano, sobre o livro A Viagem do Elefante, de José Saramago. A boa receptividade animou-me a continuar e esta semana escrevi um texto sobre O Jornalismo em Quadrinhos de Joe Sacco, aproveitando minha ida à Flip – Festa Literária Internacional de Paraty.

Aos poucos vou me soltando um pouco mais do blog para criar um texto diferenciado para o CUBO3. Mas, é claro, sem deixar este de lado. Afinal, ele é razão de tudo, o começo de tudo, e onde me sinto à vontade para falar de mim por meio das leituras e das observações que faço.

As oportunidades estão aí. Basta prestar atenção e não deixá-las escapar.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Meu olhar sobre a Flip

Era a quarta vez que eu desembarcava naquele paraíso, era a quarta vez que eu iria participar daquela festa literária, era a quarta vez que eu me equilibrava para andar por aquelas ruas de calçadas irregulares e escorregadias. No entanto, era como se fosse a primeira vez, pois tudo me soava como novo, desconhecido e belo.

É, Paraty tem mesmo o encanto da inovação – ou melhor, da reinvenção, de se transformar a cada nova estadia do visitante à cidade. Pelo menos é assim para mim, que não me canso de visitá-la, ainda mais se puder aliar sua beleza e cultura ao fascínio exercido pela literatura.

A Flip – Festa Literária Internacional de Paraty, que acontece na cidade, agora em sua nona edição, reinventou-se, possibilitando uma integração maior entre a margem que abriga o centro histórico da cidade, propriamente dito, e a margem do outro lado da ponte, que desemboca na Praia do Pontal.

Com essa nova estrutura, a tenda do autor, a tenda dos autógrafos aliada à Livraria da Vila, a tenda do telão e a simpática lojinha da Flip, acrescida de bem instaladas máquinas de vender livros, destas que existem nas estações do metrô de São Paulo, passaram a ocupar o mesmo lado, da Praia do Pontal. E ganharam um bonito calçadão, onde foram montados estandes dos patrocinadores da Festa, uma novidade desta edição.

A beneficiada com a mudança foi a Flipinha (direcionada ao público infantil), que adquiriu um espaço maior, no centro histórico, além de uma biblioteca. A única ressalva ficou para a Flipzona (voltada para os adolescentes e jovens), montada no espaço reduzido de um casario do centro, que mal comportava a quantidade de pessoas ávidas pela programação, gratuita, que oferecia.

Infelizmente não pude participar integralmente da Flip, que este ano homenageava o antropofágico Oswald de Andrade. Cheguei à Festa quase no final de seu terceiro dia e, com isso, perdi a mesa da argentina Pola Oloixarac, alçada à musa da edição, dividida – e um pouco ofuscada, se isso é possível – pelo português valter hugo mãe (letras grafadas em minúscula mesmo), que protagonizou – pelo menos foram esses os comentários que ouvi e depois li – um dos momentos mais emocionantes da Flip, ao ler um texto em que falava da sua relação com o Brasil por intermédio de brasileiros que conhecera na infância (veja aqui http://migre.me/5gM5m).

Ao menos tive o prazer de vê-lo, no final da tarde, ainda na mesa de autógrafos, mesmo depois de quase duas horas do término da sua mesa. Seu livro, Remorso de Baltazar Serapião, e o de Pola, As Teorias Selvagens, estão na minha lista de obras a ler.

A surpresa melhor viria mais tarde, quando no espaço da Companhia das Letras, montado num casario no centro histórico, vi Joe Sacco, o jornalista quadrinista, razão principal de ter me aventurado em mais uma edição da Flip, e me atrevi a solicitar uma foto ao seu lado. Gentil e simpático, ele não só tirou a foto comigo, como ainda quis ver o resultado na câmera.

Já, à noitinha, assisti à leitura da peça teatral Tarsila, de Maria Adelaide Amaral, feita pelos atores Eliane Giardini (Tarsila do Amaral), Beth Golfman (Anita Malfatti), José Rubens Chachá (Oswald de Andrade) e Pascoal da Conceição (Mário de Andrade), os mesmos que deram vida aos personagens modernistas na minissérie global Um só coração. Foi uma delícia ouvi-los e conhecer um pouco mais desses brasileiros.

No sábado assisti a tão esperada mesa de Joe Sacco, que mostrou detalhes da obra Notas sobre Gaza e de como os quadrinhos conseguem expressar, sequencialmente – abrangentemente – aquilo que a fotografia traz em apenas um click. E foi enfático em afirmar que, embora seus relatos sejam de guerra, seu interesse não são bombas, massacres, violência, mas sim retratar os civis frente aos conflitos.

O bate-papo com Sacco estava interessante, mas eu comecei a pensar na longa fila que já deveria estar se formando do lado de fora para o autógrafo. Ainda assim, não quis deixar a tenda antes, afinal, era para ouvi-lo que eu tinha ido a Paraty, e disso não iria abrir mão. Ainda bem, porque, por sorte, uma amiga que estava no início da fila veio me resgatar e, assim, pude me deliciar com os autógrafos do autor nos dois volumes de Palestina.

