Mostrando postagens com marcador Invisibilidades. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Invisibilidades. Mostrar todas as postagens

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Invisíveis porque querem (parte 3)

twittandoAna Cris e Fernando Trevisan, twittando às escuras!O invisibilidades II, segunda edição do evento de ficção-científica do itaú cultural, foi em setembro e eu ainda não terminei o meu relato.Portanto, muito tempo me distancia das duas mesas sobre as quais vou escrever - justo eu que não fazia anotações pois fotografava - vou tentar puxar pela memória...

O Domingo estava um pouco mais vazio: para alguns, era sinal que o sábado não tinha sido bom, para outros, foi o almoço de domingo, para uma terceira parte, uma turma teria exagerado na cervejinha de comemoração da noite anterior, e para o quarto final de teóricos especuladores, foi a pequena discussão sobre Star Treck que afastou uma parcela visível do público.

Domingo, segundo dia - Mesa 1
Por uma crítica de Ficção-Científica no Brasil: primeiros passos


Rodolfo LonderoRodolfo LonderoCheguei atrasado para a mesa com Adriana Amaral, Alfredo Suppia e Rodolfo Londero. A mediação foi de Rodolfo S. Filho, que tive oportunidade de conhecer no dia anterior.

A primeira impressão que tive é que havia algo errado com o nome da Mesa. O correto deveria ser algo como "a jovem pesquisa de ficção científica acadêmica", algo assim. Mas estejam atentos: "primeiros passos", diz o título da palestra. Fábio Fernandes (o curador do evento) não disfarça: ele sugere que não há uma crítica da Ficção Científica no Brasil (oh!) e aposta que ela virá de lá: da academia, dos jovens pesquisadores que estão usando seu tempo para refletir a Ficção Científica e suas reverberações por aí.

Das falas, consegui pegar apenas Adriana Amaral e Alfredo Suppia - o atraso (e o abismo já mencionado que distancia minha memória) comprometeu meu entendimento das posições do Rodolfo Londero - mas ele demonstrou grande repertório e esclarecimento sobre as pontuações. Com tese de mestrado foi sobre a recepção do cyberpunk no Brasil, estudo de caso de Santa Clara Poltergeist (veja adiante). Agora, no doutorado, segue na FC. Por sorte, consegui um trecho interessante em vídeo: confiram um pouco mais adiante.



Adriana AmaralAdriana AmaralAdriana Amaral fez questão de frisar que o campo de estudo dela é a subcultura ligada à ficção-científica, em especial ao cyberpunk. Senti que a fala dela poderia ter sido mais enriquecedora se houvesse um diálogo maior com as demais, pois pareceu-me descontextualizada, especialmente em relação às outras mesas. Mas levantou curiosidade e simpatia, sem dúvida, ainda mais com o Overlock sendo presenteado no dia anterior e circulando ainda nas mãos da platéia - se for para elaborar uma "teoria da conspiração" diria que Fábio Fernandes, em seu plano de revolucionar a literatura de ficção-científica no Brasil, convidou-a para mostrar que a ficção científica pode ir além, fazer mais e dialogar com o mundo real, modificando-o... que pode ser vivenciada. Será?

Adriana também falou um pouco sobre o fandom (fan, de fã, dom, como em kingdom), sobre como a ficção científica parece fechada a um certo grupo de admiradores, como a platéia presente (!). E disse isso como uma antropóloga, de fora da "civilização indígena" para a qual, ironicamente, está discursando. Mas não foi com maldade, não entendam mal. Ela disse em seu Blog, as palavras e as coisas, quando foi convidada para a mesa que na platéia "são todos homens e nerds rs ", mas não é agressivo, não... foi até com uma certa - e para mim preocupante - simpatia.

Alfredo Suppia
Alfredo Suppia

Alfredo Suppia me impressionou com a fala - primeiro porque não foi tolamente pessimista e reclamão, como já estamos habituados a ver por aí, em todas as áreas que consideram-se periféricas ou malditas, segundo porque, muito felizmente, mostrou que estava fazendo jus a sua cadeira no palco: tinha um bom e diversificado repertório e propriedade sobre o que estava falando. Para ele, no cinema - que é sua área de estudo - Ficção Científica não é a margem, é uma das correntes principais e com muito apelo comercial inclusive. Saem dezenas de filmes por ano (senão mais) em Hollywood e muitos, muitos mesmo chegam ao Brasil. Muitos seriam realmente bons filmes, e muitos são bem sucedidos.Rodolfo S. FilhoRodolfo S. Filho

No cinema brasileiro, Suppia disse não ser tão grande a escassez. Isto é, se formos contar a produção de curta metragens. Ele disse que o mercado no Brasil está crescendo (e alguém duvida disso!?) e que há muitos estudantes nas universidades e pessoal recém formado fazendo curta metragens de Ficção Científica - bem, um dia alguns desses caras devem fazer longas metragens, não é? E eles já tem gosto pela coisa, então quem sabe?!

