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Ontem o dia estava lindo, com sol
e temperatura amena convidativa ao passeio, à visita. Era domingo. Em criança
lembro com alguma saudade este dia da semana. Hoje, no crepúsculo do caminhar,
há um recordar de um tempo e de um modo. Fui ao Museu Ferroviário, aqui tão
perto de mim. Fiquei encantado. Gostei de tudo: famílias, crianças, vida,
alegria, vozes, olhares felizes e muito para ver no domínio do caminho de ferro.
O que me entristece, muitas
vezes, é o vazio de pessoas e do que elas transportam. Ontem foi, durante algum
tempo, diferente. Por questões de gestão e de trabalho, preciso de cada segundo
no meu viver. Tudo é contado. Não tenho mais tempo. Esgota-se o bem mais
precioso: a vida. E, porque necessito de ser parco na gestão do tempo, resta-me
quase sempre tanta solidão, porque só nela consigo conceber este caminho
pictórico, cheio de propósitos que alguns entendem e muitos outros não.
E mal começou está já a acabar a
minha exposição de pintura que intitulei “Tatuagens”. Era, inicialmente, para
ser comungada com uma tatuadora, mas outros andares deixaram-me só nesta
exposição, que é, como tantas vezes repito, um hino à mulher e aos seus encantos. De um
domingo cheio de gente no museu dos comboios, acabei o dia na galeria que
acolhe as minhas obras por mais uns dias, num mar de muitos silêncios e olhares
raros.
E dos julgamentos de valor há uns
que são mais especiais que outros, ou fosse
tudo uma questão de interesse e de gosto. As pessoas que retrato,
porque as retrato, gostam particularmente de ver como o outro ( que sou eu) as
vê, sendo a visão obtida através de um processo de limitados recursos, que
valem pela singularidade da unicidade da criação, da peça única, do objecto
raro, da obra que alguns chamam prima e outros adjectivam pela negação. Eu,
apesar dos muitos nãos, sou de continuar até ao crepúsculo.
E vos deixo com as palavras do dramaturgo, poeta e actor francês do
século XX, Antonin Artaud, que um dia
disse:
“ Ninguém alguma vez escreveu ou pintou, esculpiu, modelou, construiu
ou inventou senão para sair do inferno.”