29.12.10

Salada de abobrinha temperada com mostarda e alcaparras


Esta é uma salada que faço sempre que tenho abobrinhas bem frescas em casa. Geralmente uso a abobrinha italiana, mas a brasileira também serve. Uso o fatiador para que as fatias fiquem bem fininhas e tempero com um molho feito com alcaparras picadinhas, mostarda tipo dijon, azeite, sal e pimenta a gosto. Misturo tudo muito bem e finalizo com um pouco de parmesão ralado.

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Minha cidade

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A cidade onde moro é pequena e tem ruas arborizadas. As construções não tem mais de três andares e tudo de que preciso está a poucos quarteirões da minha casa: a mercearia do casal simpático, a padaria, a quitanda onde as frutas estão sempre frescas. Há uma loja de ferragens perto da igreja e uma praça onde velhos de chapéu jogam dominó.

Há sempre crianças brincando nos quintais e os vizinhos fazem silêncio durante à noite, ouve-se no máximo a sugestão de Bossa Nova ou de Ella Fitzgerald vinda de alguma janela aberta, o que alegra alguns de meus finais de tarde.

E sente-se o aroma de bife, ou pipoca, ou café, preparado nas cozinhas.

Sei que nem todos são felizes aqui, há sempre algum drama doméstico comentado entre as vizinhas, ou um adolescente solitário trancado em seu quarto, mas não há nada errado nisso, pois o que descrevo não é um ideal, é uma nostalgia.


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23.12.10

Torta de cenoura com parma e tomilho


Receita do Lucullian Delights. Não resisti, achei a ideia da torta muito interessante. Qualquer massa serviria para a base, mas estava particularmente curiosa em experimentar essa massa feita com batatas cozidas.

Fiz metade da receita e a minha torta ficou bem diferente da original. A massa antes de assar lembra aquela de um gnocchi. Ela ficou gostosa, mais leve do que uma massa feita só com farinha.

Substitui a pancetta por presunto de parma. A combinação de sabores é muito boa, mas se preferir usar só cenouras, também ficaria boa.




Torta de cenoura com parma e tomilho

massa:
5 batatas médias
100-150g de manteiga ou azeite (usei este último)
Cerca de 2 x ou 2 1/2 x de farinha
1,5 c chá fermento em pó
sal a gosto

cobertura:
1,5kg de cenouras
100g de pancetta ou bacon picado (ou presunto de parma como eu)
algumas folhas de tomilho
sal
azeite extra-virgem

Descaque e corte as cenouras em fatias bem finas. Refogue-as com um pouco de azeite junto com o tomilho até que fiquem macias. Adicione a pancetta e continue cozinhando até que as cenouras  dourem  ligeiramente e a pancetta fique crocante. Verifique o sal e adicione mais caso necessário, lembre-se de que a pancetta  é salgada.

Cozinhe as batatas até que fiquem macias, descasque (caso as tenha cozinhado inteiras) e passe pelo amassador de batatas (ou use um garfo, o que for mais fácil). Faça isso enquanto elas ainda estiverem quentes. Deixe esfriar um pouco antes de adicionar a manteiga (ou azeite), a farinha e o fermento. Corrija o sal. Adicione mais farinha caso as batatas sejam de uma variedade mais úmida. A massa deve ser elástica e não muito dura. Forre um refratário com essa massa reservando um pouco para decorar a parte de cima com faixas, caso deseje.

Espalhe as cenouras sobre a massa e asse à 175C por cerca de 30 min. (Minha torta levou mais tempo, retirei do forno depois que a massa começou a dourar).


22.12.10

Peras assadas com mel e alecrim



Peras assadas desta forma dão um bom acompanhamento para carnes como carneiro, porco e pato, também podem entrar em saladas de folhas com queijos azuis (gorgonzola ou roquefort). Eu usei 5 peras pequenas,  maduras, mas ainda firmes, lavei, cortei ao meio e retirei as sementes. (Corte em quatro se as peras forem grandes e junte um pouco de suco de limão para evitar que elas escureçam, eu me esqueci).  Coloquei em uma panela junto com folhas de um ramo de alecrim, 1 colher de sopa de azeite e 1 coher de sopa de mel. Levei ao fogo e aqueci apenas o suficiente para que o mel ficasse mais líquido e envolvesse bem as frutas junto com o azeite. Coloquei em um refratário e levei ao forno. Assei em fogo baixo até que as peras ficassem macias, cerca de 20-30 min. Se preferir pular a etapa da panela, aqueça o mel por alguns segundos no micro-ondas e misture as frutas com as mãos junto com os demais ingredientes.