Já me dava por satisfeita, achando que minha ida a Paraty estava mais do que justificada quando, outra boa surpresa me alcançou naquela tarde. Vi João Ubaldo Ribeiro na rua, cercado de fãs que se acotovelavam para tirar uma foto com ele. Juntei-me a eles e também pude tirar uma lasquinha da investida. Ali, vendo-o sorridente e me parecendo até mesmo encantado com os leitores, desfez-se a impressão que tinha: um escritor sério, mal-humorado, sem paciência.

Sua mesa, Alegoria da ilha Brasil!, foi divertidíssima, uma das melhores – e mais lotada nas duas tendas - que assisti nesses anos que frequento a Flip. Franco, aberto, bem humorado, João Ubaldo surpreendeu ao falar sobre as razões que o levaram a escrever um de seus maiores sucessos – Viva o Povo Brasileiro: “quis fazer um livro grosso para esfregar na cara do Pedro Paulo (Sena Madureira, então editor na Nova Fronteira), o que efetivamente fiz”. Na época, o editor dissera a Ubaldo que escritor brasileiro só fazia livros finos para serem lidos na ponte aérea, daí sua revelação na Flip: “Não quis reescrever a história do Brasil. Quis escrever um romance bem escrito, caprichado e grosso”, e lembrou que os originais pesavam 6,7kg!

No final da noite assisti Lugares escuros, uma das mesas mais aguardadas da Flip com o escritor americano James Elroy. Da infância marcada pelo brutal assassinato da mãe, Elroy enveredou pelos caminhos do romance policial, sendo autor de sucessos como Dália Negra e Los Angeles - Cidade Proibida, ambos adaptados para o cinema. Era natural a expectativa em torno dele. No entanto, embora os comentários pós mesa tenham sido favoráveis, sua entrada performática e teatral no palco me irritou, mas mesmo assim insisti em continuar. Suas declarações e comentários, no entanto, foram poucos claros para mim e acabei desistindo de assistir a mesa até o fim. Mas isso não significa que não queria ler seus livros, uma coisa não exclui a outra.

Mas nem só de literatura se vive na Flip, embora ela seja o fio condutor dos acontecimento. A Festa ainda proporcionou reencontros memoráveis, de amigas queridos, como Mari, de Curitiba, que tem um blog bacana, o Orelha do Livro ( http://www.orelhadolivro.com.br/ ) e que conheci na primeira vez que fui a Paraty. Comigo, Gil, a Princesa Amnésia, de São Paulo, também descoberta na minha primeira Flip, e que escreve textos lindos, como os do seu blog http://www.mundodaamnesia.blogspot.com/ E ainda tive a oportunidade de conhecer o garoto  Heitor, do blog do Le-Heitor (http://blogdoleheitor.sintaxe.com.br/), acompanhado de seus pais. Um personagem simpático, apaixonado pela literatura.

E, por fim, o maracatu nas ruas, o show quadrilhanesco (se é que existe esta palavra), as performances artísticas nas calçadas, o artesanato local, a beleza das igrejas, o som repousante das ondas na Praia do Pontal, o sol iluminando o centro histórico, as carrocinhas de doces e os bares lotados na noite paritiense dão sempre um colorido a mais à Festa.

Fui embora de lá com gostinho de quero mais... A nona edição nem bem terminou e já estou sonhando com a próxima. Será que 2012 ainda demora muito a chegar?


* A foto da Pola Oloixarac é de Carolina Campos, a de valter hugo mãe é de Ana Pereira, e a de James Elroy é de WikimediaTripsspace. As demais são de autoria da Princesa Amnésia.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Frente a frente com Joe Sacco

Definitivamente quadrinho não é só leitura de criança, faz parte do mundo adulto também, e pode ser usado como ferramenta paradidática, além de contar uma história real, contemporânea, narradas em estilo jornalístico, mas sem perder, contudo, o encanto e o humor característicos dos chamados “gibis”.

Se alguém ainda tinha alguma dúvida quanto a isso, o jornalista e quadrinista Joe Sacco dissipou qualquer possibilidade ao afirmar, na Flip 2011 – Festa Literária Internacional de Paraty, que sua arte, conhecida como Jornalismo em Quadrinhos, é mais adequada ao público adulto, embora as “HQs despertam a criança que existe nos adultos”.

Talvez seja o lado criança que me levou a conhecer e ler o trabalho de Sacco, mas sem dúvida, foi a parte adulta que por ele se interessou ao ponto de fazer, em 2003, um trabalho de pesquisa em pós-graduação do seu livro Palestina, ou melhor, do seu trabalho jornalístico em quadrinhos sobre o conflito israelense-palestino.

E, agora, oito anos depois, tive a oportunidade de estar em Paraty para conhecer de perto – e ouvir - o principal nome do Jornalismo em Quadrinhos, um acontecimento que vou levar para sempre em minha mente e, principalmente, no meu coração.

