quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

QUESTÕES DE FAMÍLIA



A família Malatesta, que governou Rimini de 1295 a 1500, além de outras cidades italianas, foi o tema de uma peça de teatro de Gabriele D'Annunzio, Francesca Da Rimini, baseada em factos históricos. Aliás, já Dante, n'A Divina Comédia, no Segundo Círculo do "Inferno", evocara o conflito entre os irmãos (Giovanni, Paolo e Malatestino) que, no século XIII, conduziu ao crime perpetrado por Giovanni. Também Sigismondo Malatesta, um dos mais notáveis membros da família, foi tema de uma peça de Montherlant, Malatesta, cuja acção decorre no século XV.



Baseando-se na peça de D'Annunzio, o grande escritor italiano, homem de refinado bom gosto e autor de extensa obra (que António Ferro entrevistou em Fiume), Tito Ricordi escreveu o libretto que suporta a ópera de Zandonai, Francesca Da Rimini, estreada em 1914, no Teatro Regio, de Turim.


O argumento, que não reproduz exactamente os acontecimentos, resume-se em poucas palavras. A jovem Francesca Da Polenta, filha de Guido I Da Polenta, senhor de Ravenna desposa Giovanni Da Rimini,  (dito Gianciotto , o Coxo), filho de Malatesta Da Verucchio, senhor de Rimini. Tomba, porém, amorosa do cunhado Paolo (dito, il bello). O mais novo dos irmãos, Malatestino, apercebe-se do idílio e tenta obter os favores da cunhada. Como esta se recusa, denuncia ao irmão, Gianciotto, a ligação de Paolo e Francesca. Tal amor, quase incestuoso, só poderia ter um desenlace. Surpreendendo Paolo e Francesca em flagrante delito passional, Gianciotto mata ambos. Claro que, na visão de Dante, teriam de figurar no círculo luxurioso do "Inferno".


Armas da Casa de Malatesta

A ópera  de Riccardo Zandonai conheceu grande sucesso aquando da estreia mas depois quase caiu no esquecimento. Na segunda metade do século passado regressou aos palcos, destacando-se as interpretações de Leyla Gencer, Magda Olivero, Raina Kabaivanska, Renata Scotto, Mara Zampieri e Elena Filipova. O clip que se reproduz é relativo à produção do Festival de Ópera de Macerata, na arena do Sferisterio, a mais recente edição vídeo. A direcção musical é de Maurizio Barbacini e a encenação de Massimo Gasparon. São intérpretes Daniela Dessì, em Francesca, Fabio Armiliato, em Paolo e Alberto Mastromarino em Gianciotto.

Francesca Da Rimini, de Gabriele D'Annunzio

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

JEAN GENET: O CAMINHO DO FIM





Foi publicado em Casablanca, pelas Tarik Éditions (em parceria com a editora Paris Méditerranée), em Dezembro de 2001, um interessante livro de Souad Guennoun: L'ultime parcours de Jean Genet.

Não o tendo adquirido na ocasião, rapidamente se esgotou, e desde há anos que tentava obtê-lo. Consegui, finalmente, comprá-lo, usado mas em muito bom estado, através da internet e não estou arrependido do preço que paguei.

Trata-se de um álbum de fotografias, efectuadas pelo autor, que ilustram os depoimentos de pessoas ainda vivas em 2001 e que conheceram ou privaram com Genet em Marrocos. Recorde-se que este se instalou pela primeira vez no país, onde aliás já tinha estado, em 1968 (ocasião em que conheceu Mohamed Choukri)  e que passou a visitá-lo frequentemente até à sua morte em 1986. E foi em Marrocos, em Larache, que por sua vontade foi enterrado, tendo o caixão sido despachado de Paris com a indicação de "trabalhador migrante".

