segunda-feira, 2 de dezembro de 2024
Javier
domingo, 1 de dezembro de 2024
sexta-feira, 29 de novembro de 2024
Fiabilidade dos números ou manobra de evasão?
1. Em mais uma surpreendente notícia veiculada através do Expresso, o ministro da Educação Fernando Alexandre vem agora dizer que, por falta de fiabilidade dos dados, afinal não é possível aferir o objetivo a que se propôs em junho: no final do 1º período, a «redução em pelo menos 90% do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo em relação a 2023/24» (Plano +Aulas +Sucesso, página 12). Isto é, uma redução relativamente aos alunos que, em dezembro do ano passado, não tinham aulas a pelo menos uma disciplina.
2. Sejamos claros: o problema começa aqui, o problema está aqui e sempre esteve aqui. Na forma como o governo fixou a fórmula de cálculo do seu objetivo, que num erro grosseiro e inaceitável manipulação de dados compara o que não é comparável. Fernando Alexandre não pode, seriamente, ponderar o universo de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano letivo, com o total de alunos sem aulas a uma disciplina num dado momento (e que inclui, portanto, os alunos que começaram o ano letivo com todos os professores). O erro da fórmula é, nestes termos, alheio à fiabilidade dos dados. Mesmo com dados fiáveis a fórmula continua a ser errada.
3. Mas o argumento tem um outro problema, não menos grave. Se é legítimo duvidar da capacidade dos serviços para apurar, passo a passo, o número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, já não colhe a dúvida relativamente à capacidade de saber, a cada momento, quantos alunos estão sem aulas a uma ou mais disciplinas. Duvidar disso seria duvidar dos horários não preenchidos que as escolas comunicam regularmente ao ministério da Educação, e que permitem estimar o número de alunos sem aulas, independentemente de estes se encontrarem, ou não, nessa situação desde o início do ano letivo.
4. Aqui entramos numa dimensão ainda mais problemática. Foi o próprio ministério da Educação que referiu, ao Expresso da semana passada, a existência de um total de 41 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina. Estando ou não nessa situação desde o início do ano letivo, a verdade é que é este o universo que importa considerar para aferir a melhoria da situação face a 2023. E o que nos dizem as estimativas, como a da Fenprof (cerca de 31 mil alunos no final de novembro do ano passado), é que o universo global de alunos sem aulas a todas as disciplinas se agravou.
5. Face ao total de alunos que chegou ao final do 1º período do ano passado sem aulas a pelo menos uma disciplina (os tais cerca de 21 mil), isto significa que o ministério da Educação tem agora menos de um mês para se aproximar desse valor, objetivo que se afigura pouco exequível. Por isso - e não pela questão relativa ao grau de fiabilidade dos números - é legítimo supor que o ministro Fernando Alexandre, ao desqualificar os dados (e o trabalho da DGEstE), está na verdade apenas a tentar não ser confrontado pela realidade, que o obrigaria a reconhecer o fracasso das medidas adotadas. Se assim não é, espera-se que pelo menos compare a situação do total de alunos sem aulas no final de dezembro deste ano com a situação no ano anterior. Para que não suceda, a uma aldrabice descarada, uma desculpa esfarrapada.
Poucochinho
António Costa foi, é e será sempre tão poucochinho. É um desperdício da experiência. O seu principal problema é o problema da elite do poder e foi diagnosticado por um socialista com outra estatura político-ideológica, histórico-filosófica, José Medeiros Ferreira: foi, é e será bom aluno de maus mestres, cada dia piores. Bem que pode alardear princípios, já que estes são negados pela vassalagem permanente ao imperialismo, em linha com Lagarde e von der Leyen, de resto. É a UE realmente existente, afinal de contas.
Liberdade de escolha? Para quem?
Não se iludam, a alegada liberdade de escolha, na saúde e na educação, financiada com recursos públicos, acaba sempre por ser sempre a liberdade de escolha dos privados que prestam o serviço, e não dos utentes e dos alunos, como a direita tenta fazer crer. A recusa desta lógica, centrada nos lucros e não nas pessoas, é aquilo a que recorrentemente chamam de «preconceito ideológico». Está bem, abelha.
