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terça-feira, 29 de agosto de 2017

NINGUÉM ESCREVE AO CAPITÃO

Ninguém escreve ao capitão
(Publicado no semanário O JORNAL em 29 de Agosto de 2017)

Em geral, quando as pessoas pretendem que lhes façam um favor, mesmo simplesmente na forma de opinião ou de conselho, não deixam de contactar quem os pode ajudar. Mas poucos se decidem a oferecer uma palavra de afecto, de carinho, de esperança e de incentivo para que esse alguém suporte com melhor ânimo as dificuldades da idade.

A frase do título é o resquício da memória de um livro brasileiro, já de há muitos anos, que deixou a ideia de que as pessoas menos gratas e solidárias se encarregam de «passar à reforma» aqueles que deixam de lhes ser úteis. O tema também foi desenvolvido pelo escritor Virgílio Ferreira em «Manhã Submersa» quando o personagem principal, estando num lar de idosos, se lamentava de a filha não o visitar. Num lar com cerca de 100 idosos, apenas menos de uma dezena recebem visitas semanais de familiares e/ou amigos.

Não gosto de referir casos concretos, mas eles ajudam a compreender o que se passa na sociedade, por estimularem a reflexão e a curiosidade sobre o que se passa à volta. Continuo a receber, e-mails mas a quase totalidade é constituída por reenvios (FM) de remetentes que se prestam a servir de carteiros, arremessando para as caixas de entrada dos «amigos» das suas listas de endereços tudo aquilo que recebem. Estou convencido de que muitos reencaminham coisas que não viram nem leram. É impossível que um remetente de álbuns de imagens de várias partes do planeta arranje tempo para ver todas as imagens que reencaminha. Essas imagens pouco interessam a um idoso sem condições de viajar pelo mundo e que está mais interessado em analisar os comportamentos sociais da humanidade e as atitudes de governantes que agem em função de pressões de grandes empresários que actuam por interesse próprio, sem escrúpulos nem respeito pelos outros que serão atingidos pelos efeitos de jogos financeiros.

Há um outro, já na terceira idade, que envia quantidade de vídeos pornográficos que apenas podiam fazer sofrer um idoso qua já passou a fase de sentir tais prazeres e teria o desgosto de nunca ter tido oportunidade para tanta luxúria.

Mas nem tudo é mau. Há quem comungue as intenções de procurar melhorar a humanidade, pela recuperação de valores éticos e cívicos, enviando mensagens muito estimulantes. Uma amiga de Minas Gerais, bisavó, constitui um modelo de solidariedade e de amor ao próximo, com mensagens maravilhosas. Outra, do Cacém, envia mensagens a perguntar pelo estado de saúde do destinatário e a informar da evolução da sua, por vezes com pormenores da fraca qualidade do apoio que recebe que confirmam a ideia com que se fica através de notícias frequentes. Casos como este prestam-se a sermos úteis com conselhos e sugestões que alimentem a esperança e a aceitação serena do inevitável. É positivo podermos colaborar na esperança e na eliminação do stress.

A felicidade das pessoas depende mais do bom relacionamento e das amizades do que do saldo da conta bancária ou do património material e será bom que as pessoas se sintam compreendidas e apoiadas. Um verdadeiro amigo é como o sol: mesmo que as nuvens não permitam vê-lo, sabemos que ele está lá.

Qualquer idoso tem muita necessidade de afecto, coisa que hoje não é muito fácil obter em qualquer situação real. A humanidade precisa de recuperar valores cívicos para que as pessoas sintam amizade e felicidade, em vez de desprezo. Uma pessoa precisa de sentir que tem utilidade para si e para os outros, para evitar a tentação da autodestruição psíquica ou mesmo física.

António João Soares
22 de Agosto de 2017

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terça-feira, 16 de junho de 2015

IDOSOS PRECISAM DE SOLIDARIEDADE



Tenho ido visitar pessoa amiga internada numa Casa de Repouso em CASCAIS e saio sempre preocupado, com as condições do fim da vida de muita gente que, embora se encontre num lar com pessoal carinhoso e eficiente, vive abandonada pelos familiares e amigos que o esqueceram. Há pessoas muito deficientes e afastadas do mundo real, que precisam de receber visitas frequentes de familiares e de amigos.

