Na cama preguiçosa de domingo
23 de set. de 2012
20 de set. de 2012
Nino
-- Oi, Nino, bom dia!
-- Oi, Sonia...
-- É impressão minha ou esse oi tá meio desanimado hoje?
-- Ah, não é nada, não... Quer dizer, é só uma coisa que eu andei pensando...
-- Hmm. E eu posso saber ou é segredo?
-- Não tem segredo nenhum! É só uma ideia meio maluca...
-- Oba, adoro ideias malucas! Vai me contando enquanto a gente mede a sua temperatura.
-- Foi por causa disso mesmo que tive essa ideia!
-- Ih, você está me deixando muito curiosa!
-- É que também devia existir um tipo de medidor de amor, igual a esse que mede febre.
-- Nino! Essa ideia é maluca mesmo! Como assim?
-- Ah, é fácil. A gente coloca o aparelho em cima do coração e pronto. Se ficar vermelho, quer dizer que a pessoa tá sentindo amor. Quanto mais forte o vermelho, mais forte é o amor! E já pensei até no nome do aparelho – amorzômetro!
-- Uau! E como foi que você teve essa ideia tão genial?
-- Foi por causa da Amanda...
-- Aha, entendi!
-- Com o amorzômetro eu logo ia descobrir se ela também gosta de mim. Nem precisava ficar perguntando.
-- É uma grande ideia, Nino. Aposto que um monte de gente ia querer ter um aparelho desses!
-- Antes, eu queria ser bombeiro, mas agora quero ser inventor.
-- Que bacana, Nino!
-- Às vezes fico pensando num monte de coisas que podiam ser inventadas... Um xampu com espuma-fazedora imediata de cabelos, um óculos de chuva com limpador de vidro, e também um escorregador com botão de marcha-a-ré pra gente subir sentado e escorregar de novo quantas vezes quiser. Já pensou? Dava pra brincar um tempão sem cansar nunca!
-- Nossa, Nino, quantas ideias incríveis...
-- É por isso que quero ser inventor. Falta tanta coisa nesse mundo!
Nino é o personagem criado pelo meu parceiro Daniel Kondo para o ITACI -- Instituto de Tratamento do Câncer Infantil--, e essa conversa faz parte da história que estamos preparando juntos.
19 de set. de 2012
Reviravento
Vento é assim: muda de jeito e de direção
Pode ser cortante como tesoura
E consegue varrer o chão sem vassoura
Pode ser cortante como tesoura
E consegue varrer o chão sem vassoura
Leva e traz cheiro de chuva, de bolo e de flor
Refaz o desenho das nuvens
Refresca o sol, alivia o calor
Vai e vem, levando folha, papel e pensamento
Vem e vai, imprevisível a cada momento
Faz a gente ficar arrepiada, alegre e também triste
Faz a gente lembrar que as coisas invisíveis existem
Refaz o desenho das nuvens
Refresca o sol, alivia o calor
Vai e vem, levando folha, papel e pensamento
Vem e vai, imprevisível a cada momento
Faz a gente ficar arrepiada, alegre e também triste
Faz a gente lembrar que as coisas invisíveis existem
18 de set. de 2012
Max (2)
Eu andava atrás de um nome para certo personagem quando o próprio apareceu na fila da padaria -- contei essa história aqui, no mês passado. Confesso que ainda estava pensando será que isso, será que aquilo, será que Max? A resposta apareceu ontem no meu mural do facebook. Obrigada, Eunícia Fernandes!
13 de set. de 2012
Relicário
No começo, era só um vaso de barro não muito grande, duas mudas magrinhas, promessas de felicidade e fortuna enraizadas na mesma terra. Cresceram devagar sobre as pedras que iam chegando de tantos lugares, plantando ali histórias de rios, montanhas e dias de sol. Hoje as árvores tocam o teto da sala, abraçadas dentro de um vaso largo e amarelo, junto com os cristais transparentes e o buda da sorte, a corujinha de pedra-sabão da minha mãe, o enfeite que meu filho fez numa noite de um natal distante. Gosto de rezar assim: regando a minha planta.
11 de set. de 2012
Entrevista
Ficou uma lindeza a reportagem de Aryane Cararo sobre o "Psssiu!" no Estadinho do último sábado -- como não achei o link, selecionei alguns trechos da entrevista que ela fez comigo e com Daniel Kondo.
De onde veio a ideia para o livro? SILVANA -- Do próprio Silêncio! Certas coisas a gente só escuta quando conversa com ele.
Qual foi a concepção para ilustrar o livro?
DANIEL -- Criar dois personagens-perguntadores que pudessem dar voz ao Silêncio.
Por que a escolha por traços “simples” e poucas cores?
DANIEL -- Pra conseguir escutar as coisas que o Silêncio pode nos contar, quanto menos interferência, melhor!
Quem são os personagens que aparecem ilustrados no livro?
SILVANA -- Somos nós, e todo mundo que fica curioso tentando adivinhar o que o Silêncio fala.
Quando o Silêncio dorme, o ambiente fica ainda mais silencioso? Ou o barulho aparece?
