Tínhamos prometido não falar dos incêndios nem de políticos suicidários. E não falámos.
Só que fomos traídos por uma terceira pessoa alheia às "nossas combinações"...
Olhámos um para o outro e assim que pudemos fomos mudando de assunto.
Foi a Rita que me transportou para uma parte considerável das férias grandes passadas na aldeia dos avós maternos (só escapavam os 15 dias de praia habituais, nos primeiros anos em Salir do Porto e Baleal e depois na minha Foz do Arelho...).
Aldeias sem água canalizada, com a luz eléctrica a não chegar a todas as casas e sem saneamento e até casas de banho...
Embora sempre me lembrasse da casa da avó com luz eléctrica (foi das primeiras pessoas da aldeia a ter esta modernidade, graças ao tio Zé, electricista...), adorava visitar de noite a casa dos Antunes, ainda iluminada pelos candeeiros de petróleo, por todo aquele jogo de sombras digno de qualquer palco, desde os corpos que se agigantavam nas paredes aos rostos que quase se tornavam fantasmagóricos, por serem iluminados por pontas.
O mais curioso é que todos tínhamos boas memórias do campo, que cheirava muito mais a liberdade que as praias (cheias de histórias de "fundões" e "correntes assassinas"...).
Claro que a terceira pessoa era insistente e daí a nada lá estava ela a dizer que as fazendas agora era mato e era por isso que o país ardia tanto no Verão.
Eu e a Rita ainda fizemos mais um esforço, inglório, para mudar de conversa, mas apareceram mais duas pessoas e como estavam com uma vontade terrível de colocar uma corda no pescoço no pretenso líder da oposição, fomos fingindo que ouvíamos ao mesmo tempo que trocávamos olhares de cumplicidade...
(Óleo de August Macke)