Neste breve livro, Souad Guennoun percorre os passos de Genet em Marrocos nos últimos anos da sua vida. Em Tânger, entrevista o escritor Mohamed Choukri, Rachel Muyal, proprietária da Librairie des Colonnes e o engraxador Ayachi; em Rabat, recolhe depoimentos de Abdallah El Alioui e de Zohor Chergui, recepcionista e criada de quarto do Hôtel d'Orsay, de Amina El Katrani, mãe de Azzedine (filho de Mohamed El Katrani, o último amante oficial de Genet), do arquitecto Patrice de Mazières e de sua mulher Pauline, de Anis Balafrej (amigo de Genet), da dentista Jacqueline Fontaine, da charcutista Marie-Claude Giguet e do escritor Mohamed Berrada (marido de Layla Shahid, que foi delegada-geral da Palestina em França); em Casablanca, encontra Kamal Lahbib, proprietário da Librairie Al-Karama, Sion Assidoun, antigo preso político, Elias Sanbar, escritor palestiniano e Marilu Marini, actriz argentina; em Larache conversa com Mohamed Abid, professor primário, Mohamed Jabelhaj (um conhecido de Genet), Ahmed El Katrani (irmão de Mohamed) e Mohamed Cherki (proprietário de um quiosque); finalmente, em Paris, entrevista o piloto de automóveis Jacky Maglia (filho espiritual de Genet, de quem também foi amante).

Pelo livro, perpassam ainda as imagens da sua confidente, a citada Layla Shahid, do já referido Mohamed El Katrani (amante de Genet) e de outros amantes árabes, Abdallah Bentaga (o funâmbulo) e Ahmed Lahoussine (amigo do Bentaga).

Os conhecedores da vida e da obra de Jean Genet dispensar-me-ão de considerações sobre as mesmas. Este texto pretende apenas referir os testemunhos que Guennoun ainda conseguiu obter em 2001 e que completarão as biografias de Genet, entre as quais se destaca, por ser a principal, a de Edmund White.

A leitura do livro permite também confirmar (se tal fosse necessário) a atracção de Genet pelos árabes, especialmente pelos palestinianos e pelos norte-africanos.

A benefício de inventário, aqui fica a recensão da obra.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

O ANÚNCIO FEITO A MARCELO




O título do post nada tem a ver com a peça de Claudel. É pura coincidência, se coincidências existem.

Ao anunciar o perfil desejado pelo PSD para futuro presidente da República, na sua moção de estratégia ao Congresso do partido, o primeiro-ministro Passos Coelho, enumerando as características pretendidas, excluiu ab initio uma candidatura de Marcelo Rebelo de Sousa.

Sendo público o desejo de Marcelo de concorrer à eleição presidencial, declarou este, todavia, no comentário do passado domingo na TVI, a sua desistência de se apresentar ao escrutínio nacional.

Por muito ineptos que Passos Coelho e a sua entourage possam ser, não é crível que não tenham intuído o disparate gratuito que tal enunciação de perfil, por demais desnecessária neste momento, constituiu, sabendo-se que Marcelo Rebelo de Sousa, apesar da sua evidente inconstância, desfruta de alguma popularidade e que, segundo as sondagens, seria o único potencial candidato da "direita" capaz de vencer um candidato da "esquerda".

Importa, por isso, encontrar uma explicação convincente para este exercício aparentemente desastroso. Sendo que um candidato da "esquerda", maxime António Costa, parece ter garantida a sua eleição caso concorra, carece a "direita" de uma vitimização para tentar obter ganhos de causa.

Considerando que Passos Coelho é, desde sempre, o chefe de Governo da República mais odiado pela maioria da população do país, muito mais do que Salazar, mais ainda do que Afonso Costa, é evidente que a exclusão que fez de uma candidatura de Marcelo só pode granjear ao professor simpatias que não reuniria antes deste episódio. Assim, tem-se por certo que Marcelo concorrerá às eleições presidenciais e que muita gente do "centro" poderá votar no seu nome exclusivamente por aversão a Passos Coelho, o que permitiria instalar em Belém um presidente "não de esquerda" à falta de um presidente da "direita ultra-liberal", como Durão Barroso, cuja eventual candidatura afastaria, como se calcula, os eleitores do "centro" e da "esquerda" e até de alguma "direita".