Encontrei Joe Sacco antes da mesa literária que ele participaria na Flip. Foi um encontro casual, no espaço da Companhia das Letras, onde ele conversava longamente com uma moça, talvez uma jornalista, e em seguida autografava seus livros. Sem dominar o inglês, atrevi-me a aproximar dele e pedi para tirar uma foto, no que se ele se dispôs prontamente. Falei rapidamente qualquer coisa, nem mesmo sei o quê e, de certa forma, nos entendemos. Fiquei admirada com sua simplicidade e simpatia e sai exultante dali.

No dia seguinte, quando da realização da sua mesa, fiquei ainda mais maravilhada com seu trabalho e sua forma tranquila de falar. No início da sua apresentação, mostrou alguns de seus trabalhos, apontando detalhes e o processo de criação. Falou sobre o tema recorrente da guerra em suas reportagens e no desejo de fazer algo mais leve e divertido no futuro.

O que mais me chamou a atenção, no entanto, foi a abordagem dos seus trabalhos: mostrar o lado humano das pessoas, ou seja, a vida dos civis sob a influência das guerras, e não retratar bombas ou tiroteios. É dar voz a essas pessoas, mostrar como vivem, o que sentem, o que esperam, como são afetados pelos conflitos. É um tipo de Jornalismo Literário, sem dúvida, adaptado para os quadrinhos.

E é este o cerne dos seus livros publicados no Brasil: Palestina e Palestina – na Faixa de Gaza, Área de Segurança: Gorazde, Uma História de Sarajevo e o recém-lançado Notas sobre Gaza.

Ao final da sua apresentação, corri para a fila de autógrafos com Palestina e Palestina – na Faixa de Gaza, já antevendo a fila enorme que teria de enfrentar. De fato, fiquei quase no final dela, mas para minha sorte – e a sorte estava ao meu lado em se tratando de Joe Sacco – uma amiga veio me resgatar e levou-me mais para frente, onde estava outra colega aguardando sua vez.

Quando estive, novamente, diante de Sacco, ele me olhou e disse algo como “você é familiar”, foi então que lembrei a ele da foto, tirada no espaço da Companhia das Letras. Ele sorriu e, gentilmente, autografou meus dois livros, deixando em um deles o desenho de seu perfil.

Sacco, que nasceu na Ilha de Malta, contou durante sua apresentação que o local foi bombardeado na Segunda Guerra e falou que as histórias da sua família sobre os conflitos ficaram nas suas lembranças, sobretudo como as pessoas foram afetadas por eles. Talvez por isso tenha se voltado para o assunto em seus trabalhos, além, é claro, das influências literárias, como a de George Orwell, em seu livro O caminho para Wigan Pier, que fala sobre as condições de vida da classe trabalhadora inglesa – como os mineradores - nas primeiras décadas do século passado. O trabalho de imersão do escritor e jornalista inglês nas minas foi decisivo para que Sacco direcionasse seu próprio trabalho.

Além de Orwell, Sacco citou o quadrinista Robert Crumb e o jornalista Hunter S. Thompson, este sobretudo pela “ideia de que você pode escrever de uma maneira interessante sobre assuntos sérios, como ele fez sobre a política americana”.

Poderia ainda ficar horas e horas falando sobre Joe Sacco e seu trabalho, mas temo ser repetitiva. Sobre o livro Palestina e o Jornalismo em Quadrinhos fiz um post no ano passado que pode ser acessado neste link: http://virou.gr/pH6xPC

Sobre os dias em que estive na Flip, vou falar um pouco mais, só que em outro post. Este, é exclusivo de Joe Sacco.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Jogo da Literatura

Como leitora gosto de assinalar trechos em livros que estou lendo. Às vezes faço marcações no exemplar e arrisco alguns comentários; em outras coloco post it no lugar e depois transcrevo para o papel ou computador; e, ainda, na falta de outro recurso, cometo a “heresia” – para muitos - de dobrar o canto superior da página para lembrar de anotar posteriormente.

Esses trechos assinalados são passagens bem subjetivas, que me tocam no exato momento em que os leio, e acho que deve ser assim para a maioria dos leitores. Contudo, há alguns trechos que se tornam célebres, facilitando a identificação do livro a que se referem. E é exatamente esta a ideia do Jogo da Literatura, um teste bacana que vi recentemente no site da revista Nova Escola.

O jogo avalia o conhecimento do leitor sobre 25 clássicos da literatura nacional e internacional. O desafio é relacionar 10 trechos aos seus respectivos livros, dispostos em uma estante. Antes de passar para o item seguinte, o leitor confere se acertou ou se errou e, sendo este o caso, qual a resposta certa.

Achei bem divertido – e instrutivo – e, apesar de não ter lido alguns dos livros selecionados, consegui ter uma boa margem de acertos. Os trechos, na verdade, tem tudo a ver com o livro a que se referem, é só prestar atenção. E funcionam como um chamariz, aguçando nossa vontade de ler.