Por seu lado, as comunicações dos residentes entre si raramente são animadoras, dado o seu estado de saúde mental e desgaste psíquico agravado pelas saudades dos seus anteriores «amigos» conhecidos e familiares que deixaram de lhes dar o indispensável afecto e carinho.

Muitas pessoas que conhecem um destes idosos a quem dirigiam palavras amáveis, de ocasião, provam agora que não sentiam por eles um mínimo de afecto, de amizade. Por vezes, perguntam por eles no café ou no restaurante onde os encontravam, mas não dão um passo para fazer um gesto, um carinho, um afago que anime e melhore a qualidade de vida psíquica da pessoa de quem era suposto serem amigas. Não interessa levar uma guloseima, mas é importante dizer uma palavra amiga, fazer uma carícia na mão ou na face, o que não custa dinheiro. Mesmo quem trabalha o dia inteiro, pode fazer isso, ocasionalmente, depois do trabalho ou no fim-de-semana.

A SOCIEDADE É POUCO SOLIDÁRIA E OS IDOSOS SÃO OS MAIS PENALIZADOS POR ISSO. PENSEMOS NAQUILO QUE GOSTAREMOS DE SENTIR QUANDO ESTIVERMOS EM SITUAÇÃO SEMELHANTE.

Não custa muito, num momento mais livre, comunicar com um conhecido que esteja solitário em casa ou internado num lar e transmitir-lhe uma palavra de conforto, de amizade, de afecto que o ajude a enfrentar com mais ânimo as suas dificuldades. E, numa visita a uma casa de repouso ou lar, procurar transmitir afecto também a outros residentes.

É preciso alertar na Internet as pessoas para tal necessidade de solidariedade. Devemos procurar melhorar a afectividade da humanidade.

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quinta-feira, 14 de junho de 2007

Solidão ... de Chico Buarque

Solidão ...

"Solidão não é a falta de gente para conversar, namorar, passear ou
fazer sexo...
Isto é carência!

Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes
queridos que não podem mais voltar...
Isto é saudade!

Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vezes para
realinhar os pensamentos...
Isto é equilíbrio!

Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe
compulsoriamente...
Isto é um princípio da natureza!

Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
Isto é circunstância!

Solidão é muito mais do que isto...
SOLIDÃO
é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela
nossa alma."

(Chico Buarque de Holanda)

Uma análise interessante de um problema que afecta principalmente os reformados, mas a que não são alheios muitos, mais jovens.

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quarta-feira, 16 de maio de 2007

Solidão

Solidão, maleita grave da sociedade actual

A solidão, principalmente nos idosos, não é um fenómeno recente mas, nos últimos anos, tem assumido proporções preocupantes. Os textos frequentes em blogues mesmo que revestidos de arte literária, impessoal, e a circular por e-mail, evidenciam ao mesmo tempo crescimento da frequência do fenómeno e o aumento da sensibilidade para esta terrível maleita da sociedade moderna. A meu ver, de leigo na sociologia e na psicologia, é, realmente, uma doença agravada pelas alterações dos valores éticos e morais que enformam a sociedade moderna, demasiado competitiva, focada no dinheiro e na ostentação, muitas vezes fingida, esquecendo as relações humanas e familiares.

O aumento recente da escolaridade, levou filhos de famílias humildes pouco acima de analfabetismo a subirem muitos degraus acima do nível dos progenitores à custa de grandes sacrifícios e privações destes. Acontece com demasiada frequência que essa nova geração, vaidosa do seu estatuto de Dr., em vez de mostrar pelos pais gratidão por aquilo que lhe deram, exige-lhes carro e casa própria, passa a sentir vergonha deles e evita-os, chegando ao ponto de evitar contactos dos avós com os netos «para que não lhes ensinem coisas retrógradas». E quanta experiência lhes podem transmitir, enriquecendo a sua formação como futuros cidadãos responsáveis e dignos. Os pais-avós passam a ser considerados como escória, nem para acompanhar os netos servem. Ficam condenados ou a acabar num lar ou a ser encontrados sem vida em casa alguns dias depois de finarem.