Estaremos, pois, perante uma jogada de antecipação, uma manobra política que, contudo, não se afigura susceptível de render votos ao "actual" PSD, demasiadamente empenhado na aplicação de medidas que decorrem mais da imposição de um programa marcadamente ideológico do que da necessidade de diminuir o défice e a dívida.

Porque ainda faltam dois anos para as eleições presidenciais de 2016, muita água correrá sob as pontes.

Como na peça de Claudel, cuja leitura se recomenda, também há nesta intriga doméstica e provinciana os indispensáveis ingredientes dramáticos: a cruzada (do monoteísmo de mercado), o repúdio (de Marcelo), a traição (de Passos), a lepra (das medidas de austeridade), a perversidade (de Barroso), a inocência (dos portugueses que votaram no PSD) e o mistério da anunciação (que se revelará no fim).

Quem viver, verá.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

CRISTIANO RONALDO: A CONDECORAÇÃO




Decorreu hoje no Palácio de Belém a cerimónia da condecoração de Cristiano Ronaldo com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, com que fora agraciado pelo presidente da República.

Estiveram presentes ao acto diversas personalidades nacionais e espanholas, que quiseram testemunhar o seu apreço pelo jogador português do Real Madrid.

Sem dúvida que Cristiano Ronaldo é o português vivo, e mesmo o português tout court, mais conhecido em todo o mundo. As suas exibições justificam a distinção.

Felicidades, CR7.

CLAUDIO ABBADO




O maestro italiano Claudio Abbado, um dos mais notáveis regentes de orquestra das últimas décadas, morreu hoje em Bolonha, com 80 anos de idade.

Durante a sua extraordinária carreira musical, Abbado dirigiu as principais orquestras do mundo. De 1968 a 1986 foi director musical do Teatro alla Scala, de Milão. Dirigiu a Staatsoper, de Viena, de 1986 a 1991, tendo sido eleito director da Berliner Philharmoniker em 1989, lugar onde sucedeu a Herbert von Karajan, e que abandonou em 2002, por lhe ter sido diagnosticado um cancro.

Regressou aos palcos em 2004, após tratamento, e manteve-se em actividade até data recente.

A sua biografia ilustra um percurso excepcional ao longo da segunda metade do século XX. As suas interpretações, quer na música sinfónica, quer na ópera, apaixonaram o público e delas são testemunho os numerosos discos que gravou, ao vivo ou em estúdio.

A morte de Claudio Abbado empobrece a cena musical mundial.

domingo, 19 de janeiro de 2014

O REFERENDO




Ocorreu na passada sexta-feira, dia 17, na Assembleia da República, a aprovação da realização de um referendo sobre a co-adopção por casais do mesmo sexo. As peripécias que envolveram esta decisão do PSD e as circunstâncias em que ocorreu a votação por todos são suficientemente conhecidas para me dispensar de as evocar.

O que se verificou no Parlamento envergonha a Nação, que elegeu deputados que se prestaram a esta farsa sem qualidade (aliás, não haverá referendo, porque os termos em que foi proposto carecem de constitucionalidade) e desacredita este PSD de Passos Coelho e uns tantos, mais ainda do que ele já estava nesta data.

Permito-me transcrever do blogue "Da Literatura" dois textos publicados hoje, um de Pedro Marques Lopes, no "Diário de Notícias" e o outro de Pedro Santos Guerreiro, no "Expresso":


Pedro Marques Lopes, Uma vergonha sem nome, hoje no Diário de Notícias. Excertos, sublinhados meus:

«Primeiro o mais importante: na sexta-feira, em pleno Parlamento, assistiu-se a mais uma vitória de quem acha que se deve negar uma família a muitas crianças. Uma vitória dos que estavam revoltados pelo facto de haver crianças que finalmente viam a possibilidade de ter como pai ou mãe, de pleno direito, aqueles que o são de facto. [...]