A visão, ou o interesse, de Alfredo Suppia pareceu bastante abrangente (nesse sentido, muito próxima a visão de nosso pequeno coletivo). Entre os filmes que mencionou fazerem parte de sua pesquisa sobre ficção científica, destaco o brasileiro Kenoma. Uma rápida pesquisa pelo seu nome no google nos leva também a um bom número de textos de sua autoria sobre o cinema de ficção-científica.

Quanto ao Rodolfo S. Filho, ele foi um excelente mediador, com umas perguntas meio exageradas e canastronas mas muito instigantes e bem formuladas. Soube conduzir bem a conversa, levá-la e trazê-la de volta, proporcionando uma visão geral e diversidade de temas, sabendo lidar com a mesa heterogênea.
Domingo, segundo dia - Mesa 1
Ficção Científica Brasileira: passado e presente do gênero no Brasil


flagranteFlagrei uma anotação no caderninho da pessoa que estava aa meu lado!Como na mesa anterior, o título também não era assim tão correspondente ao conteúdo. Mas quem se importa! Bráulio Tavares, Fausto Fawcett e Guilherme Kujawski compunham essa mesa mediada por Sérgio Kulpas.

A mediação de Kulpas deixou a desejar, é verdade, mesmo tendo começado bem, com uma pergunta que rendeu assunto até o final da mesa: como os autores presentes lidavam com a linguagem em seus trabalhos.

Kulpas arrancou comentários aborrecidos do público e não era para menos, sua euforia acabou atrapalhando mais do que ajudando: atropelava a fala dos demais com comentários, em geral sem grande pertinência, e acabou por confundir seu papel de mediador, unindo-se a discussão ao lado dos demais. Especialmente na segunda metade da mesa, quando não disfarçava mais seu entusiasmo.

Bráulio TavaresTavaresBráulio Tavares é nosso já conhecido escritor, crítico e compositor brasileiro que dedica uma parte de seu tempo à ficção científica e à literatura fantástica - com pelo menos três coletâneas de contos dignas de nota, publicadas pela editora Casa da Palavra. Mais uma vez (tal qual no Fantasticon), ele fez a ponte entre a literatura convencional e a discussão em torno do gênero. Desconsiderou as colocações do mediador sobre seu texto literário (invenção de linguagem), confessou-se melhor crítico que escritor e trouxe para a discussão a tradição negligenciada da ficção científica Brasileira.

Com habilidade, expôs a sinopse (e os devidos comentários) de textos que ele considerava, na literatura brasileira, essenciais, ou verdadeiras obras primas da ficção científica. Mias uma vez, elaborou uma fala rica, distante da obviedade, do esperado, do comum. Segue abaixo um pequeno vídeo, que serve para ilustrar o sentido de sua fala.


Fausto Fawcett é músico e ficou famoso algumas décadas atrás com o hit Kátia Flávia, mas ele estava lá por ter escrito o livro de ficção científica Santa Clara Poltergeist (que também é nome de música e de vídeo). Com um discurso cheio de idas e vindas, digressões fenomenais e arrancando muitas risadas da platéia, Fausto convenceu a todos. Ainda que se perdesse em alguns pontos e pudesse parecer esguio em outros, traçou relações muito interessantes e - se não resolveu nada - trouxe novo tempero a discussão. Aliás, um tempero bem particular, bastante diferente do que estamos acostumados na FC brasileira.

Sua "tese" que mais me chamou a atenção foi a de que a ficção-científica, no Brasil e em outros países (Índia, Angola...), tem um ar diferente, uma lógica e um comportamento diferente da FC norte-americana e européia: um ar de traquitana, de "jeitinho" que se dá as coisas. Pode parecer óbvio falando assim, mas acredite: muita coisa foi (e ainda é) produzida no Brasil como mero reflexo do que se fez no exterior, e uma visão assim colocada, vinda justamente do padrinho-mor de Kátia Flávia e Regininha Poltergeist, tem muito significado!