(E sim, eu adoro usar mel na cozinha...)


21.12.10

Aquiles e a tartaruga


Não sei muito bem o que dizer deste filme do Takeshi Kitano. Para ser honesta, minhas opiniões sobre o diretor são conflitantes. Assisti a vários filmes dele e gostei de muito poucos.

Li que este é o último filme de uma trilogia sobre a arte e o artista. Os dois primeiros parecem ter sido mais autobiográficos. Aqui, a história começa com um garoto, Machisu, que nasce em berço de ouro e acaba em um orfanato quando o banco do pai vai à falência e este se suicida com a sua amante. O garoto gosta muito de pintar e passa o tempo todo desenhando em seu caderno.

Já adulto, Machisu trabalha em empregos sem futuro durante o dia e pinta no tempo que lhe resta. Tornar-se famoso por meio da pintura é sua ideia fixa, tanto que ele parece se distanciar da realidade e do contato com as pessoas para atingir sua meta. Assim mesmo, ele conhece uma mulher que o compreende e o apoia totalmente. Eles se casam e ele chega à maturidade sem obter sucesso. Entretanto, ele não desiste, sua esposa trabalha para sustentar a família. A filha tem vergonha dos pais e ganha dinheiro como prostituta.

Os quadros de Machisu são sempre rejeitados, ele não encontra um estilo próprio e está sempre fazendo experiências, chegando a extremos para dar "alma" e originalidade às suas obras. As atitudes do personagem e  as situações que ele cria e nas quais se envolve vão ficando cada vez mais patéticas e constrangedoras. 

O filme é deprê, apesar de ser chamado de "comédia". Há sempre pessoas morrendo ao redor de Machisu, mas sua cabeça está tão focada na pintura que ele parece não se importar com mais nada. Nem todo mundo tem talento, originalidade e sorte suficientes para deslanchar. Machisu é um caso que ilustra isso. Se ele se desse por satisfeito apenas em pintar sem perseguir o sucesso, sua vida seria bem mais simples.

O título do filme é inspirado no paradoxo de Zeno sobre Aquiles e a tartaruga, segundo Zeno, se Aquiles, o herói grego, apostasse uma corrida com uma tartaruga que estivesse alguns metros à sua frente, sempre que ele chegasse ao ponto em que a tartaruga estava no começo, ela estaria em um ponto mais  adiante, seguindo esse raciocínio, Aquiles nunca alcançaria a tartaruga. No filme, Machisu seria Aquiles e o sucesso seria a tartaruga. (Ao menos foi o que li em algum lugar, mas o final me fez questionar essa interpretação).


18.12.10

Kabocha cozida com açúcar e shoyu


Mais uma receita com kabocha. Andei numa "fase aboborenta".

Kabocha cozida bem simples, dá para fazer de várias maneiras, desta vez, preparei da seguinte forma: limpei e cortei um pedaço de kabocha em cubos médios, coloquei em uma panela de fundo grosso, polvilhei com açúcar (a gosto, os japoneses fazem mais adocicada), misturei com as mãos, como se estivesse fazendo um "peeling" nos pedaços de abóbora (vi na tv, parece que dá mais sabor), adicionei algumas colheradas de shoyu e outras de saquê (também a gosto e dependendo da quantidade de abóbora), tampei a panela e cozinhei em fogo baixo até que a abóbora ficasse macia sem se desfazer. Dei algumas chacoalhadas na panela de vez em quando para misturar. Não adicionei mais líquido para o cozimento, mas se houver necessidade, adicione algumas colheradas de água. A própria abóbora solta um pouco de líquido enquanto cozinha.

15.12.10

Cookies de aveia, tâmaras e nozes


Receita adaptada do blog da Clotilde. São cookies saborosos e cheios de coisas que adoro: tâmaras, nozes, aveia, sementes de linhaça. Eles são mais crocantes logo após retirados do forno, mas continuam firmes mesmo após alguns dias. 


