Portugal e Jonas Savimbi
24 de Fevereiro, 2013
Uma parte significativa das elites
políticas corruptas e intelectuais portuguesas fez tudo para que Angola não
fosse um país independente. Se o plano aprovado na ilha do Sal por Spínola,
Nixon e Mobutu tivesse resultado, hoje as elites portuguesas e a sua imprensa
tratavam os angolanos como trataram durante décadas a UNITA. Já a ONU tinha
aprovado pesadas sanções contra a organização de Jonas Savimbi e os seus
dirigentes e Portugal era ainda um paraíso para os sancionados. A imprensa
portuguesa apresentava Savimbi como um herói. Mário Soares, então presidente da
República, tratava-o como um amigo e o seu filho João como compadre. Altos
dirigentes políticos seguiram o exemplo e curvaram-se reverenciais diante dos
servidores do colonialismo e organizados nas forças repressivas do regime de
“apartheid” da África do Sul.
Nunca a imprensa portuguesa referiu que
Savimbi foi um dos carcereiros de Nelson Mandela, ao colaborar com o regime
racista da África do Sul. Ou que pôs as suas armas ao serviço da sangrenta guerra
colonial. Os dirigentes da UNITA andaram décadas por Lisboa a traficar armas e
diamantes e a tratar das suas negociatas criminosas. Mas nunca a
Procuradoria-Geral da República Portuguesa ou os serviços de combate ao
banditismo investigaram os traficantes e criminosos que circulavam livremente
em Portugal. Muito menos os raptores e assassinos de cidadãos portugueses que
viviam em Angola. Antes pelo contrário, muitos foram premiados com a atribuição
da nacionalidade portuguesa e integrados em instituições e sociedades secretas
para ficarem melhor protegidos.
Qualquer jornalista português sabe
disso, mas todos se calaram. O império mediático português foi sempre um fiel
servidor de Jonas Savimbi. Os jornais e canais de televisão do senhor Pinto
Balsemão trataram a rede criminosa como se os seus membros fossem os seus
heróis. Savimbi escolhia a dedo os jornalistas portugueses necessários às
acções de propaganda para a guerra em Angola. Os nomes dos jornalistas a quem
Savimbi pagava os seus serviços são conhecidos e continuam activos nas
redacções. Mas mantêm um silêncio cúmplice até hoje. Alguns estão agora em
lugares-chave das grandes empresas e passaram a ter como nova tarefa prejudicar
ao máximo as relações luso-angolanas. Já o escrevi aqui e volto a repetir: a
imprensa portuguesa foi responsável pelo prolongamento da guerra em Angola e as
elites corruptas portuguesas apenas se servem dos angolanos. Por trás estimulam
ataques violentos contra quem lhes dá a mão e oferece amizade desinteressada.
Continuamos a lidar com uma chocante falta de carácter.
Um antigo ministro da Defesa português,
Castro Caldas, voltou a pôr a mão na ferida. Confirmou o que todos sabíamos:
Jonas Savimbi e a UNITA foram agentes das autoridades coloniais portuguesas,
que armaram, municiaram e financiaram as suas operações para impedir a
libertação de Angola. Pensava eu que face a mais esta confirmação oficial da
traição, a actual direcção da UNITA fosse rever a sua posição de continuar a
apresentar o fundador do partido como um patriota. Mas nada aconteceu. O
defunto chefe da UNITA continua a ser glorificado pela desacreditada imprensa
portuguesa e pela liderança do maior partido da oposição.
Os recursos que foram roubados pela
UNITA em Angola para pagar os serviços prestados pelos jornalistas portugueses
ordena os silêncios e as cumplicidades em Portugal. Mas essa cobardia merece
uma profunda indignação em Angola. Por continuar ainda hoje, décadas depois da
independência, a perseguição aos interesses de Angola em Portugal, soa mal e gera
muita desconfiança quando vem a Luanda um ministro do governo de Lisboa
afiançar que a amizade entre Portugal e Angola continua de pé e os
investimentos angolanos são “bem vindos” em Portugal. Já começamos a acreditar
que isso não é sincero. Mesmo quando o portador da mensagem é Paulo Portas,
ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros de Portugal, que é líder de um
partido que nunca escondeu a sua simpatia por Jonas Savimbi e que foi director
de um jornal, “O Independente”, que tanta desinformação verteu para a opinião
pública sobre a nossa realidade.
Hoje Paulo Portas é um grande amigo de
Angola e está a ser lançado para liderar a direita portuguesa em caso de as
coisas correrem mal à actual coligação, o que mostra que é possível, afinal de
contas, um entendimento com Portugal, se calhar igual ao Entendimento do Luena,
para que se ponha fim, de uma vez por todas, às guerras e guerrinhas
portuguesas contra Angola.