Fausto Fawcett
Fausto Fawcett


Guilherme Kujawskio jornalista Guilherme KujawskiKujawski é ligado ao Itaú Cultural (inclusive um dos responsáveis pela bienal de arte e tecnologia, emoção artificial), mas estava lá também por um livro de ficção científica, o seu Piritas Siderais. Foi bastante discreto e humilde, mostrou muito decoro e respeito com os demais componentes da mesa e falou pertinentemente sobre movimentos literários, dando exemplos de literatura onde a forma ganhava maior importância - e como isso poderia ser caro à FC. Nesse sentido, acrescentou muito à fala de Tavares e ao ponto de vista geral da mesa, levantado pelo Kulpas.

Aliás, esta visão geral disse a plenos pulmões: ficção científica é literatura. Está sujeita as regras e avaliações da literatura e não pode esquivar-se do que já foi conquistado nesse campo. Assim, a última mesa "casou-se" com a primeira - e o Invisibilidades II, evento de ficção-científica do itaú cultural, parece ter terminado com a seguinte mensagem: ficção científica é coisa séria!

Pecha Kucha NightPecha Kucha Night

Ou quase. Para terminar descontraído, o evento preparou uma edição temática do Pecha Kucha Night. Não vou me deter muito aqui, deixo três pontos:


1 - Pecha Kucha Night é um evento que surgiu no Japão (Pecha Kucha = burburinho, reza a lenda). Foi criado por um escritório de arquitetura e é uma forma de apresentar projetos, teoricamente mais dinâmica que a tradicional. A idéia é que há um número definido de slides e um tempo definido para cada slide, nada muito além disso - mas com apresentação animada (e quando não "intervenção") da organização. No fundo, no fundo, é um nome descolado para "apresentação de powerpoint".

2 - A versão de São Paulo é bem animada, com interferências do apresentador, gracinhas e boicotes por parte da equipe técnica. Muito bom isso, aliás. O Pecha Kucha paulista está "sediado" no Itaú Cultural, mas o formato foi dado - como nos contou o Kujawski - por Paulo Scott, que comanda o evento Vocabulário, n'o Barco (e mais alguém que - desculpem- eu não me recordo). A apresentação ficou então sob égide do Kujawski que, infelizmente, não tem nem de longe a desenvoltura e carisma do Paulo Scott. Uma pena, pois fica claro que Kujawski está tentando "imitar" Scott e sua turma (dentro dela também o poeta Chacal) - impressão que tenho é que Kuja ganharia mais se tentasse um estilo próprio.

3 - A adesão para esse tipo de evento não costuma ser muito impressionante, nem em número, nem em qualidade. Com o tema ficção científica, então! Mas entre algumas apresentações ruins houve coisa boa. Inclusive uma saída de mestre da organização, que frustou uma apresentação meia-boca e ainda assim mostrou todas as divertidíssimas imagens que o expositor preparou (apenas com o intuito de ser selecionado). O grande destaque foi o Alfredo Suppia, que preparou uma ficção hilariante a partir de frames extraídos de filmes (curtas e longas) de ficção científica de diversos tempos e origens.


Saldo positivo no evento que se mostrou mais denso e interessante que o Fantasticon, pelo menos até agora. Correram pedidos acalorados para que o evento se torne anual, e não bienal. Tolice! Deixem como está, que está de bom tamanho. Dois anos é tempo de distinguirem-se as tendências e os assuntos mais pertinentes relativos ao gênero e de escolher a dedo um bom curador.

Diminuir a frequência seria comprometer a qualidade. E tenho dito!


LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Visuais no Unicentro
Belas Artes

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Invisíveis porque querem (parte 2)

Antes de mais nada, gostaria de pedir desculpas pela sumiço geral. Já deve ter passado quase um mês e devo admitir que será um exercício de memória continuar a falar do Invisibilidades, 2° evento de ficção científica promovido pelo Itaú Cultural.