SILVANA -- Depende. Às vezes, o Silêncio até ri enquanto está sonhando...
DANIEL -- Eu já acho que o Silêncio nunca dorme -- nós é que somos barulhentos e nem sempre percebemos que ele do nosso lado.
O que cansa o Silêncio?
SILVANA -- Ter que fazer sala pra visita que aparece sem convite, como certos pensamentos folgados, que vão entrando na casa dele a qualquer hora e sem pedir licença.
DANIEL -- Britadeira, furadeira, choradeira e gente que fala asneira.
Quando vocês ficam em silêncio?
SILVANA -- Sempre que consigo me desligar de todos os barulhos, os de dentro e os de fora.
DANIEL -- Em muitos momentos do dia, mas principalmente quando olho para um céu azul.
Quando o silêncio é bom?
SILVANA -- Quando ele me põe no colo e conta histórias.
6 de set. de 2012
Canhota
Diário do gesso: cada vez que tento escrever com a mão direita, lembro dos meus primeiros anos de escola e das professoras que viviam tirando a caneta da minha mão esquerda -- quem mandou não aprender?
3 de set. de 2012
30 de ago. de 2012
Meu querido escafóide
Você sempre esteve aqui, inteirão, junto comigo para o que desse e viesse. Apesar disso, eu não sabia nada sobre você, nem seu nome, e confesso: nosso relacionamento provavelmente seguiria sendo como sempre foi -- distante, pra não dizer inexistente. Peço desculpas, mas é que, às vezes, a gente só se dá conta de certas importâncias quando acontece uma ruptura. Se você não tivesse rachado, eu não saberia como pode ser difícil escovar os dentes, pentear o cabelo e fazer uma infinidade de coisas que sempre foram "grátis", afinal, você nunca cobrou por nada disso! Entendo sua revolta, mas, poxa, você sabe que sou da esquerda, não precisava ser tão radical assim... Bom, agora é tarde, não dá pra gente negociar, e você me pede paciência. Vamos em frente! Nosso primeiro contato foi meio traumático, é verdade, mas temos pelo menos trinta dias pra ajustar as coisas e restabelecer o nosso vínculo. Enquanto isso, aproveito pra conhecer melhor o seu irmão gêmeo que tem feito o possível e o impossível pra me mostrar tudo o que a mão direita é capaz de fazer -- e eu que sempre chamei a pobrezinha de desajeitada?
...
No sábado, conversando com meu querido escafóide, no pátio do pronto-socorro.
28 de ago. de 2012
24 de ago. de 2012
Eu me lembro
A vila de sobradinhos geminados, a calçada estreita, a rua de paralelepípedo, o canteiro de gerânios vermelhos, a porta com janelinha de vidro atrás da grade, o sorriso da avó abrindo a janelinha, a sala apertada, os móveis escuros, a poltrona grande com pata de cavalo, a mesa de madeira, e a menina sentada no chão, debaixo da mesa-casinha, apartando a briga da boneca loira com a morena por causa do vestido vermelho de bolinhas brancas.
23 de ago. de 2012
Recreio
Estava trabalhando na maior concentração quando veio a dúvida: como é mesmo o título daquele livro? Google após google acabo chegando no blog da Livreira Anarquista, de onde tirei essa lindeza de ilustração, depois de passar um tempão me divertindo com as "pérolas da sabedoria freguesa" ou: perguntas hilárias dos clientes que essa livreira atende, em algum lugar de Portugal. Delícia de recreio.
21 de ago. de 2012
Idades
Ontem eu vi um homem de quase 50 anos sendo de novo e ainda um menino.
Aconteceu enquanto ele me contava como era bom quando o avô aparecia pra jantar e esticava a visita até a hora em que ele e os cinco irmãos tinham que ir pra cama. Naquelas noites especiais, os seis se amontoavam no quarto maior, o das meninas, pra ouvir história, mas ele, caçula da turma, nunca conseguia ficar acordado até o final, a voz do avô embalando o sono, preenchendo a imaginação com paisagens, personagens e sonhos. Ouvindo-o falar do esforço que fazia pra não adormecer e do quanto se sentia frustrado no dia seguinte, vi o homem e o menino franzindo os olhos num mesmo tempo -- o tempo que nos suspende e nos atravessa continuamente com todas as idades que vivemos: naquele momento, ele tinha 1, 2, 3... e também quase 50 anos.
Aconteceu enquanto ele me contava como era bom quando o avô aparecia pra jantar e esticava a visita até a hora em que ele e os cinco irmãos tinham que ir pra cama. Naquelas noites especiais, os seis se amontoavam no quarto maior, o das meninas, pra ouvir história, mas ele, caçula da turma, nunca conseguia ficar acordado até o final, a voz do avô embalando o sono, preenchendo a imaginação com paisagens, personagens e sonhos. Ouvindo-o falar do esforço que fazia pra não adormecer e do quanto se sentia frustrado no dia seguinte, vi o homem e o menino franzindo os olhos num mesmo tempo -- o tempo que nos suspende e nos atravessa continuamente com todas as idades que vivemos: naquele momento, ele tinha 1, 2, 3... e também quase 50 anos.