Divisão
Na divisão internacional do trabalho jornalístico financeiro, não cabe ao Financial Times estes tão flagrantes preparos ideológicos antidemocráticos. Isso é para os ecos periféricos. Na realidade, têm de saber que, tal como na Grécia, só há crise da dívida que não é soberana se o tão supranacional quanto pós-democrático BCE quiser. O banco central controla as taxas de juro dos títulos denominados na moeda que emite.
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
Cada dia piores
E ainda isto, como se explica?
Como a hipótese da iliteracia se torna pouco plausível (e inadmissível), tudo indica que a tutela pretendeu, à força toda, poder dizer que o número de consultas aumentou com a entrada em funções do novo governo. Para tal, procedeu à comparação do valor acumulado entre janeiro e abril (4 meses) com o valor acumulado (também desde janeiro) até setembro. Sugerindo assim, ao calcular a variação entre os dois valores, que houve um aumento de consultas entre o primeiro quadrimestre e o segundo (sendo que este último «quadrimestre» tem, segundo o governo, 5 meses).
Não surpreende assim que, nos termos da tabela, o aumento de consultas nos CSP, com a AD no governo, tenha sido estonteante. Segundo o ministério da Saúde, esse aumento, entre abril e setembro, mais que duplicou, atingindo um valor a rondar os 116%. Aliás, na verdade, quando feitas as contas desta forma - com ambos os valores acumulados desde janeiro - bastaria ter sido realizada apenas uma consulta entre maio e setembro para que a variação fosse positiva. Espantoso, não é?
Ora, o que se constata quando se corrigem os cálculos - comparando o número de consultas realizadas entre janeiro e abril com o número de consultas realizadas de maio a agosto (e não setembro, para que a comparação se faça por iguais períodos de quatro meses), lá se vai o aumento esfusiante das consultas realizadas desde a entrada em funções do novo governo. Pelo contrário, o que emerge é uma redução, em cerca de 6%, do total de consultas entre maio e agosto, face ao total de consultas entre janeiro e abril.
Este não é o primeiro exercício de contabilidade criativa do governo. Em junho, o atual ministério da Educação inflacionou o número de alunos que começou o ano letivo anterior sem aulas a pelo menos uma disciplina, de modo a criar a ilusão de que o atual ano letivo teria já começado com um valor inferior. E como se não bastasse, para ficcionar ter atingido a meta a que se propôs (diminuição em 90% dos alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano), ponderou os alunos nessa situação com o total de alunos sem aulas em dezembro do ano passado. Isto é, comparando indevidamente dois universos distintos.
O padrão começa, portanto, a tornar-se cada vez mais claro. Em vez de responder efetivamente aos problemas, que são estruturais e complexos, o governo prefere inventar e manipular números, para criar junto da opinião pública a falsa ilusão de que os mesmos estão a ser ultrapassados, por obra e graça do executivo. Até que as ilusões se desfaçam.
quarta-feira, 27 de novembro de 2024
Nos ombros de gigantes
A correta relação entre investimento e poupança escapa à sabedoria convencional, mas não escapou à melhor tradição keynesiana. Há tantas relações que escapam a tantos economistas convencionais sem memória, vivendo num eterno e tão ilusório presente...
terça-feira, 26 de novembro de 2024
Os números que Marques Mendes não mostrou
Optando por construir o gráfico apenas com a evolução do universo de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, Marques Mendes não se coibiu, porém, de incluir na infografia a informação relativa ao total de alunos sem aulas em dezembro de 2023 (cerca de 21 mil), a partir da qual, indevidamente, o governo chegou à dita redução, em 90%, do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo. Ou seja, à semelhança do governo, o comentador da SIC não resistiu à tentação, conveniente, de misturar «alhos com bugalhos».
Comparando o que é comparável, isto é, o total de alunos sem aulas, por um lado, e o número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, por outro, Marques Mendes teria chegado a conclusões distintas daquelas a que chegou. E poderia assim reconhecer que o problema da falta de professores se agravou em termos homólogos. De facto, como mostram os gráficos aqui em cima, o total de alunos sem aulas é hoje de cerca de 41 mil (21 mil em dezembro de 2023), sendo idêntico o número de alunos sem aulas a uma disciplina desde o início do ano (6% do total) e que, por isso mesmo, não permite neste âmbito falar de uma melhoria da situação face a 2023).
