Por André Debevc
...e se alguma coisa tiver quebrado?
...e se for uma daquelas coisas que não tem conserto?
...e se for uma dessas coisas sem volta?
Uma pessoa só é realmente importante na sua vida
quando o que ela pensa, ou deixa de pensar,
faz toda a diferença para você.
sexta-feira, agosto 15, 2014
Um amor – platônico – de adolescência
Por André Debevc
Todo sujeito já ouviu, em
algum momento da adolescência, que amores platônicos existem para nunca serem
consumados. Que são desse tipo de amor ou paixão que nasceu para pastarem
inofensivos, sempre no terreno das idealizações. Meras fantasias que existem só
na nossa cabeça, sem nenhuma chance de acontecerem de verdade.
E foi se escondendo atrás
da esfarrapada desculpa de que a expectativa é a mãe de todas as merdas, que
aquele menino lá do alto do edifício cresceu. Poderia até se dizer que num
momento, foi apaixonado, em silêncio, por sua vizinha de prédio.
Sempre que encontrava com
ela, a menina mais bonita do universo, seu coração disparava, e ele se via
atrapalhado com as palavras, que mal se organizavam para sair de sua boca.
Nos sempre curtos
encontros, esperando o elevador ou nas breves viagens até o andar dela, era
como se ele ficasse procurando (sem nunca encontrar) as palavras certas. Hoje
talvez chamassem isso se roaming emocional, sei lá. Sei que ele era muito mais
do que um garoto tímido. Era o menino que ia crescer sem nunca a tirar pra
dançar. Nunca a abraçar devagarinho. Foi o cara que nunca conseguiu – e nem
tentou – a beijar com carinho.
Eles tinham acabado de
entrar na adolescência, e um belo dia ela entrou no elevador, e mudou toda a
vida dele. A partir desse dia, era como se ela tivesse sempre um sol e uma
praia só pra ela. De onde quer que viesse, sempre vinha iluminada. Aos olhos
dele, eternamente linda, com cabelo preso num rabo de cavalo. Quase sempre
séria, sorrindo mais com os olhos do que com os dentes. A filha da família mais
bacana do prédio. Perfeita imagem de um verão interminável, passando pelo
Jardim Botânico num apaixonante vestido azul de alcinha.
Ele era um cara com milhões
de coisas para dizer, mas que ficava cercado de silêncios e hesitações de todos
os lados quando a via. Ele foi o cara – já no fim da adolescência – que um dia
se encheu de coragem e pediu o telefone dela. Mas que, amarrado pela timidez,
nunca ligou. Que nunca a pegou pela mão e nem a olhou no fundos dos olhos
castanhos, sem pressa de ir embora. O admirador nada secreto e muito inseguro,
que sempre achou que talvez ela gostasse mais de surfistas e dos garotos mais
populares do que ele, sem nunca nem tentar saber se isso era mesmo verdade.
Uma paixão adolescente e
platônica. E como em todas as paixões, ele também tinha na cabeça uma cena que
só ele tinha visto umas mil vezes. Ele parando o elevador, a puxando e roubando
um beijo. Mas nunca teve coragem. E nunca teve nem um beijo. Porque, ele por
algumas vezes hesitou – o maior pecado na vida de um homem – porque pensou mil
vezes o quanto ela diria não, o quanto poderia parecer um tolo moleque
apaixonado. E vulnerável, claro. E se tem uma coisa que um garoto no caminho de
se transformar em homem não quer mostrar, é vulnerabilidade. Ah, quanta
imaturidade…
Passou anos, subindo e
descendo aqueles elevadores, e perdeu a chance que talvez tivesse nessa vida,
por ser refém de uma paixão platônica maior que ele. Não consegue lembrar uma
só vez que tenha a visto em que ela não estivesse sempre linda e morena.
Perfeita. A filha favorita do sol e do mar. Linda e inatingível. Não foram
poucas as vezes em que entrou naquele elevador pensando nela. Acreditava que se
Deus está nas coincidências, como dizia Nelson Rodrigues, O Criador aparecia
toda vez que o elevador parava no segundo andar e ela, só ela, entrava.
Hoje, em tempos de amores
que passam rápido, e escorrem pelas mãos, ele pode olhar para trás e dizer que
teve uma paixão ou amor nunca realizados. Com um telefone para o qual ele nunca
ligou. Com a menina linda do segundo andar que ele nunca vai esquecer. E que
talvez um dia ele pudesse ter beijado, se não tivesse sido refém da única coisa
maior que sua vontade de conseguir tê-la nos braços: o medo de um dia não poder
beijá-la nunca mais.
segunda-feira, agosto 04, 2014
DESENCONTRO no 4357 (André Debevc)
e de tanto esperar, se viu de novo
num lugar desconfortavelmente familiar.
não seria a primeira,
e nem a última vez,
que se decepcionaria.
e mesmo depois de tantas vez,
ainda não tinha se acostumado com aquele gosto
de quem engole seco para não ter que engolir o choro.
pediu para descer do carro antes,
e foi andando na garoa fina e insistente,
esperando (mais uma vez) que a água lavasse
a decepção estampada no seu rosto.
caminhando no frio,
descobriu-se sozinho,
sem ajuda nem para enterrar
o cadáver das suas últimas expectativas.
num lugar desconfortavelmente familiar.
não seria a primeira,
e nem a última vez,
que se decepcionaria.
e mesmo depois de tantas vez,
ainda não tinha se acostumado com aquele gosto
de quem engole seco para não ter que engolir o choro.
pediu para descer do carro antes,
e foi andando na garoa fina e insistente,
esperando (mais uma vez) que a água lavasse
a decepção estampada no seu rosto.
caminhando no frio,
descobriu-se sozinho,
sem ajuda nem para enterrar
o cadáver das suas últimas expectativas.
SEM SACIAR A SEDE (André Debevc)
sempre que olhava pra ela, pensava em silêncio:
- você me dá uma sede que eu não posso ter.
se fosse paixão,
seria platônica.
mas não era.
era vontade.
uma vontade que ele tinha.
mas talvez fosse melhor que não tivesse.
porque era dessas vontades
que só passam
quando são saciadas.
e substituídas por outras.
ele gostava dessa (vontade).
por isso, sempre que olhava pra ela, tinha uma certeza:
ela provocava nele uma sede que ele não sabia como não ter.
- você me dá uma sede que eu não posso ter.
se fosse paixão,
seria platônica.
mas não era.
era vontade.
uma vontade que ele tinha.
mas talvez fosse melhor que não tivesse.
porque era dessas vontades
que só passam
quando são saciadas.
e substituídas por outras.
ele gostava dessa (vontade).
por isso, sempre que olhava pra ela, tinha uma certeza:
ela provocava nele uma sede que ele não sabia como não ter.
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