Como
já dissemos, as práticas de letramento se configuram como eixo fundamental do
trabalho por meio da (re) elaboração cognitiva, da inserção e da intervenção
das crianças de três a cinco anos no mundo da cultura escrita, a partir de suas
interações sociais discursivas, do diálogo, dos diferentes usos e práticas da
língua no contexto escolar e sócio-cultural. Para tanto, são promovidas
situações que tenham a ver com os usos da língua nas práticas culturais, em interação
permanente entre adultos e crianças, que juntos constroem textos
significativos.
Segundo;
A inserção social na cultura
escrita significa oportunidades que crianças e adultos têm de experiências
significativas com a escrita. O processo, longe de ser mecânico ou linear, é
dinâmico, complexo, fragmentado e, sobretudo, vivo e rico, com personagens,
aventuras, enredos em desfechos alegres ou tristes, situações engraçadas, irônicas,
angustiadas, sofridas. Textos narrados em prosa ou recitados em verso. Nunes e
Kramer (p. 24, 2010)
Nessa
perspectiva, as práticas de letramento não pretendem ser, e não poderiam ser
atividades isoladas, fragmentadas e descontextualizadas. Há na ação realizada
pela criança uma razão para que ela escreva e leia.
1. Álbum
No
álbum – caderno de desenho que vai para casa no fim do ano – as crianças ditam
para a professora escrever textos elaborados coletivamente sobre os momentos
mais significativos vivenciados pelo grupo ao longo do ano, tais como as
festas, as aulas-passeio e os projetos desenvolvidos. Os textos, digitados ou
copiados pelas crianças, são lidos por todos na rodinha e depois cada uma faz o
seu desenho. O álbum também traz mensagens que as crianças escrevem para os
colegas, letras de músicas, e tudo o que foi importante para a turma.
2. Livro de
histórias da turma
O
livro de histórias é uma atividade desenvolvida durante o ano. A criança cria
um desenho no papel e dita uma história para a professora escrever. Em seguida,
são feitas cópias do trabalho para cada aluno da turma. Crianças e professora
lêem a história, interpretam e depois elas colorem, enfeitam o desenho com
alguma técnica. No fim, as crianças escolhem o título do livro e assinam a
capa.
3. Bilhetes na
caderneta
A
caderneta ou agenda é um meio de comunicação entre a escola e a família, pois
nem sempre é possível estar conversando com os pais e ou responsáveis sobre o
trabalho cotidiano. Além dos avisos sobre calendário, normas de funcionamento
da escola, dias de reunião, pedidos de autorização para uma aula-passeio, a
caderneta é utilizada como mais uma estratégia para mostrar à família o que as
crianças estão aprendendo e também como forma dos parentes aprenderem algo
novo. Os bilhetes são lidos com as crianças, na rodinha, antes de seguirem para
casa.
4. Atividades
de rotina
Planejamento
do dia, quadro de horários das atividades da semana, Calendário. As atividades
de rotina são muito importantes para organizar o dia. Todos os dias, no horário
de entrada, as crianças sentam em roda e participam do planejamento das
atividades que serão desenvolvidas naquele dia. A professora registra no quadro
a pauta/agenda que é consultada ou alterada, quando necessário. Após elaborarem
a pauta, as crianças consultam o quadro de horário semanal, preparado por elas e
pela professora, onde representam por meio de desenho, o espaço ou a atividade
que a turma terá em cada dia da semana (sala, casinha de bonecas, pátio
pintado, pátio coberto, parque, sala de leitura). Ele é montado após o grupo
conhecer e vivenciar todos os espaços. Com o passar do tempo, os horários do
rodízio são tão internalizados pelos alunos, que é comum vê-los explicando uns
aos outros, quando querem saber o que farão naquele dia. Cabe ressaltar que o
objetivo do horário semanal é organizar a circulação de todas as turmas da escola
pelos espaços, garantindo que as crianças percorram todos durante a semana.
Esta rotina serve como referência, como parâmetro para as turmas se locomoverem
nos espaços. Porém, os horários são flexíveis, respeitando as necessidades e interesses
de cada grupo.
5.
Procedimentos e combinados
No
início de cada ano, a professora traz à discussão procedimentos e combinados da
turma que devem ser lembrados e cumpridos no cotidiano. Afinal, todos os
lugares têm regras e as pessoas não podem fazer tudo o que quiserem, na hora
que quiserem. A partir do que as crianças entendem sobre a conversa, a
professora sugere o registro para que os procedimentos e os combinados sejam
sempre consultados e lembrados. As crianças, então, falam o que “não pode” e o
que “pode” fazer na escola, e a professora registra em duas listas. No decorrer
do ano letivo, volta-se regularmente a estas listas para consultá-las e fazer
acréscimos.