Não é a primeira vez, como sabemos, que Marques Mendes faz eco das narrativas do governo nesta matéria. Há cerca de dois meses caucionou igualmente o exercício de contabilidade criativa do ministério da Educação, através do qual a tutela inflacionou o número de alunos sem aulas no arranque do ano letivo em 2023 (de cerca de 72 mil para 324 mil), de modo a criar a perceção de que o ano letivo em curso tinha já começado de modo mais favorável. Só que não, como se procurou demonstrar aqui e se poligrafou aqui.
Combates pela história
Isso significa, do ponto de vista da metodologia, o contrário do que alguma literatura sobre o assunto tem feito, ao cindir previamente, de acordo com a subjetividade criativa de cada autor, a realidade complexa do campo da extrema‐direita em taxonomias classificativas substancialmente arbitrárias e que rompem a unidade essencial do objeto e das suas variantes, tornando‐o historicamente ilegível e fracionado. Fazem‐no, frequentemente, com o propósito ideológico de repescar para a boa causa a fatia da direita radical que consideram «útil» ou «respeitável» — de alguma forma, repetindo para o estudo da nova extrema-direita o que certa politologia se tem entretido a fazer com a análise do fascismo canónico: retalhá‐lo e anulá‐lo como época e como fenómeno global entre as duas guerras mundiais quase até ao seu «cancelamento» como realidade histórica, ou à sua redução ao caso isolado da Itália mussoliniana, onde nasceram o nome e a «coisa».
Fernando Rosas, Direitas velhas, direitas novas, Lisboa, Tinta da China, 2024, p. 12.
Ontem, foi um dia muito triste, dado o espetáculo deplorável de desmemória histórica promovido pelas direitas velhas e pelas que parecem novas, cada vez mais extremadas, com a participação de certa esquerda, cada vez mais desorientada. Felizmente, houve quem tivesse resistido, quem tivesse dito não. Haja esperança.
Ontem, ao fim da tarde, passei pela Almedina do Estádio e deparei-me, no escaparate globalmente deprimente do ensaísmo, com uma exceção, o mais recente livro de Fernando Rosas, um historiador que leio desde os anos 1990, um intelectual público marxista sempre combativo, com uma escrita de exemplar clareza. Li de pé a introdução e continuei a ler em casa, bem sentado. Tudo começa pela metodologia, realmente.
segunda-feira, 25 de novembro de 2024
Descarada aldrabice
Leitão Amaro, ministro da Presidência, exultou com a boa nova, afirmando tratar-se de «um dia histórico», alcançado por «um governo que enfrentou um problema [e] o resolve», qualificando a alegada queda como «um dos melhores resultados, uma das melhores novidades que os portugueses tiveram». Dando sinais de estar mais ciente do embuste, Luís Montenegro apressou-se a desvalorizar a «discussão sobre números», acrescentando que o governo os utiliza «apenas para poder aferir se as decisões estão a ter bom ou mau resultado».
Sucede, porém, que a suposta redução em 90% do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, face ao ano letivo anterior, suscita várias questões, que comprometem, de forma séria e factual, a alegada façanha:
a) Ao tomar como referência, para aferir o cumprimento do objetivo, o total de alunos sem aulas no final do 1º período em 2023 (20.887 alunos) - e não, apenas, os alunos sem aulas desde o início do ano letivo (cerca de 2.000) - o governo compara o que não é comparável. Os alunos sem aulas a uma disciplina desde o início do ano letivo, em dezembro de 2023, representam apenas 10% de todos os alunos que, nesse momento, não tinham aulas a uma disciplina.
b) Ao focar-se apenas nos alunos sem aulas desde o início do ano letivo, o governo descurou o universo de alunos que, por diversas razões (baixas médicas, licenças de paternidade dos docentes, etc.) estiveram sem aulas a pelo menos uma disciplina, por períodos de tempo muito variáveis. Como mostra o gráfico aqui em cima, este universo foi assumindo um peso cada vez maior, passando de cerca de 38% do total de alunos sem aulas a 10 de outubro (26 mil alunos), para 94% do total (39 mil alunos), a 20 de novembro.
c) Regista-se, além disso, a partir de 6 de novembro, uma inversão na tendência de redução do valor global de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina. Se nessa data o total de alunos (incluindo, portanto, os que estavam sem aulas desde o início do ano letivo e os restantes) era de 37 mil, atinge-se a 20 de novembro um valor já próximo dos 42 mil (agravamento de 12,5%). O que, de acordo com a estimativa da Fenprof, traduz um aumento de cerca de 10 mil alunos face ao período homólogo de 2023 (27 de novembro).
d) Os cerca de 41 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina significam, ainda, que o governo tem cerca de um mês para se aproximar do valor registado no final do 1º período do ano letivo anterior. Isto é, os quase 21 mil alunos registados em dezembro de 2023 e que o governo tomou, indevidamente, como referência para a alegada redução de 90%. Ou seja, o governo tem cerca de um mês para reduzir para metade (em cerca de 20 mil), o número de alunos que estão neste momento sem aulas a pelo menos uma disciplina.