Mesa 2
Mercado Editorial

Com Ana Cris Rodrigues (clfc), Samir Machado de Machado (não), Ednei Procópio (giz), Richard Diegues (tarja) e Jaques Barcia (terraincognita).
Moderação: Sílvio Alexandre (www.universofantastico.com.br )

Edinei ProcópioEdinei, pulso firme e números 'de cabeça'

Fábio Fernandes, curador desta edição do evento, deve ter se realizado quando formou essa mesa. Já há tempos, como pudemos verificar no Fantasticon e nas entrelinhas de postagens em seu Blog, Fábio vem defendendo a idéia da WEB como terreno tão válido para a publicação quanto a mídia impressa. Além de tradutor de livros em papel (de clássicos como "O Homem do Castelo Alto") ele encabeça hoje dois projetos de revistas online com seu parceiro Jaques Barcia: Terra Incógnita e Kalíopes (disponível no site do CLFC). As duas com a pretensão de fazer barulho no cenário da FC nacional e chamar atenção para o que está sendo produzido lá fora.

PAPEL x WEB

Foi assim: Ana Cris, atual presidente do CLFC, e Jaques Barcia - ambos editores de publicações online - defenderam com romantismo a migração dos escritos para a Web, a publicação de textos, revistas, contos e o que mais for na internet. Associaram isto à divulgação maciça, maior visibilidade, mais leituras do material disponibilizado desta forma.

Edinei Procópio e Richard Diegues, editores respectivamente da Giz e da Tarja, se mostraram muito mais abertos e realistas. Reconhecem e acreditam no potencial da internet, mas não desmerecem a boa e velha mídia impressa. Já o Samir, da Não Editora... o negócio dele ainda é papel (mas não descartou nada).

6 MIL DOWNLOADS
Um argumento fraquinho usado no debate foi a quantidade de Downloads em comparação com a quantidade da tiragem de um material impresso. Ana Cris, que está entre trancos e barrancos tocando a digitalização do CLFC, disse que 3 autores convidados a publicar seu material na Somnium recusaram pois preferiram fazê-lo em um veículo impresso.

Ela deu uma leve debochada da atitude comparando a tiragem de 300 exemplares (pouco inferior, diga-se de passagem, à tiragem do Fabulário #1) aos 6.000 downloads da revista BlackRocket. Oras... 6mil exemplares vendidos, por exemplo, seria realmente algo a se admirar, não é? Mas 6mil downloads? Será que é grande coisa mesmo esse número de 6mil downloads? (Não me refiro à revista, ela é sim, muito boa e muito bem feita!)

Donwload não significa também que o material tenha sido lido não é? Ok... essa discussãozinha não é nada produtiva, oras... mas serve para tomarmos mais cuidado com a numerologia empregada neste ou naquele discurso.

Sílvio Alexandre e Ana Christina RodriguesSílvio Alexandre e Ana Cris Rodrigues

NUMEROLOGIA
Por falar em numerologia: Sílvio Alexandre surpeendeu na mediação, levando as perguntas anotadinhas, com dados específicos, numéricos, para colocar em debate. Só surpreendeu mais mesmo Edinei Procópio que, quem diria, apresentou números de cabeça, de institutos de pesquisa diferenciados.

Aliás, Edinei e Richard, respectivamente editores da Giz e da Tarja, pareceram realmente muito preparados, muito inteligentes, muitos "antenados". Se fosse para julgar a publicação dessas editoras pela credibilidade que seus editores conseguiram passar nesta ocasião, poderíamos sair comprando todos os livros. Mas, infelizmente, não é assim.

Se o discurso de Ana Cris e Jaques Barcia foi pautado pela qualidade literária, pela contribuição ao gênero e refinamento dos materiais, ficou a impressão (para algumas pessoas no público que conversaram comigo depois, eu realmente não senti isso na hora) que o discurso dos dois editores "impressos" estava pautado apenas por um critério muito duvidoso de "vendabilidade".

Bem... se podemos conferir o material editado por Jaques e Ana Cris na web, gratuitamente, para averiguar o material da Giz e da Tarja não adianta numerologia ou outras formas, místicas ou não, de especulação: resta ir às livrarias (ou pedir pela internet, que é mais garantido).

Richard Diegues e Edinei Procópio

ENQUANTO ISSO...
Às vezes a gente pode ter a impressão que o movimento na literatura fantástica brasileira se dá geograficamente no eixo Rio-São Paulo (ou no Sudeste) e no Nordeste. Quando fazemos isso, é bastante saudável considerar ingenuidade de nossa parte.

