quinta-feira, 28 de agosto de 2014

O FAIR PLAY NO JOGO DO PIÃO_História_3



Ainda hoje, conservo muitos dos meus brinquedos, que outrora me proporcionaram momentos de muita alegria e satisfação, apossando-se de mim, um não sei quê de nostalgia.

Eles contam as histórias, onde fui protagonista.

Desde uma caixa de cartão cheia de lego.

Um exército com todos os soldados e equipamento bélico.

Uma coleção de animais que mais parecia um jardim zoológico, tal é a quantidade e variedade de bicharada que saía na compra de uma determinada marca de detergente para lavar roupa a mão.

Junto a tudo isto, uma coleção de miniaturas de carros, os meus berlindes, o meu cubo mágico, um protótipo de uma locomotiva do início do século e o meu ioiô.

Mas de todas estas recordações, há efetivamente, uma muito especial, que se destaca e guardo com muito carinho, é o meu pião.

Ainda hoje, ocupa um lugar de privilégio nos objetos de decoração da minha casa.

Foi o meu companheiro de muitas horas de prazer, disfrutadas e partilhadas, com os meus amigos.

Sorrisos e tristezas.

Vitórias e derrotas.

Ele, ensinou-me a ver, que a vida é uma longa caminhada, calcorreando caminhos tortuosos, de paladar acre-doce.

Lembro-me dos despiques ao jogo do pião.

O Rafael, era um verdadeiro ás.

O Daniel, logo lhe seguia.

Reconheço, que eu nunca tive grande jeito, até ao dia que o Rafa, se dispôs a ser meu mestre no lançamento do pião.

Bom, aí subi muitos níveis e comecei a empenhar-me, e rapidamente atingi o patamar do Rafa e do Dani.

Depois, bom depois era só juntar uns trocos dos recados que fazia, para estar sempre na vanguarda dos modelos de piões que o Sr. António tinha para vender.

Tornei-me um bom cliente de piões, ponteiras e cordel a que chamávamos faniqueira.

Era o meu jogo preferido.

Grandes emoções, grandes despiques, chegávamos a fazer, campeonatos entre aldeias.

Eu, o Rafa e o Daniel, era-mos os ídolos e os mais fortes candidatos a vitória.

O mais difícil de se digerir, eram os jogos entre nós, já que se tornavam muito competitivos e intensos.

Como já sabia das dificuldades do Rafael, assumir as derrotas, tentava sempre não me expressar efusivamente, quando ganhava para não espicaçar a sua fúria.

A nossa aldeia detinha os expoentes do jogo do pião, com os mais novos, e o da malha com os mais velhos.

Era-mos, imbuídos de um espirito e raça ganhadora.

Nós, fazíamos de claque dos mais velhos, na malha e eles, retribuíam em relação aos nossos campeonatos do pião.

Recordo uma dessas competições, entre aldeias, de um rapaz que nós bem conhecíamos, de outros torneios e da escola, era inegavelmente um bom jogador, viu o Rafa, desferir um lançamento feroz e certeiro, que simplesmente, abriu o pião do Rui ao meio.

Foi um momento de gáudio que suscitou um grande aplauso, de todos que estavam a presenciar.

Era o consumar da nossa vitória, já que a equipa dele, não tinha mais nenhum pião de reserva, ficando com um jogador a menos.

Mas algo me chamou a atenção, fazendo desvanecer a minha alegria.

Quando olhei para o Rui, vi os olhos rasos de lágrimas.

Todos riam dele.

Tive uma atitude, que deixou todos da minha equipa incrédulos, e revoltados.

Meti a mão ao bolço e tirei o meu pião suplente.

Toma Rui, vamos continuar o jogo.

O Rafael soltou o desabafo.

 

Diogo? O que estás a fazer?

Deves estar a brincar connosco, só pode.

 

Senti que tinha todos contra mim, até o meu Irmão Rodrigo, estava a ser-lhe difícil digerir aquele meu gesto.

Só o André, me apoiou.

O rui, agradeceu-me e lá continuamos o jogo.

Foi uma verdadeira hecatombe.

O Rui, rapidamente imergiu, e logo se tornou num sério candidato a vitória.

Foi então que o Rafa, indignado repetia.

 

Andamos uns a jogar para os outros!

Assim não dá!

Já podia ter isto ganho.

 

Mais adverso se tornou o ambiente para o meu lado, já que o Rui ganhou.

O Daniel, insurgia-se contra mim, dizendo.

 

Parabéns Diogo, foste um herói.