Resulta daqui, portanto, neste momento, um agravar da situação face ao ano anterior, ao contrário do feito histórico que Leitão Amaro propagandeia. E tem razão o Primeiro-ministro: se os números não devem servir para alimentar «querelas», mas antes para aferir «se as decisões estão a ter bom ou mau resultado», fica hoje claro que as medidas do governo, face ao objetivo traçado, fracassaram. Afinal, não bastava mudar de governo para que os problemas se resolvessem, ao contrário do que Luís Montenegro assegurava há cerca de um ano.
domingo, 24 de novembro de 2024
Generosidade
O domingo estava luminoso no passado fim de semana, ao contrário do céu de chumbo de hoje. Descemos as escadas, “não olhes ainda”, fomos em direção ao Rossio e subimos. Lá estava o painel de azulejos, formando um cravo, com a incisiva palavra “cumprir” inscrita.
sábado, 23 de novembro de 2024
sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Um parágrafo, dois gráficos, algumas palavras.
O parágrafo é da autoria de Domenico Losurdo, em A luta de classes - uma história política e filosófica, editado, em 2015, pela Boitempo no Brasil. Já devia ter sido editado em Portugal, mas, como acontece com o melhor marxismo contemporâneo, não o foi.
Dois pesos e uma impunidade total
«Senhora presidente, o mundo não devia habituar-se à morte de palestinianos. A ver morrer crianças palestinianas à fome. A ver mães carregar os seus filhos de um lado para o outro, deslocados à força. Não devia habituar-se a ver jornalistas serem assassinados, nem trabalhadores humanitários a serem mortos.
A ver palestinianos serem detidos, sequestrados, carregados em camiões para serem torturados, abusados sexualmente e violados. O facto de sermos palestinianos não torna isso menos chocante, nem menos ultrajante. Talvez para alguns nós tenhamos a nacionalidade errada, a fé errada, a cor de pele errada. Mas nós somos humanos! E devíamos ser tratados como tal. Existe uma Carta das Nações Unidas para Israel que é diferente da carta que todos aqui têm? Digam-nos!
Existe uma lei internacional para eles e uma lei internacional para nós? Têm eles o direito de matar e o único direito que nós temos é o de morrer?»
Da intervenção de Majed Bamya, Vice-embaixador palestiniano na ONU, no dia em que os Estados Unidos vetaram mais uma resolução que apelava a um cessar-fogo imediato em Gaza. Isto é, os Estados Unidos ainda sob a administração de Joe Biden, que de forma consistentemente trágica, além de ceder armas, pouco ou nada mais fez, ao longo do último ano, que verter mediáticas lágrimas de crocodilo.
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Fascismo e antifascismo
Recordar é viver: um trol de extrema-direita, encerrado numa bolha reacionária estrangeira, usou a expressão “wokismo” nas cerimónias do 25 de abril e alguém o apanhou bem na RTP, com uma magnífica gralha.
Obsessões que resistem a factos: João Marôco e o alegado «retrocesso educativo» de Portugal
Trazendo à memória o ex-ministro Nuno Crato e a sua peregrina tese da «década perdida» na educação – que corresponde justamente ao período em que o nosso país alcançou os progressos mais notáveis na aferição internacional PISA –, João Marôco insistiu recentemente, no Público de 4 de novembro, na ideia de que Portugal regista um «retrocesso educativo que ninguém quer ver».
O recente debate sobre a disciplina de Cidadania foi o pretexto para o regresso a esta tese, com João Marôco a lamentar que a relevância concedida a esse debate não permita que se discuta aquilo que, em seu entender, realmente importa: o recuo, «sem precedentes, nas literacias de leitura, matemática e ciências dos alunos, evidenciado no último PISA».