6. Observação
em campo
Nos
projetos que são realizados, muitas vezes é necessário ir a campo para observar
aspectos que acrescentem novas informações ao assunto que esteja sendo
estudado. Crianças e professora saem com prancheta, folha e lápis, e vão
anotando (com desenhos e letras) o que é importante e também vão fazendo
perguntas e comentando uns com os outros as descobertas. Ao voltar para a sala,
na rodinha, cada criança apresenta para as demais os dados registrados e suas impressões
e, a partir de então, novas atividades são planejadas. Esta atividade investigativa
é feita dentro da escola (por exemplo, procurar focos de mosquito da dengue) ou
fora (ida ao horto para observar as diferentes plantas; ida ao mercado para
entrevistar os vendedores, ver diferentes frutas, legumes, verduras; dar a
volta no quarteirão para ver que tipo de lixo é jogado na rua ou para conhecer
o espaço para construir uma maquete do quarteirão; entre outras).
7. Relatório
de experiência
Nas
atividades com experiências que exigem observação durante um tempo mais
prolongado, são elaborados com as crianças quadros de acompanhamento, divididos
em três colunas com a data, o relato escrito e o desenho. Dependendo do
experimento que a turma esteja realizando, a observação sistemática e seu
respectivo registro podem ser diários ou semanais. Assim é que, por exemplo, as
crianças acompanharam e aprenderam sobre o crescimento do girassol e do feijão,
a decomposição de materiais orgânicos e inorgânicos enterrados no canteiro, as
fases da vida do mosquito na mosquitoeira.
8. Jogo do
boliche
O
trabalho com os jogos é iniciado com o levantamento do que as crianças já
conhecem a respeito deles. O jogo de boliche é confeccionado junto com crianças,
utilizando material de sucata: garrafas pet, sobras de papel colorido, bola de
meia. As crianças, primeiramente, brincam à vontade, explorando as
possibilidades de arrumar as garrafas, as maneiras de marcar os pontos, quantas
chances cada um vai ter, de que distância e de que maneira devem arremessar a
bola, etc. Nos outros momentos, são elaboradas as regras para jogar com a
participação das crianças, problematizando cada situação. As regras do jogo são
escritas pela professora, na frente das crianças, e afixadas na parede ou no
mural. No quadro ou tabela de pontuação, cada jogador registra com números,
traços ou algum outro símbolo a quantidade de garrafas derrubadas. Depois de
jogar na escola, uma criança a cada dia leva o boliche para casa para jogar com
os parentes ou vizinhos. Junto com o jogo, vai um caderno em que são
registrados nomes, idades e pontuação dos jogadores da família, além do relato
dos responsáveis sobre como foi a experiência.
9. Bingo dos
nomes
Durante
todo o ano letivo, são realizadas atividades com os nomes das crianças, tais
com jogo da memória, amigo-oculto, esconder as fichas para que as crianças
encontrem, trabalho com as letras móveis e o quadro-de-pregas. Entre as
diferentes atividades, destacamos o bingo dos nomes. As professoras
confeccionam as cartelas com os nomes de cinco crianças. As crianças são
divididas em duplas ou trios e jogam em colaboração. Para marcar os nomes
“cantados”, usam-se tampinhas ou palitos de picolé. As “pedras a serem
cantadas” são as fichas dos nomes.
10. Gráfico e
tabelas
A
linguagem matemática também é bastante trabalhada. Além do trabalho com o
calendário e da contagem das crianças, em muitas situações é necessário
elaborar tabelas ou gráficos. Pode-se transformar a pontuação de cada criança
no jogo do bingo, por exemplo, em um gráfico no qual se pode ler com as
crianças qual delas teve a maior pontuação, quem fez menos pontos, quem não
marcou ponto etc.
11. Biografia
de artistas e cientistas
Uma
das atividades desenvolvidas nos projetos de trabalho e nos de cultura é
conhecer com as crianças a vida e o trabalho de artistas e cientistas. As
professoras pesquisam dados da história da vida pessoal e profissional e
organizam em pasta-catálogo que passa em cada turma. Assim, as crianças são
convidadas a se transportarem para o mundo destes artistas ou cientistas, de acordo
com o projeto que está sendo realizado, e começam a fazer relações com a vida cotidiana,
a levantar questionamentos sobre o trabalho, o contexto em que aquele artista
ou cientista viveu e a solicitar mais informações sobre sua família.
12.
Apresentação oral dos trabalhos produzidos
Relatar,
oralmente, para os colegas das outras turmas o processo de trabalho que
resultou na construção de uma maquete ou escultura, explicar o que aprenderam
sobre a dengue ou sobre a vida de determinado artista para os pais ou
responsáveis, é uma atividade de letramento que desafia a criança a elaborar no
nível abstrato uma tarefa que ela executou em interação com os colegas, com
outra dinâmica, na prática. É necessário adotar uma postura de palestrante, organizando
e elaborando o pensamento para falar sobre o porquê do grupo ter escolhido
fazer tal trabalho, que materiais foram usados, que informações a turma
conseguiu.
Concluímos
que as discussões sobre alfabetização, escrita e leitura ocupam amplo espaço no
debate acadêmico. Discute-se os métodos para alfabetizar, o material didático,
a formação do professor, a avaliação. Numa sociedade como a nossa, preocupada
com os resultados estatísticos muito mais do que com a qualidade, o lugar
ocupado pela escrita é muito estreito na prática escolar, em relação ao papel
fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança.
Ensina-se as crianças a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não
se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que
está escrito que acaba-se obscurecendo a linguagem escrita como tal. (VIGOTSKY,
1991, 119)