Samir Machado de MachadoSamir Machado de Machado, editor da Não e organizador do Ficção de Polpa
A Não Editora é uma editora independente de Porto Alegre, já velha conhecida do pessoal aqui do Fabulário, e que chamou a atenção da comunidade de ficção científica antes mesmo de existir, com a coletânea Ficção de Polpa. Explico: na época, o lançamento da primeira coletânea foi realizado pela editora Fósforo. (mais detalhes no site das editoras).

Samir Machado de Machado, um dos editores da Não e organizador das coletâneas de "literatura especulativa" Ficção de Polpa, veio para enriquecer a mesa. O discurso dele soa bastante distinto do que ouvimos dos demais editores presentes (online ou não) e do discurso que costumamos ouvir vindo dos dois outros "eixos" ("Nordeste" e "Sudeste", se é que eles existem assim, enquanto eixos).

Ele não se preocupa em separar "mainstream" de "literatura de gênero", não aponta dados desmotivadores da recepção do público, entre muitas outras coisas que prometem, a longo ou a imediato prazo (afinal, você já pode pedir os livros deles pela livraria cultura) um novo fôlego para a literatura fantástica nacional! (Ao menos, para uma delas).

DUAS FICÇÕES DE POLPA, NÃO UMA!
Esse detalhe me chamou a atenção. Quase não falei dele, mas Samir Machado de Machado, um dos editores da Não e organizador das coletâneas Ficção de Polpa estava presente. Como sempre, ele deu seu parecer (lúcido parecer) de quem está de fora do gueto, com visão geral e abrangente.

Em dado momento, Ana Cris falou com alegria do artigo publicado por ela (juntamente com Alexander Lancaster) na Scarium #19: disse que estava falando da mesma coisa que a antologia que veio depois (e sem conhecimento prévio um do outro, vale ressaltar) organizada pelo Samir. Ora! Eu li os dois materiais e tive contato com a conceituação de ambos...

Se há algo que eu posso dizer a respeito é que não, não é a mesma coisa. Samir Machado de Machado e Ana Cris Rodrigues não estavam falando da mesma coisa. Mas isso é assunto para um artigo à parte.

LÁ FORA E AQUI DENTRO
No discurso do Jaques Barcia (e do parceiro e curador, Fábio Fernandes, também) a gente houve algo que pode parecer às vezes um certo culto ao exterior, ao que é produzido lá fora. Bem... a impressão que os dá (digo impressão por que não li nossos contemporâneos estrangeiros ainda, então só tenho discursos de terceiros para me apoiar)... a impressão que dá é de que os americanos estão lá na vanguarda da Ficção Científica.

Fábio e Jaques não escondem nem um pouco a opinião de que deveríamos nos contaminar com a literatura e o espírito desses escritores (que são além de americanos, franceses, russos, romenos ou de onde quer que sejam afinal)... e, afinal, quem poderia ser contra eles nesta opinião? Mas, junto a isso, parecem levantar discretamente a bandeira de que esta é uma obrigação dos leitores/escritores de ficção científica que devem ler os textos em inglês, importar os livros via amazon.com e buscar contos e copylefts na web.

Não é assim a atitude mais mediadora que poderíamos esperar, é verdade, mas os dois também não estão lá fazendo só o gênero reclamão e questionador: é possível conferir que estão indo além disso logo na Terra Incógnita #1, trazendo ao conhecimento do público brasileiro novos autores.

Às pessoas, como eu, que não dominam o inglês a ponto de destrinchar os romances de 300 páginas que são produzidos no exterior, só nos resta esperar a facilidade de pequenos contos traduzidos, entrevistas e quem sabe, uma ou outra indicação, no futuro, vinda de um tradutor de confiança de alguma editora interessada em ficção científica para que traduzam, de repente, um Perdido Street Station tão breve quanto possível....
Jaques BarciaJaques Barcia

CONVERGÊNCIA, OTIMISMO E COBRANÇA

Três coisas ficaram claras no debate:

1) Há sim um crescimento dos gêneros fantásticos, no Brasil, nos últimos tempos (ainda vamos descobrir no que isso vai dar);

2) Parece haver uma tendência, ao menos no discurso da mesa, de liquefação (êêêê) nos limites destes gêneros, seja entre si, seja com aquilo que está "fora do gênero";

3) A mesa, muito sabiamente, cobrou qualidade dos escritores presentes. E acredite, um grande filão do público era composto por escritores ou pretensos escritores. Muito bem feita a cobrança, diga-se de passagem (e particularmente, bastante refinada no discurso do Jaques).

