por Maria Rita Angeiras
Você sobrevive naquele momento em que eu estou com alguém e minha cabeça se distrai, deslizando meus olhos delicadamente para o lado esquerdo, enquanto a cabeça permanece imóvel, apenas fingindo acompanhar o que a outra pessoa está dizendo. O mesmo momento em que essa outra pessoa coloca a mão no meu queixo e pergunta, em uma caótica mistura de curiosidade e angústia, o que eu estou pensando, na tentativa de arrombar essa porta que eu coloquei entre ela e eu para finalmente entrar na minha cabeça, onde você está confortavelmente alojado. E isso viola minha liberdade de todas as maneiras que você conseguir imaginar. E essa pessoa não sabe, mas essa vai ser apenas a primeira das tantas vezes em que eu vou fazer isso, até encontrar alguém com quem eu queira passar mais do que meia hora em um restaurante ou até o dia em que você parar de sobreviver nesses segundos em que meus olhos procuram um ponto de fuga e ficam concentrados na sua estúpida e desnecessária existência dentro da minha vida. E, com sorte, um dia eu vou ficar parada na frente do microondas, vendo a comida girar, num balé interminável que me coloca em transe, e você não vai aparecer para me lembrar do quanto é um cara incrível, adorável e impossível. E a comida girando vai ser só mais uma comida girando durante cinco minutos na bandeja. E o timer vai alcançar a contagem de 3, 2, 1 e eu finalmente vou voltar a mim, sem sequer ter lembrado de você naquele espaço de tempo ocioso. E esses minutos preciosos vão ser de outro alguém, talvez daquela mesma pessoa que não vai mais precisar virar o meu queixo para me lembrar de que ela está logo ali, bem na minha frente, e não você, e não aquele lugar para onde eu fujo dentro da minha cabeça para encontrar você, rir das suas piadas tímidas, lembrar dos seus olhos, encarar a sua resignação ou para comparar você com os caras que eu conheço. Um dia isso ainda vai acontecer, eu espero, e a minha liberdade não vai ser mais violada pelos seus adjetivos e pela insegurança dos outros, que eu batizo de tempos em tempos com a minha falta de. Falta de vontade, falta de interesse, falta de atenção. Mas se nem assim, nem com o passar do tempo, nem depois de eu conhecer muita gente, você não fizer a gentileza de sair da minha cabeça, então eu quero sair dela, por favor.
12 comentários:
é isso. exatamente isso! finalmente alguém conseguiu descrever exatamente o que eu estou sentindo agora...
sabe identificação. foi totalmente o que rolou... =*
Perfeito se texto. Perfeito!
Cadência maravilhosa Rita.
Incrivelmente incrível!
Parabéns Rita..
[suspiro...]
incrível!!
Muito bom!!!!
gilvanycynthia
Como você sabe ser tão intima,tão sutil?como você consegue entrar na gente tão despretensiosamente?como pode um texto fazer tão bem ao meu sorriso e involuntariamente enxugar minhas lágrimas?vivo grata por tuas palavras cada vez mais nossa.
genial. parabéns. Habilidade rara com as palavras. COnheço e adoro os textos do rafa e do muhle. Não te conheço mas já virei fã.
Parabéns!
Sentimento Textual universal. Muito bom! Chegou ao nível do texto "Se".
Parabéns!
Menina, quando vc resolve dá um tapa na cara de alguém vc dá hein.. e que classe! A alguém daqui agradece! E, igual ao teu texto "Se" de outrora, irei igualmente guardar este, no mesmo lugar, pra tomar de hora em hora enquanto a minha liberdade eu não tenho de volta. Parabéns! Esse é o texto do ano! (Enquanto estão dormindo os meninos! Rs..)
Q ótimo blog. Adorei o humor e a sensibilidade dos três. Parabéns!
Ótimos textos.
Ai bonita... Esse mundo é cruel!
Você escreve maravilhosamente!
um beijo!
Olá! Passo sempre aqui, e recebi um desses selos pelo blog... Seguindo o protocolo, indiquei vocês lá, aqui é muito bom!
Abraço!
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