Perdemos por tua culpa.

 

O André tomou a minha defesa bem como o Rodrigo.

 

Vamos ver uma coisa, eu até poço ter alguma dificuldade em entender o que o Diogo fez.

Mas daí culpá-lo da derrota e expressar dessa forma o que estamos a sentir, é injusto.

 

Eu estava consciente do meu ato.

Magoava-me mais, era a frieza e a incompreensão, da parte de alguns dos meus amigos.

O Rui, entregou-me o pião e agradeceu-me, dizendo.

 

O que vocês estão a fazer ao Diogo é muito mau.

Nem sei que raio de amigos vocês são.

Ao júri, quero desde já dizer, que esta minha vitória, é para atribuir ao Diogo.

Não é que a equipa dele mereça, pela atitude que tomou.

Mas pelo gesto, que teve para comigo, já que a minha continuidade em jogo deveu-se graças à boa vontade, ao emprestar-me o pião suplente dele.

Quero que esta vitória seja toda do Diogo.

Fico tão feliz como se fosse minha.

Mais uma vez deste uma grande lição a todos nós.

 

Demos um abraço fraterno, carregado de emoção.

 

Se queres mesmo saber Diogo, esta atitude vinda de ti, não me surpreende, já que pautas a tua conduta, por uma postura irrepreensível.

Pensei, que a tua equipa, formada pelos teus amigos, te conhecessem melhor.

Terão que rever, o verdadeiro significado de amizade.

 

Mantive-me em silêncio, deixei que o Rui, desabafasse, a sua revolta, perante a injustiça que presenciava.

Ele, era um dos meus bons amigos.

Ali no jogo, pertencentes a aldeias diferentes, era-mos adversários.

Mas para mim, imperava sempre o lado humano.

Eu sei que o Rafael, tinha feito uma grande jogada, mas as lagrimas do Rui, iriam para sempre manchar a nossa vitória.

Obrigado Rui, fiz tudo isto porque quis, e em circunstância alguma estava a espera desta tua atitude.

Mas obrigado, soubeste retribuir da maneira mais nobre.

 

Não podia ser de outra forma Diogo.

 

Ficamos isolados dos nossos grupos.

Já que a equipa do Rui acabou por não gostar que ele me atribuísse a sua vitória.

Mas acima de tudo ficamos de consciência tranquila, e aprendemos e demos, mais uma boa e bonita lição.

Obrigado Rui.

 

Eu é que te agradeço Diogo, por seres meu amigo e por seres assim.

 

De regresso a casa, o ambiente estava gelado.

O grupo estava dividido.

O Rafael e o Daniel, caminhavam mais a frente e o silêncio era ensurdecedor.

Eu vi que o Rafa e o Dani, foram aos poucos retraindo o paço para que nós os pudéssemos alcançar.

Agora, já todos juntos e chegados ao largo da aldeia, ponto para cada um seguir para sua casa, lá nos despedimos.

Eu carregava um semblante de desilusão.

Sentia-me magoado com a postura do Rafa e do Dani.

Chau, fiquem bem até amanhã.

Só vos quero comunicar uma coisa, no caminho tomei uma decisão.

Não contem mais comigo para qualquer tipo de jogos.

Para mim acabou hoje.

Quanto a nossa amizade, Rafael e Daniel, é algo que ainda vou refletir.

A vossa atitude, deixou-me bastante desapontado, e apreensivo.

Mais uma coisa, aprendam o significado de fair play, vai vos ser muito útil pela vida fora, e engrandece-nos.

Eu sou assim.

Desta forma vou pautar a minha vida.

Quem quiser ser meu amigo de verdade, terá que me aceitar tal como sou.
Egoísmo não!

 

Diogo, tem calma, escuta uma coisa.

Achas que se tivesse sido o Rui, a rachar o pião de algum de nós, tinha tomado a mesma atitude?

 

Não, claro que não Rafael.

Mas sabes porquê?

Ele não tem mais nenhum pião.

Rafael, as atitudes ficam com quem as pratica.

O Rui, soube estar, e portar-se à altura de um campeão.

Comigo não contem mais.

Competir e ganhar sim, mas repito, com fair play!

 


Diogo_Mar

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

UMA TARDE NO RIO_HISTÓRIA_2



Preguiço na cama do tempo, como se ele fosse o relógio,

Onde os anos são horas,

Os meses os minutos,

Os dias segundos.

Percorro esse longo e íngreme caminho que me trouxe até aqui.