Apreciei há dias um texto de Mário Relvas repleto de humanidade e de sensibilidade em relação aos outros, aos idosos, aos que já não têm esperanças que lhes dêem força de ânimo por falta de projectos e de objectivos. Descreve uma situação impressionante, mas que infelizmente não é única, pois abrange a generalidade dos idosos que deixam de sentir o carinho de familiares e amigos e da sociedade em geral. A sociedade está doente e a solução não depende apenas dos governantes, mas de todos e de cada um de nós. Aquele texto é uma contribuição válida mas são precisas outras. Também relembro as palavras de Naty quando diz «a solidão, a falta de carinho e a ingratidão são as piores coisas que me podiam ter acontecido»

Há que combater a solidão que apenas traz inconvenientes para a saúde. Repare-se que não estou a referir-me ao isolamento voluntário para reflexão ou para um trabalho individual. Isso não é solidão. Porém, o primeiro passo para evitar e combater a solidão tem de partir do íntimo do próprio. Fui professor voluntário, gratuito, de três academias de seniores, e verifiquei que a maior parte dos alunos e alunas não estavam ali para aprender, mas apenas para se sentirem no meio de outras pessoas, para combaterem a solidão que sentiriam se ficassem em casa. Todavia, dado esse primeiro passo, pouco faziam para interagirem com os outros, para se interessarem por um estudo, um hobi, um projecto, de preferência colectivo.

Os idosos precisam de ajuda, mas como em tudo, ajuda significa uma colaboração numa acção que alguém está a desenvolver, isto é, só pode ser ajudado quem está a fazer algo e solicita e aceita essa colaboração, como reforço da sua acção. A ajuda não substitui o esforço do interessado e não se impõe; neste caso deixa de ter esse nome.

A solidão da idade começa a ser evitada quando ainda se tem autonomia, actividade. A troca de e-mails, a «brincadeira» de um blogue em que se trocam comentários, são formas de contactar, de continuar a viver intelectual e espiritualmente. A ida à rua, e meter conversa com as pessoas que se encontram, começando por um simples «bom dia», por um sorriso, é o mínimo que se deve fazer, daí podendo vir um relacionamento mais cordial e a amizade, a consideração dos outros.

Mas, infelizmente, as características dos portugueses são mais propícias ao fecho em si mesmos, à desconfiança, à inveja, à cara dura, que nada facilitam nos contactos e conduzem às carências de afecto e à solidão.

Nos momentos de juventude, eram jovens atléticos, cheios de pujança física, com ideais, actos de bravura, de valentia, de sonhos, ilusões e desconsolos, mas chegados os cabelos brancos, passam os dias, muitas vezes, silenciosos, a jogar as cartas no jardim com companheiros de «infortúnio», que sofrem do mesmo mal, nada fazem, apenas vislumbram o fim, na incerteza do futuro.

E como diz M Relvas, importa praticar a camaradagem, com cidadania, humildade, por forma a chegar a idoso um dia, sem ser velho, porque velho é aquele que perde os ideais, que deixa de sonhar e de acreditar. E, para evitar a solidão e ajudar os semelhantes a vencerem a sua, de mãos dadas, unidos, olhemos uns pelos outros, continuando a sonhar!

A teimosia em cultivar a saudade, a memória do que houve de melhor na vida, não é muito saudável e, por vezes, provoca dor e desgosto. Nem sempre é fácil ultrapassar a dor de uma perda de algo muito precioso, mas é possível. Não se é infiel a uma memória se usarmos a medida higiénica de a colocarmos um pouco de lado e pensarmos na nossa vida agora com vista ao amanhã, com aquilo que temos à mão, procurando ser tão felizes quanto possível com aquilo de que dispomos. O sol, as flores os sons, os aromas da primavera devem ser apreciados e usados para nosso prazer. Não é saudável agarrarmo-nos demasiado ao que é impossível reviver, embora nunca devamos esquecer os momentos felizes que tivemos. Conheço pessoas que curtem a infelicidade porque, a cada momento menos agradável recordam e comparam com os momentos em que foram mais felizes. Isso está errado, porque só agrava o vida no dia de hoje. E nós temos obrigação de ser felizes hoje, agora. Se não o formos agora, nunca o seremos, porque o amanhã não existe (teoricamente, existirá ou poderá vir a existir, mas então será como presente, será o agora de então)! Temos de criar entusiasmo para que o amanhã, quando for presente seja vivido da forma mais feliz.

Sugere-se a leitura de:
- De Mário Relvas, «Continuemos a sonhar»
- António Barreiros, «Os meninos de sua mãe»
- De Naty, «Solidão»

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