Tudo isto aconteceu sob o alto patrocínio do primeiro-ministro e com a fundamental e imprescindível colaboração de uns senhores e de umas senhoras que não só partilham dos “valores” acima referidos, como quiseram fazer parte de um acontecimento que envergonha a história do PSD, achincalha o mandato que lhes foi conferido pelo povo e insulta a Assembleia da República e a democracia representativa.

Os deputados do PSD, que viabilizaram a lei da coadoção, passados alguns meses de a terem aprovado vêm apoiar um referendo sobre o tema. Não estavam no seu estado normal? Pensaram durante seis meses, debateram o projeto no grupo de trabalho e só agora se lembraram de um referendo? E mesmo os que votaram contra, será que gostaram de ver as deliberações da Assembleia desrespeitadas? E que dizer de um partido que dá liberdade de voto para a lei e impõe a disciplina de voto para o referendo dessa mesma lei? [...]

Perguntarão os portugueses: para que é que elegemos representantes se eles se demitem de decidir, e quando decidem o primeiro-ministro desrespeita o Parlamento e trata os deputados como moços de recados? Sim, está em causa o primeiro-ministro. Ninguém acredita que um indivíduo que esteve numa comissão durante seis meses se tenha lembrado de um referendo meia dúzia de dias antes da votação final. Nem que um projeto da JSD tenha tido um rigor tão apertado a forçar a disciplina de voto
 Pedro Santos Guerreiro, certeiro como um bisturi: Os neoliberais são ultraconservadores, ontem no Expresso. Excertos, sublinhados meus.

«Na verdade, não são neo nem são ultra. São de espécie anfíbia [...] O referendo foi feito para nem se fazer. Não há tempo, não há dinheiro, não há perguntas e não há pachorra. O Presidente da República poderá arquivar a intenção. Fará bem. O que não se arquiva é a manha institucional. PSD e CDS não querem a coadoção. Inventaram um expediente. A JSD serviu de barriga de aluguer, o PSD adotou e o CDS coadotou uma construção política de destruição legislativa. Quem quis? Quem impôs? Quem disciplinou? As “bases”.

As bases. As bases não são o povo, são os eleitores dentro dos partidos. [...] Foram elas, as bases, que impuseram este desfecho que envergonha até deputados que ontem cumpriram a religião continente de votar como lhes mandam. A demissão de Teresa Leal Coelho não basta para ser indignação, mas chega para ser dignidade. Que dizer dos deputados que votaram contra a sua consciência? [...] A objeção ou é um exercício ou não é objeção, é plasticina. A disciplina de voto pode fazer sentido, mas não neste caso. Mas serve de capote para acomodar a cobardia política sentada no Parlamento. A disciplina de voto tornou-se a disciplina de veto. Veto à própria Assembleia, que aprovara o processo legislativo, precisamente porque então houvera liberdade de voto. Ontem não houve liberdade. Escreveu-se torto por linhas tortas. Foi tudo triste. Tudo triste.

Mais importante do que o Direito são os direitos. Mais importante do que o golpe do referendo é a lei da coadoção. [...] Mais tarde ou mais cedo, esse é o curso imparável das coisas, a coadoção será legalizada. Já há crianças entregues a casais do mesmo sexo por decisão de juízes. [...]»

 SOMOS GOVERNADOS POR GENTE INDIGNA, É UM FACTO!

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

PATRIARCA MAS (AINDA) NÃO CARDEAL




Segundo informa a Santa Sé, o Papa reunirá um Consistório no próximo mês de Fevereiro, onde anunciará oficialmente a criação de novos cardeais. A lista dos futuros purpurados não inclui, ao que parece,  o actual Patriarca de Lisboa (D. Manuel Clemente), tradicionalmente elevado à dignidade no primeiro consistório realizado após a sua nomeação (que teve lugar em 2013).

A arquidiocese de Lisboa foi elevada a patriarcado em 1716, pelo papa Clemente XI, no reinado de D. João V e, desde então, o respectivo patriarca tem sido sempre designado cardeal, como se escreve acima.