Vasculho na minha memória passagens que fizeram o meu livro de vida, que vou partilhando no meu blog, em forma de prosa, ou de poesia.

Vai daí, e já estou pronto para vos transmitir mais uma peripécia da minha adolescência, essa idade onde quase tudo nos é permitido fazer.

Só ainda não encontrei a definição correta, já que fico dividido entre:

Puberdade, ou pobre idade lol!

Seja lá como for, é o patamar mais aparvalhado, mas o mais belo da nossa existência.

 

Foi numa tarde, sob um sol escaldante, que castigava o alto Douro, como de resto é normal no pico do verão, que fomos até ao rio.

Era sempre assim, quando a temperatura, nos convidava a uns bons mergulhos, Naquele belo espelho de água, que banha aquela região.

Nós não nos fazíamos rogados.

O rio Douro, é o nosso ex-líbris da paisagem, parece que joga ao esconde esconde, por entre vales e montanhas, assim, como chama a si, a responsabilidade, por aquele microclima que disfrutamos naquelas paragens.

Ténis, calções, t-shirt e boné montados nas nossas bikes aí estávamos nós prontos para uma tarde de grandes emoções.

Eramos seguidos de perto pelo Dique, o meu Cão, que estava eufórico porque já sabia onde íamos, pela direção que estávamos a tomar.

Tenho que reconhecer, que vestir um fato de pelo, em dias de calor não devia ser nada agradável.

Por isso, toda a sua alegria desconcertante e trapalhona.

Tínhamos que o reprender por vezes, já que se atravessava por entre as bicicletas, atentando a nossa integridade física.

 

Vá, Dique, calma!

 

Repreendeu o André.

O caminho foi-se estreitando, seguíamos em fila indiana, o cão tomou a dianteira do pelotão.

Quanto mais nos aproximávamos, mais ele corria, língua de fora arfava com intensidade, agitando a cauda.

Íamos em roda livre, aproveitando a inclinação do traçado, que serpenteava os vinhedos.

As nossas narinas eram inundadas pelo perfume do mosto, sinal de uvas boas e maduras.

Eis chegados.

Encostamos as bicicletas, tiramos os ténis, as t-shirts e os bonés, e lá vai disto.

O Dique já estava todo encharcado.

Ladrava, expressando toda a sua alegria, parecia dizer que a temperatura da água, estava boa.

Claro está, provocando-nos para as brincadeiras que sempre fazemos com ele.

O Daniel e o André, foram os primeiros a lançarem-se a água, imediatamente seguidos por mim, o Rodrigo e o Rafael.

Sabíamos, dos cuidados que tínhamos de tomar, já que 3 anos antes, um rapaz de uma aldeia vizinha, tinha morrido afogado num local mais acima.

Daí a nossa atenção.

Embora, todos nadássemos bem, mas de heróis está o cemitério cheio.

Entre braçadas piruetas e brincadeiras com o Dique, a quem lançávamos um pau, e logo ele se atirava a água para o ir buscar.

Levamos uma bola, para darmos uns toques.

Estavam reunidos todos os requisitos para uma fantástica tarde de verão.

Não demorou, que mais gente chegasse.

O rio, era um ponto de encontro de diferentes gerações, nos dias quentes.

Não tínhamos que nos preocupar com os nossos haveres, já que dessa tarefa o Dique se encarregava.

Ninguém estranho ao nosso grupo, ousava aproximar-se do sítio onde estavam Os nossos pertences.

Tomava conta de tudo e até de nós.

Quando eu, ou o Rodrigo nos afastávamos mais da margem, ele ficava nervoso, ladrava freneticamente, como se nos estivesse a repreender.

 

Diogo, e Rodrigo, não nadem para longe, o cão não se cala!

 

Pedia o Rafa.

Nós era-mos profundos conhecedores daquele local, mas não fosse o Diabo tecê-las.

Regressamos ao perímetro em que o Dique nos consentia estar.

 

Vá, tem calma já cá estamos meu lindo.

 

Disse-lhe o Rodrigo.

Cobria-nos de lambidelas de satisfação, por nos ter de volta.

 

Diogo, ao teu cão, só lhe falta falar!

 

Diziam os outros rapazes, que foram chegando.

Fizemos um joguinho de futebol, e rematamos com mais um bom e reconfortante mergulho.

Amarramos as t-shirts aos guiadores das bikes e começamos a pedalar para casa, disfrutando daquela frondosa paisagem em anfiteatro que a natureza nos oferecia.