Cookies de aveia, tâmaras e nozes

(cerca de 15 cookies)

2 c sopa de sementes de linhaça
140g de farinha integral 
80g (3/4x) de aveia ou quinoa em flocos
1/2 c chá de fermento em pó
1 c chá de grânulos de café instantâneo (nescafé)
50g de açúcar demerara
30g açúcar mascavo
90g nozes picadas
60g tâmaras picadas
60ml de óleo
80ml leite

Coloque as sementes de linhaça em uma pequena tigela e adicione cerca de 2 c sopa de água. Deixe descansar por 30 min até que a mistura "gelifique".
Preaqueça o forno à 180°C, forre uma forma com papel manteiga, alumínio ou unte-a muito bem.
Misture a farinha, a aveia, o fermento, o café, o açúcar demerara e mascavo, as nozes e as tâmaras. Adicione as sementes de linhaça, o óleo e o leite e mexa até que massa fique homogênea. Ela deve ser úmida o suficiente para que você possa moldar os cookies, mas não mole demais. Adicione mais leite ou farinha para ajustar a consistência caso seja necessário.
Retire pequenas porções da massa, molde bolas e achate-as um pouco. Coloque os cookies sobre a assadeira deixando algum espaço para que cresçam. (Minha massa ficou mais mole, mas eu preferi não adicionar mais farinha. Apenas fui derrubando porções sobre a forma com uma colher).
Asse por cerca de 20 minutos, até que dourem. Deixe esfriar antes de retirar da assadeira.


Throwing away the alarm clock

Conhecia vagamente Charles Bukowski como um escritor americano "porra-louca" e também vi alguns trechos de um filme baseado na vida dele há muito tempo. Este é o primeiro poema  "bukowiskiano" que leio, gostei muito.



Throwing away the alarm clock

my father always said, "early to bed and
early to rise makes a man healthy, wealthy
and wise."

it was lights out at 8 p.m. in our house
and we were up at dawn to the smell of
coffee, frying bacon and scrambled
eggs.

my father followed this general routine
for a lifetime and died young, broke,
and, I think, not too
wise.

taking note, I rejected his advice and it
became, for me, late to bed and late
to rise.

now, I'm not saying that I've conquered
the world but I've avoided
numberless early traffic jams, bypassed some
common pitfalls
and have met some strange, wonderful
people

one of whom
was
myself—someone my father
never
knew.

"Throwing Away the Alarm Clock" by Charles Bukowski, from The Flash of Lighting Behind the Mountain. © Harper Collins, 2004.

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12.12.10

Lombo recheado com nozes, maçã e linguiça acompanhado de molho de frutas vermelhas



 Receita da revista Taste of home. O recheio é ótimo (apesar de eu ter me esquecido do ovo) e o molho também fica muito bom. Acho que a géleia pode ser de outras frutas, pensei em laranja ou abacaxi. 




Lombo recheado com molho de frutas vermelhas


3/4 x de nozes 
340g de linguiça de porco (usei um pouco menos, procure uma linguiça sem muita gordura)
1 maçã média descascada e picada 
1 dente de alho picado
1 c sopa de salsinha picada
1 ovo batido (esqueci, mas não senti falta)
1 lombo de cerca de 1,5-2 kgs
sal e pimenta do reino
manteiga derretida para pincelar


molho:
1 x de geléia de alguma fruta vermelha (ou outra de sua preferência)
2 c sopa de mel
1 c sopa de passas
2 c chá de vinagre
1/4 c chá de molho de pimenta

Bata as nozes no processador até obter uma "farofa". Reserve.

Refogue a linguiça desfeita com as maçãs e o alho até que a carne cozinhe. Escorra o excesso de gordura e líquido. Deixe esfriar um pouco e junte as nozes moídas, a salsinha e o ovo. Acerte o tempero adicionando sal e pimenta. Lembre-se de que a linguiça já contém sal.

Faça um corte no meio do lombo, no sentido do comprimento até mais ou menos a sua metade. Pense nele como um livro aberto. Agora, faça um corte em cada uma das "abas" começando de dentro para fora para formar mais uma "aba". Você terá um retângulo aberto. Cubra a carne com filme plástico e bata com um martelo apropriado para diminuir a espessura da carne. (A minha não ficou assim tão fina, tinha cerca de 1,5cm). Se quiser/achar necessário, tempere o lombo com um pouquinho de sal, isso depende da quantidade de sal da linguiça que usar.