Existem hoje três cardeais portugueses: D. José da Cruz Policarpo (n. 1936), Patriarca Emérito de Lisboa, D. José Saraiva Martins (n. 1932), Prefeito Emérito da Congregação para as Causas dos Santos e D. Manuel Monteiro de Castro (n. 1938), Penitenciário-Mor Emérito do Supremo Tribunal da Penitenciária Apostólica.

Na hipótese de ocorrer um conclave este ano, só teriam direito a voto, por terem menos de 80 anos, D. José da Cruz Policarpo e D. Manuel Monteiro de Castro.

Com a distribuição geográfica dos novos cardeais, a Europa, que durante séculos teve a quase exclusividade de representação no Sacro Colégio, fica definitivamente diminuída no que se refere à eleição do próximo papa.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

CRISTIANO RONALDO (A BOLA DE OURO)




Cristiano Ronaldo recebeu hoje, pela segunda vez, a Bola de Ouro atribuída pela FIFA, que o consagra  como o melhor jogador de futebol do ano transacto.

Apesar da polémica que antecedeu a decisão, trata-se de uma distinção inteiramente merecida, já que Ronaldo é muito melhor que Messi ou Ribéry, sob todos os pontos de vista.

Parabéns, CR7


DOS BONS COSTUMES NA BÍBLIA




A editora Bel Air publicou a gravação da ópera David et Jonathas, de Marc-Antoine Charpentier, espectáculo apresentado no Festival d'Aix-en-Provence, em 2012.

A orquestra Les Arts Florissants foi dirigida pelo maestro William Christie, sendo a encenação da responsabilidade de Andreas Homoki. O papel de David foi cantado por Pascal Charbonneau e o de Jonathan por Ana Quintans, em travesti, dada a dificuldade legal de contratar para o efeito um jovem de menor idade.



O tema, como é do conhecimento geral, ocupa-se dos amores entre David, futuro rei de Israel e de Jonhatan, filho do rei Saul, narrados no Antigo Testamento. O libretto é do padre jesuíta François de Paule Bretonneau e a ópera foi estreada no Collège Louis-le-Grand, em 28 de Fevereiro de 1688.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

PORTUGAL, O PAÍS DOS TRÊS "F"




Durante os últimos dias, tem o país vivido um autêntico e inusitado período de nojo. Nas duas acepções da palavra. De nojo, porque de luto pela morte de Eusébio, um estimável futebolista. Também de nojo, porque de náusea pela despudorada colagem dos órgãos de soberania, partidos políticos, autoridades autárquicas e outras entidades ao infausto acontecimento, na expectativa de obterem dividendos à custa das homenagens ao defunto.

Sou já suficientemente antigo para me recordar de outro notável jogador, também ele negro, de nome Matateu (1927-2000), cuja morte não constituiu motivo para uma "consternação nacional" como a que presentemente ocorre.

Na Antiga Roma, o Povo reclamava espectáculos e o Poder, complacente, concedia-lhos. Panem et circenses foi sempre uma forma de acalmar as reivindicações populares, e mesmo quando o pão escasseia, resta o circo. Convém compreender a psicologia das massas, Gustave Le Bon explica-o.

Durante o Estado Novo, os democratas apelidavam Portugal de país dos três "F": Fado, Futebol, Fátima. A tonitruante reivindicação, veiculada pela imprensa, a rádio, a televisão, a internet, de trasladar Eusébio para o Panteão Nacional prova que nada mudou.

Foi já na III República que Amália Rodrigues, expoente máximo do Fado, foi entronizada no Panteão de Santa Engrácia, quando, na verdade, os seus restos mortais ficariam melhor em mausoléu apropriado, num cemitério como o dos Prazeres, onde inicialmente se encontravam, o que mais facilmente permitiria a veneração dos devotos.

As multidões e quem delas se serve pretendem agora conceder honras de panteão a um vulto maior do futebol nacional, Eusébio da Silva Ferreira, de seu nome.