Fizemos uma paragem junto de um pessegueiro onde comíamos os mais saborosos e suculentos pêssegos.

Ao longo do percurso, fomos colhendo algumas amoras e uvas, das quais eramos apreciadores.

O que na ida para o rio era fácil, já que íamos quase em roda livre, agora tínhamos que pedalar com afinco.

Em alguns pontos, o caminho tornava-se bastante sinuoso.

 

Já dava outro mergulho Diogo!

 

Dizia o Rafa.

 

Até eu, retorquiu o Daniel.

 

Mesmo em tronco nu, o calor castigava.

Quando chegarmos a minha casa ligo a mangueira sugeri eu.

 

Diogo, tenho melhor ideia.

 

Qual André?

 

O meu Avô, tem o tanque cheio, para regar mais logo, por isso podemos lá ir dar um mergulho.

 

Boa, isso mesmo.

Bora lá, só vou a casa, deixar o Dique, e vou lá ter convosco.

Abri o portão fronteiriço, para o meu cão entrar.

Ele estava sequioso, e cansado.

Fiz-lhe uma festa, e segui viagem para casa do Avô do André, o Sr. Fonseca, um senhor muito simpático, de quem todos nós gostávamos.

 

Então rapazes, não chegou o banho no rio?

 

Quando se chega aqui acima, já temos de tomar outro banho.

Respondeu-lhe o André.

 

Temos por arte mágica, inverter a posição do caminho!

 

Gracejou o Rodrigo.

 

Pois, para baixo todos os santos ajudam, o pior é na vinda.

Mas vocês são novos e valentes!

Vá divirtam-se.

 

Obrigado Sr. Fonseca.

 

De nada Diogo.

 

Se quiserem comer, tu André, conheces os cantos a casa, e a tua Avó prepara-vos um merendeiro.

 

Ok, Avô, obrigado.

 

Não viemos para aqui, para dar trabalho, disse-lhe eu.

 

Ora essa, Diogo mas que trabalho que carapuça.

Gosto de vocês, e são amigos do meu neto.

Em minha casa, os amigos são sempre bem-vindos e bem recebidos!

 

Esta é a bandeira, que define as gentes Alto-durienses, serem amigas do amigo, e hospitaleiras.

 

Até logo rapazes.

 

Obrigado, e até logo, dissemos nós em uníssono.

E agora, 1 2 3!

Mergulhooo!!!

 


DIOGO_MAR

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

FRAGA ALTAR DA MINHA ALDEIA



Fraga encarquilhada pelo tempo, que se perde na história

Fraga gélida imponente e com memória.

 

A erosão a que o vento te castiga

Fazem um enlace ao traçado da minha vida.

 

Essa tua imponência, rugas e frieza

Dão contornos únicos a tua beleza.

 

Deitado no teu colo, oiço as histórias que tens para mim

Fecho os olhos, viajo no tempo

Folheio o livro do sem fim!

 

Acariciava as tuas rugas, e as gretas expostas ao tempo

No meu ouvido ecoava a tua voz, chorava de tristeza dor e de sofrimento.

 

Fraga gigante confidente do universo

Brotas palavras tão belas que não cabem neste verso.

 

As feridas rasgadas pelo vento agreste, desventrando o teu corpo

Numa luta titânica contra o tempo, trespassaram-te deixando morto.

 

Fraga altiva e serena, guardiã de histórias que se perdem no tempo

Sussurras-me ao ouvido a melodia do sentimento.

 

Gosto de te contemplar, lá no alto da serra, como se fosses o adamastor

A herança que em ti encerras, é o testemunho do meu amor.

 

 Amor que simbolizas, nesse corpo rude, escarpado e sofrido

És a bela de uma história onde fico adormecido.

 

Fraga da minha aldeia, marco geodésico altar para o mundo

Carregas aos ombros, séculos de lendas e mitos onde me perco feito vagabundo!

 

Património de Deus ou do homem, um testamento inacabado

Doaste-me um pedaço de ti, que ainda hoje guardo.

 

A tua voz, num murmúrio trémulo de saudade

Agastada pelos longos anos sem idade.

 

Viste o meu primeiro beijo, aquele que roubei

Fraga amiga, não contes a ninguém, eu também não contarei!

 

Um beijo de inocência da minha tenra infância

Dos verdes anos da minha adolescência.

 

Ainda hoje lá moras, adormecida dentro da tua altivez

Fraga da minha história

Acorda!

Diz comigo

Era uma vez?

 

 

DIOGO_MAR