CONCLUSÕES
Este debate foi menos polêmico e mais produtivo que o anterior. A Mediação de Sílvio Alexandre ajudou muito para manter o nível e o preparo, conhecimento do terreno e diversidade de opiniões engrandeceu a mesa.

Nota dez para o Fábio, que parece ter captado as energias certas para a elaboração desta mesa!

Ah! E para aqueles que ficaram achando que "foi dito o mesmo de sempre, o que sempre dizem"... talvez não tenha sido acrescentado muito tempero ao caldo desta discussão, nada foi "repetido" inutilmente.


LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas no Unicentro
Belas Artes

domingo, 21 de setembro de 2008

Invisíveis porque querem (parte 1)

Acabo de voltar do evento Invisibilidades, do itaú cultural. Rapidamente, vou tentar dar um parecer sobre a primeira das mesas que aconteceram lá ontem (afinal, já passa da meia noite, então é ontem). A segunda mesa fica para uma próxima postagem.

Mesa 1:
Por uma Ficção Científica pós Moderna

Mediação de Gerson Lodi-Ribeiro. Com Max Mallmann, Antônio Xerxenesky, Octávio Aragão, Nelson de Oliveira

Gerson Lodi-Ribeiro
A Não-Mediação
Gerson Lodi-Ribeiro pode ser uma referência para a literatura de ficção científica brasileira (e de história alternativa como ele faz questão de lembrar em todas as ocasiões). Mas isso não foi importante para este debate: cá entre nós, ele não foi igualmente feliz como mediador dessa discussão. Contribuiu mais, a meu ver, como participante do debate.

Autoridade
Max MallmannHá um problema recorrente nas reuniões do Fabulário que é a falta de autoridade sobre determinado assunto, ou melhor: há um ou outro assunto no qual todos querem dar uma de "autoridade sobre o assunto". Com o tempo vamos superando esse problema e aprendendo a entender nosso lugar junto às coisas, afinal, nos reunimos bastante. Esse problema fica especialmente engraçado, ou curioso, quando é visto em um evento do porte do Invisibilidades. (Salvam-se da acusação Antônio Xerxenesky e Max Mallmann, que mandaram bem no quesito "meu espaço".)

Octávio AragãoPós-Hein!?
Há muitas teorias sobre a pós modernidade. A minha teoria preferida é a que chama a pós modernidade de modernidade líquida. Liquefazer é um verbo excepcional, na minha opinião, podemos usá-lo para falar de muita coisa do nosso tempo - e coisas boas. Eu não sei particularmente o que o Octávio Aragão entende por pós-moderno (parece que ele nunca deixa muito claro qual é a referêcnia dele, mas não tenho certeza quanto a isso), mas ele parece levar isso muito a sério mesmo, quase uma obsessão no percurso discursivo (não é a primeira vez!). Os outros componentes da mesa, menos fanáticos ou exaltados, também deram sua contribuição. Mas como sempre, tudo que é pós moderno se desmancha no ar, e ficamos como começamos...

Inovação?
Em um certo momento, o Octávio falou de inovação, que tem que inovar na literatura. Deu a impressão até que é para isso que existe essa tal pós-modernidade (hihi!). Acho que é de Adorno a frase "não existe o novo, o que existe é o desejo do novo" (e devo esta afirmação a Evandro Carlos Jardim). Nada poderia ser mais moderno que ess coisa de inovar, não é? Na minha opinião: liquefaçam.

Antônio Xerxenesky

O rótulo que te pariu
Tem algo que eu provavelmente nunca vou entender que é esse fetiche pelo rótulo (falaram tanto sobre fetiche pelo papel hoje na mesa seguinte, deviam ter dito algo sobre esse fetiche louco pelo rótulo). Funciona assim: algumas pessoas tem um desejo insano de ser chamado de Ficção Científica. Ou pior: de chamar isso ou aquilo de ficção científica. Ainda pior: de ficar discutindo, muito praticamente, se Moby Dick ou Saramago são ficção científica. Às vezes é só um recurso retórico, que varia do divertido: "Moby Dick é branca, é grande e nada mata ela! Só pode ser mutante" - fala do Octávio. Para o insensato: "Um escritor de ficção científica não ganha um Nobel. Se o Saramago escrever algo de ficção científica ele não vai mais ser o Saramago" (sic) - não lembro o autor. Bem insensato se considerarmos o diálogo que existe entre o recentemente adaptado para o cinema Ensaio Sobre a Cegueira e a FC.
E claro, completamente insensato se considerarmos que a ganhadora do Nobel 2007 de literatura foi a Doris Lessing, que tem uma grande parte de seu trabalho desenvolvido na ficção científica. Ainda que não tenha sido exatamente por este mérito.
O que quer dizer então um sujeito que usa essa argumentação?

