Virei-me para o outro lado
Carregado desta dura solidão
Grito o grito enternamente calado
De tanto ser maré, pedaço de carne e pão
Deixo-me cair, num silêncio embriagado
Vazio de mim, sem verso ou canção
Na pele, um sangue que corre envenenado
Nos olhos, os calos da palma da mão
Vejo passar as palavras em tom magoado
Rios de sangue e dor, lágrimas e paixão
De tudo, fica-me um aconchego desaconchegado
Um caminho de vertigem, fome e sofreguidão
Onde pára a magia do abraço já cansado?
Essa luz cega de queimar meu coração?
Ai, que saudades do futuro, do passado
Que do presente, me iludo, quem sabe em vão...
Seremos de novo magia e fado?
Melodias de tamanha inquietação?
O tempo... virá ditar o seu ditado
Enquanto me envelheço assim, sem dó nem perdão...
Vale a pena tudo isto, o brilho forte e delicado
Numa nuvem pousado na tua direcção?
Vale a pena um sonho assim acordado
Se da noite me consumo escravo no porão?
Mal sei da minha viagem onde tudo levo guardado
Dos que perdi... um enorme calor no coração
Dos que ganhei... um louvor de punho fechado
Mal sei da minha viagem, travessia e dura solidão