Pincele a superfície da carne com a manteiga derretida, espalhe o recheio sobre o lombo aberto e enrole como um rocambole começando pela parte mais comprida (ou como achar que ficará melhor). Amarre com um barbante. Coloque em um refratário, pincele com mais manteiga e asse por cerca de 1h30. Espere uns 15 min antes de fatiar e sirva com o molho.

Molho: Aqueça rapidamente os ingredientes em uma pequena panela até que a mistura fique uniforme.

10.12.10

Armadillo


Armadillo é um documentário de Janus Metz que acompanha um grupo de soldados dinamarqueses enviados para uma base chamada "Armadillo" no Afeganistão. Eles integram o Isaf, o exército da Otan. Ele começa ainda na Dinamarca com os rapazes se despedindo das famílias e participando de uma "festa" com bebidas e strippers antes de passarem seis meses em missão. Vários dentre eles ainda têm espinhas nos rostos e suas mães não conseguem esconder sua apreensão diante do que aguarda os filhos.

Em seguida, vemos os rapazes assistindo videos pornôs no computador ou jogando videogame para se distraírem na base. O lugar é praticamente um forte com muros, cercas de arame farpado e torres de vigia. As patrulhas que eles fazem são sempre tensas porque qualquer pessoa é um inimigo em potencial e eles são alvos fáceis de tiros e de minas terrestres, basta que se afastem cerca de um quilômetro da base para que entrem em território controlado pelo taliban.

Pelo documentário, vê-se claramente que a ideia de "conquistar mentes e corações" é risível. Os morteiros lançados pela base caem sobre casas, campos e matam civis. As patrulhas passam por cima das plantações dos camponeses causando estragos. Sempre há gente indo até a base para reclamar a perda de animais e outros pertences.

Um dos momentos mais dramáticos ocorre quase no final dos seis meses de serviço da tropa. Ocorre um tiroteio e os soldados matam três talibans em uma vala, na verdade, eles vão lá e descarregam os cartuchos nos três homens já mortos e depois há uma sugestão de que tiraram fotos ao lado dos cadáveres. Algo que causou muita comoção na Dinamarca. Isso não foi mostrado, mas pelas imagens de como um dos soldados revista os corpos para encontrar armas, você percebe que os rapazes passam a considerar algumas coisas com indiferença. O sentimento é o de caçar ou ser caçado e há euforia quando o resultado é favorável.

A justificativa de todos diante das câmeras é a de que apenas quem esteve lá pode dizer algo sobre o que aconteceu. As filmagens se focam em um grupo de uns cinco soldados que vão ao Afeganistão pela primeira vez. É possível ver como eles mudam com o tempo, endurecem. Há os "natural born killers", enquanto outros preferem se distanciar de tudo aquilo de vez em quando. Ao final, dos cinco, apenas um deixou o exército e tornou-se eletricista, os demais retornam (ou pretendem retornar) ao Afeganistão em 2011.

Guerra produz os efeitos de uma droga? Os soldados sentem falta da adrenalina?  Do companheirismo? Talvez. Ou talvez seja como ir à Lua. Voltar para a "Terra" e viver no meio de pessoas que nunca estiveram no "espaço" acaba fazendo com que eles se sintam estranhos. Mas essas são meras suposições.

9.12.10

Kabocha cake


Do programa da NHK. Resolvi dar uma "fuçada" no site e estou satisfeita com os resultados até o momento. Este não é exatamente um bolo, a consistência é mais parecida com a de um pudim, fica com um sabor de abóbora kabocha (abóbora japonesa) bastante agradável, é leve, doce na medida certa (para mim). Sem falar que fica pronto em um segundo...

Alguém escreveu que você pode adicionar uma pitada de canela para um perfume extra, eu esqueci, mas gostei assim mesmo. A superfície do "bolo" incha, mas isso não significa que ele cresça, é só a "casquinha" mesmo.



Kabocha cake

300g de abóbora kabocha
100g de açúcar
3 ovos
200ml de creme de leite
4 c sopa de farinha
50 g de manteiga derretida

Descasque e corte a abóbora em cubos, leve ao micro-ondas até que fique macia (cerca de 4-5 min dependendo do tamanho dos pedaços que cortar).
 