Nelson de OliveiraO Nelson de Oliveira quer escrever ficção científica como um manifesto anti-literatura convencional. Aí batata: o sujeito se agarra num sub-gênero muito "mal visto" pela "elite arrogante dos narizes-empinados" (palavras minhas, ele não disse nada disso) com a intenção de aprofundar-se no enredo. Beleza: pitoresco e exótico, perfeito!

Já o Xerxenesky foi praticamente caçoado quando disse que não achava que o livro dele era ficção científica. A fome por rotular é tão intensa que os rotuladores nem se preocuparam com detalhes. Minha impressão é que soou mal ao público. Ao menos, soou mal a mim.

O Max Mallmann, único na mesa que eu ainda não conhecia, pareceu também bastante sossegado a respeito. Já o Octávio nem se fala, pareceu febrilmente atacado pelo fetiche do rótulo.

Será que não seria, nessa altura tão "pós-moderna" do campeonato se preocupar menos com esse ou aquele rótulo internacional e simplesmente priduzir literatura de qualidade? Será que o Saramago tivesse se preocupado enormemente em fazer "ficção científica" ele teria ganho o nobel e sido adaptado pelo Meireles (e olha que essas duas coisas são as mais "fichinhas" e superficiais, heim!)? O que será que se ganha com esse esforço de rotulação?

Liquefaçam, por favor
Os pontos altos da palestra foram uma ou outra reinvenção da roda (pode-se falar em FC no Basil sem isso? eu acho que sim, né, mas vamos ver...) e a batalha fanfic X startreck. Alfinetadas ressentidas para tudo quanto é lado. Bom... é assim, né? Fazer o quê? Saí de lá meio lamentoso, é verdade: até quando a patota vai resistir tão sólida como está?

EM OFF
Fabulário

Em off, realizamos duas reuniões do Fabulário: uma antes do evento, sobre o fanzine, e outros projetos, e outra depois do evento (não resistimos a sentar em um restaurante e conversar um pouco com as pessoas que conhecemos e as que não víamos com frequência). Essa segunda girou em torno de literatura, cinema e rpg de terror, do escritor Chuck Palaniuk, de um conto do Carlos Orsi (do qual temos falado bastante) e de impressões dispersas sobre o Invisibilidades.
Fabulário mais amigos

O evento contou com apresentação elegante (ponto para o Fábio que se mostrou um gentleman e, lógico, para o itaú cultural, um dos meus espaços preferidos de arte e cultura na cidade) e cenografia, além de microfones de lapela (que fazem uma grande diferença), ou seja, infraestrutura de primeira. Claro: não foi na sala vermelha nem teve comes e bebes. O espaço utilizado é a "garagem" (brincadeira gente) do itaú cultural, geralmente destinado a teatro e shows onde já vimos Jaraguá Mulungu, Vestido de Noiva pelo Satyros, entre outros.

Vale, e muito, falar de um fanzine que a gente recebeu antes do evento, feito por um pessoal de Santa Maria - RS. Overclock. Fanzine de cultura cyberpunk (música, cybercultura, cinema, hq - embora não tenha nenhuma - ficção científica). O material é muito bonito, com belas imagens e muito bem diagramado. Nesse pequeno tempo ainda não deu para ler muita coisa, mas o material é bom, garantimos: traduções do fanzine de Bruce Sterling (dos anos 80) texto de Bráulio Tavares e outras coisas finas. Lembrando: a diagramação é jeitosa e bonita, muito diferente da grande maioria de fanzines impressos ou virtuais.

Em geral, como sempre, cada um tem suas opiniões, bem divergentes, sobre o evento. Essa postagem é uma forma de expor a minha visão sobre ele e não reflete a opinião do grupo.

Seguirei com meus relatos, mais ou menos demorados, aos longo dos dias, como fiz com o Fantasticon. Espero que apreciem.


LUIZ PIRES,
é webdesigner e estudante
de Artes Plásticas no Unicentro
Belas Artes