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terça-feira, 13 de agosto de 2019

André Oliveira & vários autores, ALMANAQUE (2018): verdades essenciais

 
        Noutros tempos, quando o país era eminentemente rural, um almanaque era, depois do missal, o breviário que encontrava guarida em todos os lares, concentrando numa mesma publicação tudo quanto era necessário à travessia do ano sem percalços, da meteorologia aos dias santos a guardar. Eça de Queirós, que escreveu sobre o assunto como ninguém, na apresentação do Almanaque Enciclopédico para 1896, falava de como estes livrinhos singelos mas profusos guardavam as «verdades essenciais que a humanidade necessita saber, e constantemente rememorar».
            André Oliveira (Lisboa, 1982) – um dos mais prolíficos argumentistas da BD portuguesa –, ao escolher para esta colectânea o título Almanaque, teve, por certo, a intenção de espelhar a diversidade de que o volume se compõe. São 24 «curtas de BD», algumas inéditas, outras publicadas na revista Cais, em parceria com outros tantos desenhadores: André Diniz, Rui Lacas, Phermad, Bernardo Majer, Pedro Serpa, João Lam, Nuno Frias, Afonso Ferreira, João Vasco Leal, Luís Louro, Patrícia Furtado, Miguel Andrade, Daniel Viçoso, Tiago Lobo Pimentel, Selma Pimentel, Filipe Andrade, Darsy Fernandes, Catarina Paulo, João Sequeira, David Cerqueira, Susana Resende, Susa Monteiro e Marta Teives. Parte destas narrativas caracterizam-se pelo humor, cujos melhores exemplos serão o nonsense garoto do díptico «Coisas que o t-rex não consegue fazer» e «Coisas que o dentes-de-sabre não consegue fazer», com desenhos de Pedro Serpa; ou ainda «Se Janeiro deixar» (com João Sequeira), a lembrar os Gato Fedorento.
            Mas o melhor André Oliveira surge, quanto a nós, naqueles relatos em que perpassa uma melancolia fina, uma angústia existencial insistente, em confronto com o sentimento trágico da vida, a sua fragilidade, e que por isso mesmo procura valorizar o que é verdadeiramente importante para si, denunciando um romantismo que não vai bem com a modernidade suicidária que vivemos: a constância no amor, os vínculos familiares, a fidelidade a si próprio, a memória da inocência, quantas vezes ao sabor dos caprichos do acaso – outras verdades essenciais que Eça estava longe de  desconhecer, mas que não tinham a primazia para o público, numa época que ainda não voltara costas ao campo e se orientava pela regularidade das estações. «Mesmo assim, abandonei-te» (com desenhos de Rui Lacas), «No meu lugar» (Filipe Andrade), «Saudade» (Darsy Fernandes), «Nina» (Catarina Paulo) ou «Narciso» (Susa Monteiro, também autora da capa), são alguns dos momentos inexcedíveis deste livro.

 Almanaque, Bicho Carpinteiro, Lisboa, 2018