Coloque a abóbora no liquidificador junto com todos os outros ingredientes. Bata bem e derrame sobre uma forma forrada com papel manteiga ou muito bem untada para que não grude no fundo. 

Asse à 170C por cerca de 45min.

7.12.10

Herta Müller - Herztier


Herta Müller ganhou o Nobel de Literatura de 2009, antes disso, nunca tinha ouvido falar nessa autora romena que escreve em alemão. Fiquei curiosa em ler algo dela, lembrava que seus temas eram relacionados à época em que a Romênia estava sob a ditadura de Ceaucescu, mas era tudo. Leio poucos livros escritos por mulheres, o panteão literário ainda é bastante masculino. E, para falar a verdade, eu cresci com um certo preconceito em relação à "escrita feminina". São raras as escritoras que se salvam em minha lista. Acho que isso é algo que devo repensar.

O livro contém alguns elementos autobiográficos e é narrado por uma estudante universitária na casa dos vinte anos que compartilha um dormitório com outras garotas. Uma de suas colegas, Lola, é encontrada morta um dia em circunstâncias estranhas. A narradora conhece três garotos, aparentemente conhecidos de Lola, que procuram entender o que aconteceu. A narradora e esses três rapazes - Kurt, Edgar e Georg - compartilham o mesmo sentimento de impotência e revolta em relação ao regime e tornam-se amigos. Os quatro lêem livros proibidos, escrevem textos críticos e, por isso, acabam sendo investigados pela polícia. Eles são interrogados e ameaçados constantemente.

Depois de terminarem a faculdade, cada um deles é empregado em lugares diferentes, mas  permanecem em contato e continuam sendo vigiados. Os amigos apoiam-se um nos outros para suportar o estado de tensão em que vivem. Eles escrevem cartas nas quais determinadas palavras têm significados que apenas eles podem compreender e servem para alertar uns aos outros sobre quando estão em perigo.

Além da tensão constante dos personagens principais, há a preocupação de suas mães,  elas escrevem cartas comentando as visitas de "agentes" do governo e, por meio delas, temos uma visão do cotidiano das pessoas comuns nos vilarejos. É um mundo onde os sonhos são reprimidos e cada um precisa se concentrar nas necessidades do dia a dia. Em suma, uma vida insuportável para os quatro jovens.

É um livro de imagens estranhas e belas, composto de textos curtos e metafóricos. Como é o primeiro livro da autora que leio, não sei se essas são características de seu estilo. Gostei, é diferente de tudo o que já li e não sei muito bem como classificar.

O título foi traduzido para o português (de Portugal) e para o inglês como "A terra das ameixas verdes". "Herztier" é uma expressão difícil de traduzir. A autora a usa para descrever algo frágil e inquieto dentro dos personagens. ("Herz" = coração, "Tier" = animal).


Traduzi um trecho:

"Eu conhecia a anã do Praça Trajano. Ela tinha mais pele do que cabelos sobre a cabeça, era surda-muda e carregava um tapete de fibras como as cadeiras descartadas sob as amoreiras dos moradores antigos.  Ela comia o resto das bancas de legumes e engravidava todos os anos dos homens de Lola. Eles vinham à meia-noite depois do último turno das fábricas. A praça estava escura. A anã não conseguia fugir a tempo porque não ouvia quando alguém se aproximava. E não podia gritar.

Na estação, perambulava o Filósofo. Ele tomava os postes telefônicos e as árvores por homens. Discorria sobre  Kant e o universo dos carneiros que comiam a grama para o aço e a madeira. Ia de mesa em mesa nos bares, bebia os restos e enxugava os copos com sua barba longa e branca.

Na frente da praça do mercado, sentava-se o velho com o chapéu feito de alfinetes e jornal. Ele arrastava um trenó com sacos ao longo das ruas no inverno e no verão. Em um deles, havia jornais dobrados. O velho fazia um chapéu novo todos os dias. No outro, estavam os chapéus usados. 

Apenas os loucos não teriam mais levantado  a mão no auditório. Eles trocaram o medo pela loucura.

No entanto, eu podia contar pessoas na rua, contar a mim mesma, como se fosse encontrar-me casualmente. Podia dizer a mim mesma: "Hei, você, Ninguém!". Ou: "Hei, você, Legião!". Mas eu não conseguia enlouquecer. Ainda estava lúcida."