Mostrar mensagens com a etiqueta José Carlos Soares. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta José Carlos Soares. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 22 de maio de 2019

JOSÉ CARLOS SOARES

[AO MENOS ISSO: O VENTO]


Ao menos isso: o vento
é brisa, o sol
não queima,

a espera tece
a trajectória
da bala. Ao menos

o relógio no chão, o pulsar
das mãos na terra,

flor e sangue
na mesa, cascas

avivando o lume.


Café Candelabro [com Eduardo Matos], Edições Guardanapo [Porto], 2017.

domingo, 28 de janeiro de 2018

JOSÉ CARLOS SOARES

[ABRES O DICIONÁRIO]


Abres o dicionário
não querendo traduzir
a sombra, apenas
navegar

na restante sabedoria
dos clássicos. Uma ou outra
mancha na camisa
acende-se

na procura dos vocábulos.
Há um desastrado voo
em tudo isto:

O que vejo
é uma foice
degolando esperas

e a noite imensa,
amarga,
nos joelhos.

Telhados de Vidro, n.º 22, Averno, Lisboa, 2017.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

JOSÉ CARLOS SOARES

[AO RELENTO DORMEM]


Ao relento dormem
as palavras

com os pés voltados
ao vazio. Só as mãos

dos que cortaram
as árvores
sabem como pode o inverno
arrefecê-las.


Igor Dgah, DSO, Coimbra, 2014.

domingo, 11 de novembro de 2012

JOSÉ CARLOS SOARES

[NADA OBTERÁS]


Nada obterás
a não ser a perda,

a cor cega
que dentro já separa
a paz secreta

dos espinhos. Inevitável
sombra insubmissa
decide por que passos
se prepara a entrega.


Do lado de fora, Edições 50 Kg, Porto, 2012.

domingo, 5 de junho de 2011

JOSÉ CARLOS SOARES

[NÃO VENHAS DEVAGAR]


Não venhas devagar
com tanta pressa. Deixa
que derrame a fome
nos quintais e a maldição

suspeite do suave
aroma do delírio. Envia
o que te sobra
ou rouba

o mais pequeno passo
por um fio.


Este perder-se [de Areia de Same], edição do Autor, Porto, 2011.

domingo, 29 de agosto de 2010

JOSÉ CARLOS SOARES

[SURPREENDI-O VIVO]


Surpreendi-o vivo
num cemitério de esperas. Bebia
o sangue das horas

enquanto a memória desenhava
ventos passeando
pelos cantos da boca.


Telhados de Vidro, n.º 5, Averno, Lisboa, 2005.

terça-feira, 29 de julho de 2008

JOSÉ CARLOS SOARES

[DESCIA A TEMPESTADE]


Descia a tempestade
como quem vai
comprar cigarros ao outro

lado da vida. Lá ia
de mãos nos bolsos de alguma
inclinação. Subia

para os comboios na estação
mais fria, lia

sobretudo nobre
azul e poesia.


Bátega, edição do Autor, Porto, 2006.