20 de ago. de 2012
Bom de ler
"Tina gosta muito disso que está lhe acontecendo agora, essa nova vida que leva desde que sua amiga veio morar ao lado da sua casa. A mãe de Carlota nunca está aborrecida ou nervosa, como às vezes fica sua avó Hermínia; a mãe da sua amiga tampouco tem pressa, então as três vão andando pelas ruas como se fossem uma mãe e suas duas filhas. Ela sabe, porém, que a mãe de Carlota não é a sua mãe, e então, em meio à alegria que sente por comer amendoim ou sentar-se com as duas num banco da praça, aflora também uma tristeza que não sabe bem de onde vem e que às vezes demora muito para ir embora."
Terminei "A menina, o coração e a casa" encantada com a escrita da argentina María Teresa Andruetto.
17 de ago. de 2012
15 de ago. de 2012
Max
Vou caminhar com a firme intenção de me concentrar nos nomes, o do cachorro e o do gato. Não estou conseguindo continuar a história sem esses nomes, e sei que não vou encontrar o que preciso no google ou nos livros. Então resolvo dar uma volta, arejar sempre é bom, vai que tropeço numa boa ideia, quem sabe? Pra não ficar andando a esmo, sigo na direção do parque e ponho em prática meu plano inicial: listar possibilidades de nomes em ordem alfabética. Nem bem começo, já empaco: um nome para o cachorro com a letra A? Que coisa mais difícil! A...Astolfo, Armagedon, ai, ai, ai, melhor ir em frente, Boris, Billy e... E o que mesmo? Muito antes de chegar à letra C, meus pensamentos atravessam a rua -- um deles se encanta com uma árvore toda florida, outro escapa pra ouvir a conversa de duas mulheres que passam e, quase ao mesmo tempo, meus olhos colam na capa da revista que o jornaleiro está pendurando na frente da banca. Estou flanando a quilômetros do meu assunto quando entro na padaria, e então acontece: enquanto espero a próxima fornada de pão de queijo, com água na boca, vejo o cão. Um golden grandão de pelo clarinho avança na minha direção, puxando o menino que segura a coleira, e quando os dois entram na fila, bem atrás de mim, adivinho que estou prestes a descobrir o nome do meu personagem.
10 de ago. de 2012
Ai, que delícia!
Quando eu menos espero ela aparece: a bruxa Creuza aterrissou na Livraria Casa de Livros e acabou até ditando o texto para o projeto Literatura na Parede.
9 de ago. de 2012
7 de ago. de 2012
Dois meninos
O mais alto deve ter sete, oito anos. O outro não tem mais do que cinco. O maior corre atrás do menor, em volta do fusca creme, estacionado num corredor-garagem, ao lado da loja de tintas. Num dos cruzamentos da rua Cerro Corá, o farol fica verde, amarelo, vermelho e novamente verde, mas os carros não se movem, então abaixo o volume do rádio e fico ouvindo a risada gostosa dos meninos, os gritinhos aflitos do pequeno cada vez que o outro inverte o sentido do pega-pega, tentando surpreendê-lo em pleno voo. Pra que a brincadeira não termine, o mais velho diminui o ritmo, quase para até o menorzinho recuperar o fôlego. É só um instante e logo estão correndo de novo, rindo do que já sabem que vai acontecer: o maior repete a armadilha, o pequeno leva o mesmo susto, como se fosse a primeira vez.
Quando o trânsito começa a fluir, avanço sem pressa, olhando os meninos pelo espelho retrovisor, agradecida por me fazerem lembrar que a alegria não precisa de motivo pra acontecer.
Quando o trânsito começa a fluir, avanço sem pressa, olhando os meninos pelo espelho retrovisor, agradecida por me fazerem lembrar que a alegria não precisa de motivo pra acontecer.
...
Andei remexendo em textos antigos, como esse, publicado aqui.
2 de ago. de 2012
O sabor das palavras
Framboesa: a frutinha é linda, e a palavra que a nomeia também é. Mas o sabor quase sempre me decepciona, como se o visual e a sonoridade do nome prometessem muito mais. Acontece o mesmo com a exótica carambola -- fico com água na boca, seduzida por essa palavra tão gostosa de se falar e acabo me frustrando com o sabor (geralmente) sem graça da fruta.
Dias atrás, uma amiga confirmou minha teoria lembrando da famosa sobremesa que a avó húngara preparava quando ela era pequena. O doce de carambola nem era bom, ela me diz, mas fazia o maior sucesso porque ficava lindo dentro do pote e tinha um nome delicioso: "compota de estrelas".
O sabor de certas palavras é mesmo irresistível.
Dias atrás, uma amiga confirmou minha teoria lembrando da famosa sobremesa que a avó húngara preparava quando ela era pequena. O doce de carambola nem era bom, ela me diz, mas fazia o maior sucesso porque ficava lindo dentro do pote e tinha um nome delicioso: "compota de estrelas".
O sabor de certas palavras é mesmo irresistível.
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