Sucede, porém, que a ideia de um recuo de Portugal no PISA de 2022, que em termos comparativos caracterize o nosso país como um caso isolado de fracasso – por não acompanhar uma tendência internacional generalizada – carece de fundamento. De facto, a descida verificada face ao PISA de 2018 está em linha com o decréscimo de resultados registado à escala da OCDE e da UE, refletindo assim, em idêntico grau, o impacto da pandemia nas aprendizagens. Ou seja, sem que as diferenças observadas sejam estatisticamente relevantes, como a própria OCDE e o Iave cuidaram oportunamente de assinalar.
(...) Em suma, o que a evolução dos resultados de Portugal neste exercício internacional de aferição das literacias demonstra é, portanto, algo muito claro. Depois de uma aproximação progressiva à OCDE em todos os domínios, conseguida com diferentes governos, passa-se a uma situação em que os alunos portugueses acompanham a evolução de valores à escala da organização.
O resto do artigo pode ser lido no Público de ontem.
quarta-feira, 20 de novembro de 2024
Choque de procuras
Nesta linha, foi recentemente divulgado um novo estudo, em que se procede a uma comparação entre Portugal e Espanha, constatando-se que as semelhanças entre os dois países, em termos de trajetória macroeconómica, não se refletem na evolução do preço das casas. De facto, desde 2013, «os preços da habitação em termos reais cresceram mais de 80% em Portugal e menos de 30% em Espanha».
Dando nota que os preços das casas em Portugal estão sobrevalorizados desde 2017, os autores do estudo concluem que «o crescimento dos preços em Portugal tem sido impulsionado maioritariamente por forças da procura, com a oferta a ser ineficaz em contrabalançar essas pressões, ao contrário do que sucede em Espanha».
A expressão «choque de procuras», sugerida no estudo, é particularmente feliz para descrever o essencial da génese e natureza da crise de habitação, contribuindo para refutar a tese simplista e ilusória da falta de casas, que tende a ignorar, desde logo, a relação entre população e alojamentos. Aliás, deste ponto de vista, tudo indica que Portugal até construiu mais ao longo da última década do que o nosso país vizinho, como ilustra o gráfico aqui em cima. Em média, entre 2010 e 2023, foram licenciados 1,8 fogos por mil habitantes em Portugal e apenas 1,5 em Espanha.
Ora, se a crise de habitação decorresse simplesmente da falta de construção, como dominantemente se afirma (ao arrepio do que nos dizem as comparações internacionais), os preços das casas em Espanha teriam até subido mais que em Portugal. Porque, de facto, como assinalam os autores do estudo, «o crescimento dos preços é marcadamente guiado pelas forças da procura», sendo a oferta «incapaz de contrabalançar este efeito» e contribuindo até, «em alguns períodos, ainda que de forma ligeira, para o crescimento dos preços».
terça-feira, 19 de novembro de 2024
Teses
Apresentação e debate
Sábado, workshop Causa Pública sobre a crise de habitação
«A crise na habitação está hoje na ordem do dia em diferentes países como um dos problemas políticos que emergiram depois da crise financeira de 2008. Mas em Portugal a situação é pior do que na esmagadora maioria das economias desenvolvidas. A crise habitacional é hoje um dos mais graves problemas que a sociedade portuguesa enfrenta.
A Causa Pública tem vindo a trabalhar sobre a questão da habitação, sob a coordenação de Guilherme Rodrigues. No dia 23 de novembro iremos realizar um workshop em que apresentamos o primeiro de um conjunto de três relatórios dedicados a este tema.
Pretende-se apresentar o diagnóstico da crise habitacional portuguesa, discutir os seus custos sociais, mas também o seu impacto económico – que é muito relevante e que tende geralmente a ser ignorado no debate público. Finalmente, depois de anos em que foram lançados diferentes pacotes legislativos, queremos começar a debater políticas públicas que respondam efetivamente ao problema».
Com a participação de Alexandre Abreu e João Pereira dos Santos, num debate moderado por Ana Drago, sobre o estudo que será apresentado por Guilherme Rodrigues. Sábado, 23 de novembro, a partir das 14h30, no SPGL (Lisboa). A participação é gratuita, devendo as inscrições ser feitas por email: iniciativas@causapublica.org.
segunda-feira, 18 de novembro de 2024
Haja luz e esperança
«Estive na primeira reunião de líderes do G20, convocada em Washington no contexto da crise financeira de 2008. Dezesseis anos depois, constato com tristeza que o mundo está pior.