Para cumprir a trilogia dos três "F", porque não trasladar também para o Panteão o corpo da Irmã Lúcia, ícone do Milagre de Fátima, a quem a própria Virgem Maria terá aparecido? Estou certo de que os crentes das religiões monoteístas cristã e islâmica aplaudiriam com fervor e entusiasmo.

Por isso, proponho: a Irmã Lúcia para o Panteão Nacional. Já!

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

WALTER BENJAMIN E PROUST




A editora Plon/Grasset publicou recentemente um Dictionnaire amoureux de Marcel Proust, da autoria do escritor Jean-Paul Enthoven e de seu filho o professor Raphaël Enthoven. Trata-se de uma obra interessante, que reúne mais de 300 entradas, seleccionadas segundo escolha pessoal dos organizadores e relacionadas com À la recherche du temps perdu e o seu autor.

Pela novidade, transcrevemos a seguinte entrada:


Arcade (11, rue de l')

C'est, dans le quartier de Madeleine, à Paris, l'adresse de l'hôtel Marigny, le claque d'Albert Le Cuziat, alias Jupien. Aujourd'hui encore, s'y dresse un hôtel dont on suppose qu'il n'est plus, comme jadis, le «paradis du vice et des turpitudes» qui enchanta (horrifia?) Proust, Walter Benjamin, Jouhandeau, Maurice Sachs et quelques autres lettrés invertis.


Suspeitávamos, há muito tempo, dos gostos do filósofo e historiador judeu alemão Walter Benjamin, que, perseguido pelos nazis, se suicidou (?) em Portbou (França, junto à fronteira com a Espanha), em 26 de Setembro de 1940. Mas é a primeira vez que vemos, preto no branco, a confirmação da sua orientação sexual pela pena de dois insuspeitos franceses.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

O LÍBANO, OUTRA VEZ



A explosão de um carro armadilhado em Beirute, provocou hoje pelo menos quatro mortos e 77 feridos. Como afirmámos aqui, a guerra alastra da Síria ao Líbano, continuando a manter-se no Iraque.

Como advertiu Rami Khouri, no texto que se transcreve, é a próxima grande guerra dos tempos modernos que terá como campo de batalha o Médio Oriente.




Não sei se a invasão do Iraque, causa dos males que agora afligem a região, foi premeditada para ter este resultado, ou se ele é consequência da insanidade de Bush, Blair e respectivos acólitos.

Para os fins convenientes, segue a notícia da CNN:

Beirut, Lebanon (CNN) -- At least four people were killed and 77 injured when a car bomb exploded in a residential neighborhood in southern Beirut on Thursday, Lebanon's state-run National News Agency reported.

The explosion caused significant damage, Lebanese broadcaster Al Manar TV said.

Video from Al Manar showed people gathered around smoking cars, and others bringing hoses to put out the flames. Thick clouds of dust rose as buildings collapsed after the blast.

The district, Haret Hreik, is known as a Hezbollah stronghold. The blast was strong enough to be felt in nearby neighborhoods of the capital, NNA reported.

A source with knowledge of the security situation told CNN that the car bomb exploded near Al-Jawad restaurant, about 50 meters (55 yards) from a building used by Hezbollah.
There has not yet been any claim of responsibility for the blast.

Lebanon's armed forces, in a statement published by NNA, urged people not to gather in the area in case of further explosions. Experts are gathering forensic evidence from the scene, the statement said.

The explosion comes less than a week after a car bomb exploded in downtown Beirut, killing half a dozen people and injuring dozens.

Among those killed in that blast was Mohamad Chatah, a former Lebanese finance minister and ambassador to the United States. He was an outspoken critic of Hezbollah and the Syrian regime.

Hezbollah, a Lebanese-based, Iranian-backed Shiite militia that is better equipped than Lebanon's army, has been supporting government forces in neighboring Syria's civil war.

This has led to increased tensions in Lebanon, where sectarian divisions reflect those in Syria.