Temos o maior número de conflitos armados desde a Segunda Guerra Mundial e a maior quantidade de deslocamentos forçados já registrada. Os fenómenos climáticos extremos mostram seus efeitos devastadores em todos os cantos do planeta. As desigualdades sociais, raciais e de género se aprofundam, na esteira de uma pandemia que ceifou mais de 15 milhões de vidas.
Segundo a FAO, em 2024, convivemos com um contingente de 733 milhões de pessoas ainda subnutridas. É como se as populações do Brasil, México, Alemanha, Reino Unido, África do Sul e Canadá, somadas, estivessem passando fome. São mulheres, homens e crianças, cujo direito à vida e à educação, ao desenvolvimento e à alimentação são diariamente violados. Em um mundo que produz quase 6 bilhões de toneladas de alimentos por ano, isso é inadmissível. Em um mundo cujos gastos militares chegam a 2,4 trilhões de dólares, isso é inaceitável.
A fome e a pobreza não são resultado da escassez ou de fenômenos naturais. A fome, como dizia o cientista e geógrafo brasileiro Josué de Castro, “a fome é a expressão biológica dos males sociais”. É produto de decisões políticas, que perpetuam a exclusão de grande parte da humanidade.
O G20 representa 85% dos 110 trilhões de dólares do PIB mundial. Também responde por 75% dos 32 trilhões de dólares do comércio de bens e serviços e dois terços dos 8 bilhões de habitantes do planeta. Compete aos que estão aqui em volta desta mesa a inadiável tarefa de acabar com essa chaga que envergonha a humanidade.
Por isso, colocamos como objetivo central da presidência brasileira no G20 o lançamento de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Este será o nosso maior legado. Não se trata apenas de fazer justiça. Essa é uma condição imprescindível para construir sociedades mais prósperas e um mundo de paz».
Do discurso de abertura proferido por Lula da Silva, no início da Cimeira do G20, no Rio de Janeiro.
domingo, 17 de novembro de 2024
Obrigado, Celeste Caeiro
sábado, 16 de novembro de 2024
A ascensão da extrema-direita não começou hoje
Como escreve Manuel Loff, no Público (13/11), a segunda vitória de Donald Trump configura uma viragem histórica.
Esta vitória parece não encaixar nos modelos dos cientistas políticos da mesma maneira que a crise não existia nos modelos económicos neoclássicos. Abundam as análises, focando-se no papel da inflação e do custo de vida, no apoucamento, com décadas, de grande parte da classe operária americana, bem como o papel da desinformação e das redes sociais ou do jogo sujo da campanha baseada na mentira, no racismo, na xenofobia, na lgbtfobia, e num discurso populista reacionário, que pretende fazer retornar os EUA a um passado idílico que nunca existiu, contra uma suposta elite corrupta de que na verdade o próprio Trump sempre fez parte. Todos estes pontos, e outros, como o apoio demcrata ao genocídio, são válidos e cumulativos.
O facto é que Trump não ganha apenas nos EUA. Qualquer análise que se preze não pode esquecer que Trump faz, obviamente, parte de uma tendência generalizada nos países do norte dito global, onde a extrema-direita ganha ou, pelo menos, cresce de uma forma tal que influencia os termos do debate, extrema as posições da direita tradicional e coloca a esquerda na defensiva.
Trata-se, portanto, de uma viragem histórica com alcance internacional. Uma tendência óbvia é olhar para outras eras históricas semelhantes. Estamos, de facto, bem próximos do período após a Primeira Guerra Mundial, com a progressiva ascensão dos fascismos, a grande depressão, as guerras civis e que culminou na Segunda Guerra Mundial. As semelhanças são claras e têm sido notadas amiúde.
O que não tenho visto (e pode ser falha minha) é o encontrar das causas desta viragem na última viragem histórica de dimensões semelhantes – falo dos anos 70 e 80 do século passado.
sexta-feira, 15 de novembro de 2024
Espaços e tempos
quinta-feira, 14 de novembro de 2024
Memorável
Graças sobretudo ao sociólogo Carlos Fortuna, Professor Catedrático Emérito da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), o Mil Folhas já vai no décimo número. É o boletim quadrimestral da excelente biblioteca da FEUC, agora em obras de renovação.