'Opened the doors of hell'

Outgoing Prime Minister Najib Mikati warned that worse is to come if the Lebanese people don't overcome their political differences and engage in dialogue, NNA said.

A member of the Future Bloc, a political group opposed to Hezbollah, condemned the bombing. Hezbollah's involvement in the Syrian crisis has "opened the doors of hell to Lebanon," said Ammar Houry, quoted by NNA.

Syrian Information Minister Omran al-Zoubi condemned the bombing, which he labeled a "terrorist act," Syrian state news agency SANA reported.

In an online statement, Derek Plumbly, the U.N. special coordinator for Lebanon, expressed his "outrage that this is the fourth bomb to have exploded in Beirut's southern suburbs since July."

"It is deeply distressing to have to condemn yet another appalling act of terrorism, the latest in the number which have killed and injured so many innocent people in this country," he said. Plumbly called for those responsible to be held accountable.

Car bombs in the same area of Beirut in July and August killed dozens and injured hundreds.

And in November, a suicide bomb attack outside the Iranian Embassy, close to the neighborhood where Thursday's attack occurred, killed two dozen people and injured about 150.

Earlier this week, Lebanese state media reported that Saudi Arabia had pledged $3 billion to strengthen the Lebanese army. The money will allow Lebanon's armed forces to buy weapons from France.

It's been seen as a move to counter the strength of Hezbollah, but many analysts are doubtful because of the time it will take to equip and train the Lebanese armed forces, in a period when tensions and violence are increasing day by day.

Hezbollah still enjoys wide backing in Lebanon, but some groups have been angered by its support for Syrian President Bashar al-Assad's forces.

'Proxy war'

Beirut-based Middle East analyst Rami Khouri told CNN the recent surge in violence in Lebanon was part of larger, regional turmoil.

"We are seeing the greatest proxy war of modern times playing itself out in Lebanon and Syria and Iraq, that have now become really one battlefield in which two great ideological camps are fighting to the death like gladiators," he said.

Political divisions and ideological tensions in Lebanon go back several decades, Khouri said, but they have been reinforced by the emergence of radical Islamist terrorist groups, linked to al Qaeda, following the U.S.-led invasion of Iraq.

The situation has been aggravated by the civil war raging on Lebanon's doorstep in Syria, Khouri said, but that is not its cause.

It's not clear who is behind the bombings, he said, adding that the violence is not from ordinary Sunnis and Shiites attacking each other, but a more complex picture of extremist ideologies.

Hezbollah was designated as a terrorist group by the United States in 1995 "for a long history of terrorist attacks against American citizens and officials, including the bombing of the U.S. Embassy and Marine barracks in Lebanon during the 1980s," the U.S. State Department website says.

The U.N.-backed Special Tribunal for Lebanon is due to begin the trial this month of four Hezbollah suspects in the 2005 assassination of former Lebanese Prime Minister Rafik Hariri. He was also killed in a car bomb attack.

Nota: O destaque é nosso.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

O CONFLITO NA SÍRIA




Neste primeiro dia do ano de 2014, fazemos votos para que o conflito que se desenrola há três anos na Síria, com centenas de milhar de mortos, feridos, estropiados, desalojados, emigrados, perdidos no turbilhão que tudo arrasa, possa ter um rápido fim.

Não sabemos se as próximas conversações de Génève, a iniciar em 22 deste mês, alcançarão o resultado pretendido, num país em que a longa duração da guerra tem antagonizado os seus habitantes. Impõe-se, todavia, uma solução. Não a invasão demencial projectada pelos Estados Unidos, a França, o Reino Unido e outros, mas a intervenção internacional e imparcial, que não tome o partido dos revoltosos contra um regime que conta ainda com o apoio de mais de metade da população que resta.

O que se tem verificado na Síria, sede de antiquíssimas civilizações, é uma vergonha para o mundo dito livre.

 É tempo de pôr fim a uma das maiores tragédias contemporâneas. É a hora!